Goodbye

Capítulo Único


Tanto tempo que se passou... Não sou mais aquela simples menina do coro, nem a cantora talentosa que outrora encantava milhões de pessoas com uma simples nota - entre elas, meu marido, Raoul de Chagny - muito menos a criança de sete anos que chorava pelo falecimento de seu pai. Não... Não posso ser mais referida a uma mulher jovem, com sonhos e esperanças para um mundo onde pudesse ser livre. Considerem a mim como uma pessoa idosa, que está nas suas piores condições. Tive uma boa e longa vida, tive dois lindos filhos Louis de Chagny, e Marc de Chagny, e uma filha chamada Blair de Chagny.

Depois do incêndio que houve na Ópera, nunca mais pisei lá. Não só pelo medo de rever aquele rosto, aquele homem, mas por causa da minha saúde. Começou assim que soube, por meio de uma carta, que minha mãe adotiva, Madame Giry, falecera. Aquela fora a mulher, que sempre foi minha mãe, que me acolheu, me fez lembrar de como seria ter minha real mãe por perto... Ela realmente batalhou para terminar sua vida com 82 anos. Fiquei tão deprimida com aquela notícia que senti meu coração parar; e eu nem pude me despedir, dizer a ela o quão bom foi tê-la ao meu lado.

Fui até seu velório, no dia após receber a carta. A vi pela última vez, uma mulher de longos cabelos totalmente grisalhos, e o rosto enrugado, com uma expressão calma, totalmente relaxada. Com certeza estava descansando pacificamente. Mas me deu aquela vontade de abraçá-la, sentir seus braços delicados, me trazendo aquele conforto, de que ficaria tudo bem. Vi minha amiga ajoelhada, ao lado do corpo da mãe, fazendo esforço para mais lágrimas caírem - nem imagino o quanto ela sofrera ao saber da notícia. Ajoelhei-me ao seu lado, e usando mesma técnica que Madame Giry fizera em mim, abracei a Meg, - ela não se casara, então continua com seu sobrenome original - de uma maneira mais reconfortante, dizendo palavras que a acalmaram. No enterro, nós duas não aguentávamos vê-la ser colocada abaixo do solo. Está certo que a morte chega para todos, mas não podemos nos manter calmos e normais com essa coisa natural e inevitável para qualquer ser vivo.

Após a morte de Madame Giry, mal podia comer ou dormir sem deixar de pensar em tudo o que ela fizera por mim. Com o passar do tempo, essa depressão toda me deixava cada vez mais adoentada. Cansei de contar quantas milhares de vezes tinha de ir ao médico.

Agora tenho 63 anos, eu estou ficando praticamente 18 horas na cama; as outras 6 horas, são reservadas para minhas refeições e banhos, claro. Por sorte meu quarto tem uma janela grande o suficiente para eu ver as alvoradas, a movimentação dos coches e dos carros elétricos - essa tecnologia de hoje em dia é incrível! Uma pena eu não poder sair de casa. O máximo de “sair” que eu consigo, é ir até o jardim da frente, ficar dois minutos lá, e voltar para dentro de casa. Bem, conseguia, até meu estado de saúde piorar, até eu ficar quase tetraplégica; meus braços ficavam cansados com muita facilidade, e minhas pernas não aguentam mais carregar meu corpo.

Minha maior surpresa vem agora. Raoul me disse que eu estava com a pele muito mais pálida, então saiu para procurar um médico. Meus filhos têm suas próprias famílias, e nenhum deles moram mais aqui, mas me visitam sempre que podem. No entanto, eles não vieram hoje, e tem apenas uma empregada e uma cozinheira na casa.

Já é o final de uma tarde de outono, o céu está todo pintado com tons de azul escuro, azul claro, e rosa, além de nuvens alaranjadas. Está começando a ficar um pouco escuro no meu quarto, e assim que me preparo para chamar a única empregada que viera trabalhar hoje, para acender a luz, sou surpreendida por aquele homem que cantava canções em minha mente. Ele, aparentemente não mudara. Continuava a usar a mesma máscara branca, os cabelos negros, combinando com as vestes, as luvas, e os sapatos. Ele fecha a porta e a tranca. Oh, céus! O que ele quer de mim? Eu mal posso sair da cama! Ele não iria querer me matar, não é?

—Por favor! –Tento me afastar, desesperada. –Me deixa em paz! Eu estou muito doente! –Mexo bruscamente meu braço para meu rosto. Mas tal movimento, faz sentir como se eu levasse uma martelada do meu ombro até as pontas dos meus dedos –Ai!

—Eu sei que está doente. –Ele disse, se aproximando de mim, rumo a minha cama. –E é por isso que vim vê-la. –Ele ajoelha ao lado da minha cama, e toca minha testa. Eu teria o impedido de me tocar, mas eu já aprendi a lição agora há pouco ao tentar esconder meu rosto com o braço. Logo, com o pouco de esforço que tenho, desvencilho minha cabeça para o lado oposto de onde estava o “anjo”.

—Se afaste de mim!

—Christine... Estive tão preocupado que aquele seu marido lhe fizesse algum mal. –Fala, num tom bem calmo.

—Mas não fez! Ele cuidou, e está cuidando muito bem de mim! –Achei até grosseria da minha parte falar nesse tom de voz com ele. Mesmo que eu não pertencesse mais a ele, acho que merece o meu respeito, afinal, ele quem me consolou e esteve comigo desde a morte do meu pai.

Me surpreendo ainda mais, assim que ele senta na minha cama, ficando mais próximo de mim. Temo que ele me levante e me leve para sua casa abaixo da Ópera, porém ele alisa meus cabelos, já grisalhos com uma mão, e com as costas da outra, tocou meu pescoço.

—Você está fria. –Sua postura calma foi para uma muito preocupada. Ele vai até o fim da cama, e me cobre até o pescoço. –Precisa se aquecer! – olhando o lado exposto do seu rosto, posso ver algumas rugas, não tanto quanto as minhas, por um momento o considerei até mais jovem do que eu.

—Obrigada. –Digo, após ele me cobrir, e um silêncio reina entre nós, até que ele me diz:

—Senti sua falta. Faz anos que não vejo minha única aluna. É ótimo ver você novamente.

Sinto meu coração disparar. Em outras circunstâncias, esse é um momento tenso. No entanto, sempre que ele fala comigo, e desse modo, com sua voz tão grave que faz meus órgãos tremerem, pode-se dizer que o meu coração não está tendo problemas.

—É bom ver você também... –Mesmo com minha mão ainda dolorida, meus instintos insistem que eu toque em seu rosto. E foi o que fiz. Além de fitar seus olhos verdes, eu me atrevo a dizer o que eu nunca mais tinha dito. Nem pro Raoul, nem para os meus filhos. –Meu anjo...

Não acredito que falei isso! Depois dele ter me enganado, ainda me atrevo a dizer que ele é meu Anjo da Música!?

—Sou seu Anjo da Música. E sempre estarei com você. Você sabe disso. –Ele toca meu rosto com as duas mãos, e beija minha testa.

O contato dos seus lábios mornos e macios na minha testa faz com que todo o meu corpo derreta. Como eu queria poder beija-lo outra vez!

—Christine, eu te amo. Não interessa se está casada, o meu amor por você sempre permanecerá, por que o amor não é algo material, não tem forma, não tem cheiro, não é ouvido. Amor é o sentimento mais forte e imparável que existe. –Ele diz, olhando nos meus olhos, com suas mãos ainda sobre minhas bochechas, acariciando-as com os polegares.

Quando termina seu belo discurso, eu quero dizer algo em resposta, mas um barulho de carro desvia nossa atenção. Meu anjo se levanta, e vê pela janela. Ele apenas se vira e fala com um pouco de desprezo.

—Seu marido chegou.

Ele vai até a porta, liga a luz no interruptor, destranca a porta, a abre, olha para mim, e a fecha. Juro ter visto seus olhos brilharem ao olhar para mim.

Se passa uns dez segundos e Raoul entra com o médico. Será possível que eles não tenham se visto, ou ele não ter sido visto pela empregada, ou pela cozinheira? Bem, de qualquer maneira, o médico me examina da cabeça aos pés, e diz que, infelizmente, eu só tenho... E sussurra no ouvido de Raoul, que fica boquiaberto.

—Está certo disso? –Raoul pergunta, e conhecendo-o bem, diria que está muito assustado.

—Desculpe-me, Monsieur. Mas o estado de sua esposa não está melhorando.

Aquela frase, aquelas palavras... Então é isso? Morrerei em breve?

Espero o médico sair com o Raoul, que agora usava uma bengala para andar, para chamar Helen, minha empregada. Assim que ela chegar, mando-a escrever o seguinte:

"Caro Raoul, você já fez muito por mim, e sempre serei grata. Se lembra daquela caixinha, com seu forro de veludo e a estatueta de chumbo? Pois bem, por favor, faça isso por mim. Consiga trazer para mim, Raoul. Música sempre viveu entre nós, assim como nosso amor desde que nos conhecemos. É tudo que peço a você.

Christine"

De acordo com o médico, eu morreria em uma semana, pois bem, já se passaram duas semanas! Já é de noite, e estou quase dormindo, até que escuto o barulho da porta se abrir. Levanto um pouco a cabeça, e o vejo. Mas será que é ele mesmo, ou é apenas impressão minha? A resposta chega depois de sua aproximação silenciosa na escuridão, seguida de seu toque suave pelos meus cabelos.

—Anjo da Música. –Sussurro –Você voltou!

—Eu disse que nunca a deixaria. –Fala naquele tom baixo, grave, e envolvente que me arrepia.

—Posso te pedir um favor? –Fico um pouco sem jeito, e começo a entrelaçar meus dedos uns nos outros. –Você poderia... Se não te incomodar...

—O quê?

—Cantar para mim, outra vez... –A vergonha fica maior, então abaixo a cabeça, e fecho os olhos com força. Sinto, num instante, seus braços me envolverem, e ele empurra minha cabeça para algo macio, eu posso escutar algo batendo em um ritmo um pouco acelerado. Ele começa a me balançar de um lado para o outro. Abro os olhos, e vejo que estou com a cabeça em seu peito. Respiro fundo, e fecho os olhos, apenas escutando a música calma que ele canta. Quando eu menos espero, a música para, do nada. Sinto meu corpo endurecer. Céus! O que está havendo? Estou tentando abrir meus olhos, mas parece impossível! Rapidamente, estou sentindo meu corpo esfriar, mas por dentro. Não consigo me mexer! Eu sinto meu coração bater cada vez mais devagar! E minha respiração! Eu... eu... acho que... sinto... que estou... est.

P.O.V. Narradora

Assim que sentiu sua amada gelada, Erik achou que estava com frio. Ele a colocou de volta na cama, cobrindo-a. Acariciou o rosto de Christine, sentindo-o duro e frio. O Anjo ficou mais preocupado ainda, e colocando sua cabeça sobre o peito esquerdo da moça, tentando ouvir seu coração, que parara definitivamente de funcionar.

—Não! Não! Não! Christine! Meu anjo! Meu amor! –Lágrimas caíam do seu rosto sem controle. Ele aproximou-se do rosto dela, e encostou seus lábios quentes nos gelados dela. Mesmo sem vida, os lábios de Christine contraíram um pouco, formando um pequeno sorriso. Erik ficou ao seu lado por mais longos minutos, e assim que levantou a cabeça, viu os primeiros raios de sol. Ele chegara de madrugada! Como...? Bom, os longos minutos equivaliam a algumas horas. Logo, ele se levantou. –Descanse em paz, minha amada.

Erik fitou sua amada aluna por mais dois minutos, antes de sair, desta vez, para sempre. Ao menos declarou o seu amor por ela, que finalmente o correspondeu; infelizmente, o destino tivera outro plano, que não envolvia ambos juntos.

No dia seguinte, foi feito o enterro da antiga soprano. As famílias de seus filhos estiveram presentes e fizeram uma pequena homenagem à Condessa. O belo enterro foi finalizado com pétalas de rosas das mais variadas cores.

Dois anos depois:

Erik está de frente ao túmulo de Christine. Ele se ajoelha e tira debaixo de sua capa negra uma rosa vermelha com uma fita preta enrolada, num laço, no caule esverdeado.

—Uma vez seu Anjo da Música, sempre seu Anjo da Música. –Retirou do bolso, o anel que a moça lhe dera e colocou no meio do laço da fita da rosa. E a pousou ao lado da lápide. –Nunca deixarei de te amar.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.