Heart Attack

Uma mancha invisível





Heart Attack

Uma mancha invisível

...


O sorriso dele naquele momento era de puro escárnio e prazer. Ele questionava se ela podia ir além de seus limites e tudo o que pôde ouvir foram sussurros vazios na vã tentativa de procurar por um resquício de ar... Desesperadamente, quase agonizando ao tentar manter sua consciência viva, Nami lutava contra sua própria incapacidade de se proteger.

– Onde está sua coragem agora...? Gata Ladra...

A navegadora tentava desesperadamente desprender a mão feita de metal do seu pescoço. Ela estava a um passo de ser estrangulada da forma mais cruel que existira.

Procurando encontrar uma forma de respirar, ela percebeu que não resistiria mais. As imagens de Bellemere e Nojiko não saiam de sua mente. E finalmente... Seus companheiros... O bando do chapéu de palha. Sua vista insistia em ficar completamente turva, prestes a desvanecer. Porém... Um último pensamento ecoava intensamente dentro de si.

– Me desculpe Luffy... Acho que não poderei ajudar a realizar o seu sonho...

Nami soltou o último suspiro antes de desmaiar. Kid sentiu o corpo da ruiva enternecer em sua mão, mas antes que pudesse reagir, uma voz interrompeu sua linha de raciocínio.

– O que você está fazendo, seu idiota!!?

Bonney surgiu atrás do ruivo, e a expressão dele foi a mais sádica possível.

– Estou ensinando uma lição a esta insolente... – Kid atirava o corpo da navegadora sobre o chão. Sem nenhuma piedade.

Sim... Você ensinou muito bem a lição... Agora já podemos enterrá-la! – A glutã soltou um grito irônico que pôde ser ouvido do outro lado do navio. Kid a encarou com fúria.

– Ela agiu cautelosamente para fugir daqui... Eu a deixei livre para transitar pelo navio e lhe dei tudo o que pediu... Não aceitarei ser engando por uma mulher tão fraca... – Os olhos do ruivo queimavam impetuosamente em cólera.

– Sério...? Por que acha que alcunha dela é Gata Ladra...? Pare de ser infantil! Ela não é uma qualquer!

– O acordo foi que me levasse até a garota para sequestra-la durante festa, então daqui pra frente... Não se meta! – O ruivo advertia a devoradora com seu típico jeito atroz. Bonney apenas o ignorou.

– Eu disse pra não estragar a mercadoria... Você sabe o que o Chapéu de Palha pode fazer com você se descobrir que feriu a navegadora dele...?

Um riso irônico pôde ser ouvido.

– Darei um jeito no Chapéu de Palha futuramente... Então pouco importa se esta garota se machucar...

– Ela ainda não está respirando! Chame uma enfermeira agora!!!

...

– Ainda faltam duas semanas... O que esse cara está planejando...? – Franky indagava desconfiado.

– Eu espero que esse maldito não esteja maltratando a Nami-San!!! – Sanji chutava a parede da cozinha. O loiro se encontrava furioso.

– Não podemos fazer mais nada a não ser esperar o prazo que ele nos deu... – Law tentava apaziguar a situação.

Luffy e os outros se encontravam a caminho de uma ilha desconhecida, situada num dos locais mais perigosos da Grandline, porém, teriam de esperar durante catorze dias para se encontrarem com o sequestrador. A pessoa que havia capturado Nami no baile da corte em Dressrosa era o pirata mais temido daquela geração: Eustass Kid. Nem mesmo Law conseguia entender qual era o objetivo dele.

– Por que esse cara quer a Mera Mera no Mi...? – Usopp perguntava enquanto olhava diretamente para Law.

– Eu não sei... Mas essa fruta é almejada por figuras poderosas... Pode ser que ele a venda ou troque por uma arma... Não podemos ter certeza de nada...

Luffy e Zoro se encontravam sérios no canto da cozinha. A ideia de que teria de trocar a fruta que havia conseguido com tanto esforço no Coliseu com sua companheira, ainda lhe intrigava. Mas Luffy sabia o que era mais importante. E Nami era sua prioridade.

Repentinamente o navio sofria um movimento brusco e todos foram jogados de forma violenta para o lado esquerdo.

– Mas o que esse cara tá fazendo!!? – Franky protestava enquanto tirava de cima de si a mesa que havia caído no forte baque.

– A Robin não foi verificar...?

– Você arrumou um péssimo navegador, Trafalgar... – Zoro repreendia insatisfeito.

– Ele era a única pessoa em Dressrosa que estava apto a navegar, então não reclamem... – Um dos subordinados de Doflamingo foi obrigatoriamente a navegar o navio por meio de ameaças feitas por todos os chapéus de palha. Aquela era a única opção que possuíam.

– Droga... Eu machuquei minha cabeça! – Chopper resmungava enquanto segurava o galo.

Enquanto os outros também se recompunham daquele contratempo, Law se mantinha perdido em pensamentos. E se questionava até onde Bonney havia lhe usado. Porém, o mais surpreendente... Como estaria aquela ruiva atrevida...? No fundo ele sabia... Que até mesmo ele estava preocupado com aquela garota geniosa e manipuladora... Ele se questionava se ela poderia ficar quieta o suficiente apenas para sobreviver até que todos chegassem ao local marcado para a troca, pois o gênero de Eustass Kid era implacável.

...

“Minhas pálpebras estavam pesadas e encontrei dificuldades para abrir os olhos, mas quando consegui, a primeira coisa que vi foi a claridade do lustre do quarto onde estava. Relutantemente, olhei ao redor e reconheci aquele lugar... Era o quarto onde Eustass havia me hospedado contra minha vontade. Reuni forças para levantar daquela cama tão macia e aos poucos meu corpo se ergueu. Meu pescoço estava densamente dolorido, e quando resolvi colocar os pés para fora da cama, senti uma forte tontura a ponto de me escorar na parede próxima. Mas ainda assim, me dirigi ao espelho que estava pendurado no centro do quarto e forçando a vista, percebi que haviam me vestido com uma camisola branca de alças finas e então finalmente... As marcas ao redor de meu pescoço. Aquilo havia de fato sido extremamente violento e eu ainda podia sentir a horrível sensação do oxigênio se ausentando dos meus pulmões. Então tive a certeza de que não poderia fugir daquele navio sem ser morta...
Me pergunto por que ele me deixou viver... E isto só pode significar uma coisa... Ele precisa de mim para algo que está planejando. Esta é a única conclusão que consigo tirar ao analisar essa terrível situação, porém... Por que esse dilema está me matando gradativamente...? Essa mancha invisível dói profundamente...”


Ainda tentando entender a situação que lhe cercara, Nami não conseguia se desvencilhar dos pensamentos onde o término de tudo aquilo seria a sua morte. Então olhou ao redor do quarto, procurando algo para se distrair, pois era notável que agora seria mantida em cárcere após uma tentativa de fuga. Uma tentativa patética, pensava ela.

Após andar ao redor da cama, ela se direcionou à mesinha que estava logo a sua frente. Se agachou e abriu a gaveta. No mesmo instante ela sorriu ao olhar um rolo de papel e caneta cartográfica.

...

– Muito obrigada por ter me deixado esperar cinco dias! Caso não saiba, tenho outros compromissos marcados... – Bonney ironizava ao constatar que finalmente Kid e ela teriam uma reunião de negócios.

O ruivo lançou um olhar significativo e misterioso para ela ao entrar na sala, porém, ele lentamente se posicionou atrás de onde a mesma estava sentada. A garota estava com os pés em cima da mesa, numa pose completamente mal educada enquanto devorava um pedaço de pizza.

– Por que está tão aborrecida...? Em vez de reclamar... Relaxe... – Kid ajeitava gentilmente as longas madeixas rosadas para trás do pescoço dela, e passou a acaricia-las delicadamente no ímpeto de sentir toda a sua maciez. Bonney arqueou uma sobrancelha.

– Por que em vez de flertar comigo você não tenta domar o seu novo brinquedinho...?

Kid sorriu audaciosamente.

– A mulher mais indomável do mundo está na minha frente nesse momento... – Ele dizia em tom provocante.

– Todas aquelas pobres mulheres presas naquele cubículo lá embaixo não são suficientes pra lhe satisfazer...? Por que você não as liberta...? É muita tortura te ter como amante... – A glutã terminava a afronta enquanto apanhava mais um pedaço de pizza.

– Jewelry Bonney... Você realmente é uma mulher atrevida... Mas saiba que... – O ruivo se afastava da devoradora, ficando de trás para a mesma enquanto abria o armário da adega e procurava qualquer bebida que lhe agradasse. Ele terminava a questão não explicada anteriormente.

– Essas mulheres não estão aqui obrigadas... Mas por livre e espontânea vontade...

Bonney franziu o cenho, desconfiada.

– Sim... Elas te servem sem ganhar nada e ainda querem estar aqui... Que tipo de macumba você fez?

Kid soltou um riso abafado em resposta.

– Se tivesse feito tal coisa, até mesmo você estaria enfeitiçada, não acha...? – Ele ironizava, descontraindo com a pirata que curtia com sua cara de modo debochado.

– É verdade... Mas talvez... – Ela mastigava ainda mais, enquanto engolia rapidamente, no intuito de terminar a frase. – Talvez esse feitiço só funcione com mulheres burras... E isso explica por que a gatinha ruiva tentou fugir daqui...

Kid a defrontou intimamente.

– Diga logo o que você quer. Minha paciência está se esgotando...

– Ooh, pobre Eustass... Não consegue lidar com a rejeição... – Bonney fazia um bico de deboche.

Ele lhe fitou sério e ficou em silêncio alguns segundos.

– E você...? Como lida com o fato de não poder estar com o seu amado...?

A garota engasgou no mesmo instante, lhe encarando séria logo depois. Embora nunca admitisse nada sobre sua vida pessoal com Kid. Era óbvio que ele sabia de algo.

– Eu juro que queria entender sobre o que está falando, mas meu tempo está acabado e logo preciso par-

– Não vai esperar o Trafalgar chegar...?

Kid mais uma vez sorriu sádico e Bonney sentiu uma intensa constrição no estômago. Ela praguejava mentalmente se deixou alguma brecha para o pirata.

– Não. Preciso voltar para reportar algumas coisas para o ruivo... – Tentava desconversar, como se o que ele havia dito não fizesse nenhum sentido.

– Sinto dizer, mas você vai ficar até que tudo saia como combinamos.

– O QUÊ!? – Ela se levantou, mostrando que não havia gostado do que dissera anteriormente.

O ruivo a fitou da cabeça aos pés, esbanjando um sorriso de canto.

– Até que o nosso plano obtenha êxito, você ficará aqui comigo, ou pensou que poderia fazer uma pequena parceria, conseguir o que queria e depois ir embora...?

– Não!!! Você não vai me usar em seus planos contra o Chapéu de Palha! Não faz parte do acordo!!! – A glutã chutou furiosamente a mesa que se encontrava com várias caixas de pizza e bebidas em cima. Tudo voou pelos ares, porém, Kid continuou sentado e sua reação foi a mais pacífica possível.

– Você está mais do que ciente, de que Doflamingo e a Marinha virão atrás deles... Preciso que distraia o Trafalgar quando todos chegarem ao local marcado...

A garota arregalou os olhos em resposta.

– Sem chance... – Ela baixou o olhar.

– Bem... Então eu terei que tomar medidas drásticas... – O olhar de Kid acendeu em fúria. Bonney não gostava do rumo que aquilo estava tomando.

– Você não pode me tocar... Sabe disso melhor do que ninguém... – O rosto cabisbaixo foi notável.

– Eu não preciso te machucar para saber que no fundo você vai escolher ficar... – O ruivo se levantou rapidamente e ficou de frente para a mesma. Aos poucos se aproximou do rosto dela, mas ela continuou cabisbaixa, sem encará-lo.

– Escolha... Seu egoísmo ou a vida do Cirurgião da Morte... – Sussurrou de forma provocativa no ouvido dela, abriu a porta da cabine e se retirou do local logo depois.

...

Kid transitava pelo navio e era reportado sobre os últimos acontecimentos, quando distraidamente passava em frente ao quarto onde a ruiva descansava. Ele estava lhe mantendo presa após a tentativa de fuga. Foi então que procurou pela chave do cômodo e sem pensar abriu a porta para ver como a mesma se encontrava.

Quando o mesmo terminou de entrar no quarto, teve a ligeira surpresa ao ver a ruiva repousando em cima da mesa.

Ao se aproximar, percebeu a luz do abajur em cima da mesa centralizada num bloco de papel. Nami estava dormindo e sua feição era de extrema e pura serenidade. Com um leve sorriso terno nos lábios, a garota segurava uma caneta. Foi então que o ruivo percebeu que a mesma havia desenhado vários mapas. Ele focalizou o olhar no mais recente e percebeu algumas coisas escritas.

Vila Cocoyashi – East Blue

Na lateral do mapa, um nome: Nojiko.

Ele se perguntava se aquele era o nome de sua terra natal e de um parente.

A feição dela era angelical. Terna, diáfana e cristalina... Como a de um anjo. A ruiva parecia estar vivendo num sonho extremamente prazeroso e curiosamente sua expressão causou certo desconforto no pirata. Algo que nem mesmo ele sabia ao certo o que era. E a única coisa que ele podia vislumbrar era o quanto Nami parecia magnífica. O rosto iluminado, os trajes claros, os cabelos que pareciam estar simetricamente dispostos sobre a mesa.

– Hn... – A navegadora passou a balbuciar algo quase inaudível, enquanto abria os olhos suavemente.

Ela teve seu campo de visão invadido pela silhueta de uma pessoa e quando seu olhar se tornou nítido, ela constatou quem era.

– Aah...! – Nami recuou na cadeira ao enxergar Kid em sua frente. O olhar dela mostrava todo o horror que ele havia lhe causado.

O ruivo a encarou seriamente. Era notável que ainda estava irritado pelo fato de a mesma tentar fugir, mas a recém-impressão que tivera com ela, ainda estava mais forte dentro de si, embora não demonstrasse.

– O que quer aqui...? – Ela perguntava de modo receoso.

– Este é o meu navio e ando por onde quiser, inclusive, o quarto ao qual vou lhe manter em cárcere até que tudo saia conforme meus planos. – Kid redarguia em tom temerário. Nami esbanjava repulsa em demasia.

– Você... Não vai mesmo me dizer o que quer comigo...? – Ela se arriscava, na tentativa de captar algo que lhe fizesse entender por que estava ali.

– Depois de tentar fugir, você não tem mais o direito de saber de nada. Esse é o seu castigo... Princesa...

Nami baixou o olhar e embora expressasse suplício, também mostrava indignação.

– Uma princesa encarcerada na prisão do vilão... Isso é realmente clichê... Mas... – A navegadora ousou se levantar e exprimir um olhar valente e ousado antes de continuar...

– Pode ter certeza que o Luffy virá me resgatar... E vai acabar com você... – E mais uma vez ele se sentia surpreso, não com o charme extasiante da ruiva, mas com o sorriso tão obstinado e seguro.

– Eu sei que chegará o dia em que esmagarei aquele inseto do Chapéu de Palha... E quando esse dia chegar... – Ele se aproximou audaciosamente para perto da face dela e elevou o queixo da mesma no ímpeto de que o encarasse. Os dois se defrontaram através dos olhares que queimavam intensamente. Olhares esses que expressavam uma mescla de ódio, intrepidez e vigor, porém... Kid completou sua sentença.

– Você será minha...

Nami respondeu com o olhar mais absurdo que existia. Ela não estava mais disposta a viver um novo pesadelo com mais um cruel e desumano pirata.