Fugir não era uma coisa glamorosa e a cidade de Phoenix provava isso, os becos escuros, o lixo entulhado na parte suburbana, os cachorros moribundos e os traficantes não passavam uma boa imagem ao lugar. Gert sabia essa que era a realidade das pessoas que não haviam nascido em uma família economicamente estável como a dela, mas seu senso justiceiro fazia com que ficasse muito incomodada com a situação.

Um trovão forte ecoou na viela escura pela qual passavam.

— Parece que vai chover- Chase comentou olhando para o céu.

— Concluiu pelas nuvens pretas ou suas luvas também são meteorológicas? – Respondeu cortando a conversa.

Chase respirou fundo, as vezes era difícil controlar a raiva perto de Gertrude, principalmente quando sabia que as péssimas respostas dadas por ela não eram só propositais, como também um simples mecanismo de defesa.

— Vou anotar isso para uma próxima atualização, alguma outra sugestão?

— Não, nenhuma.

— Gert, qual o problema? É tão ruim assim passar um tempo comigo?

— Só quando eu estou sendo acusada de envolvimento em um....

— É isso que te chateia? Porque não é só você sabe, eu sinto saudade de casa, dos meus pais.

— Eles são assassinos Chase, não sinto falta deles, minha família está comigo, Molly, Old Lace...

— Nico, Karolina, Alex, eu.

Ela fez menção a falar, mas mudou de ideia e segundos depois formulou uma pergunta.

— Você poderia ter escolhido qualquer outra pessoa para te ajudar com essas compras, porque eu, Chase?

— Porque eu gosto da sua companhia, claro, quando não tenta me afastar assim.

Uma rajada forte de vento os atravessou e Gert se abraçou, a noite estava gelada e nebulosa, o que dava um pouco mais de conforto para que saíssem pelas ruas com pouco disfarce, Chase por exemplo usava sobretudo e uma touca e Gert prendera o cabelo em um coque no topo da cabeça, os cabelos roxos pareciam negros com a falta de claridade, vestia uma capa preta que tinha pegado emprestado de Nico que a ela um ar místico.

Os dois passaram o resto do caminho em um silêncio desconfortável.

Porém, assim que avistou o letreiro neon do supermercado, as mãos da garota começaram a tremer, era pavoroso pensar em ir para cadeia e pior ainda, cogitar a possibilidade de voltar a morar com os pais e se alguém ali os reconhecesse? Esse pavor crescia dentro dela a cada dia, tinha que se livrar desse sentimento e que forma melhor do que descontar em Chase? Entendeu como era uma imbecil.

— Desculpa por ser assim- Disse ela baixinho controlando a respiração, era difícil demais fazer aquilo- Eu ando irritada, confusa, com medo....

Chase segurou a mão dela e os dois entrelaçaram os dedos depois de um tempo.

— Tudo bem, não vou deixar que nada te aconteça.

Assim que entraram Chase tirou um papel do bolso.

Eles tinham uma lista:

Frutas
Vegetais
Chips
Água
Isqueiro
Lenços Umedecidos

— Não acha que deveríamos comprar um ou dois frangos para Old Lace?

— Minha garota é esperta, ela tem caçado ratazanas de noite, a independência feminina reina- Respondeu esboçando um sorriso, o primeiro do dia.

— Não discutirei mais sobre as refeições da sua garota- Disse levantando as mãos- Mas e quanto a nossa? O que acha de comprarmos um vinho?

— Uma péssima influência para Molly- Gert retrucou- O Alex também não vai gostar.

— Podemos tomar só nós dois, sozinhos, juntos- Sugeriu.

A garota sentiu o rosto corar um pouco, percebeu só então que andavam como um casal pelos corredores do comércio.

— Alex não conseguiu esse dinheiro para gastarmos assim Chase.

— E se eu fizer o vinho sair de graça? Toparia tomar ele comigo?

— Vai seduzir uma caixa? Porque usar mulheres é opressor e significa rebaixa-las a amebas que podem ser facilmente influenciadas por um cara bonitão, sou totalmente contra.

— Bonitão?

— Quem disse isso? – Retrucou ela.

— Você disse.

— Me prova.

— Não preciso, você sabe que disse e eu ouvi dizer, Já basta.

— Como vai fazer uma garrafa de vinho sair de graça?

— Tenho meus métodos que não envolvem sedução, mas farei só se valer a pena, só se aceitar passar um tempo comigo Gert.

Mesmo contra a vontade outro sorriso surgiu em seu rosto, Chase se sentia vitorioso.

— Vou acreditar que isso significa um sim.

— Se não envolver nada ilegal ou extremamente patriarcal eu aceito.

Foi a vez de ele abrir um sorriso, um daqueles bem bobos mesmo.

.....

— Certo, eu pego a fila do caixa e você me espera na porta- Instruiu ele.

— Devo me preparar para correr? – Perguntou Gert.

— Se prepare para beber comigo.

Ela assentiu e fez o que ele havia pedido.

Enquanto a fila para o caixa seguia, Chase parou um tempo para fitar Gert, a garota estava de cara fechada e braços cruzados, batia a perna impacientemente no chão e bufava de leve, ela tinha um gênio forte encantador, uma beleza que ele não conseguia ignorar, estava perdidamente apaixonado por ela, era um idiota e não sabia o que fazer.

— Próximo- Chamou a caixa.

Chase passou os itens da lista primeiro e ficou segurando a garrafa de vinho na mão.

— Senhor, vai levar a garrafa?

— Bom, na verdade eu pensei que poderia me ajudar.

— Com o que? – A mulher perguntou curiosa.

— Tenho dinheiro apenas para as comidas, mas tem essa garota.... Aquela ali fora- Apontou ele- Quero impressionar ela.

— Desculpe, mas vai ter que impressionar ela com as frutas.

— Hey, olha... Marisol- Disse olhando para o crachá dela- Eu observei o livro que mantém no seu colo, O fim das eras é um romance não é?

— isso, é sim.

— Sendo amante de romance, não quer apoiar o começo de um? Eu só quero passar um tempo bom com ela, tomar um vinho, dar a ela um momento bom para se lembrar.

— Garoto você nem ao menos parece ter idade para beber, pode me mostrar sua identidade?

O coração de Chase gelou.

— Minha identidade? Perdi semana passada.

— Certo, então largue essa garrafa- Pediu ela- Agora.

Ele abaixou a cabeça demonstrando certa tristeza e deu o dinheiro contado para as compras, Marisol colocou tudo em sacolas e antes de entrega-las, pegou sua carteira e tirou 20 dólares dela.

— Leva a garota para tomar um café, é mais a cara dela.

— É sério?

— É sério, eu gosto de romance.

— Obrigado, muito obrigado.

Chase Stein se sentia vitorioso, guardou as sacolas dentro de sua mochila junto com suas fistgonas e foi em direção a garota emburrada de braços cruzados.

— Temos dinheiro para um café.

— Eu tenho apetite por café.

— Ótimo.

......

— Que esquisito.

— O que?

— É estranho me sentir segura.

Estavam sentados em frente a um laguinho, o vento ricocheteava em suas roupas e o frio era harmonizado por seus cappuccinos, as luzes da cidade os iluminavam e o assovio das rajadas de ar era música.

— É bom saber que te proporciono esse sentimento- Chase respondeu passando uma de suas mãos ao redor da cintura de Gert.

— Não disse que me sentia assim por sua causa- Respondeu chegando mais perto dele.

— Nunca precisou dizer.

— Chase você é a pessoa mais convencida que já conheci, sabia?

— A mais atraente também?

De fato ele era.

— Defina atração, esse é um termo muito pessoal- Disse escapando do assunto- Eu poderia falar sobre a relação de tudo isso com a beleza e os padrões estabelecidos pela sociedade e como isso influência diretamente nos seus gostos sexuais e na sua libido por certos corpos.

— Não faço a mínima ideia do que quis dizer com isso.

— Se quiser, eu posso desenhar para você.

— Não, seria entediante do mesmo jeito.

— Você se entedia fácil com o que não entende, não é mesmo?

— Com tudo não- Falou apertando um pouco a cintura dela- Mas, se eu estivesse em uma sala sozinho com você a última coisa que eu iria querer era aprender sobre o patriarcado, tem tantas coisas mais interessantes para se fazer.

Gert sentiu as bochechas queimarem mais uma vez, uma parte dela queria beija-lo e a outra dar a ele uma resposta atravessada, decidiu não fazer nenhum dos dois, encostou a cabeça em seu peito e ficou ouvindo seus batimentos, rápidos, fortes, intensos, ficaram ali deste jeito por um tempo.

— Acho melhor irmos- Chase falou assim que um raio rasgou o céu a cima deles.

E de repente era tudo o que ela não queria fazer, era tão bom tocar o corpo dele, sentir o cheiro, abraçar, ter ele ali só para ela.

— Como eu faço para ficarmos assim para sempre? – Perguntou impulsivamente.

O garoto fixou o olhar na parte que conseguia enxergar dela com clareza, a pele branca quase morena, os cabelos roxos, o óculos meio sujo.

— É só me deixar ficar e eu prometo, não vou te deixar nunca.

Gert largou o copo ainda meio cheio de café no chão e se pôs na frente dele, os olhos grudados nos seus, a respiração próxima, os cheiros se misturando.

— Fica comigo.

Ele nem se importou em onde jogava o resto do café, passou os braços ao redor da garota e a puxou para um beijo, as mãos dela envolveram seu pescoço e o trouxeram para mais perto, trovões se expandiam pelo céu e os dois não pensavam mais em nada, queriam um ao outro, precisavam um do outro.

A chuva começou a cair, mas nenhum dos dois se moveu, Chase acariciava o rosto dela limpando as gotas que caiam, foi ai que Gert abriu os olhos e viu.

— Chase- Sussurrou pousando a cabeça no ombro dele- Tem alguém nos observando.

— Tem certeza?

— Absoluta.

— Continue falando comigo- Respondeu baixinho- Preciso que mantenha a calma.

— Não vou te um ataque aqui, não se preocupe- Disse se levantando irritada- Não é tudo o que eu sei fazer.

— Está brava comigo?

— Vem logo Chase, está chovendo forte e eu definitivamente não preciso de um resfriado.

Eles começaram andando rápido, depois correram, estavam adquirindo prática nisso, viravam a cada segundo e lá estava uma sombra encapuzada os seguindo tranquilamente, os dois entraram em um beco, Chase abriu a mochila com rapidez, Gert pegou os óculos dele e procurou pelo perseguidor.

— Ele sabe que estamos aqui, coloque logo essas luvas, temos que derruba-lo.

Se posicionaram rente a parede do beco e ficaram na espreita, alguns moradores de rua que estavam deitados por ali ficaram intrigados.

— Ele está vindo.

As fistgonas já estavam preparadas para disparar, quando a pessoa em questão passou tranquilamente pela rua os ignorando no beco.

— Acho que ele não está nos seguindo- Chase começou.

— Acha que é paranoia minha? Que eu sou doida?

— Um pouco bipolar com certeza.

— Quando não se tem coisas boas para falar é melhor ficar quieto sabe.

— Você compreende que é sempre a primeira a atacar, não é?

— Talvez você não tenha percebido que na maior parte das vezes eu só respondo aos estímulos que me são dados.

— Mais uma vez sem sentido.

— Mais uma vez depreciando minha inteligência.

— Jamais, só respondendo a altura mesmo.

E bingo, ela se viu desarmada.

— Ficamos mais uns dois minutos aqui e vamos para nosso cortiço, ok? – Mudou de assunto.

— Sim senhora.

O tempo passou mais depressa do que esperavam e como a rua estava sem movimento algum seguiram até o esconderijo.

Duas batidas seguidas, três batidas seguidas, um batida.

Molly abriu a porta, o rosto claramente aliviado.

— Estávamos para mandar Nico e o cajado atrás de vocês!

— Finalmente chegaram, mas que droga! Pensamos que tinham sido pegos- Nico falou se levantando de um colchão que estava jogado no chão.

— Porque demoraram tanto?

Eles se entreolharam e Chase soube o que responder.

— Porque Wilder, a fila do caixa estava imensa.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.