A verdade é que não estou prestando atenção em nada do que meus pais dizem. Eles estão falando e não é por mal, mas não estou ouvindo nada.

Meus pensamentos estão bem distantes daqui ou não tanto. Acho que minha mente já não suporta mais informações.

Depois de terminar o jantar resolvo ir para o quarto. Chegando lá, retiro os sapatos e me jogo na cama...

Fiquei me castigando mentalmente...

Quando foi que tudo que acreditei e todos os meus princípios foram colocados à prova?

Cheguei à conclusão que tudo começou quando eu inventei de ir até a cidade... Será que se eu não tivesse ido isso tudo não iria acontecer? Será que eu nunca cairia em mim? Será que sou egoísta em só pensar em mim o tempo todo?

Eu sumia por horas. Trancava-me na biblioteca ou no quarto para fugir das responsabilidades que eu achava não serem minhas. Mas elas são.

Sou predestinada a algo que mal sei o que é, e o trono será meu em alguns anos. E eu? Bem... Eu só fiz fugir de tudo o tempo todo.

É... Minha irresponsabilidade está começando a pesar. Será que eu pensei que isso não aconteceria comigo?

O tempo todo achando que estava tentando assimilar que nem percebi o quão imatura eu sou para lidar com tudo isso. Ingenuidade seria o termo correto...

Acho que essa é à hora de fazer as coisas certas e parar de ser ingênua.

Decido me levantar para me trocar e me lembro da carta que Lilian me entregou mais cedo. Então abro o livro, pego a carta e a abro...

"Querida Clara,

Fiquei horas olhando para esse papel, pensando no que escrever-te.

Bem para começar, quero te agradecer pela pequena estadia no castelo, passei poucos dias, mas foram dias maravilhosos principalmente por terem sido ao seu lado.

Quero me desculpar pelo que fiz hoje mais cedo, não foi minha intenção.

Ou foi não sei.

Eu não consegui me controlar... Estava me segurando há tempos para não fazer isso. Mas bem, eu fiz e peço que me desculpe.

Eu encontrei coisas sobre minha família e resolvi ir investigar.

Sei que você é forte e não vai precisar mais de mim.

Obrigado por me mostrar como é sentir diversos sentimentos diferentes. E como eles são importantes em um todo.

Não tive coragem de me despedir pessoalmente... Mas sei que é melhor assim.

Existem escolhas na vida que você vai precisar escolher mesmo sem querer e algumas vezes elas serão dolorosas, mas temos que fazer o possível para aguentar.

Não me esquecerei de você, espero que você também não se esqueça de mim.

Seu amigo, Julian."

Comecei a chorar na metade da carta. Tudo suou tão confuso e eu não compreendo o porquê.

Queria falar com ele que eu o amo. Mas ele se foi... Não está mais aqui.

Falta o ar, sinto uma dor latente em meu peito. Sinto-me como dentro de um buraco fundo, que por mais que eu tente sair não é possível.

Pela primeira vez na vida eu ia fazer uma coisa certa, eu não ia fugir. E agora estou me sentindo como se não tivesse mais chão.

Não sei quanto tempo eu fiquei ali chorando, e olhando para o nada. Só sei que senti meus olhos pesando, e acabei adormecendo.

Julian

Eu até agora não acredito que fiz isso... Não consigo acreditar que eu a deixei sozinha.

Ela deve está me odiando... Ou achando que sou igual ao Andrew ou pior.

Eu só quero que ela fique bem, só quero que ela seja feliz.

Cada palavra que eu escrevi naquela carta foi um pedaço do meu coração que eu deixei com ela.

Eu a amo tanto que faria qualquer coisa por ela. Eu daria minha vida por ela. Eu daria a minha felicidade para ela ser feliz.

Eu só quero que ela não sinta dor... Eu queria poder tomar suas dores para mim, mas não é possível.

Então fiz meu sacrifício, sacrifiquei ficar ao seu lado, sacrifiquei a chance de vê-la sorrir contente e de abraçar e confortar ela quando triste. Para evitar um dor muito maior ela podia vim a sentir.

Sinto uma intensa dor, e não está doendo pouco não.

Eu nunca irei me perdoar por isso... E nunca irei me arrepender de ter feito isso também.

A única coisa que vou me arrepender é de não ter falado que eu a amava. Amo mais até do que a minha própria vida.

Clara

Acordo com uma tremenda dor de cabeça, com os olhos vermelhos e doloridos.

Faço um esforço sobrenatural para levantar e ir tomar café.

Como sempre Lilian e Marie me ajudam a disfarçar a cara de choro. Não me fizeram perguntas, mas querem conversar comigo mais tarde.

Desço e vou para a Sala de Jantar, encontro minha mãe sorridente e meu pai um pouco feliz também. Minha mãe murcha o sorriso quando vê meu rosto e nota que eu não estou bem. É ela notou. E falou disfarçadamente durante o café que quer conversar comigo.

O motivo da felicidade? É que o tal cidadão que vem atacando as cidades, prometeu trégua. Isso me alivia um pouco e me deixa um pouco intrigada também. Do nada ele resolveu declarar trégua... Muito estranho.

Expulso esses pensamentos para o fundo da minha mente.

Agora minha mãe é mais uma para a lista de pessoas que quer conversar comigo.

Assim que termino, vou para o jardim. Escalo a árvore e fico em cima dela.

Antes esse lugar me trazia apenas paz e calmaria. Agora me traz lembranças de uma Clara que já não conheço mais. Eu já não me sinto eu mesma.

Nunca pensei que amar fosse doer tanto. Quer dizer, minha ideologia de amar é o que eu via em meus pais. Felizes e amando um ao outro.

Também não posso dizer que já senti algo como o amor. O que sentia pelo Andrew na infância não é nem metade do que eu tenho sentido agora.

Mas do que adianta sentir se ele nunca irá saber?

Balanço a cabeça para tentar expulsar esses pensamentos.

E me volto para um rosto familiar vindo em minha direção...

— Pedro, você veio!