— Ele foi de cara pra frente da loba, Sakura-chan, bem entre vocês duas. Um herói!

Naruto desviou de um galho arremessado contra seu rosto e riu. Na última hora, investira todo o tempo em aborrecer Sakura sobre o heroísmo de Sasuke ao proteger a menina da loba monstro de Nana. No início, ela ainda se dava ao trabalho de justificar, dizendo que o Uchiha, provavelmente, estava apenas se posicionando para defender Kakashi. Ele é o próximo Hokage e você também deveria ter se levantado para defendê-lo, Naruto!, ela repetira algumas vezes. Mas agora, após milhares de piadinhas, a garota simplesmente atirava o que tivesse por perto (naquele momento, os galhos em que ela prendia os peixes para assar na fogueira) na direção de Naruto e mandava que ele se calasse. Ambas atitudes, na opinião do Uzumaki, eram igualmente engraçadas.

— Ah, qual é, Sakura-chan! - continuou Naruto, que só observava o trabalho de Sakura e Aiko em preparar o almoço - As outras meninas de Konoha morreriam para que eu ou o Sasuke déssemos uma de herói pra elas. No caso da Hinata-chan, só eu mesmo.

— Cala a boca, Naruto! - ordenou Sakura, jogando outro galho em no companheiro. O garoto desviou novamente e viu a kunoichi corar ainda mais. Permanecia a dúvida se a vermelhidão era consequência da timidez ou da raiva.

— Sakura-san, - chamou Aiko, que tentava não rir em aparente solidariedade feminina - Assim você vai jogar fora todos os galhos que eu achei! Se você quer se vingar, então eu posso fazer o fogo da fogueira perseguir o traseiro dele até queimar.

Naruto arregalou os olhos. Esquecera que a garota tinha a mesma habilidade que a mãe. E que provocá-la mais cedo acabara por deixá-la de castigo. Certamente a menina não morria de amores por ele e, depois do que a Sakura-chan contara, Kakashi-sensei o mataria caso ele machucasse, mesmo que por acidente, a criança. Ou seja, nem se defender podia.

— Ok, ok, parei - disse Naruto, sorrindo inocente pra menina, que simplesmente virou a cara. Sakura riu para ele, que deu de ombros. Sempre tivera jeito com crianças. Era uma questão de tempo para Aiko gostar dele. E, se ela era filha de Kakashi-sensei, teria que se acostumar com o Uzumaki de qualquer forma.

— Você não vai fazer nada não, Naruto? - provocou Sakura, agora colocando os peixes na fogueira. Sakura falara aquilo apenas para o fazer passar por preguiçoso. Não havia muito a se fazer, e ela sabia disso, indignou-se Naruto. Ele já preparava uma resposta, que obviamente incluiria uma provocaçãozinha sobre Sasuke, quando Aiko interrompeu a conversa dos dois, apontando para floresta:

— O que é aquilo? - perguntou a menina, levantando-se assustada enquanto Shori prontamente se colocava à sua frente.

Naruto olhou por cima do ombro e espantou-se. Não que o que vira fosse ameaçador, mas certamente representava que algo estava errado. Afinal, Sasuke não desperdiçaria chakra conjurando o Susanoo para simplesmente ter uma carona de volta.

— Sasuke-kun! - gritou Sakura levantando-se imediatamente e correndo em direção ao garoto. Naruto a seguiu e alcançou Sasuke segundos depois, quando o Uchiha já desconjurara o Susanoo e, parado, esperava os companheiros. O Uzumaki congelou. Nos braços do amigo, Nana jazia imóvel.

— Sakura, - começou Sasuke, em tom urgente - ela tá queimando em febre.

— O que aconteceu com...? - perguntou Naruto, afobado, enquanto via Sakura correr para a mulher e começar a examiná-la.

Mas Sasuke não chegou a responder. Um grito fino de criança interrompeu a pergunta de Naruto, fazendo-o virar-se somente para se deparar com uma Aiko desesperada correndo na direção do grupo. Institivamente, Naruto segurou a menina antes que ela alcançasse a mãe, que ainda era examinada por Sakura. A experiência lhe ensinara que se algo era potencialmente perigoso, então não era para crianças.

— ME SOLTA! ME SOLTA! - gritava Aiko se debatendo enquanto Naruto a segurava, levantando-a pela cintura - É A MINHA MÃE! ME SOLTA! SHORI! SHORI!

Mas, para alívio de Naruto, a loba não obedeceu. O animal aproximou-se de Aiko e lambeu-lhe os pés, tentando acalmar a menina. Em vão. A criança simplesmente continuou debatendo-se, as lágrimas escorrendo pelas bochechas rosadas.

— A Sakura-chan examinando ela, Aiko-chan! Calma! - pediu Naruto, enquanto a menina tentava se soltar de qualquer maneira.

— O que aconteceu? - perguntou Kakashi, a quem Naruto nem reparara chegar, acompanhado da loba Ihai. O sensei olhou para a menina e fez sinal para que Naruto a soltasse, mas o garoto não se sentiu muito confiante em obedecer.

— Ela vai atrapalhar a Sakura-chan! - argumentou Naruto ao sensei, mas, diante de nova ordem, acabou cedendo. A menina correu imediatamente em direção à mãe, mas, antes que pudesse alcançá-la, Ihai ordenou que ela não atrapalhasse, fazendo a criança parar há meio metro de Sakura, soluçando abraçada à Shori.

— O que aconteceu - perguntou Kakashi novamente, e Naruto pode ver que o ninja evitava olhar para a filha - Sasuke?

— Kakashi-sensei, - interrompeu Sakura, impedindo, novamente, que Sasuke respondesse a pergunta - eu nunca vi alguém com tanta febre! O corpo dela não vai aguentar mais do que uma hora se a febre não abaixar.

— Como assim? - perguntou Aiko, soltando Shori e levantando-se para encarar Sakura - Você quer dizer que… que minha mamãe…

Mas ela não terminou. Aparentemente, verbalizar o que pensava era demais para Aiko. A menina abaixou-se novamente, abraçando a loba, soluçando tanto que seu corpo tremia. Naruto sentiu dó. Sabia como era crescer sem mãe e, olhando para Sasuke, viu que o amigo pensava o mesmo.

— O corpo dela liberando a energia que ela absorveu por não conseguir manipular, Sakura - informou Kakashi, numa calma fingida, aproximando-se da mulher e tocando-lhe a testa, a fim de medir a temperatura. Naruto o acompanhou e observou Nana por um instante. As mechas de cabelo vermelho caiam sobre o rosto da ninja, cujo corpo estava todo envolto em uma camada de, e Naruto não podia pensar em nada melhor que descrevesse, energia vermelha. Mesmo naquele estado, a mulher parecia definitivamente perigosa. E hipnotizante.

— Eu tentei baixar a febre dela, mas parece que esse manto de energia não me deixa manipular chakra no corpo dela! - exclamou Sakura, exasperada.

— O corpo dela se protegendo do excesso de energia e chakra é um tipo de energia… - explicou Kakashi, observando Nana atentamente, como quem tenta lembrar de algo. Alguns segundos se passaram em que todos olhavam para a mulher, ainda nos braços de Sasuke, sem saber ao certo como proceder. Todos menos Naruto. Ele não conseguia tirar os olhos de Aiko, que continuava soluçando abraçada à loba.

— Eu nunca vi Nana não conseguir manipular energia… - comentou Ihai, tristemente, todo o tom ameaçador de antes agora extinto em sua voz.

— Eu já… - respondeu Kakashi, muito sério - Mas ela ainda era criança e…

Kakashi parou de repente, e Naruto se assustou. O sensei virou-se e, abaixando para falar com Aiko, que ainda soluçava, perguntou no tom mais calmo que conseguia fingir diante da situação. Naruto sentiu-se levemente irritado com Kakashi. Ele só se lembrara da filha agora?

— Aiko, - começou Kakashi, pausadamente, afastando o rosto da menina do pelo de Shori - sua mãe te treinando para manipular energia, né? - perguntou o ninja e, diante do aceno positivo de Aiko, continuou - Quando você não consegue manipular tudo e acaba absorvendo energia, o que ela faz?

— Isso só aconteceu uma vez! - disse Aiko, tentando defender-se de acusação nenhuma.

— E o que ela fez? - perguntou Kakashi, novamente.

— Me deu uma injeção… - respondeu a menina após um instante pensando - De um remédio que ela fez.

— E você tem isso em casa? - perguntou Sakura, de forma excessivamente bruta, na opinião de Naruto. Aiko acenou novamente com a cabeça e correu para a cabana, seguida por Shori.

— Como você sabia, Kakashi-sensei? - perguntou Naruto, ainda levemente irritado pelo sensei ter ignorada a filha enquanto a menina chorava.

— Vi Nana perder o controle uma vez - respondeu Kakashi, tenso - Quando éramos crianças. Eu tinha esquecido.

Mal Kakashi terminara de falar, Aiko apareceu pela porta dos fundos da cabana, correndo o mais rápido que podia. Trazia uma caixinha branca nas mãos, tão apertadas que Naruto não se surpreenderia caso a menina quebrasse o objeto. Ela alcançou o grupo segundos depois, estendendo à Sakura a caixa, com olhos ainda cheios de lágrimas, mas sem mais soluçar.

Sakura abriu a caixinha rapidamente, e Naruto espiou o conteúdo. Haviam quatro injeções, todas contendo um estranho líquido amarelado, e um papel dobrado ao meio. Sakura entregou a caixa à Naruto, abriu o bilhete e pôs-se a lê-lo.

— Aqui diz que não se pode dar duas doses em um espaço menor que seis horas - informou Sakura, enquanto lia o papel.

— Minha mãe escreveu isso pra eu não errar...

Sakura sorriu pra menina, encorajando-a, e pegou uma das seringas da caixa que Naruto segurava. Ela tirou o objeto com cuidado, mas Naruto a sentiu hesitar e estranhou. A Haruno tinha muita confiança em suas habilidades médicas. Já a vira em situações muito mais complexas, em meio ao campo de batalha, e a garota jamais hesitara. Ele acompanhou com o olhar a companheira caminhar em direção à Nana e tentou pensar nas razões da amiga. Chegou a duas: ou ela não se sentia à vontade medicando alguém com algo que não conhecia ou os olhos marejados de Aiko a colocavam sob pressão. Se tivesse que apostar, Naruto apostaria na última.

— Um momento, Sakura - chamou Kakashi, tirando Naruto de suas suposições. Sakura parou e virou-se ao sensei, que continuou - Sasuke, é melhor colocar Nana sobre a grama. Não lembro como o corpo dela reagirá à medicação.

Sasuke concordou e deitou a ninja sobre a grama, excessivamente cuidadoso para os padrões do Uchiha. Naruto aproximou-se dos amigos enquanto Sakura abaixava-se para aplicar a injeção. Ele sentiu Aiko fungar e virou-se, apenas para se deparar com Kakashi afastando-a carinhosamente da mãe, enquanto bagunçava os cabelos da menina tentando confortá-la. Naruto voltou-se à Nana sem poder conter um sorriso. Então Kakashi não ignorara a filha. Ele simplesmente não sabia como agir.

Sakura aplicou a injeção no braço da mulher, empurrando o embolo lentamente. Naruto observou a tensão da amiga aumentar, até essa tirar a agulha de Nana e cobrir o furinho com algodão. Todos então voltaram-se para shinobi, completamente focados nos efeitos que o líquido teria no corpo dela. Por um momento, Naruto achou que a coisa toda tinha falhado. Nada mudara. A ninja continuou estendida, imóvel, sem nenhuma aparente reação ao medicamento. Sasuke chegou a tocar-lhe a testa, medindo a temperatura somente para, segundos depois, negar a diminuição da mesma

Quando Naruto já pensava em expor sua opinião de que o remédio estava vencido, tudo aconteceu. O corpo de Nana, antes parado como uma estátua, começou a tremer violentamente, batendo com força contra o chão. O Uzumaki e Sasuke rapidamente seguraram os membros e a cabeça da mulher, a fim de impedi-la de se machucar, enquanto Sakura moldava chakra dentro do peito de Nana, fazendo Naruto sabia lá o que. Aiko tentou correr para a mãe, mas Kakashi a segurou no colo, tentando consolá-la enquanto a menina, soluçava desesperadamente.

— SENSEI! - gritou Sakura, o rosto molhado em suor, sem alcançar melhora alguma em Nana - O CORPO DELA AINDA NÃO ME DEIXA INFUNDIR CHAKRA!

— Somente a segurem! - respondeu Kakashi, seu falso tom calmo traído por uma tensão crescente - Ela deve estar liberando a ener…

Mas Kakashi não terminou. Suas palavras se perderam em algum lugar, no momento em que Nana parou de debater-se. Tão de repente como começou, a mulher voltou ao seu estado imóvel, quieta como num sono. O manto de energia vermelha que a envolvia minutos antes desapareceu, restaurando a aparência normal da ninja. Naruto olhou para Sasuke incrédulo, que por sua vez fitou Sakura, ambos buscando respostas que a menina parecia não ter. Ela pousou a mão sobre a testa de Nana e levantou os olhos aliviada.

— Ela ainda está com febre… - informou Sakura - Mas de um jeito normal. Não dá mais pra fritar um ovo na testa dela.

— Ufa! - exclamou Naruto, sentindo um peso sair de suas costas - Achei que ela ia morrer mesmo…

Naruto sentiu um baque na cabeça e precisou de alguns segundos para perceber que Sakura o batera. Ele já começava a discutir quando viu Aiko passar como um raio por ele para abraçar a mãe, ainda desacordada.

— Sempre se pode contar com você quando o assunto é tato, né Naruto? - ralhou a amiga, enquanto Naruto tentava desculpar-se com o olhar mais culpado do mundo.

— Bem… - começou Kakashi abaixando-se ao lado de Aiko e colocando Nana nos próprios braços - Melhor levar Nana pra casa, né?

Naruto levantou-se rapidamente e, assim como seus companheiros e Aiko, acompanhou o sensei de volta à cabana. No meio do caminho, Sakura lembrou-se dos peixes na fogueira e pediu que Sasuke fosse verificar se estavam bons. Naruto viu o amigo respirar fundo antes de obedecer à garota e riu quando o Uchiha simplesmente se virou e foi em direção ao fogo, sem argumentar. Sabendo que era completamente inútil para Sakura, Kakashi ou Nana naquele momento, Naruto seguiu o amigo, de quem pelo menos poderia descobrir o que acontecera.

Os dois alcançaram a brasa instantes depois, ao mesmo tempo em que Kakashi subia a escada para a cozinha. Naruto abaixou-se esperando ver os peixes queimados, mas se enganou. Os animais ainda sequer estavam assados.

— Achei que tinha passado mais tempo - comentou Naruto, enquanto Sasuke sentava-se à frente da fogueira, pousando a espada ao seu lado. O Uzumaki imitou o companheiro e sentou-se também, achando muito bem vindo o calor das chamas numa tarde que começava a esfriar demais. Ele esperou o amigo falar algo mas, uma vez que os dois permaneciam em silêncio, continuou, indo direto ao que queria saber - O que aconteceu, Sasuke?

O Uchiha olhou para Naruto por alguns segundos antes de responder. O Uzumaki sentiu um certo receio no olhar do amigo, e desconfiava do motivo. Ultimamente, tudo era culpa de Sasuke. Se Nana morresse, seria mais uma culpa para o garoto carregar.

— A gente encontrou os caras um pouco longe daqui - disse Sasuke, quando finalmente começou a responder - Eram uns doze. A Nana matou todos em menos de cinco minutos.

— Explodiu os caras? - perguntou Naruto, com os olhos esbugalhados em espanto. Matar tão rápido assim era meio que matar de graça, pensava o garoto. Não houvera sequer tempo para os convencer a mudar.

— Espada. Cortou-lhes a garganta - respondeu Sasuke, imitando com a mão o caminho da lâmina pelo pescoço - Quando a gente procurava por pistas nos bolsos dos ninjas, Nana percebeu que eles eram bombas. Ela os levou pra cima, para conter a explosão, absorveu tudo, e caiu. Se eu não a tivesse segurado, teria morrido.

Naruto precisou de um minuto para digerir a informação. Vira Nana lutar mais cedo, absorver uma enorme quantidade de energia dos jutsus que Sasuke e ele lançaram nela e pousar sobre a água tão leve como um pássaro. Isso o levava a imaginar o tamanho da explosão para que a kunoichi não conseguisse conter. E fez surgir a pergunta: o que ninjas como aqueles queriam no País do Fogo?

— Qual foi o tamanho dessa explosão? - perguntou Naruto, sério.

— Muito grande - respondeu Sasuke, transpassando um peixe ainda cru com um galho e colocando-o no fogo - Ela estava quilômetros acima de mim e mesmo assim o Susanoo sentiu o impacto.

— Caraca… - surpreendeu-se Naruto, baixinho. O garoto dedicou um tempo a observar o crepitar das chamas sobre os peixes, enquanto tentava avaliar todos os aspectos da situação. Pensou no tipo de ninjas que seriam aqueles a quem Nana enfrentara, e no que eles estariam interessados na Vila. As cinco nações ninja estavam em paz, logo os homens teriam que ter vindo de outros locais. E ordenados por outras pessoas. Com objetivos diferentes dos que levaram a guerras no passado. Mas de onde poderiam vir? Quem poderiam ser? O que poderiam querer?

— Mas tem uma coisa estranha nisso… - começou Sasuke, despertando Naruto de seus pensamentos e trazendo-o de volta ao entorno da fogueira.

— O quê?

— Antes de encontrarmos os caras, Nana me disse que ninguém sabia que ela era a guardiã da fronteira. Que ela não deixava sobreviventes, assim ninguém poderia contar que a fronteiras era guardada por uma pessoa só.

— E daí? - perguntou Naruto, achando um pouco extremista a política da ninja.

— Os caras sabiam quem era ela…

— Ah, mas isso pode ser porque ela deixou algum escapar.

Mas Sasuke negou em um aceno tão firme que Naruto teve certeza de que o amigo não acreditava na chance de uma fuga. Ele franziu as sobrancelhas sem entender qual outra possibilidade existiria. Se ninguém fugira, ninguém sabia quem guardava o norte, certo? O garoto olhou para o companheiro, pronto a perguntar qual alternativa, quando foi atingido em cheio por ela: estava ali, na sua frente, a principal consequência da outra possibilidade.

— Você acha que…? - começou Naruto, mas não precisou terminar para obter um aceno positivo do Uchiha. E, de certa forma, não foi um choque. Foi apenas uma decepção.