As apresentações estavam chegando ao fim, logo seria a minha vez de subir no palco. Ainda estava em busca da minha guitarra. Não a achava em lugar nenhum e todos diziam não ter-la visto. Se eu não achasse a minha guitarra não poderia apresentar a música que passei tanto tempo compondo... Fui em busca da mesma no lado mais escuro das cochias e lá estava minha guitarra com seu braço quebrado. Senti minha garganta queimar, faltava tão pouco para a apresentação. Passei tanto tempo escolhendo as notas certas, dediquei tanto de mim para estar alí...

- Bonnie, dez minutos para você entrar... O que houve?

Pedro logo perguntou ao me ver agaixada no chão com minha guitarra estraçalhada em mãos. Ainda nem havia posto o meu vestido para a apresentação.

- Minha guitarra... Não vou mais poder participar.

Falei pausadamente encarando o chão. Estava desesperada. Pedro estendeu-me a mão e sorriu.

- Vá para o camarim e ponha seu vestido, beba bastante água e me encontre atrás das cochias.

Fiz o que me mandou rapidamente, corri para o camarim que já estava vazio. Eu seria a última a me apresentar e precisava me apressar. Pus meu vestido e terminei a maquiagem. "Ele arranjará outra guitarra parar mim, tenho ceteza!" mas e se não? Tentava pensar positivo mas seria bem difícil... Então ouvi o chamado e corri para cochia esperando Pedro chegar com a minha guitarra. Ele não veio. O palco estava escuro, era a minha vez de entrar. Todos em silêncio.

- Vá! - alguém sussurou.

- Não posso! Minha gui...

Fui empurrada e então uma luz forte iluminou o palco. Um piano. Um lindo piano, com uma linda calda, enormes e espaçosas 88 perfeitas teclas. Perfeito. Mas não, não estava alí para mim. Eu iria tocar a guitarra, e fazia muito tempo que não encostava sequer um dedo em um piano. Não ousaria...

Olhei para trás, Pedro estava parado, olhando fixamente para mim com um sorriso no rosto. Tive quase certeza de que ele estava ciente de tudo. Estava me preparando para voltar às cochias quando vi o público me olhando anciosos. Estava parada havia um tempo, e eles continuaram em silêncio junto comigo. Havia muitas pessoas, sem dúvida mais de trezentas. Todas aguardando-me. Olhei novamente para o Pedro que esboçou um sorriso ainda mais largo e apontou para piano com sua cabeça. Sorri.Segui mais uns passos e sentei, antes de tudo pigarriei e olhei para a platéia.

- Boa noite.

Não fazia a mínima ideia do que eu estava fazendo alí, sentada em frente a um piano. Eu não poderia fazer isso. Era um show de composições próprias, não poderia...Até que meus dedos começarem um balé involuntário sobre as teclas. Nunca havia tocado essa música, mas suas partituras estavam fixas em minha mente. Ela tinha um grande valor sentimental para mim.

Olhei para cada um da fileira da frente, me lançaram olhares esperançosos e outros espantados. Podia ver o desespero de todos aqueles que estudaram comigo. O espanto no olhar de cada um deles de me ver alí diante de um instrumento dos deuses e sabendo tocá-lo tão sabiamente, tão... Calmamente.

- Playground school bell rings again

Rain clouds come to play again Has no one told you she's not breathing?Hello, I'm your mind giving you someone to talk to

Hello!

Abaixei a cabeça. Sabia que não tinha necessidade de olhar para as teclas, meus dedos se moviam sozinhos. Sabiam exatamente o que fazer. Apenas fechei meus olhos e me deixei levar. Cada suave toque em uma das teclas me dava uma sensação tão diferente, mas ao mesmo tempo tão igual. Já não me sentia assim há um tempo, há muito tempo... Exatamente 3 anos. Nossa, três anos haviam se passado tão lentamente. Tudo parecia uma eternidade sem ela, uma vida monótona e dolorosa.

- If I smile and don't believe Soon,

I know I'll wake from this dream

Don't try to fix me, I'm not broken

Hello! I'm the lie living for you so you can hide

Don't cry

Lembro-me do seu sorriso tão perfeitamente como se ela o tivesse me presentiado com ele há dois minutos atrás. A imagem de seus olhos não saia de minha mente, e sua boca falando algo inaldível para mim, os segredos só dela. Coisas que eu jamais iria poder perguntar novamente. Me peguei de olhos marejantes, mas continuei a tocar.

Não entendia o porquê de ainda estar alí, me torturando... Havia algo que não me deixava simplesmente levantar e abandonar minhas lembranças alí. Algo muito maior que eu, muito maior que a minha dor.

- Suddenly, I know I'm not sleeping

Hello! I'm still here

All that's left of yesterday

Senti-a tocar sua mão na minha, naquele erro inocente e proposital de sempre. Olhei-a em seus olhos, mas ela não me encarava, apenas se preocupava em olhar para as notas que eu produzia.

Demorei um pouco para perceber, mas isso era tudo o que ela queria desde que partiu. Ela só queria que eu a deixasse ir, mas eu não podia, eu nunca ia a deixar. Vi sua lágrima cair assim que terminei a canção que compus pra ela exatamente a três anos atrás. Ela sorriu. Sorri junto. Era impossível não sorrir ao olhar para ela.

- Obrigada - eu a ví balbuciar silênciosamentte antes de desaparecer ao apagar das luzes novamente.

Tudo havia acabado e o que restou em mim foi só a lembrança da minha irmã indo embora... Uma vez mais...

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.