In Real Life

Acting Class


—Onde diabos você foi parar ontem a noite?


Selena estava esbravejando, isso era um grande indicio de que tinha ficado preocupada. Estávamos na escola, por algum motivo desconhecido eu cheguei cedo. Cedo ao ponto de conseguir levar uma bronca das minhas próprias amigas. Assim que passei pela porta encontrei-as sentadas em cima da mesa do professor, que ainda não havia chegado. Estreitei os olhos surpresa com tanta demonstração de inquietação.


—Eu... Fui embora mais cedo.


—Oh, jura? Custava muito ter avisado, não é? A gente te procurou pelo quarteirão inteiro.


—Eu não consegui avisar, okay? – respondo com uma voz calma, tentando fazer com que ela falasse mais baixo.


—Sério? Deve ter um ótimo motivo pra isso.


—É claro que eu tenho. – respondo em um tom defensivo.


—Será que pode nos contar então?


—O Wilmer estava na boate. Ele veio atrás de mim enquanto eu estava dançando. – abaixo a voz, deixando um pouco mais alta que um sussurro.


Por um ou dois segundos elas me olharam em silêncio. Foi uma droga mesmo. Eu estava enlouquecendo com a batida da musica, dançando como se não houvesse nada e nem ninguém a minha volta. Dançar era como cantar para mim, os dois eram coisas inexpressíveis, inexplicáveis. E o meu momento foi quebrado por duas mãos grandes que seguraram minha cintura por trás. Num primeiro momento não me importei até sentir o corpo do cara se colando de mais ao meu. Lembro que tive dificuldade em me afastar por que ele aumentou o aperto, mas assim que ameacei gritar ele me virou para ele. Fiquei surpresa, mas apesar de não ser exatamente agradável vê-lo ali também não chegava a ser ruim.


—Wilmer? O cara doze anos mais velho que você? – Miley finalmente se fez soar, ainda receosa.


Fato foi que ela falou isso alto de mais e atraiu olhares de alguns alunos da sala, inclusive os olhos do senhor perfeito. Prendo alguns palavrões e me viro lentamente para as garotas de novo, rezando e pedindo por um pouco de paciência.


—Exatamente. – deixo o cenho franzido, sentando na primeira carteira da fileira mais próxima delas. – Só que isso não é exatamente uma coisa pública, então querem fazer o favor de falar mais baixo?


—E o que aconteceu afinal? – Selena me cortou, ignorando minha ultima sentença.


—Nada, ele tentou puxar assunto. Só que ontem eu não estava com saco para aturar ele. Eu arranjei uma desculpa e sai pela tangente. Na correria eu me esqueci de avisar vocês e quando cheguei no meu quarto a bateria do meu celular tinha pifado.


—Mesmo assim, custava ter parado em um telefone público? – a Gomes insistiu


—Você aceitaria uma ligação a cobrar de um numero que você nem sequer conhece? – ergo uma das sobrancelhas.


—É claro que não.


—Então pronto. – rio ironicamente, levantando e indo me sentar no meu lugar no mesmo instante que o professor resolveu aparecer.


Antes mesmo de ter a sala toda completa o professor já estava mandando a gente para o anfiteatro, usando argumentos divertidos e dizendo que os atrasados saberiam onde nos encontrar. Pelo menos um dia da semana a primeira aula me era agradável. Teatro sempre me foi fácil e sem mistérios, além de ser encantador interpretar personagens novos e cheios de conflitos internos. Querendo ou não era uma ótima forma de colocar as minhas dúvidas e meus temores nas ações de uma pessoa paralela, inexistente. Além de enriquecer a atuação, ninguém desconfiava de que estava colocando meus sentimentos para fora dessa forma.


—Não sou muito de teatro e seus derivados, mas admito que sair da sala sempre é uma ótima coisa a se fazer – Comenta Miley, bocejando.


Seguimos em direção ao térreo, virando a esquerda em dois corredores pequenos até chegar a porta dos fundos do camarim improvisado. A turma não era exatamente pequena, então ficamos todos espremidos. Algum momento alguém lá atrás começou a questionar a nossa entrada por ali. Dois segundos depois a bagunça virou um coro de reclamação.


—É verdade professor, por que a gente tinha que entrar por aqui? Tem uma entrada bem maior do outro lado. – comento, cruzando os braços.


—Ninguém mandou vocês me seguirem. Vocês poderiam muito bem ter chegado ao palco pelo outro caminho. Aliás, cadê a independência de vocês agora? Por que tem que me seguir em vez de escolher o próprio caminho? – Ele sorriu, dando sinal claro de que estava apenas nos ensinando uma lição. A reação do resto dos alunos não foi muito positiva, mas me fez pensar que ele tinha razão. Em nenhum foi dito que era para nos o seguirmos, só para ir ao anfiteatro.


Alguns momentos depois todos estavam espalhados pelo palco e pelas três primeiras fileiras da platéia, conversando como se já tivesse chegado a hora do intervalo. Não deu nem cinco minutos e logo o professor estava chamando a atenção de todo mundo. Pegou uma cadeira que estava no canto do palco e subiu em cima, vestindo sua expressão séria e gesticulando abertamente com os braços, começando a recitar alguns trechos conhecidos de Shakespeare.


—“Os homens de poucas palavras são os melhores”.


Ainda haviam alguns risinhos por parte dos rapazes mais sem-graça que tinham na sala. Logo eles ficaram calados, oprimidos pelo rosto que não aparentava brincadeiras do professor.


—“Lutar pelo amor é bom, mas alcançá-lo sem luta é melhor”.


O silêncio reinou mais imponente na sala, onde as garotas mais atrevidas olharam para baixo e os garotos bocejaram em tédio. Eu continuava presa em minha redoma de vidro invisível, refletindo a profundidade das palavras que o professor estava recitando. Como o resto das pessoas não conseguia refletir também? As colocações das frases faziam todo o sentido na minha cabeça, no entanto parecia tão irrelevante para os outros alunos.


—Certo, vocês já conhecem essas citações. Agora entra a parte mais interessante e divertida. Ah, e antes que se desinteressem, vale como nota mensal, traduzindo, façam por que se não fizerem vão se ferrar. – Terminou a frase com um pequeno sorriso. – Formem duplas.


Grudei-me na Miley e na Selena, e assim que ele olhou nossa cara de imploração revirou os olhos e gritou que seriam duplas mistas. Uma garota e um garoto. Praguejei baixinho, maldizendo pela primeira vez uma atividade da aula. Em um piscar de olhos David estava ao lado de Selena, tentando convencê-la a fazer par com ele. Miley já tinha corrido atrás de Nick e agora eles conversavam animadamente. Suspiro ao perceber que estava sozinha nessa. Qual é, posso muito bem fazer um ótimo trabalho sozinha. Tão só quanto o Joe, que acaba de me olhar e está vindo na minha direção.


—Sem dupla, hã?


—Não é como se eu estivesse vendo você com uma garota ai do seu lado. – caçôo dele.


—Agora está. Parece que vamos ter que fazer um trabalho juntos.


Dou de ombros, aceitando a proposta. Não é como se eu me importasse em fazer trabalho com ele, na verdade não fazia diferença alguma para mim. Bom, tudo que não me afetou pareceu afetar Ashley, que estava do outro lado da sala me olhando como se eu tivesse peste negra.


—Tudo certo turma? Então vamos lá. O nosso exercício vai...


—Na verdade, professor, não está tudo certo! – Grenne cortou sua fala com sua voz fina. – Não estou satisfeita com a minha dupla.


Kevin que estava postado do seu lado não pareceu ficar nenhum pouco contente com a conclusão da garota. Cruzou os braços e revirou os olhos, indignado. Qual é a dessa menina? Sem sua interferência tudo poderia estar correndo naturalmente agora.


—E o que quer que eu faça? – o professor devolveu, massageando os lados da cabeça com as pontas dos dedos.


—Troque de dupla. – respondeu prontamente.


—Alguém se candidata?


Ninguém se pronunciou, o que me fez prender um riso nervoso. Com aquele gênio dela nenhum garoto iria querer chegar a três metros de distância. Sorte foi ter conseguido Kevin e nem assim ela ficou satisfeita.


—Na verdade, se possível, eu adoraria fazer o trabalho com o Kevin.


Todo mundo se virou para o canto esquerdo, onde Danielle corava por ter falado aqui em voz alta. Ele não esperou mais nada e logo foi para o lado dela, ignorando Sterling que era o antigo par dela.


—Pronto – disse o professor de novo. – Sterling, você faz com a Ashley agora.


—Eu não quero esse nerd!


—Na verdade quem não quer fazer dupla com você sou eu. – o senhor perfeição ergue uma das sobrancelhas.


O professor acaba se exaltando e solta alguns palavrões baixinhos. Eu sabia bem quem ela queria, e acho que Joe também, por que após um lento revirar de olhos ele se levantou do meu lado e murmurou que faria com ela. Ou seja, ele me abandonou e nem sequer pediu desculpas. Por que isso me soa meio nostálgico? Ah, talvez seja por que ele já fez isso comigo. E ironicamente me trocou pela mesma garota. Droga, isso é apenas uma trabalho.


—Desculpe se prefiro a revoltada à atirada.


A voz do Knight me despertou das minhas divagações e dou de ombros, forçando a mesma indiferença para ele que dispensei para o Joe. O fato é que eu me importava em fazer com ele sim, por que já o estava odiando por me dar aulas de reforço. Maldição!


—Será que agora eu posso falar qual vai ser o trabalho de vocês?


Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.