Ice Prince Passion

As Coisas de Dentro



O som de vidro quebrando me tirou dos meus devaneios matinais. Parecia vir do lado norte do palácio. Me apressei até e o que eu vi tirou meu fôlego. O vidro da janela da biblioteca esteva quebrado e os cacos ainda estavam caindo, mas o pior, Yell estava caído logo ali, sob uma pilha de neve como se ela tivesse se juntado abaixo dele de propósito criando um cobertor fofo para amortecer a queda do Escolhido. Me coração pareceu parar. Em seguida acelerou como seu eu estivesse correndo uma maratona e corri até ele.

- Yell? Responde por favor! – Havia um corte na testa dele, só um, mas estava sangrando muito e eu estava ficando cada vez mais preocupado. Olhei ao redor, olhei na direção da janela mas não havia ninguém. E ninguém parecia ter ouvido também, não que eu estivesse surpreso, o castelo era enorme, e a maior parte da corte e todos guardas estavam paparicando a princesa de Fogo.

O sangue tingia de escarlate a neve pura, e eu estava começando a ficar realmente assustado. Ele estava respirando de um jeito fraco e entrecortado e não respondia a nenhum dos meu toques. Sem saber muito o que fazer tirei minha camisa preta de guarda e rasguei em tiras, tentando fazer o sangue parar. Meus olhos estavam ardendo e eu estava em pânico, mas eu precisava ser racional agora. Fiz o que me ensinaram de primeiros socorros no treinamento que honestamente achei que nunca ia precisar fazer.

Enrolei a camisa na cabeça dele do jeito que pude e fiquei sem saber o que fazer em seguida. Devia chamar alguém? Buscar ajuda? Resolvi primeiro leva-lo pro quarto e decidir o que fazer a seguida depois. Meio sem jeito peguei ele no colo, o que me lembrou os príncipes pegando as princesas nos contos de fadas, o que foi bem irônico por que o príncipe ali era ele.

Fui me esgueirando silenciosamente pelo palácio, a última coisa que eu queria era que me vissem carregando o príncipe daquele jeito. Minha sorte é que estava tudo estranhamente calmo, para onde todos tinham ido? Levei ele até o quarto e o deitei na cama com todo o cuidado. Fiz um carinho nos cabelos loiros dele e dei um beijo de leve na testa sentindo os olhos arderem de novo. Ele tinha que ficar bem. Ouvi um barulho e quando me virei, Meena estava na porta do quarto. Ela não parecia em choque com o que vira, mas olhava fixamente para Yell.

- O que aconteceu com o príncipe, jovem guerreiro? – Ela perguntou com calma.

- E-Eu não sei, eu o achei assim, juro! Ele deve ter caído eu não sei a janela da biblioteca quebrou eu não sei o que aconteceu e aí eu o trouxe aqui e-... – Eu fui falando tudo de uma vez, sem respirar, de tão nervoso que estava. Ela se aproximou.

- Isso está muito bom. Você que fez? – Ela olhou para mim e eu assenti. – Onde aprendeu?

- No treinamento. Nunca achei que fosse usar os conhecimentos de primeiros socorros, mas...

- Faz parte. – Ela voltou os olhos para Yell. – Ele vai ficar bem. Só está desmaiado, logo vai acordar. Ela soprou de leve e ele começou a respirar regularmente. Olhei pra ela, estava óbvio. Sentindo meu olhar ela apenas assentiu. Sou uma maga da Guilda do Ar.

- Como acabou aqui de babá do... Quer dizer, desculpe. Mas como veio pra cá?

- É uma história muito longa e complicada. Mas eu vim por vontade própria. Praticamente criei essa coisinha quando os pais dele... Bom. Isso ele é quem deve te contar. – Ela fez um carinho no rosto de Yell e se afastou. Fiz menção de sair do quarto, mas ela me impediu.

- Por favor, se não for pedir demais, fique. Ele deve precisar de companinha quando acordar. Todos estão arrumando as coisa para a celebração de recepção. E por favor não conte a ninguém sobre isso. Não precisamos de outro alvoroço no palácio, e isso não ajudaria ele nem um pouco em sua relação com os pais... – Ah, então era isso. Claro que não era pedir demais. Assenti e ela inclinou a cabeça num agradecimento silencioso e saiu do quarto.

Encarei Yell, mais tranquilo depois que Meena tinha feitio sua mágica nele e tudo o mais. Me aproximei da cama de novo e peguei a mão dele, que estava fria como a morte. Comecei a sussurra palavras carinhosas qualquer coisa que me viesse a cabeça.

Depois de um tempo resolvi sair pra tomar um ar por que ele não ia acordar tão cedo e minha preocupação estava me sufocando. Fui para o jardim dos fundos. Mas claro que eu não fiquei sozinho. Ela não ia deixar eu te rum minuto de paz.

- Você está bem? – Wine perguntou com aquele tom apaziguador que eu aprendera a odiar.

- Não. – Respondi sem me virar. – Pode me deixar sozinho agora?

- Não. – Ela se aproximou de mim, pude ouvir seus passos sobre a neve recém caída. Passou os braços ao meu redor do jeito doce de sempre, e eu fui atingido com toda a força por um trem de lembranças. Felizes, em sua maioria, mas já tinham passado. Ela era outra pessoa agora. Tirei os braços dela de mim e me afastei.

- Me deixa quieto Wine.

- Você está assim por causa do príncipe? – Ela perguntou assim, sem rodeios. Não sabia bem ao que ela estava se referindo. Não respondi e acho que o silencio deixou as coisas bem claras. – Ele não gosta de você como eu gosto. – Por que ela não parecia surpresa?

- Eu não espero nada dele. – Eu disse, e de alguma forma era mentira e verdade ao mesmo tempo. Me virei pra ela. – E sinceramente nada de você também. O que existia entre a gente acabou Wine. Aceite isso.

- Só acaba quando eu disser que acaba. – Ela se aproximou mais de mim e não hesitei em me afastar mais uma vez.

- Então é bom que você perceba logo. – O olhar dela estava decidido. Eu já tinha visto esse olhar outras vezes, ela não desistia fácil das coisas.

- Você tem tanta dor dentro de si... – Desviei os olhos. Parecia que ela lia as pessoas. Eu me sentia meio desconfortável com isso. – Me deixa ficar com você de novo, curar sua dor. – Desviei dela e saí antes que ela se aproximasse de novo.

- Não. Por pior que seja minha dor, preciso dela. Ela me faz ser quem eu sou.

*¨*¨*¨*¨*¨

De volta no quarto de Yell eu olhava para ele como se meu olhar ou minha vontade o fizessem acordar mais rápido. Eu rezei para deuses que não acreditava e fiz promessas que não pretendia cumprir, até que finalmente ele suspirou e se mexeu.

Apesar da vontade de sair correndo pra perto dele, fiquei onde estava, com meus olhos presos nele. Yell se mexeu de novo e por fim, abriu os olhos. Sentou na cama rápido, como se tivesse levado um choque e tentou levantar, mas uma súbita tontura o atingiu, fazendo-o se sentar de novo. Dessa fui até ele.

- Ei, ei calma aí... Não pode se levantar tão rápido. – Ele me olhou como se estivesse me vendo pela primeira vez.

- Allen? – Ok, ele não perdera a memória. Isso era bom.

- É, sou eu. Tudo bem?

- Eu não sei. Minha cabeça dói e eu não me lembro de nad-... – Ele levou uma das mãos à cabeça e empalideceu.

- Yell? O que foi? – Ele se levantou da cama dessa vez sem tonturas e foi para o banheiro. Encarou o espelho por alguns segundos. Tirou a bandagem improvisada que eu fizera devagar, fazendo caretas como se estivesse com dor. Tinha parado de sangrar, graças aos céus.

- Você... Você me salvou? – Eu ri sem jeito e baixei os olhos.

- Acho salvar uma palavra muito forte. Só fiz para de sangrar. – Ele estava concentrado no reflexo no espelho examinando o corte.

- Acha que vai ficar uma cicatriz? Algum maluco me jogou da janela da biblioteca. – Aquilo me fez perder o ar.

- O que?! Quem?? – Se bem que eu fazia alguma ideia.

- Não sei, não consegui ver quem era. - Ele abriu a torneira e lavou o corte fazendo caretas. – Ai meu deus, o corte é muito grande.

- Por que está tão desesperado? Você se machucou, acontece. – Mesmo que, por dentro eu estivesse fervendo de ódio e possessão, louco pra torcer o pescoço de quem tivesse se atrevido a tocar em Yelll daquela forma.

- Não posso me machucar, Allen, e absolutamente, não hoje. – Ele suspirou e encontrou meus olhos no reflexo do espelho. – Não sei se você percebeu, mas a realeza não gosta de nenhum tipo de imperfeição. Não no ambiente, não na comida e certamente não nos filhos. Eu tenho uma Recepção pra ir hoje e não posso estar nada menos que perfeito.

- Ninguém é perfeito Yell.

- Bom, deve ser por isso que meus pais me ignoram então. Se eu for ‘ninguém’ então serei perfeito certo? – Aquelas palavras me deram um nó no estomago. Só tinha visto o casal real uma única vez, mas os achara tão bondosos e simpáticos... Mas era Yell que os conhecia como ninguém então resolvi acreditar nele. Os olhos dele se acenderam de repente, numa ideia brilhante.

- Minha mãe. Ela tem uns pós, umas coisas que passa no rosto, acho q pode funcionar.

- Maquiagem? – Perguntei. Ele se virou e me olhou rindo. Incrível como ele conseguia mudar de humor rápido.

- Você conhece essas coisas? Depois eu que sou a menina. – Ele revirou os olhos. – Eu já volto. – Saiu do quarto que nem um furacão. Eu ainda estava meio chocado tentando absorver as coisas que ele tinha dito. Que tipo de pai ia ficar furioso se o filho se machucasse? Exigia perfeição a todo custo? Aparentemente os pais dele.

Yell voltou algum tempo depois com alguns potes nas mãos. Tomou um banho rápido e Meena o vestiu, saindo do quarto pouco tempo depois sem comentar sobre o corte. Se sentou na cama e me chamou.

- Desculpe a demora. Olha, você sabe mexer com essas coisas? – Suspirei e me sentei na frente dele.

- Sei. – Ele fechou os olhos, esperando que eu começasse. Tinha sentado em frente à janela o que dava uma iluminação perfeita. Não que eu estivesse reparando. A rainha tinha um tom de pele parecido com o dele, o que já facilitava muito as coisas. Abri um dos potes e com todo o cuidado passei uma camada de corretivo sendo o mais carinhoso q pude. Ele fez careta mesmo assim.

- Desculpe. – Murmurei. – Está doendo?

- Um pouco. Mas tudo bem. – Continuei e modéstia à parte eu era muito bom.

- Você precisa parar de se mexer. – Disse rindo. Ele fez o possível e quando eu terminei ele se olhou no espelho e um sorriso iluminou seu rosto.

- Meu deus, você é bom. – Eu sorri, ficando sem jeito.

- Obrigada. – Meena abriu a porta do quarto o chamando.

- Alteza, precisa ir ou vai se atrasar. – O olhou e em seguida pousou os olhos em mim.

- Bom trabalho jovem. Você tem excelentes habilidades. – Eu a imitei e inclinei a cabeça em agradecimento. Yell pegou a coroa em cima da cama e a pondo na cabeça correu até a porta. Fez uma pausa e se virou pra mim e com o sorriso mais sincero que eu já tinha visto disse:

- Obrigado Allen. – Assenti, sem saber muito bem à que exatamente ele se referira pelo tom de voz. Parecia algo muito maior do que a simples maquiagem. Senti o peito aquecer e fiquei surpreso ao perceber que aquela era a primeira vez que eu o ouvia usar alguma das palavras mágica (por favor, obrigada, me desculpe, etc) comigo. Tinha sido diferente. Quase mágico de verdade. Encarei a porta pela qual ele tinha acabado de sair e me toquei que talvez tivesse me apaixonado por ele. E talvez isso fosse uma coisa.

Talvez não.