Kara olhou para as gotas grossas de água caindo e recuou mais alguns passos abrigando-se na marquise da livraria fechada. Ela sacudiu levemente os ombros para se livrar das gotículas que ainda estavam se infiltrando no tecido grosso de seu casaco, tomando cuidado com a bandeja ocupada por dois cafés em suas mãos. A assistente de Cat Grant lamentou profundamente ter subestimado a previsão do tempo naquela manhã. Os raios de sol se infiltrando pela sua janela quando o relógio marcou sete horas em ponto, tinham-na pego profundamente na ilusão de que não a abandonariam pelo resto do dia. E claro que ela não tinha trazido um guarda-chuva. Se Kara tinha uma certeza era a de que Cat já estava gritando o seu nome por todo o prédio da CatCo, sem nenhuma dúvida bastante irritada com a sua demora. Então, a última coisa que Kara poderia deixar que acontecesse agora era que seu café fosse arruinado também.

Um manto de chumbo cobria o céu, teimando em deixar a manhã cinzenta como Kara gostava que fossem as suas folgas preguiçosas. Infelizmente esse cenário era em uma plena manhã de segunda-feira.

Kara viu os ponteiros de seu relógio avançarem, constatando que já tinham se passado mais de quinze minutos. Porcaria. Sua chefe certamente estava pensando em demiti-la nesse momento.

A chuva não tinha desistido nem por um mísero segundo, com suas gotas de água caindo robustas do céu de National City. Mas Kara precisava manter seu trabalho. Se ela não enfrentasse a ameaça que aquela água toda caindo representava às suas roupas, Kara precisaria lidar com as consequências de ficar desempregada.

Ela apertou os lábios e ponderou sua decisão de correr por mais de três quadras embaixo daquela chuva. E apesar de estar longe de ser uma boa ideia, Kara decidiu seguir em frente. Mas foi quando ela estava prestes a dar o seu primeiro passo para fora de seu abrigo que uma figura, não muito longe, chamou sua atenção no meio da chuva.

Uma mulher corria em direção à marquise da livraria que esteve ocupando, solitária. Os cabelos escuros compridos escorriam pelos seus ombros tão molhados quanto o tecido de suas roupas, pesado pela água que carregava. Ela alcançou o lugar ao lado de Kara em menos de cinco minutos, ofegando com o corpo curvado, as mãos apoiadas em seus joelhos de um modo que a jovem assistente de Cat se perguntou se ela estava se sentindo bem.

"Você precisa de alguma coisa?" Kara se viu dizendo, sem poder evitar. Foi quando olhos profundamente verdes se ergueram para encontrar os seus, apagando qualquer outra coisa que Kara pudesse pensar.

"Não é necessário, eu estou bem", a jovem mulher desconhecida disse ainda tentando controlar sua respiração.

Os olhos azuis seguiram a forma da mulher endireitar sua postura em suas roupas encharcadas, o logo da universidade do MIT se destacando no moletom cinza para a curiosidade de Kara. Ela viu o corpo da morena tremer com vento frio que acompanhava a chuva e mais uma vez não pôde controlar o impulso de sua soltar as palavras que deslizaram pela sua língua.

“Você pode ficar com o meu café”, o rosto da outra jovem mais uma vez se voltou para Kara, um olhar surpreso dominava sua expressão em conjunto com uma das sobrancelhas levemente arqueada. A assistente de Cat se encontrou tropeçando na sua fala. “É-é na verdade um frappuccino com uma dose extra de caramelo, mas eu acho que ainda pode ajudar com o frio.”

A surpresa se suavizou no rosto à frente de Kara. Ela assistiu aos lábios cheios se curvarem em um sorriso pequeno e se sentiu presa por aquela imagem. “Isso é muito doce, obriga-”

“Eu sei que é doce demais, minha irmã costuma dizer que sou movida por açúcar. Honestamente eu digo que se preci-”

“Não.” Kara se surpreendeu pelo riso tímido que chegou aos seus ouvidos. “A sua atitude é doce.”

“Oh.”

“Sim”, a voz ganhou um tom divertido enquanto o sorriso se estendia ainda mais. “Obrigada por isso. Eu não quero te deixar sem o seu frappuccino, no entanto. A minha carona já está chegando.”

“Ok”, Kara se encolheu no seu lugar finalmente conseguindo desviar quando sentiu o rubor subindo pelo seu pescoço.

Depois de mais alguns minutos no seu silêncio constrangido, um carro luxuoso estacionou em frente à livraria. O vidro escuro se abriu revelando o rosto de um homem na sua meia idade.

“Bem a tempo, Thomas.” A loira ouviu a voz ao seu lado, virando o pescoço para dar de cara com o verde floresta encarando o seu azul. “Você quer-”

“Não, não. Eu estou bem, obrigada”, Kara se apressou em dizer vendo as sobrancelhas escuras se franzirem no rosto bonito. “Eu trabalho por aqui perto, só estou dando um tempo antes de enfrentar a minha chefe”, um riso curto e envergonhado se soltou de seu peito.

“Se você diz”, os olhos verdes passearam pelo sua face curiosos e Kara sentiu o calor de suas bochechas aumentando. “Tchau.”

“Tchau.”

Kara viu as costas da mulher desconhecida desaparecerem pela porta de trás do carro preto. E se chutou mentalmente. Agora ela estava mais de meia hora atrasada, o café de Cat já estava quase frio e ela não tinha perguntado o nome daquela mulher.

Seu histórico de tolice diante de rostos bonitos estava certamente maior.