Fragilidade violenta.

VIII- Trato de confidencialidade.


“Você nasce com uma alma gêmea destinada. Porém, essa alma gêmea pode não estar no mesmo mundo que você.

Às vezes o Destino ajuda. Às vezes não.

Hoje em dia o Destino anda meio ocupado demais pra ajudar. Mas antigamente ele era determinado, bem determinado.

E foi assim que os pais de Luna se encontraram, o Destino deu um empurrãozinho e acabou por misturar dois mundos distintos.

Destino é o ser mais poderoso que existe. É como um Deus: Alguns acreditam em vários possíveis, outros em só um, e até que ele nem sequer exista.

Talvez o Destino seja Deus, já parou pra pensar?

Sua mãe era uma elfa radiante e a melhor artesã que esse mundo já viu. Seu pai um viking destemido e respeitado por todos, eram perfeitos um para o outro de um jeito que ninguém imaginava ou esperava. Um feito para “equilibrar” o outro. Esse Destino é mesmo um cara esperto.

Mas ele se esqueceu que isso faria uma coisa meio estranha acontecer. Os mundos se misturariam e isso não podia rolar.

Isso não estava no destino – com letra minúscula.

E então eles juntaram alguns humanos aos elfos e criaram uma nova raça mista, em um mundo escondido por uma barreira/portal.

Mas essa barreira/portal era mantida por magos, anciões, e estava enfraquecendo. Ela enfraqueceu até se tornar visível para os humanos e eles tiveram a audácia de invadi-la, o que o Destino não gostou. Então tratou de criar alguém forte o bastante para sustentar aquilo e com as bênçãos de uma Deusa muito poderosa conseguiu.

Mas agora a maior Obra-do-destino não estava lá. Os humanos a tinham levado.

Destino está furioso, Destino a quer de volta.

Mas Destino se esqueceu que ele mesmo prometera unir sua Obra à alguém que a completasse. E a Obra dele tinha um destino reservado com alguém, e Destino terá que dar um jeito de unir os dois destinos dela sem afetar as promessas e compromissos que fizera com a Deusa da Lua.

Essa foi a última mensagem mandada à Luna Skallagrimm.

– Com carisma, Destino.”

Então aquele branco cessou e eu cai de joelhos no chão. Ler mensagens do Destino me deixava muito fraca, e eu não esperava por isso. Eu só queria mostrar a história de papai e mamãe para o Luke entender, e agora ele sabe demais.

Mas eu não entendi muito bem o que a mensagem quis dizer e eu só tive outra daquelas quando tinha quatro anos, e eu nunca entendi esse tal de Destino, aliás. Nem o que ele queria dizer com “obra-do-destino” e toda essa enrolação. Mas sempre que eu perguntava minha mãe dizia que era só uma bobeira e eu me preocupava com coisas muito tolas, mas acho que não eram tãããão tolas assim.

Olhei para Luke e ele estava parado como uma estátua, humanos são tão lerdos. Logo ele me fitou de canto de olho como se eu fosse um ser muito sobrenatural e se sentou na cadeira de novo, fechando os olhos e falando alguns palavrões que eu não dava muita importância, embora fossem engraçadas essas reações.

— Tá. Tá bom. Eu entendi. Não. Eu não entendi. Puta. Que. Me. Pariu. – Ele passava as mãos nos cabelos de uma forma estabanada e inconformada, me fazendo soltar alguns risos. – Isso é engraçado pra você? Pois saiba que pra mim não é, sua idiota. Por que não disse antes? Cara, que porras é Destino com maiúscula e qual a diferença dele com “destino” com minúscula?

— Não faço a menor idéia. – Falei dando de ombros e me levantando, depois me apoiei na cama e deitei. – Agora, cala a boca que eu tô morrendo de dor de cabeça, por favor. – Eu coloquei a mão nos olhos, e eu estava mesmo. Aquilo arrancava qualquer energia que eu tivesse no corpo.

— Você tá me mandando calar a boca? – Ele se levando e ficou na minha frente, me olhando furioso. – COMO ASSIM NÃO FAZ IDEIA? VOCÊ ME MOSTRA UMAS BAGAÇA LOUCA DESSAS E NEM SABE A RESPOSTA? EU NÃO VOU CALAR A ... – Eu o interrompi com a voz mais maligna que eu tinha.

—Se não ficar calado eu vou fazer você perder a sua voz por cem anos, e acho que isso é bastante pra um humano. – Eu o vi engolir em seco e voltou para a poltrona, e então eu fechei os olhos novamente.

— Isso é demais pro meu cérebro aguentar, desculpa. – Ele sussurrou, e eu apenas sorri. Sabia que aquilo era coisa demais pra uma mente humana e limitada. – Só uma pergunta: Se eu vender essa informação pro governo ou pra alguém da internet eu vou ganhar quanto, mais ou menos?

— Deles eu não sei. Mas da minha parte, você quem vai pagar, e com isso que você tem no meio das pernas. – Eu abri os olhos e olhei pra ele, que tinha um sorriso malicioso. – E além de arrancar, eu faço você comer. – A expressão de divertimento dele em um segundo passou para uma de pavor, o que me fez rir e voltar a fechar os olhos.

E sem eu perceber, adormeci.

~~~~*~~~~*~~

— Não sei se vai funcionar, mas minha mãe me dá isso pra beber quando tô com dor de cabeça. – Luke me estendeu um comprimido e um copo de água gelada.

Eu estava muito fraca e mal conseguia ficar em pé, aquela mensagem tinha sido muito longa e todos os meus sentidos tinham se atrapalhado. Tenho quase certeza que meu tato tinha ido pro olfato, e meu paladar para a visão. Estranho? Muito. Mas já tinha acontecido uma vez e é bem mais estranho do que você um dia vai conseguir imaginar.

Eu peguei o remédio e enfiei na garganta, bebendo o copo de água de uma vez e em menos de 2 segundos. Olhei para Luke por um momento e o vi escorado no balcão da parte de dentro da cozinha, lendo a bula de algum remédio e me olhando de vez em quando.

— Esse aqui é alívio corporal, são cinco gotas. – Vi que ele pegou uma colher e pingou o líquido (que era um rosa chiclete) na mesma. – Luna, pode vir aqui?

Eu me levantei meio atordoada e caminhei até ele, e ficamos um de frente para o outro – dessa vez eu apoiada no balcão e ele bem à frente, com a tal colher na mão –, e pra falar a verdade, aquele garoto era lindo com aquela expressão de preocupação.

—Isso deve ter gosto de pônei. – Comentei enquanto olhava aquela gosma cor-de-rosa.

— Então diga “aaah” e me fala se tem gosto de pônei, por que eu aposto que tem gosto de fada. – Ele riu de canto e eu revirei os olhos abrindo a boca. Aquilo era doce demais, mais doce do que a seiva das arvores mais doces.

— Urgh, tem gosto de carne de pônei morto por urubus há três dias. – Eu o vi rindo e colocando a colher no balcão atrás de mim. – Que gosto horrível que fica na boca, caralho! – Eu fiz algumas caretas e estava tão entretida em tirar aquele sabor asqueroso que não percebi o quanto ele estava perto.

Quando percebi nossos narizes já estavam praticamente se tocando e os olhos de Luke estavam semi-serrados. Suspirei quando senti o olhar dele nos meus lábios e sua respiração tão fora do normal, caramba, como ele ficava sexy de perto. Eu queria me afastar para não fazer nenhuma besteira, mas minha fraqueza só me fazia querer uma coisa: ficar sentindo aquele assopro quentinho que saia das narinas e boca daquele ser. Era reconfortante, por mais estranho que possa parecer.

— Imagino que o gosto deve ser bem ruim... – Sua voz rouca me fez ter arrepios e suspirar, e então eu fechei os olhos. Eu sabia o que ele queria fazer, mas nem sequer colocou a mão na minha cintura. Só se mantinha muito, muito próximo.

Eu estava quase encostando nossos lábios de uma vez quando ouvimos barulhos agudos de passos, o que fez com que nos afastássemos bruscamente (e por incrível que pareça, meus reflexos tinham voltado em força total naquele momento).

— Luke, Luke, Luke! – Uma voz fina e doce ecoou pela cozinha, deveria ser a irmã dele. – A mamãe trouxe sorvete! – A vi entrar e dizer empolgada e pulando, até que me viu e mudou a expressão para uma curiosa. – Essa moça é sua namorada, Luke? – Eu arregalei os olhos e não resisti de soltar uma gargalhada, fazendo com que a menina me olhasse surpresa. Mas antes que o moreno respondesse, ouvimos outra voz, agora uma pouco mais adulta.

— Merry, isso é jeito de falar? Vai deixar a garota envergonhada. – Eu corei ao ver a mulher que dessa vez chegara ao lugar. Era alta, morena e tinha olhos azuis lindos, que me olhavam de uma maneira maliciosa. – Hm, ela é linda mesmo filho, meus parabéns!

— Ela não é minha namorada, porra! – Ele se alterou e estava vermelho também, o que me fez rir. – Ela é a Luna, a menina que eu falei, mãe. – Ele me olhou, e eu pude ler a frustração em sua face, que me fez abaixar a cabeça.

— Uh, a mocinha que chegou da Islândia... – Ela bateu as mãos uma vez como forma de espanto, e depois me abriu um sorriso. – Bom, vou deixar vocês em paz, Merry e eu vamos tirar as compras do carro. – Ela saiu e passou a mão nos meus ombros, me fazendo sorrir.

Encarei Luke e ele me olhava com aquele famoso sorriso tão... Tão... Tão Luke.

— Tenho que ir pra casa, obrigado por hoje. – Falei enquanto me aproximava para me despedir. – Espero que a gente tenha um trato de confidencialidade, senhor.

— Claro que temos, minha senhorita. – Ele fez uma reverencia, e depois me olhou de uma forma divertida. – Sem contar que eu gosto do meu Luke Jr., sabe.

Eu ri, sussurrei um “tchal” e sai o mais rápido que minhas pernas bambas conseguiram. Nunca se sabe o que vai acontecer quando se fica demais perto daquele garoto.