I'm Here Again

11. We're made for one another


Pov's Houston

Desde pequena eu tinha alguns “hábitos de vestimentas” completamente impróprios para fora de casa – agradeço ao meu pai, sem ironia – como, por exemplo, andar apenas com uma camiseta pela casa – isso mais ser uma criança completamente sem modos rendeu muitas fotos comigo pagando calcinha – o que agora se transformou no contrário, vivo andando pela casa apenas de short, principalmente se meu cabelo estiver molhado, como agora.

Depois de ter tomado banho, coloquei um short jeans preto e um top – daqueles de alça unida que fecham na frente, acho que o nome certo é “nadador” – e desci as escadas na minha casa, pulando feito uma idiota, até a cozinha onde pretendia achar algo para comer.

Minha casa estava completamente vazia, meu pai estava na empresa e minha mãe sendo voluntária no hospital como fazia antes de eu nascer, e assim tem sido desde o começo desse mês. Ou seja: ou eu deixava a preguiça de lado e me virara, ou morria de fome.

Estava cedo para a janta, mas eu não comia nada desde o almoço, estava morrendo de fome! Era questão de sobrevivência, eu tinha que matar o que estava me matando naquele momento.

Concordo com meus pais trabalharem, mas acho que andam esquecendo de por comida em casa, sempre que venho procurar algo para comer entre as principais refeições quase viro a cozinha de cabeça para baixo e se der sorte acho alguma coisa, caso contrário, tenho que gastar o restinho do meu dinheiro do lanche com alguma besteira da rua.

Ou seja, nada nos armários e mal, mal na geladeira, me obrigando a ficar parada feito uma sonsa esperando que por algum milagre aparecesse algo comestível ou que alguma ideia genial do que comer se iluminasse na minha cabeça. Mas no final da conta fiquei involuntariamente e distraidamente dançando “Elle Me Dit” do Mika na frente da geladeira até o telefone da casa tocar e eu parar de ser tão demente, fechar a porta e ir atender.

— Lô? – atendi despreocupada, roendo um pedaço da minha mísera unha que estava me incomodando.

— Lua?

— Eu? – e então minha despreocupação foi embora assim que ouvi Pattie Mallette falar do outro lado, com um tom de alarme que jamais ouvi sair de sua boca.

— Graças a Deus você atendeu!

— Sra. Pattie, aconteceu alguma coisa?

— Justin está mal!

— Mas o que ele tem? A dor de cabeça não passou?

— Ah querida, quem me dera se fosse isso!

— Então o que houve?

— Ele está com um sério problema nas cordas vocais. Aquele menino! – notei que ela se esforçou para não falar coisa pior. Ela respirou fundo. – Parece que isso já está vindo de um tempo, as dores de cabeça frequentes podem ter alguma ligação, mas ele disfarçava para não precisar cancelar nenhum show e agora mal consegue falar.

— Mas o que eu posso fazer Sra. Pattie? Quer que eu ligue para minha mãe? Ela pode falar com um médico, ou sei lá.

— Nós já fomos ao médico, assim como a Mama Jam disse, ele precisa descansar bem a voz, mas sabe como ele é teimoso não sabe? E nem tomar o remédio quer! Diz que dói a garganta.

— Sra. Pattie... eu não... não sei o que posso fazer.

— Vem para cá Lua, talvez ele te escute e te obedeça.

— A mim? Mas a senhora sabe que Justin e eu não andamos muito bem um com o outro.

— Eu sei, eu sei, mas, por favor, você é minha última esperança. Ele pode não cantar mais.

Deixar de cantar? Não! Justin odiaria isso! Os palcos são o melhor lugar do mundo para ele, abandonar suas fãs assim é a morte para ele. Não! Não pode. Sem contar que eu sacrifiquei e sofri muito para dar um pontapé inicial para toda essa Bieber Fever, fui embora para agora ele ser teimoso? De jeito nenhum! Não passei por tudo o que passei, não movi uma palha para ficar, para que Justin abandonasse a carreira em tão pouco tempo.

— Ok, estou indo.

Respondi e quase senti o alívio intenso da Pattie antes que eu desligasse.

O desespero era tanto que eu peguei apenas uma jaqueta de frio cinza e fina que, não lembro mais por qual motivo, estava jogada na sala e vesti, peguei as chaves e saí de casa sem saber mais se eu estava indo à casa da frente por ele ou por mim. De qualquer modo, saí de casa as pressas, sem apagar as luzes, nem mesmo pegar o celular, muito menos comer, mas naquele momento nem fome eu tinha mais.

Bati na porta tentando conter o desespero e Pattie abriu, ela estava realmente desesperada.

— Obrigada por ter vindo, eu sei da briga de vocês, mas...

— Tudo bem, onde ele está?

— No quarto, deitado.

— Vou subir – comecei a subir a escada, mas apenas os dois primeiros degraus antes que a Sra. Pattie me parasse.

— Lua, espera. Aqui o remédio que o médio receitou – ela me entregou uma cartela e um copo de água.

Continuei a subir as escadas, mas com cuidado para não derrubar o copo ou só a água. Cheguei ao quarto do Justin e entrei sem nem mesmo bater na porta.

— Lua? – ele tirou os olhos do Ipad que mexia enquanto estava deitado e me olhou surpreso. Sua voz rouca e desgastada também tinha surpresa.

— Sua mãe me ligou, disse que você não estava bem.

— Mas eu – ele pigarreou – eu estou bem – comecei a sentir muito calor, então arregacei as mangas da blusa de frio.

— Justin, sua voz está horrível! Quer enganar mais a quem?

— Isso? Ah! Não é nada! Logo vou melhorar.

— Sem tomar o remédio que o médico receitou não vai mesmo.

— Pelo jeito minha mãe fez um relatório completo né? Eu vou ficar bem, já disse.

— Você sabe que pode ter que parar de cantar?

— Mas isso não vai acontecer.

— Vai se você continuar sendo teimoso – me aproximei e sentei na beira da cama, depois, sem falar nada, estendi o copo e o remédio.

— Eu não quero, minha garganta dói mais.

— Imagino, sempre que fico com a garganta inflamada detesto tomar o remédio, mas tenho que tomar e logo passa. Isso deve ser pior do que uma simples garganta inflamada e deve demorar mais para passar também, mas a males que vem para bem. Ou você toma, ou cancela essa sua amada vida de cantor e suas adoradas fãs.

Sem nem pensar direito ele pegou a cartela da minha mão e tirou uma das mini pílulas brancas, depois me entregou a cartela e pegou o copo virando tudo de vez com o remédio já dentro da boca.

Fez emburrado, mas fez.

Coloquei o copo vazio e a cartela na escrivaninha do lado e me levantei da cama.

— Agora melhor você dormir.

— Mas não quero!

— Problema é seu, tenta. Do jeito que é tagarela aposto que não calou a boca o dia inteiro, então dorme, assim fica quieto.

— Que amável você é.

— Eu sei. Agora deita – ele escorregou na cama se deitando e eu o ajudei a se enrolar, me sentando na cadeira da escrivaninha que estava ao lado da cama – e descansa.

— Mas eu não quero, já disse.

— E eu já disse para tentar.

— Mas eu estou sem sono.

— Se você não dormir não vai ficar quieto.

— Vou sim!

— O que me garante se não está agora? – ele ficou quieto enquanto pensava.

— Mas eu... – cansei de argumentos e teimosia.

Inclinei meu corpo e o beijei, foi a única opção que pensei ser eficaz naquele momento, então aproveitei o impulso e beijei.

— Agora cala a boca e dorme – disse no tom de voz mais suave que consegui fazer quando se manda alguém calar a boca.

Justin parou de me encarar um tanto perplexo e fechou os olhos, antes fixos nos meus, suavizando todas suas feições aparentemente mais velhas, devido ao cansaço e trabalho duro de um artista teen.

Me levantei para sair do quarto e deixá-lo dormir, e teria feito isso se ele não tivesse segurado meu pulso.

— Fica, por favor – ao ouvir sua voz absurdamente rouca, virei a cabeça para trás e encontrei seus olhos ainda fechados.

Ele pediu e eu obedeci.

Sentei na cadeira de novo, mas ele não soltou o meu pulso, ou melhor, afrouxou apenas o suficiente para deslizar e segurar a minha mão. Eu sabia que ele ainda não havia dormido, mas estava tentando, apesar disso, não resistir em levar a minha mão livre até seu rosto e acariciar o mais delicadamente que consigo, desenhando com os dedos cada contorno de sua face virada para cima, e deixando todas as lembranças virem como bombas e se espalhando feito fogo em minha mente. Não só lembranças dos sorrisos que eu dizia serem tanto meus, dos olhares que me tiravam do chão e dessa perfeita junção que me tirava o ar, mas das sensações de cada toque, dos beijos... das alegrias compartilhadas, de cada momento feliz onde eu não sabia o quanto o mundo podia ser tão perfeito.

Mas minha mente não poderia parar por ali, claro que não, era pedir demais a ela. As lembranças começaram a vagar pelo lado obscuro. Comecei a bloquear todos os pensamentos e sensações de dor e de choro que começaram a aparecer e consegui me controlar antes que me debruçasse em lágrimas e o acordasse com os meus soluços ou com a tentativa de controla-los.

Quando tive certeza que Justin dormia e que já estava ficando complicado demais ter que lembrar daqueles momentos, soltei a mão dele lentamente da minha e saí do quarto fazendo um esforço tamanho para não fazer barulho e não fechei a porta, apenas a encostei um pouco e caminhei lentamente até as escadas além de para não fazer barulho, como para me recompor.

Pattie chegou e ficou me esperando no pé da escada, encostada no fim do corrimão e me olhando como se eu fosse uma dádiva de Deus, o próprio milagre, com esperança transbordando pelos olhos.

— E aí? – ela não resistiu e perguntou, acho que eu estava descendo as escadas, lenta demais para a curiosidade dela.

— Ele tomou o remédio e agora está dormindo.

— Oh! Graças a Deus! – ela se aliviou completamente, só deixando um fio de preocupação, afinal ele não estava totalmente bem.

— Cadê o Scooter? Ele sabe?

— Não, obrigada por lembrar, tenho que ligar para ele. Foi tudo rápido demais. Com essa coisa do CD e de clipes e a quantidade de shows aumentando cada vez mais o Scooter anda bem ocupado. No mesmo dia que ele foi resolver o show no Madison Square Garden aconteceu isso. Vou ligar para ele.

— Não, deixa que eu ligo. Por onde posso?

— Pode ser pelo meu celular, só que ele está no meu quarto.

— Eu pego se não se importar.

— Tudo bem – eu havia parado no quarto degrau e subi tudo de novo com certa urgência, mas procurando fazer o menos barulho possível. – Está na escrivaninha perto da porta! – ela falou um pouco alto e eu assenti já entrando no corredor.

Fui até o quarto da Pattie no final do corredor respirando fundo e me preparando para falar com Scooter – imagino o quanto ele me atenderá bem. Abri a porta devagar, observando o quarto. Não me lembro de já ter entrado no quarto da Pattie, mas fiquei temporariamente deslumbrada. Era um pouco maior do que o do Justin, todo perfeitamente decorado em tons de marrom, bege e verde escuro, com cada móvel aparentemente escolhido a dedo.

Por mais que eu estivesse ficado admirada com o quarto, logo minha mente rápida, impulsiva e embolada me lembrou do real motivo de eu estar ali. Me virei procurando a escrivaninha e quando achei, fucei em meio os papeis até achar o celular que estava na minha cara, ao lado de um porta lápis colorido, escrito “Para mamãe” e embaixo, tinha o nome do Justin e a série que estava meio ilegível, talvez primeiro ano.

Peguei o celular e saí do quarto já procurando o nome de quem eu deveria ligar.

— Scooter... Scooter... Scootter... – falava comigo mesma – meu Deus! Quantos contatos! Achei! Amém.

Apertei o botão de chamada e pus no ouvido antes mesmo de começar a descer a escada. Um... dois.... três.... seis toques depois ele atende.

— Pattie!

— Peeeeeeeeeeeeeen, resposta errada!

— Houston? Por que diabos você está me ligando? Do celular da mãe do Justin ainda?

— Eu sei que Pattie é mãe do Justin retardado!

— Você me ligou para me ofender? Achei que fosse menos baixa do que isso garotinha.

— Apesar de eu ter um prazer enorme em fazer isso, não, não foi por isso que te liguei.

— Então diz logo, sabe o quando é desprezível falar com você.

— Imagino o quanto, para mim não está sendo tão melhor.

— Então diz logo, quanto menos falar com você, melhor para os meus ouvidos.

— Que tal você deixar de ser tão repugnante e vir ver o Justin?

— Justin? O que aconteceu com ele?

— Ficou preocupado né?

— Deixa de ser irritante garota! Diz logo!

— Para que está perdendo tempo comigo? O que tem que saber é que é para vir para Stratford agora! O mais rápido que puder.

— Quem você acha que é para me dar ordens?

— É o seguinte, eu você viria se ainda quer seu menino prodígio bem.

Desliguei no momento que a raiva começava a tomar conta de mim, meu sangue fervia só de ver aquele cara, imbecil e arrogante, o pior de tudo é que Justin o adorava! Talvez seja só comigo que ele era tão insuportavelmente desprezível.

— Tudo bem Lua? – assenti para Pattie enquanto respirava fundo e freneticamente tentando me acalmar. – Pelo seu jeito, falou com Scott certo? – assenti de novo sorrindo, junto com ela, devido ao comentário. – E ele?

— Tenho a impressão que ele vai pegar o primeiro avião para cá – a entreguei o celular.

— Obrigada Lua, não sei como agradecer. Você sabe o quanto essa carreira é importante para o Justin, se algo o impedisse de cantar eu não sei o que aconteceria com meu filho. Sei que vocês não estão bem, mas você era a minha última opção.

— Tudo bem Sra. Pattie, nunca que eu deixaria Justin ficar mal se eu puder ajudar – ela sorriu fraternamente e eu sorri de volta o mais delicada que o sorriso dela permitiu que eu sorrisse.

Quando vi que a conversa não iria mais além, me virei e comecei a subir as escadas de novo.

— Onde vai? – virei meu tronco e a encarei.

— Justin pediu para eu ficar, não quero que ele acorde e não me veja.

Pov's Bieber

Acordei sem vontade, então não abri os olhos, a dor na minha garganta já tinha se suavizado, o que me fez pensar porque fui tão teimoso em tomar o remédio, mas pensando por outro lado, ganhei um beijo.

Beijo... Lua... ela tinha ficado ou foi só alucinação minha? Não! Ela tinha ficado sim! Eu tinha certeza, mas... não a sinto perto de mim e Lua Houston não costuma quebrar promessas, apesar de que, ela não me prometeu nada.

Levantei da cama num pulo, abrindo os olhos de imediato deixando toda a preguiça de lado e ela realmente não estava lá. A luz da manhã invadia todo o meu quarto, mas senti falta da brisa friazinha da manhã, foi quando notei minha janela fechada, talvez por causa da minha garganta, tanto faz, o importante mesmo era que Lua não estava ali.

Cheguei um pouco para trás e encostei na cabeceira enquanto deixava minha mente vagar em possíveis motivos dela não estar ali e claro que, nessas horas e circunstâncias, sempre vaga para o lado errado, procurando possibilidades que não me agradavam em nada.

Me forcei a pensar em bons motivos, e não pensar em “porém” negativos, mas mal deu tempo. Antes que eu conseguisse controlar o meu inicio de decepção interna, minha mãe abriu a porta e sorriu ao me ver acordado.

— Que bom que acordou, bem que o médico disse que o remédio pode dar sono – não respondi, nem queria, minha cara continuou a mesma de paisagem apenas acompanhando a minha mãe indo até a janela para abri-la. – Caso queria saber o Scott já sabe o que aconteceu, ele viria hoje, mas precisa adiar todos seus compromissos a uma margem de tempo em que supostamente você esteja bem, mas amanhã ou depois ele está aqui.

— Eu não – minha voz estava horrivelmente rouca devido ao problema na garganta e ao fato de eu ter acordado agora, notando isso pigarreei para falar numa rouquidão mais razoável – eu não quero saber do Scooter – e então não dava para continuar mais, minha garganta doía demais, era como se tivessem jogado ácido pela minha goela a baixo, não que eu já tenha bebido ácido, afinal, ainda estou vivo, mas agora foi a única coisa que consegui pensar para tentar explicar a dor que eu estava sentido.

Ela abriu a janela e passou pelo meu quarto recolhendo algumas peças de roupas minhas espalhadas pelo chão. Minha mãe jamais faria isso, ela sempre me mandava arrumar, mesmo depois de que fiquei famoso, mas o nervosismo mesclado com a alegria de me ver um pouco melhor estava evidente e esse era o jeito dela de não pular em cima de mim e me encher de beijos enquanto briga comigo por ter sido tão teimoso e dizendo que é melhor eu continuar tomando os remédios direito ou ela me faria engolir de um jeito ou de outro. Mas nem se ela arrumasse a casa inteira a impediria de fazer isso mais cedo ou mais tarde.

— Lua está lá em baixo comendo alguma coisa, ela ficou a noite toda com você, nem mesmo pregou o olho. Ela não quis ir embora, não quis deixar você.

Então ela ficou, a noite inteira lutando contra o sono para ficar comigo, porque eu pedi. Ela veio quando minha mãe pediu, veio por mim, e ficou por mim. Era para eu estar feliz, com um sorriso que mal cabia no meu rosto, animado com a ideia que ela ficou cuidando de mim a noite toda, mas eu só sabia encarar a minha mãe com a mesma cara de paisagem desde que acordei, enquanto mais pensamentos negativos me invadiam.

Ela estava aqui, mas eu não podia falar.

— Desce para comer alguma coisa, deve estar com fome e mesmo se não estiver desce, se não você vai piorar, tomando o remédio e não comendo.

Não discuti, continuei sem falar nada – de qualquer modo eu não podia – apenas me levantei e me dirigi porta a fora do meu quarto, ainda com uma calça de moletom cinza e uma regata justa branca, com meu cabelo bagunçado e com um sapato – que não chegava a ser pantufa, só quase isso.

Desci as escadas enquanto ouvia o som da televisão, fui até a sala com passos leves, nem eu me ouvia. Depois que notei Lua sentada, nem me preocupei em prestar atenção no que ela via na TV.

Fui até lado oposto do que ela estava sentada e me sentei, Lua apenas me encarou enquanto mordia um pedaço de pão e depois voltou a ficar concentrada na TV. Achei que ela não ia falar nada e eu ainda não estava em condições de incentivar a fazer isso, mas, como sempre desde que voltou, ela me surpreendeu.

— Eu pretendia voltar antes que você acordasse – ela terminou de engolir e ainda encarava a televisão –, mas sua mãe me convenceu a comer, agradeço por isso, não sabia que estava com tanta fome – ela então mordeu outro pedaço e não largou os olhos da TV.

Eu queria falar alguma coisa, precisava dizer, mas não podia se não levaria uma bronca ou será que ganharia outro beijo? Mesmo que a dúvida fosse tentadora, me lembrei da dor que senti quando falei com a minha mãe, então resolvi não arriscar.

- Me empresta uma blusa sua? Por mais que essa blusa de frio esteja arregaçada eu estou com calor e não quero ter que ir lá em casa só para pegar uma blusa e depois voltar – ela pôs o último pedaço na boca e me olhou para ver a resposta já que tinha se lembrado de que eu não podia falar.

Assenti.

— Valeu – ela voltou a olhar o desenho animado, que só agora eu notei ser “Os Padrinhos Mágicos”, enquanto tomava uma caneca de, se a conheço bem, café.

Silêncio, mais silêncio mortal que começava a me sufocar e a me deixar irritado, eu gosto de falar, nessas horas ainda mais, mas não dava.

Acho que nem se eu ganhasse o Grammy encararia da mesma forma que eu estava a olhando agora, Lua passou a noite aqui e nem ir embora queria, pensei em perguntar porque, mas além da impossibilidade eu não sei se queria saber da resposta, afinal, pouco importava. Quando eu receber um Grammy – o que com certeza receberei, um dia e espero que seja logo – precisarei pelo menos de um mini discurso antes de poder deslumbrar aquela cor dourada, mas ali eu não precisava de tempo e nem de disfarçar meu eterno deslumbre por aqueles cabelos castanhos e lábios que sempre me calam. Eu estava simplesmente vidrado, enquanto ela nem me dava moral, apenas tomando café – saia fumaça, ou seja, era café ou chá, ela ama café e odeia chá – encarando a televisão e dando sorrisinho com algumas coisas, mas sem desviar atenção e nem falar nada até que o episódio acabasse.

— É melhor você comer alguma coisa não? – bati a mão na testa indicando que esqueci desse detalhe.

Agora como se esquece de comer eu não sei, mas esqueci.

— Sobe para continuar descansando, vou levar algo para você comer – ela se levantou. – Você tem que tomar o remédio daqui a pouco mesmo e aposto que vai dormir depois disso, então o bom é que já está na cama – e sumiu cozinha adentro.

Ela não foi embora porque queria continuar cuidando de mim, por mim, por ela, pela minha mãe, tanto faz o motivo, mas ela estava disposta a ficar o tempo todo aqui até que eu me sinta melhor. Ela está e vai continuar cuidando de mim. Mas eu que deveria cuidar dela, de algum modo, não gosto de me senti incapacitado – apesar de que estou gostando dessa ideia – gosto de poder sempre senti que posso cuidar dela.

Peguei uma folha e uma caneta que não faço ideia do porque estava ali já que a minha mãe normalmente nunca deixava nada além de alguns enfeites de vidro na mesinha, escrevi nele – meio obvio – e deixei bem visível, depois subir correndo escada à cima.

Quando cheguei ao meu quarto, me aconcheguei de baixo dos lençóis, mas permaneci sentado e resolvi mexer no meu Ipad, mas antes que alguma coisa carregasse minha mãe apareceu na porta com uma bandeja que tinha pães, um prato colorido de frutas e um suco de maracujá – minha mãe queria mesmo que eu apagasse de vez. Comi tudo numa velocidade sub-humana, eu sinceramente não tinha notado que estava com tanta fome.

Minha mãe me deu o remédio e pegou a bandeja, descendo depois de ter dito “vê se dorme em!” pela quinta vez. Mas eu ainda não estava com sono, resolvi esperar o remédio fazer efeito enquanto mexia um pouco na internet, minhas beliebers precisam de noticias minhas.

Enquanto eu estava entretido com a barrinha carregando o tweet para ser postado, alguém pigarreia ganhando minha atenção. Lua estava na porta com uma camiseta branca minha, como a que estou usando – por eu usar muitos com camisas xadrez, por exemplo, e em casa mesmo, tenho várias delas – e com aquele sorrisinho miserável de sempre e levanta o papel que eu deixei na mesinha da sala com a sobrancelha arqueada.

Dei de ombros.

Ela encostou no batente da porta sorrindo um pouco mais e soltando curtas risadas.

— Você não toma jeito nunca? – neguei de leve com um sorriso quase nas orelhas. O dela pedia o meu e eu não podia e nem conseguia controlar que fosse tão grande, Lua também não apagava o sorriso do rosto, deixando mais radiante.

Depois de alguns segundos de silêncio fiz um sinal para que ela viesse até mim e depois bati na cama para que ela se deitasse ali comigo. Senti que ela hesitou um pouco, mas desencostou do batente e veio na direção da cama, ainda sorrindo como eu.

Pov's Houston

Entendo que pedi para que Justin subisse, mas sumir do nada e deixar uma folha de papel daquelas é sacanagem comigo.

Cheguei à cozinha e falei com Pattie que ia levar algo para Justin comer, mas ela já estava preparando algumas coisas para ele, então só colocou na bandeja e levou ela mesma. Aproveitei então para pegar a primeira camisa do Justin que vi na lavanderia – era uma regata branca que ele normalmente usava com camisetas que pediam algo por baixo, mas como era apenas para não deixar o tronco desnudo e por ser usada com outra camisa era fina e fresca, resolvi só pensar no “fresca” – e tomar mais um dedo de café, eu tinha ficado a madrugada toda acordada e apesar de ser a minha terceira xícara de manhã, eu me sentia rastejando pela casa ao invés de andar.

Achei que Justin não iria subir até que comesse alguma coisa, mas quando voltei fiquei realmente surpresa ao ver que ele não estava lá, então resolvi subir, peguei o controle para desligar a TV quando vi o bilhete. Desliguei a televisão e peguei o papel.

Na ordem natural das coisas, as garotas tem a letra linda e caprichada, e as dos garotos são quase ilegíveis e desleixadas, mas com a gente não é bem assim. Nós dois temos uma letra embolada, e nenhuma das duas são as melhores... minha letra de forma é um verdadeiro garrancho, fico surpresa quando eu mesma consigo ler algo que escrevo na escola. Justin também não tem a letra digna de convites de formatura e casamento, mas em muitas vezes sai melhor do que a minha – pelo menos mais legível – principalmente se estava grande, como naquele bilhete.

“Deixa eu cuidar de você?”

Fiquei pensando naquilo, até ontem de tarde estávamos brigados por algo extremamente infantil, mas ainda brigados e agora ele demonstra ser aquele mesmo garoto super fofo de sempre, como se nada tivesse acontecido, como se eu estive ali o tempo todo, como se ainda fossemos os mesmo. Sem fama, sem brigas, sem outros, só ele e eu.

“Deixa eu cuidar de você?”

Me esforcei para não fazer barulho ao subir as escadas correndo e quando cheguei ao corredor peguei Pattie voltando. Sorri para ela que sorriu de volta e apareci na porta do quarto do Justin que estava entretido com algo que via no Ipad, pigarreei alto para que ele me notasse e quando consegui sua atenção mostrei o papel sorrindo automaticamente. Ele sorriu de volta e depois de alguns gestos eu já estava indo... hum... “deixar ele cuidar de mim”.

Bla, bla, bla... está tudo muito fofo, mas daqui para frente não melhora.

Deitei atravessada na cama e apoiei a cabeça nas pernas dele, agora descoberto pelo lençol e ele começou a mexer no meu cabelo, me dando uma sensação de conforto. Fechei os olhos aproveitando o carinho e tomando cuidado para não dormir de vez.

— Como você se sente? – depois que perguntei, fiquei pensando se deveria, afinal, como ele iria responder? E o arrependimento de ter perguntando aumentou conforme ele demorava mais para me dar uma resposta.

Abri os olhos quando o cafuné parou por um curto tempo, depois ele me entregou o celular e voltou a mexer nos meus cabelos mega embolados.

“Com certeza melhor agora”

Tive que ri.

Devolvi o celular.

— Meloso como sempre own – brinquei e pouquíssimo tempo depois ele me entregou o celular de novo.

“Meloso, fofo, gostoso...”

Dessa eu gargalhei alto.

— Até mudo você é convencido! – ele também riu, depois de um tempo voltou a mexer no celular e me entregou de novo.

“Canta para mim?”

— Eu? Cantar para você? Por quê? – ele estendeu a mão pedindo o celular, o entreguei e me entregou de volta rápido como das outras vezes.

“Por que eu não posso e gosto de te ouvir cantar”

— “Por que eu não posso” jogo duro isso ok? – ele riu.

Pensei uma música lenta, o que estava sendo difícil, por que quando a gente sempre quer lembrar algo parece que mais esquecemos? Que raiva.

If I show you

Get to know you

If I hold you just for today

I'm not gonna wanna let go

I'm not gonna wanna go home

Tell me you feel the same

'Cause I'm 4 real

Are you 4 real?

I can't help myself

It's the way I feel

When you look me in the eyes, like you did last night

I can't stand to hear you say goodbye

Well it feels so right,

Cause it feels so right

Just to have you standing by my side

So don't let me go,

Cause you have my soul

And I just wanted you to know

Noite passada ele dormia feito anjo, relaxado me lembrando o garoto de 16 anos que conheci, leve, sem o cansaço diários estampado no rosto devido a fama.

I don't want to look back,

Cause I know that we have

Something the past could never change.

And now I'm stuck in the moment,

And my heart is open

Tell me, that you feel the same

Quando escolhi cantar “4 Real” da Avril eu nunca imaginaria que a letra tinha tanto a ver, ou eu que já estou vendo coisa onde não tem?

Hold me down

Hold me now

I'm safe

I'm sound

When you're around

Hold me down

Hold me now

I'm safe

I'm sound

When you're around

Senti a mão dele pesar e acariciar meu cabelo ainda mais lentamente. O remédio estava fazendo efeito e a música lenta não estava o ajudando a ficar acordado.

— Chega, melhor você dormir – me levantei e ele não protestou, ele estava com sono, eu estava com sono... se continuássemos assim nós dormiríamos, assim, de qualquer jeito. – Vem cá amor – escapou! Eu juro que escapou! E foi sem querer ainda.

Arregalei os olhos para Justin e minha respiração ficou levemente descompassada. Ele me encarou surpreso e depois um leve sorriso surgiu em seu rosto.

— Ainda bem que você está mudo – ele riu. – Vem cá seu astrozinho – ele me abraçou e se aconchegou mais em mim, respirou fundo e eu comecei a mexer em seu cabelo como ele fazia comigo poucos minutos antes.

Repeti o refrão da música mais duas vezes para cantar ela completa.

“Apenas te ter aqui ao meu lado, então não me deixe ir, porque você tem a minha alma e eu só queria que você soubesse”.

Então assim como ele, dormi.

(...)

— Oi Pattie!

— Oi queria! Chegou cedo hoje...

— Recebi uma carona da escola, mas então, onde está o Justin? – joguei minha mochila no sofá e ela fechou a porta, passou por mim e ficou na minha frente.

— Está no quarto descansando.

— E como ele está?

— Bem melhor, depois de amanhã já pode voltar a rotinas de shows, não a rotina normal, mas vai recuperar aos poucos.

— Vou subir para o ver, tudo bem?

— Tudo sim, pode ir – subi as escadas correndo, mas andei manso no corredor até a porta do quarto dele, abri uma brecha devagar e enfiei apenas minha cabeça para dentro do quarto.

Ele dormia, como Pattie tinha dito, parecia que ter rejuvenescido anos em tão poucos dias. Justin tinha a vida muito corrida, mal estava em casa, mais de uma apresentação por dia, entrevistas e mais entrevistas e ainda a escola... qualquer um não aguentaria, mas ele está disposto, o tempo todo, a continuar conciliando tudo isso e ainda mais.

Encostei a porta de novo e me direcionei a escada lentamente e antes que eu descesse o terceiro degrau encaro Scooter Braun. Foi o meu maior desgosto do dia, e para ele aposto que não foi diferente, assim que nos notamos, ambos soltamos um grunhido desagradado.

— E o Justin? – perguntou seco.

— Dormindo – respondi igual.

Passei por ele de cara amarrada e continuei a descer as escadas. Surpreendentemente ele me acompanhou.

— E como ele está?

— Ontem a voz dele quase não estava mais rouca, hoje deve estar quase perfeita.

— Obrigado por ter me ligado – o olhei boquiaberta, sem acreditar no que eu estava ouvindo. O cara que sempre me odiou, agora estava me agradecendo? – Não fique com essa cara, não me faça repetir.

— Não farei, sei o quanto foi difícil para você poder dizer isso – peguei minha mochila no sofá e voltei para frente da porta enquanto ele ficou grudado no último degrau. – Pattie! Vou para casa! – falei um pouco alto. – Se Justin perguntar por mim diz que já não tenho mais o que fazer aqui já que Scooter chegou.

— Tudo bem querida! – ela gritou de volta da cozinha. – Obrigada por tudo! Obrigada mesmo.

— Obrigado por ter cuidado dele quando eu deveria estar aqui para ajudar – a voz do Scooter saiu quase num sussurro, e eu realmente desejei tanto ter filmado essa cena que era capaz de uma câmera se materializasse em algum lugar com o que ele acabou de dizer gravado.

- Cuida dele Scooter – abri a porta para poder sair, mas ele me impediu.

— Houston? – o olhei por trás da porta. – Que ninguém mais saiba do que eu te disse.

— Pode ficar tranquilo Braun, afinal, para quem eu iria contar mesmo?

(...)

Caso eu não gostasse de ficar sozinha em casa, mais dia ou menos dia eu entraria em depressão. Meus pais passavam o dia inteiro fora, minha mãe quer recompensar todos esses 15 anos fora do hospital ficando grudada lá o dia todo, só pode!

Quando bateram na porta eu estava largada no sofá, como tem sido desde que minha mãe voltou a trabalhar. Estava vendo um filme, que já tinha assistido umas três vezes que eu lembre.

— Entra! – nem me movi.

Era um perigo dizer “entra” se nem conferir quem é, principalmente a essa hora da noite e sozinha em casa, mas eu estava tão lerda e morta que se fosse algum ladrão era capaz de eu ainda indicar onde tem coisas de valor para que ele roubasse.

— Seus pais estão aí?

— Não.

— Você é louca? E se fosse alguém que não conhecesse? – Justin entrou em casa e me olhou diferente, como se fosse um pai olhando para uma menina travessa que acabou de aprontar uma.

Enquanto isso, o encarei com toda a minha preguiça reunida em um simples mexer de cabeça.

— Ainda bem que é você – até a minha voz saia arrastada de preguiça. Pigarreei para melhorar. – Voltou quando? – em vão.

— Hoje mais cedo.

— E sua voz?

— Está totalmente bem. Obrigado por ter me ajudado.

— Hum... – murmurei e voltei a encarar a TV.

— “Hum”? Qual é? Você nunca responde “hum” – ele perguntou com um fio de irritação.

— Desculpa Justin – me esforcei para levantar –, to morrendo de preguiça!

— E quando não está?

— Estou sempre, mas hoje está em níveis críticos. – ele riu. – Mas então, você não deveria estar descasando da viagem?

— Eu tentei, mas não consegui. Preciso falar com você.

— Então aproveita enquanto eu ainda estou acordada – abaixei o volume da TV para eu prestar atenção direito nele, quando o encarei, ele só faltava soar frio. – Jus? – me olhou e depois respirou fundo.

— De volta aquela história de quem deve correr atrás de quem e do que – não sei se eu estava a fim de conversa séria agora, mas não tinha como fugir mais. – Desculpa por ter tirado conclusões precipitadas, to cansado disso. Não sei se é porque cansei ou porque vi que você tem razão, no final das contas to aqui para que ficássemos bem de novo. To aqui correndo atrás. Lua, você não é covarde assim como diz ser, você estava lá quando eu precisei, você correu atrás – ainda não sei qual foi o real motivo de eu ter ido lá depois que Pattie me ligou, se foi por ela, por mim, ou por ele. Mas resolvi não comentar. – Enfim, passei tempo demais com você longe de mim e agora, não posso te deixar escapar entre meus dedos, não tão perto. É impossível. Se for assim, vou continuar correndo atrás, se for para não me sentir um burro de coração vazio eu continuo, não é bom saber que fracassou em algo e eu não gosto de sentir que fracassei logo com você, com a minha realidade, a única pessoa que faz com que eu me sinta real, mesmo na fantasia toda da fama. Eu preciso estar com você – ele fez uma pausa e o silêncio reinou por alguns segundos. – Agora você pode responder alguma coisa para que eu não ache que você ouviu um monte de “bla, bla, bla”.

— Hoje, Karol disse que sente falta de nos ver juntos.

— E o que você respondeu?

— Que isso não é coisa que se diz na escola – Justin fechou a cara na hora, aposto que ele pensou ter passado por bobo vindo até aqui e dito todas aquelas coisas, e eu tive mais certeza quando ele se virou para abrir a porta, então continuei antes que girasse a maçaneta que já segurava – e ela disse que também sente falta disso, de falar o quanto ficamos bem juntos. “Todo mundo diz que ficamos fofos juntos” [Everybody say that we look cute together - First Dance], lembra? Eu lembro e também sito falta. Acho que se sentimos falta de algo é porque foi bom, se isso realmente é certo, então não foi simplesmente bom, porque eu não simplesmente sinto falta – ele abaixou o braço da maçaneta e abaixou a cabeça deixando o rosto meio virado, me olhando de canto de olho. – Meus pais vão demorar a chegar hoje, eles andam querendo aproveitar o tempo perdido comigo, agora que já posso me virar. Vou continuar sozinha por um bom tempo e eu não quero ficar sozinha. Fica aqui comigo Justin? – ele se virou por completo e deu um sorrisinho convencido.

— Talvez se você pedisse do jeito certo – soltei uma risada nasalada e revirei os olhos, depois me esforcei para fazer a voz mais dengosa que já consegui em toda a minha vida, quase vomitando açúcar de tanto dengo.

— Fica aqui comigo, amor?

Ele praticamente voou para cima de mim, me beijando com saudade e me obrigando a deitar no sofá de novo. Sabe aquela preguiça de antes? Então, não faço a mínima ideia de onde está agora.

— O pior é saber que não vai rolar nada demais essa noite – sorri, pelo que ele disse, por ele ter me beijado, por seus lábios estarem tão próximos do meu e pelo seu sussurro de voz.

Embolei meus dedos em seu cabelo curto e a outra mão deixei na nuca, olhei nas íris cor de avelã que jamais saíram da minha mente e mordi o lábio inferior contendo o desejo de beijar aquelas lábios rosados que estava sentido falta.

— Eu te chamei de amor, isso é o suficiente para uma noite.