Flor do deserto

Capítulo 32- Pistas na neve


Emanuelle se deitara na cama, estava envolta em grossos e quentes lençóis, mas não conseguia dormir. Mary se aproximou, sentando-se na cama. Ela viu que a jovem estava acordada,e comentou:

—Manu, eu soube que alguns corais vão se apresentar numa praça aqui perto. O que você acha de irmos ver?

A jovem baixou a vista. Ela não disse nada. Mary insistiu com a jovem:

—Vamos querida, vai ser bom para você. Sair um pouco do apartamento, ocupar sua cabecinha com algo.

— A última vez que eu saí pensando assim, acabei com um colega morto em frente à minha casa.

Mary se levantou e abaixou-se ao lado da cama, ficando perto do rosto da jovem.

—Você não pode deixar de aproveitar as pequenas coisas boas que a vida nós dá, por medo que as coisas ruins que aconteceram se repitam.

— Porque você está insistindo tanto em levantar meu ânimo?

— Porque eu prometi a um certo detetive, que também é meu amigo, que cuidaria de você.

Emanuelle olhou para o teto. Estava cansada de tudo, de sentir-se assim. Pensou o viu que Mary tinha razão. Ficar embrulhada em casa não resolveria nada. Ela mesmo sabia, pois se trancou em casa e nada melhorou por causa disso, resolveu então aceitar o convite e ir com a sra Watson ver o Natal de Londres. Lembrou-se que prometera a si mesma que não deixaria de ver o espetáculo do Natal inglês. Emanuelle sentou-se na cama, e comunicou à mulher que aceitaria sair.

***

Watson e Sherlock pararam numa lanchonete para jantar. John estava faminto e obrigou o detetive a parar. O médico pediu uma sopa quente com algumas torradas. Sherlock ao sentir o cheiro da sopa também quis uma. Watson olhou espantado para o amigo, perguntando enquanto devorava uma torrada:

— Você está com fome?

— A sopa está cheirando muito bem.

— Mas você nunca come. Você está mudando mesmo.

— Como assim “mesmo”?

— Sabe do que eu estou falando -disse, ameaçando o detetive com um pedaço de torrada. Sherlock suspirou e comentou da maneira mais fria possível:

— Até parece que eu cometi um crime pelo jeito que vocês estão me condenando.

— Eu não estou lhe condenando, seja qual foi o motivo que você foi flagrado -Sherlock olhou de banda para John, desconfiado- eu só espero que nessa história você não acabe magoando a pobre moça...e de alguma forma acabe saindo machucado também.

A conversa foi interrompida pelo garçom, que trouxe a sopa que o detetive pediu. Sherlock se alimentou em silêncio. Watson entendeu que ele não queria falar mais sobre isso. Então ambos fizeram suas refeições em silêncio. O barulho do celular de John tocando o tomou de surpresa. Era Mary, avisando que iria sair com Emanuelle para uma apresentação natalina.

***

Pequenos flocos de neve caíam do céu aquela noite. Não estava nevando muito, o que abrilhantou decoração do teatro à céu aberto do Regent’s Park. Naquela noite estava programada a apresentação de orquestras e coros natalinos. Mary, Emanuelle e a pequena Rosie estavam bem agasalhadas para a ocasião. Elas foram à pé, não era muito longe. Naquela noite congelante, a pista estava escorregadia, e muitos táxis se recolheram ao posto para colocar correntes nas rodas, evitando colisões. Estaria muito difícil pegar um táxi. Entretanto, Emanuelle preferiu assim. Arejar a mente enquanto andava, como também admirar a decoração das lojas e das casas. Estava tudo harmonicamente belo e suave. Ao chegarem no teatro, elas se sentaram na fileira do meio, nem muito distante nem muito perto do palco. Logo a apresentação começou.Alguns flocos de neve caindo sobre todos, foi o detalhe que faltava para tornar aquele momento perfeito. A orquestra fez uma bela introdução, dando tempo para a entrada dos componentes do coro. O maestro fez sinal, e as vozes, cuidadosamente treinadas ressoavam os cânticos natalinos. Cada instrumento fora afinado precisamente, não se ouvia uma nota fora do lugar. Música após música, a jovem era sensibilizada e sentia um imenso prazer em estar ali. Todas a músicas eram carregadas de uma mensagem de paz e esperança, fazendo a jovem refletir e suspirar, sentiu a alma leve. Ela estava grata por Mary tê-la arrancado daquele apartamento; ela iria perder tudo aquilo. Ao término, todos aplaudiram de pé por um longo tempo. O maestro agradeceu ao público, e logo em seguida todo o coro.

As duas fizeram a caminhada para casa sem pressa. Elas passeavam pelo Regent’s Park, cruzando com algumas pessoas no caminho. A neve tinha cobrido todo o chão, fazendo com que a imensidão verde do bosque e da grama, ficassem alvos e reluzentes à noite. Emanuelle estava com as mãos no bolso do grosso casaco. Ela sorria, olhando para os seus próprios pés enquanto andava, reflexiva. Seja qual foi o motivo que a levou a sorrir, Mary ficou feliz de vê-la assim.

Quando elas estavam perto da saída do parque, as duas sentiram um cheiro estranho. Emanuelle comentou, de forma cômica:

— Ah, Mary, por acaso você precisa ir no banheiro descarregar alguma coisa?

— Não entendi.

— Você soltou gases?

— Quem, eu? -Mary riu- eu não. Mas até que eu estou sentindo um cheiro estranho também.

A sra Watson, desconfiada, suspendeu a pequena Rosie à sua frente, fazendo o odor triplicar.

—Ah, nossa! Minha filhinha, eu não me lembro de ter lhe dado carne podre para comer, só leite -disse Mary.

Emanuelle aproximou o nariz do bebê, fazendo uma careta, e se afastando rapidamente.

—É...acho que ela está bem suja -comentou Emanuelle, coçando o Nariz- eu acho que vi um banheiro alguns metros atrás, lá deve ter fraldário também.

— Tem sim, eu vi -disse Mary, já se afastando da moça, indo em direção do banheiro.

— Você que que eu lhe ajude em algo?

— Não, obrigada -disse sem se virar para trás- eu cuido disso.

— Certo! Estarei sentada aqui esperando!

Havia um banco de madeira perto da jovem, ela sentou-se para esperar a troca de fraldas. Enquanto esperava, a jovem fechou olhou para cima, para o céu. Estava vendo os flocos de neve caírem. Ela retirou a touca, fechou os olhos ainda com o rosto virado para o céu, e deixou a neve cair sobre seus cabelos e seu rosto, ficando um tempo assim. A jovem abriu os olhos assustada e teve um pequeno sobressalto com uma voz masculina e rouca que surgiu ao seu lado. Ela viu que era um senhor de idade, usando uma bengala de madeira, um grosso casaco, e uma boina italiana. O homem falou:

— Desculpe tê-la assustado minha jovem, eu só queria saber se o lugar está vago.

— Sem problemas, está vago sim, pode sentar.

Emanuelle escorregou um pouco para a ponta do banco, deixando espaço para o homem sentar-se. Ele o fez lentamente, reclamando das costas, atribuindo a dor à idade. Algo na mão do homem chamou a atenção de Emanuelle. Ele segurava uma rosa de um vermelho muito vivo, criando um belo contraste com a neve branca.

— É uma bela noite não é? -disse o homem. A jovem balançou a cabeça positivamente- e foi um belo show.

— O senhor viu a apresentação?

— Vi sim, com certeza, e ouvi também. Belíssimo, como sempre.

— É a segunda vez que o senhor assiste?

— Não, muito mais que isso. Eu todo ano venho com minha senhora, e gostamos muito. Eles tocam muito bem -o rosto do homem ficou triste- pena que ela não pôde vê-los esse ano.

— Porque não?

— Ela está hospitalizada.

— Ah, sinto muito. O que houve com ela?

— Ela está em tratamento um câncer. Ela ama essas rosas vermelhas, sabia? Elas tem um cheiro maravilhoso -disse, mostrando a rosa para a jovem- Todo ano após a apresentação, eu comprava uma rosa para ela -o homem baixou a cabeça, triste- mas ela não está aqui para que eu possa fazer isso.

— É uma pena senhor -disse a jovem, se aproximando um pouco do homem, colocando a mão em seu ombro- mas se eu aprendi algo hoje à noite, é que devemos ter esperança. Tenha esperança que ela vai melhorar.

O homem balançou a cabeça, reflexivo. Levantou-se então, apoiando-se na bengala, e disse:

— Tem razão! Vou voltar para o hospital agora mesmo!

— Boa sorte para o senhor e sua esposa.

O homem agradeceu com uma saudação típico dos cavaleiros britânicos. Ao se endireitar, ele olhou para a rosa, olhou para a moça, e olhou para a flor de novo. Ele disse, estendendo a rosa para a jovem:

— Tome, em agradecimento por suas palavras encorajadoras.

— Ora, obrigada -a jovem disse, esboçando um sorriso tímido e pegando a flor da mão do homem.

— Acredito que você vai adorar o cheiro dela.

Emanuelle aproximou a rosa do nariz, cheirando longa e profundamente a flor. Entretanto, a jovem não sentiu um cheiro doce, que era o de se esperar, mas sim um cheiro muito forte, que desceu por sua garganta, deixando-a zonza instantaneamente. Sua vista escurecia. Ela sentiu suas pernas e braços formigarem. Emanuelle pendeu para frente, caindo de cara na neve. Antes que perdesse a consciência, ela ouviu o homem de idade comentar:

— Me desculpe Emanuelle, não é nada pessoal. Eles ameaçaram minha esposa, disseram que como eu era um dos cinco, tinha a obrigação de te denunciar. Sinto muito.

Antes de perder a consciência, viu uma sombra de um homem surgir ao lado do idoso, passando por ele e se curvando para ela. Depois disso, adormeceu.

***

Sherlock estava sentado em sua poltrona perto da lareira. Ele dedilhava o violino, seus olhos fechados. Então ele começou a tocar notas soltas e repetitivas, mas ecoavam no ambiente como se fora um clássico dos antigos. Era como um exercício mental. Sua mente fervilhava, repassando os achados das últimas horas. A fuga dos terroristas para o sul do país, a prisão e o silêncio de alguns deles, as pesadas caixas que os mendigos acharam suspeitas, a dosagem de urânio. Sherlock sentia que estava deixando algo passar, mas não sabia o que era. As notas no violino ficavam cada vez mais agressivas quando em sua mente ele repassava tudo mas não tinha respostas. Estava andando em círculos. Ele soltou o violino e sentou-se no chão, em posição de meditação, de costas para lareira. Em sua mente ele voltou para a fábrica. Estava no outro galpão, onde ele achara o sangue impregnado no chão. Ele olhava ao redor, a escuridão não o deixava ver as paredes. Ao levantar os olhos, havia uma projeção à sua frente do documento que ele queimou. Ele prestou atenção na tabela. Já tinha concluído que eles pretendiam explodir o país inteiro. Mas sem a quantidade certa de urânio, isso não seria possível. Os únicos que sabiam da tabela era ele e Emanuelle. “Emanuelle…” pensou o detetive. A lembrança da noite passada o assaltou, fazendo-o se lembrar de como foi tê-la nos braços, como foi tê-la tão próximo, o sabor do beijo da jovem. Sherlock sacudiu a cabeça, queria afastar essas lembranças, precisava se concentrar. Ele tinha que descobrir um meio de rastrear para onde os fugitivos foram. O detetive estava de pé, quando um clarão do meio do galpão chamou-lhe a atenção. Ele olhou para cima, e viu uma forma humana flutuar do chão. Ela brilhava, como se fosse feita de luz neon. Ela passeava por todo o teto da estrutura, como se sondasse todo o ambiente. Ao passar por cima de Holmes, a forma humana foi perdendo altura lentamente. Ela desceu, se colocando à frente do detetive. Ele reconheceu quem era, fazendo seu coração saltar no peito. Era Emanuelle. Ela estava vestida com um fato branco, típico das princesas do egito antigo. Os penduricalhos e a maquiagem egípcia que ela estava usando, fizeram sua beleza triplicar diante de Holmes. A jovem estava reluzente, como se emanasse algum tipo de radioatividade. Holmes deu dois passos para trás. A jovem riu para ele.

— Está com medo de mim Sherlock? -perguntou.

— Você precisa ir embora. Está me atrapalhando.

— O que você busca?

— Respostas.

A reluzente moça riu, e foi em direção ao detetive. Sherlock permaneceu parado no mesmo lugar. A moça passou sua mão por detrás do pescoço dele, e disse em seu ouvido: “eu sou a resposta que você procura”. Ela recuou a cabeça, ficando bem próximo do rosto dele. Sherlock olhava para ela confuso, apertando os olhos, tentando entender a mensagem. Ela então aproximou a cabeça, o beijando. Ela parou, o soltou e andava para trás.

— Me ache -disse, enquanto se afastava.

— Onde vou achar você Emanuelle?

— Não estou falando de mim -o detetive estreitou o cenho- Ache a fonte do meu brilho. Eu sou a resposta que você procura.

À medida que ela se afastava, ela brilhava cada vez mais e sua voz ficava cada vez mais alta e potente, ela repetia a frase. De repente a luz emanou dela muito forte, preenchendo todo o ambiente e de tal forma que o detetive não conseguia abrir os olhos, sendo em seguida derrubado ao chão.

Sherlock abriu os olhos. Estava novamente na sua sala, sentado no chão. Ele levantou-se do chão, e andou de um lado para o outro. Tentava entender o recado de seu subconsciente. Holmes então ouviu alguém subindo as escadas muito rápido. Watson abriu a porta do apartamento esbaforido. Ele estava no andar de baixo tomando chá com a sra Hudson. Controlando a respiração, John falou com urgência:

— Emanuelle sumiu!!

***

Mary se encontrou com John e Sherlock na entrada do parque. Então ela os levou ao ponto onde deixara Emanuelle esperando, enquanto ela ia ao banheiro. A neve tinha parado de cair, e aos poucos as nuvens se dissiparam, deixando a lua à amostra. Sherlock sondava aquele posto do caminho, vasculhava o chão em busca de qualquer evidência. Até que um volume vermelho em contraste com a neve branca chamou sua atenção. Debaixo de um banco, próximo ao ponto que Mary indicou, havia uma rosa vermelha, e do lado, um pouco coberto pela neve, estava a touca que a jovem estava usando. Sherlock analisou os dois objetos. Ele aproximou o nariz da rosa, reconhecendo o cheiro. A flor estava embebida em clorofórmio. O detetive olhou para o chão perto do banco. Procurava por pegadas. Ele achou três pares parados junto ao banco. Depois dois seguiram lado a lado, enquanto o outro seguiu em sentido oposto. Sherlock seguiu os dois pares, e viu que eles entravam no bosque, saindo da estrada. Holmes se virou para Watson e Mary, que iam atrás dele, e disse:

— Mary, vá com Rosie para meu apartamento e chame a polícia. Emanuelle foi sequestrada, mas ela ainda está aqui no parque -Mary concordou com a cabeça e caminhou para fora do lugar o mais rápido possível.

Sherlock saiu da estrada, seguindo os passos que iam para dentro do bosque. Watson o acompanhava. Depois de alguns minutos, Holmes parou e se acocorou no chão. “ O que achou?”, perguntou Watson se abaixando também. O detetive recolheu um frasco de vidro e uma seringa usada que foram propositalmente cobertos pela neve. Ele os mostrou para Watson, que pegou o vidro, leu o nome no frasco e comentou:

— Isso aqui é usada para fazer anestesia raquidiana. Mas, o que isso está fazendo aqui?

— Ela foi anestesiada.

— Como é?

— Veja Watson -disse, levantando-se do chão, mostrando os rastros na neve- essa parte mais afundada na neve é onde colocaram Emanuelle. Ela estava desacordada. Há passos também ao redor. Eles então a viraram de costas, e aplicaram a anestesia na coluna dela.

— Mas porque eles iriam querer paralisar as pernas dela temporariamente?

Sherlock olhava fixo para o chão, então perguntou:

— Você conseguiria nadar sem mexer as pernas?

— Inicialmente sim, mas com o tempo cansaria.

—Conseguiria fazer isso num lago congelado?

—Não.

—Esse parque tem um lago, não tem?

Watson passou a mão pela cabeça. Entendeu o plano.

— Céus, eles vão afogá-la.

— Não se eu puder evitar! corra Watson -disse Sherlock, seguindo as pegadas correndo.

Ao chegar perto do fim da trilha, Holmes parou e fez sinal para que John parasse também. Ele se acocorou, mostrando novos rastros na neve e comentou sussurando para John:

— Está vendo isso agora? Ela acordou e eles passaram a arrastá-la pela neve.

— Porque estamos sussurrando?

— Porque eles estão bem à nossa frente.

Sherlock apontou para um ponto em que as árvores se acabavam, a alguns passos à frente, e logo em seguida o lago podia ser visto. John sacou a arma. Eles caminharam silenciosamente para o ponto que as árvore acabavam. Eles podiam ouvir duas vozes masculinas, pareciam discutir algo em alguma língua que eles não entendiam. Os dois amigos ao verem alguém na margem poucos metros à frente deles, se esconderam atrás de uma árvore caída, bem na beira do lago congelado. Eles viram um homem de pé, carregando um pedaço grande de madeira. Ele seguiu para o centro do lago e bateu algumas vezes no chão, o quebrando. Ele voltou com cuidado para a margem, onde havia outro homem mascarado de pé, com Emanuelle amarrada e amordaçada a seus pés. Sherlock reconheceu o homem mascarado, era o chefe do Hukm Allah. Ao chegar na margem, o homem, com a ajuda do chefe, desamarrou as mãos da moça, tirando também o mordaça. Logo a jovem começou a se sacudir e a gritar “me soltem, socorr…”, mas foi interrompida por um forte tapa dado pelo chefe, fazendo a mulher se calar. Ela não mexia as pernas, somente os braços. Então, um deles a segurou nas pernas e o outro pelos braços. Ela lutava como podia, mas sem sucesso. Eles a estavam carregando para o ponto do gelo quebrado, para a jogarem na água congelante. Sherlock e John então saíram correndo de trás do tronco e abordaram os dois homens à uma distância de seis metros. Watson estava com a arma em punho, apontando-a para ambos. Os dois terroristas estavam à beira do buraco. Os dois soltaram Emanuelle. O chefe se endireitou e, cumprimentou os dois.

—Ora, se não é o senhor Holmes e seu fiel cachorro.

—É senhor Watson, seu cretino!

John se aproximou alguns passos, como também Sherlock. O chefe sacudiu um dos braços, fazendo uma afiada adaga sair de sua manga. Ele puxou Emanuelle pelos cabelos, colocando a adaga no pescoço dela.

—Nem mais um passo vocês dois! Ou vou colorir a neve com o sangue dela.

Sherlock sentiu algo oscilar abaixo dos seus pés. O gelo não estava tão grosso como pensava. Bastava um peso a mais para fazê-lo se partir. Sherlock então teve uma idéia. Ele tomou a arma da mão de Watson, e a apontou para o chefe.

—Você não ouviu? Se afaste! -rosnou o chefe.Sherlock deu dois passos para trás. Ele continuou, fazendo sinal para o outro homem ir em direção ao detetive- entregue a sua arma senhor Holmes -Sherlock permanecia mirando o chefe, enquanto o outro homem ia em sua direção- abaixe a arma agora! -disse o chefe, forçando ainda mais a faca no pescoço da jovem, fazendo um filete de sangue correr por sua pele.

— Tudo bem, tudo bem, pegue -disse o detetive, abaixando a arma e virando o cabo para o ajudante que vinha em sua direção.

Quando o homem estava perto o suficiente ele pegou a arma da mão do detetive, mas este não a soltou. Então, Sherlock pegou impulso e pulou, fazendo força no chão. Estalidos foram ouvidos e logo o gelo se partiu embaixo dos pés dele e do homem. Sherlock saltou para o lado, derrubando a arma para longe e rolou na neve, não caindo na água, ao contrário do terrorista que se debatia, tentando sair do gelo. Holmes levantou-se e viu o chefe fazer um sorriso maníaco. Em seguida ele empurrou a moça para o buraco, fazendo-a cair na água congelante. Sherlock correu em direção ao homem, e gritou para Watson “pegue Emanuelle!”. O chefe e o detetive se atracaram. Holmes estava desarmado e se desviava de cada golpe dado com a afiada adaga. Watson correu e com cuidado se abaixou na margem do buraco. Emanuelle gritava pela dor que a temperatura abaixo de zero causava no seu corpo, Watson estendia a mão para a jovem segurar, mas ao sentir o gelo se partindo abaixo de si, ele recuou e pedaços de gelo se soltaram, aumentando ainda mais a distância. A jovem tentava manter-se na superfície usando só as mãos, mas aos poucos a dor do esforço aumentada pelo frio fazia ela perder as forças e também as esperanças. Watson olhou para o lado e viu o pedaço de madeira que o terrorista usou para abrir o buraco no gelo, então ele correu para buscá-lo. A luta entre Sherlock e o chefe continuava. O detetive em determinado momento acertou um soco certeiro no rosto do homem, fazendo-o cair de joelhos. Quando Sherlock se aproximou, o homem pegou um punhado de neve e acertou nos olhos do detetive. Holmes deu dois passos para trás e, ao tirar a neve dos olhos, viu somente o brilho da afiada faca contra o luar bem perto do seu rosto. Ele desviou-se do golpe, virando-se de lado, mas o chefe era mais rápido. Então, numa rápida troca de mãos, ele feriu as costas do detetive, num corte amplo e profundo. Sherlock caiu para frente, ajoelhado e com os cotovelos na neve, por causa da tamanha dor. A lua estava logo por trás dele. Então, ele viu a sombra do homem se colocando por trás dele, e levantando a adaga para dar um golpe mortal. Sherlock então deu um chute para trás, acertando o estômago do homem. Holmes se virou e socou o rosto do homem, ele deu alguns passos para trás. Então ele o socou de novo, fazendo-o cair ao chão. Sherlock chutou a adaga para longe e começou a socar o rosto do homem. O chefe então retirou do tornozelo uma faquinha e golpeou o rosto do detetive, cortando sua testa. Em seguida ele chutou o rosto de Sherlock, que caiu para trás, com as costas na neve. Ao se levantar ele viu que o chefe estava correndo em direção ao bosque, fugindo. O detetive olhou ao seu redor e acabou por achar a arma de Watson. Ele mirou na sombra que já estava distante e atirou. Um urro de dor foi ouvido. Sherlock acertara no braço do homem, que se ajoelhou na neve. Mas, pelo medo de ser pego, ele se levantou e saiu correndo bosque adentro, sustentando o braço ferido. Conseguiu fugir.

“Sherlock!!” Gritou Watson. Ele tinha acabado de retirar Emanuelle da água, estava a puxando para longe do buraco. Holmes foi em direção à eles. Emanuelle tremia muito e sua fala era entrecortada. “Não mexo as minhas pernas”, dizia ela. Sherlock retirou seu sobretudo, ajoelhou-se ao lado da moça e a envolveu com o casaco, colocando-a no colo. John a examinava e disse preocupado:

—Sherlock, ela precisa ser aquecida se não pode entrar em choque pela hipotermia. Precisamos levá-la para o hospital!

— Não vai dar tempo! -disse levantando-se com a moça nos braços- não tem táxi nas ruas. .

O detetive corria com ela nos braços, com Watson logo atrás.

—Ligue para casa! Peça para a sra Hudson e Mary encherem a banheira com água quente -disse Sherlock.

Os dois amigos corriam com a moça. Logo saíram do parque. Apesar do horário, havia ainda algumas pessoas nas ruas, as quais olhavam com curiosidade para os dois homens. Assim que colocaram os pés na rua Baker, Emanuelle estremeceu no colo do Holmes e perdeu a consciência. Watson ao ver, arregalou os olhos e disse para Sherlock com desespero na voz: “Rápido! Rápido! Ela está morrendo!”. Sherlock estava com os pulmões pegando fogo. Sentia cada músculo do seu corpo doer, seu coração quase saía pela boca. Ele sentia o seu sangue quente correndo pelas suas costas, resultado do corte profundo. Juntando suas forças, ele superou as limitações de seu corpo, e correu pela vida da jovem.

Chegando no prédio, ele correu escadas acima é, chegando no apartamento, ele ajoelhou-se no chão, esbaforido. Mary correu para o detetive, mas ele negou-se a soltá-la é levou-a até o banheiro. A Sra Hudson acabara de colocar a última panela de água quente, enchendo a banheira. O cômodo parecia uma sauna. "Sherlock, suas costas!” Watson comentou, vendo a imensa mancha de sangue que molhou todo o dorso da camisa. Holmes colocou a moça no chão e Mary e a Sra Hudson tiraram o sobretudo que a envolvia por estar ensopado. Holmes tirou a camisa, exibindo um corte feio da metade da costas para cima. Ele pegou um esparadrapo e pediu a Watson que colocasse em cima da ferida, para não sangrar na banheira. Watson cobriu a ferida com uma grossa camada de esparadrapo rapidamente. Então, colocando-a no colo, ele entrou com a jovem na banheira. De imediato ele sentiu o alívio da água quente, mas Emanuelle continuava desacordada. Ela parecia uma criança pequena no colo do detetive. Ele afundou na banheira abraçado a ela, até o ponto que somente o rosto da jovem ficou do lado de fora. Watson estava sentado ao lado de ambos no chão do banheiro, e media a frequência cardíaca da jovem pelo pulso do braço. Aos poucos os batimentos começavam a baixar, estabilizando. A coloração dos lábios e das unhas estava saindo de um roxo azulado para róseo. Ela estava voltando. Watson respirou aliviado ao ver que a moça estava saindo da hipotermia. John se levantou, disse que iria preparar um café bem quente, ela precisaria quando acordasse. Holmes estava sozinho com a jovem. Ele então, aproximando a boca de seu ouvido, falava baixo para a moça enrolada em seus braços: “Manu, volte...por favor, acorde…”. Sherlock repetia isso no ouvido da moça. Dado momento, o detetive sentiu a moça mover-se. Com a voz baixa e trêmula, a jovem disse: “ me deixe morrer. Só deixe…” . O detetive sorriu de alívio, e apertou mais o abraço, comentando em seguida: “Não..não vou deixar. Está segura agora, vai acabar tudo bem”