Algum tempo se passou desde a chegada de Carole às terras alemãs. Por causa da gravidez, ela somente andava ao redor da casa em St. John; seu coração, porém, ficava tranquilo, pois Maximilliam levava Phillip e Sophie para longas caminhadas em Queen Victoria todos os dias. Seu menino estava aprendendo a ocupar o lugar que lhe era de direito.

Ao cair da tarde, Carole sentava-se em uma poltrona confortável da sala e bordava, uma ocupação que permitia pensar bastante sobre sua condição momentânea.

E, é claro, analisar o caráter de Maximilliam. Apesar de todas as palavras ditas (e até as não ditas), Carole não entendia muito bem o porquê de tanta gentileza. Ela não era sua responsabilidade!

Aqueles olhos verdes eram demasiado intrigantes para ela. E pensar que um dia achara que o compreendia!

O Sr. Ferrars era algo para ser decifrado.

Quando estes pensamentos inoportunos tomavam sua cabeça (afinal, ela era uma viúva grávida, por Deus! Não deveria existir nada mais reprovável na sociedade. Se alguém pudesse ler seus pensamentos, já teria sido expulsa dali), Carole deixava o bordado de lado e lia um livro que deixasse sua mente totalmente absorta.

Em um mês, já tinha lido uma prateleira inteira da pequena biblioteca.

O que lhe dava mais prazer era ver como o relacionamento entre Sophie e Phillip crescia. Os dois tornaram-se grandes companheiros e sempre saíam da casa como se a vida fosse uma grande aventura. Na volta, estavam ofegantes pelo exercício e invariavelmente Sophie trazia uma flor nos cabelos.

Todavia, Carole percebeu que o filho não esquecera a promessa. Se Sophie a insultasse (por qualquer motivo), Phillip franzia o cenho, ia até a menina e arrancava a flor de seus cabelos. Os dois, então, passavam alguns dias sem se falar.

~’~’~

Com a chegada do último mês de gravidez, os pés de Carole ficaram cada vez mais inchados, de forma que ela só podia sentar-se no sofá ou deitar-se em sua cama. As raras caminhadas eram feitas ao redor da sala.

Depois de uma das noites mais frias que passaram por lá, a mulher ganhou uma nova companheira: Sophie pegara um resfriado e necessitava ficar em repouso.

Carole sentou-se em um sofá e a menina ficou deitada em um divã no extremo oposto, suas feições completamente fechadas. Um silêncio inquieto colocou-se sobre elas.

Enquanto bordava, Carole tentava conversar com a menina:

- Que tempo adverso, Sophie!

- Você tem muitas bonecas?

- Esse vestidinho é muito lindo. De onde vem?

Ao passo que a menina somente a ignorava e fingia estar dormindo. Dando de ombros, Carole continuava a bordar. Logo os pensamentos inoportunos chegaram, então ela escolheu um livro e passou a meditar em silêncio.

- É de meu pai?

A outra levou um susto ao ouvir a voz da menina, que estava carregada de mágoa.

- Desculpe-me, querida, não ouvi sua pergunta.

- Este bebê, Sra. Smith... É de meu pai?

O coração de Carole bateu muitíssimo forte no peito. Controlando toda a raiva que sentiu daquela pergunta absurda, colocou um sorriso no rosto e respondeu:

- Não, querida. O bebê é irmãozinho de Phillip e, portanto, filho do Sr. Smith.

Silêncio.

- Não há nenhuma chance de ser meu irmãozinho?

Carole olhou para a menina, mas o rosto desta estava virado para o outro lado. Respirando fundo e fechando os olhos, finalmente acrescentou:

- Nenhuma. Não vejo seu pai há mais de 10 anos.

- Mas... – A voz da menina era quase um sussurro. – Se vocês se amassem muito, talvez o Senhor a abençoasse com um bebê, Sra. Smith.

Carole sorriu aliviada. Claro que Sophie não entendia o modo como os bebês eram concebidos! A pergunta fazia todo o sentido agora. Deixando a raiva se dissipar, ela respondeu calmamente:

- Eu amo o Sr. Smith, Sophie. – Não era apaixonada por ele, Carole lembrou, mas o admirava muito. Era um pai exemplar e um marido muito bom. Ainda sentia muita falta dele.

A menina calou-se por mais algum tempo.

- Papai deve ter se apaixonado por você por causa dos livros.

Carole franziu o cenho.

- Do que está falando, querida?

Um suspiro resignado soou no cômodo.

- Mamãe e ele sempre brigavam, pois papai preferia ler a passar muito tempo com ela. – Sophie levantou-se e um orgulho pulsava em seus olhos. – Minha mãe era uma dama, Sra. Smith, e entendia tudo sobre vestidos, bailes e etiqueta.

Carole assentiu, a comoção tomando-lhe o peito.

- Sophie, venha cá. – Deu uma palmadinha no sofá. A menina sentou-se desconfiada. – O que a faz pensar que seu pai me ama?

Uma lágrima escorreu do rosto de Sophie.

- Mamãe disse quando... quando...

- Entendo. – Carole tomou-lhe uma das mãos e prosseguiu: - E quem disse isso a sua mamãe? O Sr. Ferrars já havia saído da Inglaterra há muito quando se casou.

- Vovó Ferrars, Sra.

- Quando as pessoas vão para os braços do Senhor, querida, às vezes dizem coisas em que acreditam, mas que podem não ser verdade. Seu papai poderia ter escolhido outra moça, Sophie, mas escolheu sua mãe. Ele ainda a ama, mas do jeito dele. Nunca duvide disso.

A menina continuou olhando para as próprias mãos por algum tempo.

- Sabe, Sra. Smith, você não é uma bruxa ou... – A menina cobriu a boca quando o palavrão veio à sua mente. – Não vou repetir aquela palavra feia, Phillip não gosta. – Carole sorriu ao ver o quanto Sophie respeitava seu filho. – A Sra. é uma mulher muito boa. Obrigada por conversar comigo. - Ruborizando, a menina correu.

Enquanto a observava desaparecer no corredor, Carole finalmente respirou aliviada.

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Estavam os quatro reunidos na mesa de jantar quando Sophie decidiu falar:

- Papai, se algum dia o Sr. amar e quiser se casar com a Sra. Smith, dar-lhe-ei todo o apoio do mundo.

Phillip, Carole e Maximilliam prontamente engasgaram.