Heimkehr

Capítulo 10 – Reencontrando


Capítulo 10 – Reencontrando

ANDAVA A PASSOS LARGOS PELOS corredores da caverna atrás de Brandt. O nervosismo tomava conta de meu corpo a cada passo que dávamos em direção à cozinha. Lua tentava também manter a calma dentro de mim, para não me deixar pior, mas eu sabia que ela esperava esse reencontro tanto quanto eu. Eu sentia a aproximação dele em cada poro da minha pele, em cada batida do meu coração. Eu poderia mandar para longe da minha mente qualquer pensamento relacionado a Jamie o quanto quisesse, mas não conseguiria por mais que alguns segundos.

Melody, você precisa se acalmar, sussurrou Lua em minha mente.

Estou calma, eu disse, mais a mim mesma do que a ela.

Engraçado, pois não parece, ela tentou fazer piada. Tentou.

Finalmente chegamos a um longo corredor com teto alto – mais alto do que largo. A luz forte e quente passava por grandes buracos abertos. Dos dois lados do corredor, havia longas pilhas de rochas. Na maior parte brutas, pedras vulcânicas roxas, com uma substância mais clara entre elas. Criando costuras, as mantendo juntas. No topo dessas pilhas diferentes pedras, marrons na cor e retas. Estavam coladas com a coisa cinza também. O produto final era uma superfície relativamente reta, como uma mesa, talvez.

Eu reconhecia aquele cômodo familiar, onde eu trabalhava durante boa parte da semana, quando não estava na colheita.

Diversas pessoas transitavam por ali, mas com certeza não todos que viviam nas cavernas – apenas quem já trabalhava e os atrasados para o café-da-manhã. Alguns sentados, outros escorados. Passei meu olhar pelo lugar, procurando uma pessoa em específico, mas sem deixar de reconhecer outras. Maggie e Sharon sentadas mais afastadas de todos, como sempre ficaram; Trudy e Sunny ao lado de Geoffrey e Andy; e finalmente ele, cercado por Peg e Melanie.

Paralisei assim que o vi, contrariando tudo o que pensava que aconteceria quando eu o revisse.

— Acha que está pronta? – perguntou Brandt, quando viu-me como uma estátua perto da entrada.

— E-eu não sei. – murmurei, sentindo como se meu estômago estivesse em queda livre.

Minhas mãos começaram a tremer e a soar frio, meu estômago estava embrulhado e eu ouvia um bipe dos meus batimentos cardíacos, como se tentassem explodir em meus ouvidos. Eu esperava sinceramente não vomitar bem ali.

Respira fundo, Mely, você consegue! Lua tentava me animar e me manter sã. Foi para isso que te trouxe de volta, não foi?!

Ela estava certa. Não era um receio qualquer que me deixaria desistir. Ainda mais quando eu estava tão perto.

— Espero que esteja pronta, porque Peg e Melanie já perceberam sua presença. – disse Brandt, arrancando-me a força dos meus pensamentos.

Levantei meu olhar, vendo que o que ele dizia era verdade e as duas já me abriam sorrisos enormes, incentivando-me. Arregalei meu olhar quando Melanie se inclinou para Jamie, que permanecia de costas, e sussurrou-lhe algo incompreensível, ainda sem tirar seus olhos de mim. Ele arqueou a coluna, sentando-me ereto e largando o pedaço de pão que comia. Os segundos que ele demorou para se virar pareceram-me uma eternidade. Quando finalmente vi seu rosto, percebi porque suas irmãs ficaram tão preocupadas.

Jamie estava mudado. Seu rosto estava mais fino, como se tivesse emagrecido bastante, seus olhos não tinham mais o mesmo brilho que sempre tivera, tornando-se um azul opaco e vazio. Os cantos de seus lábios pareciam caídos, como nunca havia visto, e haviam bolsas roxas e inchadas abaixo de seus olhos, contrastando com a pele mais pálida.

E mesmo assim nada pareceu importar quando seu olhar cruzou com o meu e sua expressão pareceu resplandecer.

— Por que ninguém me disse que ela havia voltado?! – sua voz rouca chegou tão claramente aos meus ouvidos que eu segurei a respiração momentaneamente, saboreando seu timbre, pois pensava que jamais o ouviria novamente.

Jamie levantou-se de seu lugar, precipitando-se em minha direção. Eu queria ir à frente, deixar meus pés controlando a mim e jogar-me em seus braços, enterrar meu rosto em seu peito e sentir seu rosto se enterrando na curva de meu pescoço, como fizemos tantas outras vezes. Mas com uma pequena parte do meu cérebro, percebi que Lua tentava impedir-me disso mentalmente, enquanto Brandt impedia-me fisicamente, segurando em meu braço sem muita força, apenas para que eu não fizesse nada precipitado. Percebi isso com a mesma parte insignificante do meu cérebro que percebeu que todos na cozinha se calaram e agora observavam, pasmados, a cena que se desenrolava.

A cada passo que Jamie dava em minha direção parecia curar um pedaço diferente do meu coração. A cada passo que ficávamos mais próximos o sentimento de alívio e realização crescia em meu peito. E eu sentia que tudo o que passei até ali – desde o tiro que levara para salvá-lo e até quase ter sido morta por Melanie –; tudo valera a pena porque eu estaria finalmente em seus braços.

Até que Jamie pareceu realmente olhar para meus olhos, e meu coração se quebrou na mesma proporção que o recente brilho em seu olhar se tornava a mais completa escuridão e devastação.

— E-eu... M-mas... – ele gaguejou, paralisado a meio caminho.

Éramos o centro das atenções. Eu não me importava com tal fato e ele mal parecia se dar conta disso. Eu podia ver através de seus olhos que ele tentava entender o que acontecia, e eu implorava internamente que alguém me ajudasse. Lua ainda sussurrava em minha mente que eu não poderia fazer nada por mim mesma, pois isso poderia piorar minha situação. Apertei o braço de Brandt enquanto direcionava meu olhar para Melanie, como se implorasse que fizessem alguma coisa em meu favor.

Melanie entendeu meu recado, levantando-se rapidamente de seu lugar e indo até Jamie, tocando seu ombro como se amparasse. Eu sentia como se estivesse hiperventilando.

— Jamie? – ela perguntou, cuidadosamente, começando a ficar tão preocupada quanto eu.

Dei um passo à frente.

Mely... Lua tentou avisar-me, mas eu não avançaria mais de qualquer maneira, pois isso pareceu acordar Jamie do transe.

Ele livrou-se rapidamente da mão de sua irmã em seu ombro e avançou mais em minha direção, parecendo nervoso. Brandt colocou-se estrategicamente mais à frente, como se me protegesse. Eu sentia toda aquela cena errada – Jamie jamais me machucaria, mas ele também nunca me olhara como se estivesse num conflito entre explodir e urrar.

— Você suprimiu a Melody? Ela ainda está aí? – perguntou assim que parou à minha frente, e eu podia perceber o desespero crescente em sua voz.

Cuidado com as palavras que for escolher, instruiu-me Lua, e eu pensei bem no que diria a seguir.

— Eu ainda sou a Melody. – respondi, minha voz não passando de um murmúrio.

Eu sabia que não tinha sido a melhor escolha de palavras, mas ver o olhar desamparado e desacreditado de Jamie foi como ter mais um pedaço do coração arrancado. Todos voltaram seus olhos para mim, como se me analisassem e me julgassem. Jamie pareceu dar-se conta disso, pois sua próxima ação foi arrancar-me de perto de Brandt e arrastar-me para fora da cozinha.

— Ei, o que você...? – Brandt tentou impedi-lo.

— Fique fora disso. – rosnou Jamie para meu irmão, por cima do ombro.

— Calma, Jamie! – exclamei, enquanto ele mantinha seu aperto forte em meu cotovelo e levava-me pelos corredores das cavernas. – Você sabe que eu odeio quando me arrasta desse jeito!

O aperto se tornou mais forte e, por bom senso, decidi por calar-me. Eu já sentia o ar me faltando.

Melody, calma, respira! Lua quase grita em minha mente, superando o som do sangue corrente como marteladas. Desmaiar agora não vai adiantar de nada!

Respirei fundo segundo suas instruções. Ela tinha razão, era uma péssima hora para se perder a cabeça.

— Tudo bem, hora de abrir o jogo. – Jamie disse, parando no meio de um corredor parcialmente escuro. Haviam algumas lanternas espalhadas a longas distancias, e eu percebi que estávamos no meio do caminho entre o hospital e a sala de jogos. – O que aconteceu com a Melody?!

Respirei fundo mais uma vez, tomando conta da distância que ele tomava de mim. Cada um grudado a um lado diferente do corredor, a uma parede diferente. Então eu contei tudo o que havia acontecido, desde o momento em que eu acordara com uma Alma em meu corpo, prendendo meu controle sobre o corpo, passando pela parte que eu virava amiga de Lua e ela me dava o controle novamente, contei sobre como passei os últimos dias tentando achá-lo, mesmo que queimando sobre o sol do deserto, até o momento em que o vi ali na cozinha.

Terminei minha narrativa, torcendo internamente para ele acreditasse em minhas palavras.

— Uma história bem contada para quem tomou o corpo da minha namorada. – ele sussurrou, a voz tão baixa que quase não ouvi. – Como eu posso confiar em você? – ele perguntou mais alto, engolindo em seco e com os punhos cerrados.

Inspirei e expirei, tentando manter a calma.

Mely...?, Lua murmurou em minha mente, como se previsse os próximos passos.

— Você confiou em mim até quando estávamos prestes a morrer! – exclamei, a voz uma oitava mais alta. – Por que não pode confiar agora?!

Jamie deu um passo à frente, parecendo furioso e desesperado.

— Como eu posso acreditar que você realmente é a Melody?! – ele rosnou contra meu rosto, e eu dei um passo atrás por reflexo. – Como me garante que não é apenas mais uma Alma imunda como os Buscadores que está fazendo um teatrinho apenas para coletar informações e nos aniquilar?! Se fosse realmente a garota que eu amava, teria se matado antes de permitir que uma Alma desconhecida chegasse perto dos humanos que amava!

Foi então que tudo dentro de mim desmoronou completamente e eu vi a verdade diante dos meus olhos.

Nada tinha valido a pena.

Jamie não acreditava em mim.

— Chega, Jamie, eu cansei. – disse em um sussurro, mais calma do que eu estava, surpreendendo tanto a ele e Lua quanto a mim. – A Lua me devolveu o corpo para voltar para você. Eu não vou deixar de te amar, mas não tenho como continuar aqui enquanto você não acreditar verdadeiramente em mim.

Então eu saí dali, sem olhar para trás e dizendo a mim mesma para ser forte, pois agora eu estava sozinha.