Hey, Jude

Propósito final


CAPÍTULO QUATRO - O PROPÓSITO FINAL

"Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito."

(Machado de Assis)

10 de abril de 2011,

Novamente chorando e isto já estava se tornando um martírio para mim. Desde aquele dia resolvi mudar. Tentei ser freira, mas minha mãe não permitiu. Todos estavam me impedindo de fazer algo errado e isto me chateava.

Ninguém soube, mas um dia o James veio me visitar. Ele tinha fugido para me ver, mas no final descobrimos que o nosso sentimento era apenas atração. Rimos bastante naquele dia e ele disse que iria se tornar padre. Minha irmã estava melhor a cada visita, mas ainda precisava de muita ajuda para se tornar a pessoa de antigamente.

FLASHBACK

- O que você está fazendo? - perguntou minha mãe ao ver eu arrumando as malas.

- Vou para um convento, mãe. - respondi apenas, arrumando os lençóis para usá-las como corda. - Não posso ter o mesmo o futuro que minha irmã, não posso. - completei ao lembrar da mesma travada em uma cama.

- Mas acha que ir para um convento lhe fará feliz, Jude? - perguntou em um misto de irritação e preocupação.

- Eu juro que eu tentei ser feliz, mas ultimamente eu ando me debulhando em lágrimas.

- Você ainda é muito jovem, Jude. Ainda falta muito para você encontrar o homem de sua vida.

- A, é? E para isso eu tenho que sofrer tanto assim? - comentei irritada - Acho que ele não vale todas as lágrimas que derramei.

- E o Sam? - perguntou, de uns dias para minha mãe cismava que ele era meu namorado.

- Ele não é meu namorado. - sussurrei, mas ela não escutou.

- Estou até imaginando os netos correndo pela casa e chamando "Avó, vem brincar!" Não admito outro genro, senão ele Jude. - declarou, seu tom de voz era pensativo e sonhador.

Ver seu semblante alegre, deixou-me angustiada. Aquilo estava indo longe demais! Eu teria que avisá-la sobre a opção sexual de Sam, antes que aconteça algo pior.

- Isto não será possível! - comuniquei, estava temendo pela reação dela ao saber do segredo de meu amigo.

- Por que não? De longe da para saber o quanto vocês se amam, Jude.

"Doce ilusão!" Pensei ao ouvir a última frase de minha mãe. Ela sempre foi uma mulher sonhadora e isto a impedia de enxergar por outro ângulo.

- PORQUE ELE É GAY, MÃE! - berrei para que ela pudesse ouvir claramente a minha exclamação.

Deu para notar quando seus olhos se arregalaram ao ouvir a declaração. Sabia que neste momento ela iria se afastar e chorar. Dava para imaginar quantos anos ela ficou imaginando e planejando o nosso futuro, mas já sabia que ninguém podia mandar nos sentimentos. Ao reconhecer que ela ainda precisava de mim, desisti do plano.

FIM DO FLASHBACK

Sam entrou no quarto de maneira apressada. Seu corpo havia mudado drasticamente, assim como sua mente. Seu semblante se tornou doce e melancólico por me ver aos prantos. Trouxe meu corpo para seus braços, tentando me acalentar. Eu estava cansada deste mesmo desfecho e principalmente desta vida. A todo o momento eu tentava me afastar das pessoas para não me apaixonar, mas mesmo com os cuidados eu acabava me quebrando.

Sim, querido coração. Eu estou amando novamente, meu amigo gay. Ele se tornou mais maduro e misterioso com o passar dos anos. Seus gestos não eram mais previsíveis e suas feições haviam se tornado mais aristocráticas. Agora, assim como as crianças, as mulheres da nossa idade eram apaixonada por ele. Eu não poderia rir, porque eu não era a exceção.

Meus soluços se tornaram mais altos por voltar ao passado. Senti ele me abraçando mais fortemente. Queria que me soltasse e dissesse que me odiava, mas nem isso fazia. Empurrou-me para a parede com brutalidade e se preocupou ao ouvir meu gemido de dor. Eu desejava que minhas lágrimas cessassem, mas elas se tornavam mais frequentes a cada ato dele. Agora ele demonstrava dor, e não alegria.

- Quando isto parará, Jude? - comentou ao risos - É cômico o modo como você sempre acaba se atirando em meus braços após uma decepção. - seus olhos brilhavam e suas pupilas se dilataram ao olhar para mim novamente.

Ao ver sua boca rosada próxima a minha, senti uma necessidade de beijá-lo. Mordi fortemente os meus lábios com o intuito de reprimir o desejo. Percebi que assim como eu, sua respiração tornou-se ofegante. Após por as mãos em minha nuca, ele fez algo que jamais imaginaria.

Ele estava me beijando!

Seus lábios mexiam junto ao meu com intensidade. Posicionou suas mãos lentamente em minha cintura. Oh céus, dava para sentir o arrepio correr entre meus dedos. Seu gesto era desesperado, rude e apaixonado ao mesmo tempo. Apaixonado, era assim que eu o retribuía. Eu estava em suas mãos, e o pior é que ele sabia. Mordia minha boca com sutileza, era como se ele soubesse onde e como me tocar. Ele é meu melhor amigo gay, mas eu não estava arrependida por fazer algo que eu sempre desejei.

Eu não conseguia pensar em nada, enquanto seus lábios tocavam o meu. Dava para sentir o toque de suas mãos, o cheiro de lavanda e principalmente o calor... Calor, era o que eu mais sentia neste momento. Este era o único momento em que a mente e o coração trabalhavam em consenso, pareciam nublados e desligados do ambiente ao seu redor. Com muito esforço, parei o contato.

- O que você... - tentei perguntar com esforço ao levantar as sombrancelhas em dúvida, mas ele me cortou.

- Eu não me importo se você queria guardar este beijo para o seu querido primo, mas eu tinha que fazê-lo. - começou em um murmúrio feroz - Eu não admitia que eu estivesse te perdendo, mas eu lhe perdi. Desde aquele momento em que ouvi você falar de forma clara que tinha gostado de beijar uma mulher, eu me desesperei. Sabia que não podia lutar contra o seu sentimento, mas um ano depois veio James. E ele quase a beijou, maldito. Queria matá-lo no mesmo dia e mostrar para ele o quanto você é apenas minha. Faça o que quiser de sua vida, Jude, mas eu sei que no final do dia você sempre se lançara aos meus braços. Está surpresa? Pois eu não.

Aqueles palavras, vieram como uma enxurrada em minha mente. Se eu observasse bem, poderia jurar que vi a cólera brilhar em seus olhos. Agora ele era como um quebra-cabeça complexo para mim, um completo estranho. Eu poderia jurar que ele era gay, mas ele provará que o quanto gostava de mulheres. Havia quebrado o meu coração em pequenos pedaços, para depois o reconstruir de maneira rápida e indolor. Estava me sentindo tão bem, que a queda seria pior em qualquer descuido seu.

- M-mas você é gay, Rainbow. - sussurrei, em um fio de voz que me restará.

Notei que ele me ouviu, por ver a sua expressão se contorcer inteira. Como ele tinha fôlego para declamar um texto, se eu nem tinha voz para dizer uma única frase? Este silêncio estava me matando, e isto despertou o pior em mim. Queria beijá-lo novamente, até que ele perdesse todo o ar de seus pulmões. Droga! Desejava que ele se sentisse como eu após o beijo.

- Eu tentei lhe repudiar a todo o momento, Jude. - começou de maneira angustiada - Poder arrancar este sentimento de meu peito por me sentir sujo ao amar a única amiga que tinha. Acordava todas as noites por temer que alguém além de mim tocasse as mãos em você. Fiquei desesperado por descobrir que a minha boneca de porcelana havia se tornada a grande mulher que é hoje. Oh céus, as pessoas voavam para cima de você como urubus, mas eu não permitia. Jurei a mim mesmo que a esqueceria, mas hoje eu descobri que isto seria de todo impossível.

Desejava poder acordar deste sonho, algo que certamente era irreal. Dei um, dois, três passos para trás com o intuito de afastar os meus pensamentos. Ao olhar para frente a imagem ainda estava intacta, com o sorriso que eu aprendi a amar. Levei a minha mão ao braço tentando beliscar a minha pele. Alguém se aproximou de mim e parou o meu gesto. Aquilo era tão real! O toque, o calor de seu corpo e principalmente o ser.

- Eu não permitiria que você me esquecesse, Sam, porque eu também não conseguiria. - declarei ao olhar para ele, não acreditei que soltei estas palavras até escutá-las tão bem em meus ouvidos - Já estava tão acostumado com a dor de não ser correspondida, que não acreditei ao ouvir suas palavras soarem tão doces em meus tímpanos. Tantas vezes desejei esquecê-lo, mas isto terminava ao ver seu sorriso. Droga! Eu jurei a mim mesma que você era homossexual, mas não compreendia o porquê das meninas sempre te perseguirem. Sou tão egoísta, que queria gritar para todas as atiradas que você era gay só para te ter por inteiro. Principalmente porque eu sou completamente apaixonada por você.

Ele posicionou seu braço em meu corpo e me beijou. Algo que pudesse transmitir um sentimento que fora abafado durante anos. Queria absorvê-lo em mim, para que nenhuma parte fosse esquecida. Sentia todo o calor que emanava de seu corpo ao me tocar. Todas as terminações nervosas e a batida do meu coração estavam se movendo freneticamente.

"Ele sim, merecia todo o sofrimento que passei! Apenas ele. Maldição... Sam me fazia tão feliz." Pensei. Nos mínimos segundos de nosso contato, pude lembrar todos os seus gestos. Como fui tola de não perceber o quanto ele me amava? Seu olhar doce ao me observar e sua total compreensão ao abafar as minhas mágoas. Fui cega por não perceber que eu o fazia sofrer ao reclamar de minha tola vida. Ele estava ferido, mas não contava. Sim, ele é muito para mim. Algo que eu nunca imaginei ter.

- Você sempre foi minha, assim como eu sempre serei seu. - finalizou ao me beijar com sofreguidão e enroscou meus cabelos em seu dedo, mostrava-se possesso.

Eu entendia neste momento, o significado da letra "Hey, Jude". Além de ter o meu nome, ela parecia ser feita para mim. Eu poderia tornar uma música triste em algo bonito, mas não poderia sozinha. Considerava minha vida triste, mas ao ser tocada pelo Sam ela tornou-se a mais bela de todas. Talvez a mãe sempre estivesse certa, eu e ele fomos feitos um para o outro.

28 de abril de 2011,

Hoje eu me sinto completa. O médico avisou que minha irmã terá alta em duas semanas. Susie, deixou de ser minha amante e passou a ser minha amiga. Hoje ela confessa que seus olhares fuminantes eram para o Sam. Nilda ainda vive me culpando pelo ocorrido, mas ela sempre soube que seu filho não tinha vocação para ser padre. A vizinha me contou há oito dias, que ele havia fugido com a filha do prefeito. Claro, isso eram apenas boatos de uma vila fofoqueira. Ou será que não?

Sei que tudo que passei foram necessários para a minha felicidade plena. Reconheci que mesmo não enxergando um palmo a minha frente, tive a audácia de experimentar algo novo para chegar em meu propósito final. SER ETERNAMENTE AMADA PELO SAM.

Fim.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.