O vento mordia Hugo através das roupas, era uma sensação boa. Todos os sintomas do dia anterior desapareceram e ele se sentia 100%. Havia gasto muita energia e, apesar de ter retomado os sentidos antes de atingir o chão, achava melhor tirar um tempo para se restaurar.

O tempo foi curto, visto a forma agressiva que o vento soprava. Ventanias eram-lhe muito proveitosas, ele afunilava o ar e dele tirava energia.

Balançou as pernas no parapeito do prédio, impaciente. Os Rebeldes estavam vasculhando a área, procurando por Infames sobreviventes para o abate e Rickard era minucioso, ressaltando várias vezes que um inimigo silencioso que ataca por trás é mais letal do que dez inimigos barulhentos que atacavam pela frente. O jovem não descartava a preocupação do oficial, mas ainda sentia que eram esforços inúteis.

– Achei um! – Ouviu vindo de um beco próximo.

– Quem diria? – Disse para si mesmo e deixou-se cair até o lugar.

Havia sido um dos primeiros a chegar e foi recebido com o fedor azedo de alguém que morreu de estômago cheio. Angela estava de cócoras ao lado de um cadáver e Silver estava em pé, a certa distância.

– Esse ai deve ter morrido cagando, não é possível! – Ouviu a velha reclamar enquanto mais pessoas chegavam para ver a cena.

Hugo ficou ao lado de Angela para ver o morto com mais clareza. Um homem magro e pálido, sem camisa e com tufos de cabelo faltando, o rosto era coberto com manchas escuras e rugas. A morte deveria ter sido bem desagradável, os olhos revirados estavam injetados de vermelho, os dedos estavam retorcidos em posições estranhas e a cabeça estava circulada por uma poça de vômito e espuma. – O que aconteceu com ele? – Perguntou à garota.

Ela sorriu para ele, apesar da situação desagradável. – Deve ter se envenenado. – Ela tocou o rosto do defunto. – Não está quente, mas também não está gelado. Imagino que a morte não ocorreu a mais do que algumas horas.

Hugo ficou impressionado com a forma que a garota lidava com a situação. Expressão serena, nenhum traço de nojo ou repulsa. Simpatizou com ela.

– Hey, o CSI terminou aí? – Silver perguntou. – Vai chover já, já. Se esse cara fede seco, imaginem como deve ser molhado, não é algo que eu queira ver! – Saiu do beco ao dizer isso e todos a acompanharam, menos Hugo e Angela. A jovem parecia exibir um certo respeito pelo cadáver.

– Que jeito horrível de morrer. – Comentou distante.

– Ele que decidiu se matar. – Respondeu um pouco mais ríspido do que pretendia. Angela lhe dirigiu um olhar de reprovação. Suspirou.

– Ele preferiu tirar a própria vida a morrer em nossas mãos como um porco. – Fechou os olhos estáticos do Infame caído. – Talvez eu fizesse o mesmo.

Hugo estranhou a sensibilidade da garota. – Nunca conheci ninguém que demonstrasse tanto respeito por um inimigo. – Desviou o olhar. – Sabe, eu respeito isso.

Angela sorriu para ele, retirando uma mecha de cabelo escuro da frente dos olhos. – Podemos ser diferentes em nossas ideologias, mas somos iguais na morte. – Levantou-se e pousou a mão no ombro de Hugo. – Vamos, estamos ficando para trás. – Assentiu e seguiu com a garota para fora do beco, dando uma última olhada no corpo.

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– Vamos, Rainbow! – Mariana provocou. – Me machuque!

Yasmine estava tentando machucá-la, de verdade, mas não conseguia. Sentia-se pesada e lenta em suas roupas encharcadas. – Cala a boca, Mary! Que merda! – Latiu irritada, atirando várias esferas. A condutora de água viu os ataques voarem pelos dez metros que as separavam e os interceptou com disparos d’água.

– Você pode fazer melhor que isso! – Abriu os braços, convidando a condutora de tinta a atacar. Yasmine lançou uma granada de tinta na condutora imóvel que saltou velozmente para a esquerda, desviando da explosão que deixou uma grande mancha rosa no chão.

– Vai lá, Rainbow! – Hassan incentivava do lado de fora do ringue, balançando os punhos. – Ache uma oportunidade e arrebente a cara dela!

Juliet tietava com o amigo. – Fica de olho nos pontos fracos dela! Ela é muito rápida pra interceptar seus ataques! – Agarrou-se a borda de cavaletes do ringue improvisado. – Foque mais na força do que na velocidade!

– Não adianta. – Nikola comentou com certa decepção, correndo os dedos cheios de estática pelo cabelo. - Ela não tem chance, pelo menos, não em um combate a distância.

Hassan formou uma concha com as mãos a frente da boca. – Ouviu, Rainbow? Vai pra perto e come o rabo dela! – Todos riram do incentivo, até mesmo Mary.

– Obrigado pela dica! – Yasmine agradeceu. “Droga, minha tinta está acabando.” Pensou. “Tenho que me aproximar pra drenar mais, mas minha guarda ficaria muito aberta!” Desviou de uma bolha inofensiva, lançada como uma provocação.

– Pode até tentar, Coloridinha. – Mariana voltou a provocar. – Mas saiba que eu não vou permitir.

Yasmine lançou duas teias de tinta no chão e se estilingou na direção da oponente e, com suas últimas reservas, formou uma grande lâmina em seu braço direito. – Não preciso da sua permissão! – Desferiu um golpe para baixo e Mariana desviou com um giro para o lado. Ouviu a ovação dos amigos e sorriu, redirecionando o golpe em um arco transversal para cima.

Mariana desviou do golpe. – Se sua espada for tão afiada quanto sua língua, não tenho chance! – Continuou se esquivando enquanto Yasmine golpeava cada vez mais rápido. Girando, estocando, cortando, fintando, mas perdeu o ritmo quando lançou um golpe forte demais para fora e se desequilibrou, Mary estava atenta, deu um passo a frente, ficando fora do alcance da espada, pegou o braço de Yasmine e a girou sobre o ombro, derrubando-a de costas no chão.

A garota ficou de quatro e foi atingida por uma chuva de cascalho no rosto, perdendo a visão e recuando sentada.

– Qual é, areia na cara? Sério? – Esfregou os olhos ardidos e viu um jato de água voando para afogá-la. Postou a lâmina como um escudo e deteve a torrente.

Apoiou-se no joelho e levantou ainda contendo o fluxo e avançou lentamente, pisando com força.

– Vou te pegar, Mary, não adianta! – Girou para o lado e atirou um paintball na condutora, que conseguiu desviar, mas interrompeu o jato.

A condutora de tinta avistou uma abertura e entrou com tudo, avançando os três metros que as separavam com um salto, abaixando e girando.

Se sua lâmina fosse afiada, e não era, cortaria Mariana na metade.

Por isso, estranhou quando cortou a garota como uma faca quente na manteiga.

Arregalou os olhos ao ver sua lâmina sem fio retalhando a cintura da garota e sufocou um grito, sabendo que não conseguiria deter o golpe. Olhou para o rosto de sua vítima e viu um sorriso travesso estampado ali. Compreendeu.

Mariana havia se liquefeito por um instante para desviar do golpe.

“Merda...” Havia usado muita força no golpe e viu que a oponente a tinha com a guarda totalmente aberta, não conseguiria desviar do próximo ataque.

–Hum, essa vai doer. – Mariana lhe confidenciou e deu um soco poderoso no estômago de Yasmine.

Dito e feito, a condutora de tinta caiu sentada, uma das mãos envolvendo o estômago que parecia ter rompido. – Puta que pariu! – Ouviu Hassan gritar.

Conseguiu reprimir a dor depois de alguns segundos e levantou com um salto, impulsionando-se para frente com um soco amplo armado e mirado no rosto de Mariana.

– Opa! – Ela se esquivou rodando para o lado e logo depois, Yasmine sentiu a cabeça explodir em água fria.

Perdeu o ar e caiu atordoada, momentaneamente surda. Havia sido atingida por um disparo de água a queima-roupa no lado direito da face e a sensação não fora nada boa, o olho esquerdo ardia e o ouvido estava doendo terrivelmente.

Mary estava olhando para ela com uma expressão de divertimento. – Pronta para desistir? – Yasmine estava mais do que pronta, mas não iria.

– Dessa vez, não... – Tentava por os pensamentos em ordem e analisar o terreno. O chão de cascalho estava coberto por uma grande camada de tinta rosa que fazia com que os passos de Mariana soassem úmidos e obscenos. Observou como a tinta manchava as botas da adversária e sentiu uma faísca de uma ideia acender em sua mente, sorriu.

– Qual a graça? – Mary perguntou retribuindo o sorriso. Yasmine não respondeu, ao invés disso, espalmou as mãos na tinta que cobria o chão e desejou que a mesma se tornasse pegajosa e adesiva. Mariana travou e viu que os pés estavam colados, começou a lutar para se soltar, mas não teve muito sucesso. – Ah, essa é a graça. – Perdeu um pouco do ar divertido.

– Não, essa é a graça... – Yasmine afundou na tinta, desaparecendo.

Todos arregalaram os olhos, Nikola desatou a rir. – Olha só! – Apontou para a mancha onde a garota desaparecera e abraçou Juliet. – Viu?

Mon Dieu... – Hassan deixou escapar. – Acho que alguém está ferrada

Mariana olhava para todos os lados. – Acho que você está certo, Loup. – Sorria frente ao próprio infortúnio. – Cadê você, Rainbow? – Sua resposta foi um borbulho suspeito vindo da mancha. – É um belo truque, mas eu já entendi seu lance. – Deu um passo grudento para trás. – Você não consegue mergulhar no chão, só na tinta. – Deu outro passo. – Então, eu devo estar segura em terra firme. - Jogou uma bolha de água quente aos próprios pés e amoleceu o adesivo que prendia suas solas, então deu um salto para trás, sorrindo vitoriosa, mas, para sua surpresa, um tentáculo de tinta voou do chão e prendeu seus tornozelos, fazendo com que caísse de costas naquela cola.

– Puta que... – Deixou escapar quando sentiu os cabelos grudando no chão.

Hassan bateu palmas uma vez com força. – Há! – Apontou o dedo para a amiga caída. – BOOYAH! – Nikola abraçava Juliet forte, que era a única que não parecia tão eufórica, e chorava de rir.

Mariana se debatia, mas a tinta se fixava com força. Um braço envolveu seu pescoço e ela cerrou os dentes, libertando as mãos e arranhando, arrancando grandes pedaços de derme de tinta, mas Yasmine não recuava, continuava a puxar.

Quando Mary percebeu que a condutora de tinta não tentava asfixiá-la, mas sim, afogá-la, sentiu uma pontada afiada de desespero em sua espinha. Libertou as pernas e se apoiou nelas, formando um arco com o corpo, mas o aperto em seu pescoço era de aço. Travou os dentes até sentir que estava afundando. O sumidouro havia alcançado suas sobrancelhas e ela via apenas a imensidão rosa acima e o resto do mundo abaixo.

A visão invertida e o cheiro enjoativo a afligiu com uma onda de náusea e tontura. Piscou longamente.

–Já chega, me rendo! – Disse em uma respiração, porque sabia que inspirar aquele odor a faria vomitar. Caiu de costas.

O aperto sumiu e alguns segundos depois, a cabeça Yasmine surgiu, rompendo a superfície da tinta e tragando uma grande quantidade de ar puro. – É quente pra cacete lá embaixo. – Trouxe as mãos para fora e se içou até a cintura, daí usou as pernas e ficou em pé. - Precisa de ajuda ai? – Perguntou desdenhosa para a amiga presa como uma mosca. Não obteve resposta, mas decidiu ajudar. Novamente espalmou as mãos no chão e a tinta ficou líquida e oleosa.

Mariana se apoiou nos cotovelos e engoliu seco, desolada. Yasmine drenou a tinta do chão e sentou de frente para ela. – Tudo bem? – Ouviu os amigos chegando e a parabenizando, mas calou-os com a mão. Aproximou-se com cautela. – Hey, Mary, tudo bem? – A condutora de água soltou o ar e sorriu.

– Meu cabelo... Deve estar uma merda. – Levantou e viu que Yasmine estava rosa da cabeça aos pés e riu. - Você está precisando de um banho, Rainbow.

– Vocês duas estão. – Juliet constatou. – Com urgência.

– É, é, pode até ser, mas antes, precisamos comemorar! – Hassan deu um tapinha no ombro de Yasmine. – A primeira vitória da Rainbow! Acho que o Forrest trocaria essa luta por uma rodada das boas, o que vocês acham?

–Provavelmente. – Nikola estava distraído, pois pisara em algo e tentava raspar a sola da bota com a faca.

– Olha, uma cerveja não me mataria. – Mariana parecia mais animada. – Nem umas nozes.

O estômago de Yasmine roncou, aquilo consumira bastante energia. – Podemos comer antes de ir? Estou faminta. – Levantou e drenou a tinta que lhe cobria, revelando uma garota brilhando de suor com cabelos longos e coloridos unidos em uma trança. Fez o mesmo em Mariana. – Olha, Mary, seu cabelo continua uma maravilha! – A condutora de água correu os dedos pelos cachos, feliz.

– Nunca mais faça isso, Rainbow. – Limpou o cascalho da calça. – Sério, não foi legal.

– Mesmo? Estava bem legal do meu ponto de vista. – Retrucou com um sorriso atrevido. – Mas da próxi... – Foi interrompida quando Hassan a pegou nos braços e jogou por cima do ombro como se a raptasse e começou a andar. – Que porra, Loup!

– As duas podem conversar mais tarde, cachaça não pode esperar! – Afastou os cavaletes com o pé e subiu a rampa que saía daquele canteiro de obras. – E não esperneie, ouviu?

Yasmine gargalhou. – Ok! Mas aonde esse Forrest mora?

– Queens, umas quadras daqui. – Juliet respondeu. – Você vai gostar de lá, não se preocupe.

– E o Forrest vai gostar de você. – Nikola se espreguiçou.

– Como pode ter certeza? – Eles riram. – Qual a graça?

Mariana deu um peteleco no nariz da amiga raptada. – É que você é muito estranha! – Sorriu da expressão de dor. – E ele gosta de coisas estranhas.

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Já estava claro quando Hunter chegou à base, um antigo condomínio de luxo perto do Central Park.

Entrou pelo portão destrancado e pela porta de vidro. lá dentro, encontrou um casal abaixo da escada, um cara loiro e baixinho e uma menina, também loira, só que alta. Ambos estavam sentados e sorriam um pro outro sem dizer nada.

– Com licença? Saberiam dizer onde eu posso ter uma refeição? – Perguntou educado. O rapaz olhou para ele.

– Não sabe? – Respondeu com uma pergunta.

Hunter forçou um sorriso e coçou a cabeça. – Desculpe amigo, acabei de chegar. Vim de Boston. – Ninguém nunca suspeita de Boston. – Não sei de nada desse lugar.

– Ora, e o que traz alguém de Boston até aqui? – O loiro franziu o cenho, Hunter tentou manter a expressão amigável.

– Minha irmã. Vim ficar com ela, mas ainda não a achei, então pensei em tomar café da manhã e ir procurá-la.

– Sua irmã? – O sujeito já estava tirando-o do sério, mas limitou a assentir.

A moça olhou para Hunter como se ele fosse um empecilho. – E como ela é?

– Alta, morena, cabelos cacheados. – E acrescentou.

– Nome? – Perguntaram juntos e sorriram um pro outro.

–Mariana.

O loiro fingiu verificar seu registro mental antes de dizer. – Não conheço nenhuma Mariana. - Ao ver a expressão de decepção de Hunter, acrescentou. – Mas seguindo a rua em frente, tem uma antiga escola. É lá que nós fazemos as refeições, ela deve estar lá.

– Ok, vou lá, muito obrigado...

– Emerick. – O loiro se apresentou de forma ríspida. – E essa é a Zoey.

Zoey acenou desinteressada, dando tchau. – Boa sorte.

Hunter assentiu e deu-lhes as costas, sorrindo de canto. Condutores se acham tão espertos com suas perguntas.

Saiu do prédio e seguiu pela rua, indo na direção indicada. Eles deram a sorte dele estar faminto, já havia matado por menos.

Sentiu o estômago roncar enquanto andava, já fazia alguns dias desde que comera algo. Começou a divagar com o que encontraria lá, pão quentinho, café, ficou com água na boca. Afastou os pensamentos que o deixavam mais faminto e se concentrou no caminho a frente. Em sua direção, vinha uma pessoa apenas, um sujeito magrelo com uma cicatriz feia abaixo do olho direito. Hunter reconheceu ele.

–Merda. – Sussurrou e saltou para dentro de um beco, se escondendo atrás de uma caçamba de lixo. – Mas que merda! – Esperava que não tivesse sido visto, pois caso tivesse, teria que lutar e não estava com vontade disso no momento.

Espiou pelo lado e viu que o cara havia entrado no beco.

– Acha que eu não te vi entrando aqui? Filho da puta! – Confirmando as suspeitas de Hunter, ele se aproximava. – Você lembra dessa cicatriz? – Parou de espiar e sacou a faca quando ouviu a pinball gun em seu braço retinindo contra a lixeira, foi muito baixo para seu inimigo ouvir, mas o som conseguiu arrepiá-lo dos pés a cabeça.

“Merda” Amaldiçoou em silêncio. Viu que o beco se iluminara como se o sol incidisse diretamente pela entrada, mas Hunter sabia que era o condutor que acendia.

Hunter havia analisado a pinball gun antes e percebeu porque ganhara esse nome, uma câmara oca com um pequeno vão, onde algo poderia ser colocado, e um pino preso a uma mola que disparava o objeto na câmara depois de tensionado, bem simples e útil, mas ele não tinha nada o que por na câmara, então aquilo era apenas um peso em seu braço.

O condutor se aproximava e Hunter lançou uma lata no final do beco para distraí-lo, e lá ele foi, mordendo a isca.

Porque ninguém nunca via a lata voando ele não sabia, mas já havia usado esse truque várias vezes. Quando o condutor ressentido deu-lhe as costas, Hunter viu uma oportunidade e, silencioso como um gatuno, levantou e saltou para cravar a faca em sua nuca, mas o alvo se virou e Hunter errou, acertando o ombro apenas.

O condutor gritou e deu um soco no peito de Hunter, fazendo-o voar até o final do beco e perder sua faca, que continuava fincada. – FILHO DA PUTA! – As mãos dele arderam em brasa e ele correu na direção do oponente caído. Hunter conseguiu se recuperar e desviou de um soco flamejante por baixo, levantando e recuperando a faca, que emitiu um som úmido ao soltar-se do ombro, não viu o soco chegando e o recebeu no estômago, cuspindo.

A mão quente o levantou pelo pescoço. – LEMBRA DESSA CICATRIZ? – Foi erguido no ar. – VOCÊ QUEM FEZ! – Sentiu o aperto aumentar em força e temperatura. – VOU TE FAZER VIRAR PÓ!

Aquele infeliz que o estava matando era um condutor de fogo, Hunter acreditava, os dois haviam se encontrado há um mês e foi feio, Hunter talhou um corte fundo no rosto dele e ele derreteu o anel de Hunter em seu dedo. Muito azar ele o encontrar de novo.

Conseguiu dar uma joelhada entre suas pernas, fazendo com que o cabeça-quente o soltasse, então deu um soco em seu queixo, fazendo com que o anel deixasse uma marca.

– Lembra desse anel? – Sacudiu a mão que ardia levemente.

O inimigo mostrou os dentes e sacou a própria faca, saltando para trás.

Ambos se encararam em silêncio e o condutor deu o bote.

A lâmina foi reta, indo ao estômago de Hunter, que a desviou. Então, um corte foi lançado em seu rosto, debaixo para cima, mas ele girou e se abaixou, caindo com uma das mãos no chão e usando-a para impulsionar seu golpe mirado na virilha do oponente, que conseguiu bloquear.

Ficaram congelados naquele momento de tensão por um milissegundo. A bota do condutor avançou na direção de seu rosto, mas de novo, Hunter se esquivou caindo, dessa vez para o lado esquerdo, rolou no chão e levantou correndo na direção da parede. O oponente deu um longo passo, o seguindo, e achou que o havia encurralado, porém se viu enganado quando Hunter saltou, chutou a parede e virou a mesa, voando sobre o inimigo que conseguiu parar a faca, mas não o soco no rosto.

Ao ver o inimigo atordoado, deu um golpe com a palma aberta em seu nariz, sentindo a cartilagem ceder e o sangue esguichar.

Massageou a garganta dolorida e, aproveitando que o inimigo tonteava, segurou a mão da faca dele com a mão livre e enfiou a lâmina em seu antebraço, abrindo até o pulso em um movimento fluído, fazendo-o soltar a faca. O condutor ia gritar, mas a lâmina de Hunter perfurou sua bochecha e meteu-se na sua boca horizontalmente.

Cego de dor atingiu o lado do rival com um soco que fez a coluna de Hunter estalar. As pernas bambearam e ele caiu, recebendo outro soco, dessa vez no rosto.

“Agora estou morto” Pensou enquanto levava outro soco e sentia a visão turvar. O condutor removeu a faca da boca e voltou-a contra a garganta do dono, mas Hunter conseguiu segurar seu pulso. As mãos dele queimavam contra a pele do adversário e o cabo de sua faca derretia entre os dedos dele.

– Sério mesmo que você, um normal, acreditou que podia me matar?! – O condutor cuspiu sangue quente no rosto do adversário. – VOCÊ É SÓ UM NORMAL! – Hunter era forte, mas só conseguia impedir a faca porque havia inutilizado uma das mãos do inimigo e ainda tinha as duas. Respirou fundo e sentiu algo duro na boca, parecia uma pequena pedra.

Uma ideia desesperada surgiu em sua mente.

Jogou o pulso do inimigo para o lado e puxou, fazendo a faca rasgar a manga de sua jaqueta e expor a pinball gun, a lâmina retiniu no chão, escapando.

– Que merda? – O condutor confuso tentava recuperar a faca. Hunter puxou o pino e abriu o tambor da arma, cuspindo a pedra em sua boca lá.

Viu que na verdade não era uma pedra, e sim um molar de seu inimigo, mas não importava.

Colocou o cano de saída no olho do condutor confuso e liberou o pino.

Sentiu a mola liberando a tensão e o tranco que reverberou pelo seu braço.

Jogou o corpo inerte para o lado e este entrou combustão, desaparecendo em chamas. Hunter sentou com o coração martelando e a garganta dolorida, limpou o rosto e ficou em pé testando as pernas. Estavam boas.

Abaixou para pegar a faca meio derretida e, para não se queimar, rasgou a manga da jaqueta em tiras que usou para envolver o cabo. Tendo o trabalho feito, escondeu a faca na cintura.

Sentiu as costar doerem, mas ignorou.

Trocou a pinball gun de braço e a escondeu sob a manga. Formou uma imagem mental de si mesmo, um sujeito encapuzado, mal-encarado, vestindo uma jaqueta de couro que expunha seu braço direito com algumas cicatrizes. Combinava perfeitamente com os condutores cheios de atitude e individualidade daquele circo que era Manhattan.

Sentiu o estômago roncar pelo que esperava que fosse a última vez e foi na direção da escola, torcendo para que nada ficasse entre ele e sua futura refeição.