Garota Cafeína

Primeiro dia de aula


Percebi a boca dela mexendo, mas demorei um tempinho pra entender o que ela tinha dito.

– O brinquedo parou?

Olhei em volta e depois para a moça do brinquedo, ela fez um sinal com a mão insinuando que aquilo já era do brinquedo. Surpreendentemente o brinquedo começou à se mover lentamente e depois parou de cabeça para baixo.

– Gostou das minhas botas? - Ela perguntou. Percebi que todos olhavam pra gente e aquilo me angustiava.

– Você é louca. - Disse rindo.

– Eu gosto disso. - Ela riu também e o brinquedo voltou a funcionar. De repente parou e a moça disse que nosso tempo acabou.

Desci do brinquedo meio tonto. Ficamos um pouco mais de três horas no parque. Quando olhei o relógio eram 20:53 h.

– Eu tenho que ir...

– Ah, tudo bem, vamos. - Ela disse sorrindo.

No meio do caminho de volta para casa passamos na locadora e peguei seis filmes. Deixei Clarissa em casa e fui direto para a minha.

– Mãe? Tá acordada? - Perguntei enquanto limpava os pés e entrava em casa.

– Claro. Achei que iria esquecer os filmes. - Ela prendia o cabelo em um rabo de cavalo.

– Nunca.

Assistimos 4 filmes que acabaram às 4:00 da manhã. Dormimos no sofá mesmo. Quando acordei minhas costas doíam, só então reparei que estava no sofá. Peguei o celular pra ver que horas eram. 13:02 h.

– Mãe. - Sussurrei. - Acorda. Daqui à pouco meu pai chega do trabalho e o almoço nem tá pronto. - Não adiantou. Ela não acordou.

Cobri ela e pensei que precisava de ajuda para fazer o almoço. Liguei para Clarissa e ela chegou em cinco minutos me dizendo que iríamos fazer salada e frango. Peguei o frango no congelador e botei para descongelar no microondas. Enquanto o frango descongelava, íamos fazendo o tempero. Tiramos o frango do microondas, recheamos e temperamos pra depois assar.

Já com o frango assando, Clarissa começou à cortar tomate para fazer a salada.

– Amanhã começa às aulas hein? - Ela puxou assunto.

– É...acabou a folga. - Nós dois rimos.

Quando meu pai chegou, todo o almoço já estava pronto em cima da mesa e minha mãe tinha acabado de acordar. Deu um beijo no marido e os dois vieram pra cozinha juntos sentindo o cheiro da comida. Quando entraram na cozinha eu estava segurando um pote e Clarissa botando a salada dentro do pote.

– Oi, senhor Clóvis e senhora Marilyn. - Clarissa cumprimentou.

– Oi pai, oi mãe. - Botei a salada na mesa.

– Pode nos chamar de tio e tia, Clarissa, que isso! - Meu pai disse enquanto botava a mala no chão e minha mãe sorriu.

Sentamos todos à mesa e minha mãe agradeceu por termos feito o almoço. A campainha tocou.

– Quem será à essa hora? - Meu pai desconfiou.

– Deixa que eu atendo pra vocês. - Me levantei e atravessei a sala indo até a porta de entrada.

– Oi. - Sofie disse enquanto abria a porta.

– Sofie? O que você está fazendo aqui?

– Eu vim me desculpar por ontem. - Ela me abraçou e retribui o abraço.

– Entra. - Abri um pouco mais a porta.

– Perdoe-me a hora que venho. - Ela parou atrás de mim.

– Nada, estamos almoçando. Junte-se a nós. - Fechei a porta e a guiei até a cozinha.

Ela e Clarissa se encararam por alguns minutos e ela me olhou. Seu olhar aparentava que estava aflita.

– Olá. - Minha mãe se levantou e deu um beijo no cabelo dela. - Eu sou Marilyn, a mãe do Jonna. Esse é o pai, Clóvis. E essa é a Clarissa, a amiga do Jonna. - Ela tratou de apresentar e deu uma cadeira pra Sofie que ficava bem ao lado de Clarissa.

Pedi para ficar no meio das duas e meu pai riu.

Depois do jantar Clarissa foi para casa e eu fui para casa de Sofie. Quando chegamos lá ela fez um pequeno interrogatório.

– Por que você ta andando tanto com ela?

– Que foi? Tá com ciúme? - Provoquei.

– Tô. - Ela me surpreendeu. - O que ela tem que eu não tenho? Já sei. É o cabelo pintado? Ou será que é a rebeldia? - Ela ficou me pressionando.

– Você tá é louquinha, que nem ela. - Eu falei rindo e ela me empurrou na parede sem deixar eu sair.

– Amanhã começa às aulas, você vai me deixar sozinha de novo? - Ela perguntou em tom de desafio.

– Que cheirosa, esse perfume é seu? - Botei o nariz no pescoço dela e ela ficou vermelha. Isso foi engraçado. - Preciso me perfumar mais.

***

Meu primeiro dia de aula. Busquei Sofie e fui junto com ela à escola. Quando chegamos lá, todos olhavam para nós. Não sei se era por causa da doença ou pelo motivo d'eu ser novato.

Entramos na sala e ela sentou longe de mim. Olhei para frente e vi Clarissa acenando para mim. Acenei de volta. O professor entrou na classe e todos ficaram em silêncio. O professor pediu para que os alunos novos levantassem. Era eu, dois garotos e duas garotas. Tinham a mesma idade que a minha, o nome deles não me lembro, estava muito ocupado encarando Clarissa. Eu gostava da loucura dela. Quando olhei pra Sofie ela estava de cabeça baixa. Uma das meninas novas sentou ao lado dela. E as ouvi conversando. No recreio Clarissa me puxou na sua mesa.

– Está indo aonde, novato? - Ela estava acompanhada de dois garotos.

– Procurar Sofie.

– Ah, fala sério, para de colar com aquela garota, ela irrita. - Clarissa botou os pés em cima da mesa e puxou a cadeira insinuando que eu sentasse.

– Eu não acho. Venha cá que preciso falar com você. - Ela levantou uma sobrancelha. - Sozinha.

Ela tirou os pés da mesa, arrastou a cadeira e veio até mim.

– Desembucha.

– A escola toda sabe sobre...? Você sabe!

– Oh. - Ela fez uma expressão de surpresa irônica. - Agora são amigos o suficiente pra ela te contar?

– Acho que...

– Não filhote, - Ela bagunçou o meu cabelo. - eu estava brincando com você na calçada. Ninguém da escola sabe. Só eu mesmo.

– Como?

– Longa história!

– Eu tenho tempo. - Usei um tom desafiador.

– Mas eu não, tchau. - Ela saiu e acenou com a mão sem olhar pra mim.

Nesse momento alguém esbarrou em mim e caí no chão. A pessoa caiu em cima de mim.

– Desculpa. - Era a novata. - Mil desculpas, mesmo.

– Sem problemas. - Me levantei. Pelo ombro da garota vi que Clarissa ria. - Qual seu nome mesmo?

– Isabella. - Ela pareceu pensar. - Isa!

– Ok Isa, eu sou Jonna.

– Eu sei. - Ela riu. - Você disse na sala. - Fiquei vermelho. Ela prestou atenção no meu nome e eu não prestei no dela.

– Onde estava indo?

– Comprar Milk Shake pra mim e pra Sofie. Conhece?

– Sim, minha vizinha. - Comecei a andar com ela na direção da barraca que vendia Milk Shake. Compramos três.

Antes de chegar na mesa eu já tinha bebido o meu inteiro e estava quase na metade do de Sofie. Entreguei o Milk Shake na mão dela e sentamos na mesa. Ela abriu a tampa do Milk Shake e levantou a sobrancelha.

– Que merda.

– O que foi? - Isa olhou para mim e depois para ela.

– Vou ter que ir trocar. Eles só fizeram metade do Milk Shake. - Sofie estava levantando quando segurei o braço dela.

– Fui eu que bebi.

Ela parou um pouco, ficou olhando pra mim e depois fez uma expressão de raiva.

– Então pode ficar. - E bateu com o copo na minha mesa.