Flor do deserto

Capítulo 22 - Gherkin


O dia amanheceu chuvoso na grande Londres. O céu estava de um cinza escuro sombrio, e a temperatura beirava os oito graus. Os londrinos passeavam pelas ruas engolidos por quilos de roupas e agasalhos. Muitos deles só estavam com os olhos de fora, com a fumaça da respiração escapando pela boca. As árvores da grande cidade estavam nuas, e somente a madeira era aparente, um prenùncio que o inverno se instalou, e que a chegada da neve estava próxima. De repente começou a chover torrencialmente. Guarda-chuvas surgiram nas ruas, nas suas mais variadas cores. Sherlock observava tudo da janela do escritório de Lestrade, enquanto o inspetor chefe absorvia todas as informações que Sherlock acabara de falar. O detetive relatou o acontecimento da noite anterior na sua casa. Lestrade passava a mão sobre o queixo e, depois de refletir um pouco, perguntou:

— E o que você achou na fábrica?

— Nada concreto ainda.

— Tá, mas de concreto, o que você achou?

Sherlock revirou os olhos, não gostava de dar relatório das suas conclusões quando ainda estavam incompletas. Ela fora para a Scotland Yard não por achar que deveria prestar alguma explicação das investigações a Lestrade. Sherlock resolveu sair de casa aquela manhã por causa do que quase aconteceu naquela noite. Sherlock queria ficar um tempo distante da doutora. Ele queria entender porque não conteve-se diante da jovem. Era como se todos os alarmes do seu cérebro estivessem sido desligados, ao ponto de naquele momento ele não conseguir focar em nada além daquela bela mulher à sua frente. Quando Sherlock se deu conta do que quase houve, ele se assustou com isso. Mas negava que havia sentimentos por ela. Durante toda a noite ele buscou em sua mente por todos os motivos que poderiam deixá-lo desse jeito. Ele criou todas as opções possíveis: desde poeira acumulada no seu apartamento, até algum perfume que Emanuelle estivesse usado, que poderia tê-lo entorpecido. Mas nenhuma delas era concreta o suficiente. Então ele resolveu se afastar. Prometeu a si mesmo que a evitaria o máximo que pudesse, enquanto ele não descobria a causa que o deixara assim. Dessa forma, seja o que fosse, ele estaria se “desintoxicando” do que o estaria fazendo mal.

— Sherlock, o que descobriu? -falou Lestrade, com uma certa irritabilidade na voz

— A fábrica não está tão abandonada assim. Havia uma planta no escritório, ela estava saudável e tinha sido recentemente regada. Lá havia também algumas mesas e cadeiras próximas de tomadas, ambas estavam sem a camada grossa de poeira que cobria as demais. Alguém anda pagando a conta de energia da fábrica, e a usando para algo que ainda vou descobrir.

Lestrade encostou-se na cadeira, pensativo. Ele então, de um sobressalto disse, enquanto se dirigia para a porta:

— Vou emitir um mandato para a quebra de sigilo bancário. Minha equipe vai descobrir quem está pagando as contas.

Sherlock assentiu com a cabeça, em silêncio. Lestrade antes de sair da sala, perguntou a Sherlock:

— Sherlock, quanto à Emanuelle...você não acha melhor colocar ela dentro do plano de proteção à testemunha?

— Porque?

— Bom, eles sabem onde ela mora. Ela naquele apartamento é um alvo fácil.

— Lestrade, se eles quisessem tê-la pego, já teriam feito isso. O objetivo deles é que o povo faça pressão para que vocês a entreguem, o espero que não aconteça. Eles estão fazendo isso para destruir nossa nação, e Emanuelle é o bode expiatório deles. Além disso, chamaria muito a atenção das pessoas ter um policial no 221b. As pessoas iam desconfiar.

— Entendi. É melhor deixar as coisas como estão então. E quanto aos documentos?

— Emanuelle copiou todos para meu computador como eu disse a você, então eu fiz uma cópia para mim também -Sherlock tirou do bolso um Pen Drive, diferente daquele que Said entregara à Emanuelle.

—Ótimo, mas ainda me preocupo com ela. Eles podem querer machucá-la só para nos atingir.

Sherlock voltou seu pensamento para a jovem naquele apartamento. Lestrade tinha razão. Ela poderia ser atacada apenas como uma ofensiva. Ele sentiu vontade de voltar correndo para o 221b, sentiu vontade de ligar para saber como ela estava. Mas conteve-se, repreendeu-se por tais pensamentos. O detetive sentiu seu celular vibrar em seu bolso, e quando viu a tela, sentiu um alívio em seu peito. Era Emanuelle, se ela estava ligando, significava que estava bem. Entretanto, Sherlock não quis atender. Entregou o telefone à Lestrade, comentando: “é para você”. Lestrade atendeu:

— Lestrade na linha.

— Alô? Lestrade? Ah, bom dia, aqui é Emanuelle. Pensei que esse fosse o telefone do Sherlock.

— Não, esse é o número dele mesmo. Ele passou a ligação para mim.

— Mas...enfim, não importa. Era com o senhor mesmo que eu queria falar. Eu queria que o senhor passasse aqui no 221b após o almoço para pegar as fichas traduzidas. Estou terminando de traduzir a primeira pasta, e após o almoço estarei traduzindo a segunda.

— Ótimo! Irei passar aí sim. Olhe, me desculpe, ainda não conseguimos ninguém para traduzir. Acho que todos aqueles que sabem falar fluentemente o idioma estão sob a mira dos terroristas.

— Tudo bem inspetor, a culpa não é sua. Para mim é um prazer ajudar, e estou de castigo em casa por alguns dias mesmo.

— Entendo, eu e minha equipe ficamos agradecidos, e acredito que o Sherlock também -Lestrade olhou para Sherlock, que permanecia calado, observando a conversa.

— Ah sim, o Sherlock…-disse Emanuelle em tom pesaroso- por favor, diga que preciso conversar com ele, e quando ele chegar em casa me procure. Estou no meu apartamento com o computador dele, fazendo as traduções.

— Certo, passarei o recado.

Ambos se despediram e Lestrade desligou o telefone. Sherlock ouviu o recado da jovem, e permaneceu calado. Pegou o celular e o guardou no bolso, ainda em silêncio. Lestrade abriu a porta pretendo sair do escritório, mas deu de cara com Donovan esbaforida, já entrando na sala. Ela não fez caso de Sherlock estar ali, algo realmente urgente estava acontecendo. Ela disse ofegante para os dois homens ali presentes:

— Chefe! Urgente! No Gherkin, precisamos ir para lá agora!

— Calma Donovan -disse Lestrade- o que houve?

— Um rapaz foi feito refém, e está amarrado com várias bombas no saguão do Gherkin.

***

O 30 St Mary Axe, informalmente conhecido como Gherkin, é um dos principais arranha-céus comerciais da cidade de Londres. Com um belo design, esta construção se tornou notável tanto para os turistas, como para os residentes. Mas não naquela manhã, o acesso ao prédio estava fechado. Apenas a polícia passava. Os repórteres se acumulavam do outro lado da fita de isolamento amarela, logo guarda chuvas negros se amontoavam e repórteres vestidos em suas capas de chuva falavam incansavelmente para suas respectivas câmeras.

Ao verem a chegada de Lestrade, Donovan e Sherlock, os jornalistas voaram para cima dos três, alguns policiais tiveram que controlar aquele pessoal, para permitir a entrada dos três para o edifício. Assim que cruzaram a porta de entrada, os três viram uma série de policiais espalhados por todo o saguão, e alguns deles rodeavam um rapaz, a uma certa distância. No meio do saguão havia um jovem ruivo, de aparelhos nos dentes, que devia ter entre seus vinte e vinte e cinco anos. Ele vestia um colete cheio de material explosivo. Havia um celular preso ao colete, de onde saia um fone de ouvido, estando preso à uma das orelhas do rapaz. Não era suficiente para derrubar o prédio, apenas para matá-lo. O jovem tremia e chorava o tempo todo. Sherlock ao ver a cena sentiu sua espinha gelar. Já vira isso antes, com Moriarty. Imaginava o fim que aquilo teria. Assim que o trio entrou no saguão, o policial chefe foi em direção à eles, e explicou toda a situação: Karl, vinte e dois anos, foi um dos cinco que recebeu a mensagem no celular com a identificação da moça. Ele disse que saiu de casa essa manhã para se entregar à polícia, para pedir proteção; mas foi abordado no meio do caminho por homens mascarados numa van, que o obrigaram a vestir o colete e se posicionar no meio desse saguão. Os homens ameaçaram matá-lo e à sua família se ele não obedecesse. O jovem não teve alternativa, senão aceitar. Disseram que manteriam contato pelo telefone ligado ao fone em sua orelha. Quando chegou aqui, ele disse que tinha um recado para Sherlock Holmes e para o Inspetor responsável pelas investigações.

Lestrade passou a mão pela testa, estava suando frio. Sherlock permanecia olhando para o jovem, seu olhar impassível. Ele sondou todo o colete, procurava por pontos onde pudesse desarmá-lo, algumas fiação que, se cortada, poderia acabar com o sofrimento daquele jovem em questão de segundos. Mas não havia nada. O instrumento mortal fora montado de forma bem feita. Sherlock e Lestrade então se aproximaram, lado a lado. Todos os policiais ali presentes entraram em estado de alerta. Inspetor e detetive ficaram à uma distância segura de cerca de quatro metros do rapaz. Sherlock então, tomando o leme da situação, começou a conversa:

— Meu nome é Sherlock Holmes. Qual o recado para mim e para o Inspetor Lestrade?

O rapaz olhava com terror para os dois homens. Então, depois de alguns minutos, o jovem respondeu com a voz trêmula, o que era dito à ele pelo fone:

— Olá detetive. Fiquei com saudades depois de nosso encontro ontem à noite. Como vai aquela bela jovem? Agradeça à ela pela dor de cabeça que estou sentindo agora.

— Acredite, vou trazer dores de cabeça muito piores à você.

— Ora ora Sherlock, você não está em posição de ameaçar agora. Lembre-se de que eu sou o caçador. E uma presa frágil está entre meus dentes...você não quer que eu o mate não é? Não faria bem para a sua reputação.

— O que você quer?

— Quero a ruína dessa maldita cidade, quero a polícia destruída, e quero a sua cabeça na minha mesa.

— Só isso? mais alguma coisa? -falou Sherlock, em tom de tédio.

— Ah, sim...quero mostrar para toda a Inglaterra que a Scotland Yard não pode contra nós. Esse rapazinho ia para a polícia sabia? Ele preferiu covardemente se entregar às autoridades locais, ao invés de atender o meu pedido e entregar a moça...erro fatal.

O jovem parou de falar e começou a chorar. Do outro lado da linha, o homem berrava enfurecido ofensas contra o jovem, o mandando repassar o recado. O jovem respirou fundo, e tentou se acalmar, pondo-se a falar novamente entre soluços:

— Quero deixar um recado para quem pensa que pode nos desafiar. Esse jovem pagará pelo preço de sua insubordinação e covardia. Ele foi um dos cinco honrados que receberam a chance de salvar o seu país! Mas ele se acovardou e se deixou seduzir pelo belo discurso naquela coletiva. Agora ele pagará com a vida.

— Você chama esse jovem de covarde por ele ter escolhido fazer a coisa certa? Engraçado, não é ele que está se escondendo por detrás de uma máscara e de um porta-voz.

O rapaz ficou em silêncio por um tempo. As lágrimas corriam pelo seu rosto, e ele soluçava constantemente. Ele começou a falar novamente:

— Não acabou entre nós detetive. Ah...achei a pegadinha do Pen Drive bem sem graça. Você vai pagar por bancar uma de espertinho comigo. Até a próxima Sherlock, mande lembranças à Emanuelle.

Nesse momento, o celular começou a piscar e fazer um barulho estranho. Todos correram para trás, entendendo o que viria em seguida. Mas Sherlock não, ele correu para o rapaz que estava apavorado. O detetive começou a mexer no celular preso ao colete, buscando alguma forma de parar aquilo, de desativar aquela bomba. Lestrade ao olhar para trás e ver onde Sherlock estava, correu em direção ao detetive e o puxou, Sherlock se desvencilhou, mas no segundo puxão de Lestrade, o detetive se deixou levar, correndo arrastado pelo inspetor. De repente então um grande barulho seguido de um clarão, ecoou pelo saguão e pela rua, fazendo uma dezena de repórteres correrem e gritarem assustados, assim como a multidão de curiosos que tinham se amontoado na frente do prédio. Sherlock e Lestrade foram jogados ao chão pela força da explosão. O detetive levantou a vista, vendo o que acontecera ao rapaz. o Hukm Allah acabara de fazer mais uma vítima.

***

Emanuelle estava sentada à mesa de sua cozinha. Ela tinha acabado de traduzir a última ficha da primeira pasta. Levantou-se então e ligou a impressora. Logo ela estaria cuspindo fora oitenta folhas. O que aquelas pessoas eram, se havia alguma ordem naquelas pastas, ninguém sabia ao certo. Mas isso iria mudar muito em breve. Era isso o que a jovem doutora tinha em mente. A cada nova folha que ela traduzia, ela sentia que seu pesadelo estava mais próximo de acabar, e que sua vida voltaria ao normal. Era esse pensamento que dava o ânimo necessário que fazia ela passar o dia grudada no computador, traduzindo linha após linha, folha após folha. A jovem pegou uma xícara de café e, encostada no balcão da cozinha, observava o monte das folhas aos poucos se formando, enquanto dava goles em sua bebida quente. O monte ficou pronto. Ela juntou todos os papéis, os colocou em uma pasta na mesa e fechou o notebook. Já passara da hora do almoço, e ela estava com fome. A doutora fuçou a geladeira em busca de algo que ela pudesse preparar em pouco tempo para saciar a sua fome. A jovem foi interrompida por algumas batidas em sua porta. Ao abrir ela se deparou com a senhora Hudson sorrindo com uma bandeja na mão. Nela havia dois pratos, cada um estava preenchido com arroz, batatas e um cheiroso strogonoff de frango. Antes que Emanuelle pudesse dizer algo, a senhora foi falando e entrando no apartamento:

— Olá querida, trouxe nosso almoço.

— Mas senhora Hudson, não precisava dar-se esse trabalho, eu já ia preparar algo para eu comer.

— Ah, deixe disso minha jovem. Eu sei que você está trabalhando muito nesse computador, merecia uma comida decente -Emanuelle riu, tímida com a observação da mulher- E afinal de contas, eu não queria almoçar sozinha -disse, já colocando a bandeja sobre a mesa de centro da sala.

— Sra Hudson, eu não sei como agradecer.

— Sabe sim, sente e coma comigo -disse, rindo de forma doce para a moça.

Ambas pegaram os pratos e sentaram-se lado a lado no sofá. Comeram em silêncio por um tempo. Emanuelle devorava o prato rapidamente. A sra Hudson riu da cena, e comentou:

— Nossa...parece que alguém estava mesmo com fome.

— É que eu não parei para nada desde cedo, nem para lanchar -disse, com a boca meio cheia- então essa é praticamente a primeira refeição decente que faço no dia.

— Ah, entendo.

A sra Hudson viu o controle da televisão na mesa de centro, e comentou com Emanuelle, apontando para a tv:

— Querida, você se importa se eu ligar a televisão? Daqui a pouco está na hora da minha novela.

— Não, de jeito nenhum -disse, tapando a mão com a boca para não cair comida enquanto falava- fique à vontade.

A sra Hudson pegou o controle, sentou-se no sofá, ainda com metade da comida no prato e ligou o aparelho. A primeira imagem que apareceu na tela foi de uma repórter atrás de um balcão, divulgando as principais notícias do dia. Entretanto, a tarja embaixo na tela, onde anunciava o assunto que estava sendo tratado no momento, fez a jovem quase colocar a comida para fora por tamanha angústia que a assaltou. Estava escrito: Ataque terrorista no Gherkin mata um jovem de 22 anos e deixa a população londrina em alerta.

***

.

“Nessa manhã houve uma explosão num dos prédios comerciais mais famosos de Londres. O Gherkin hoje foi o cenário de mais um impetuoso ataque do grupo terrorista Hukm Allah, que assumiu a autoria do atentado. A vítima foi um jovem de vinte e dois anos, chamado Karl. Ele era estudante de direito da Universidade de Oxford. Por informações oficiais, ele era um dos cinco portadores da identidade da misteriosa moça, cujo grupo terrorista reivindica a entrega dela e de um Pen Drive. Ao que fomos informados, o jovem iria se entregar à polícia em busca de proteção, pois ele estava determinado a não revelar o nome da moça. Infelizmente ele foi pego antes que alcançasse ajuda. O Inspetor Lestrade deu uma rápida declaração aos repórteres na cena do crime, ele disse: ‘A Scotland Yard repudia o ato hoje realizado pelo Hukm Allah. Quero que a população não se deixe intimidar pelas ameaças deles. Estamos avançando nas investigações, e estamos perto de pegar esses malfeitores’.

O famoso detetive particular Sherlock Holmes foi visto na cena foi crime, mas ele não deu nenhuma declaração.

Algumas horas depois do ocorrido, algumas pessoas se amontoaram em frente à Scotland Yard, e protestavam pela entrega da moça. Entrevistamos o líder do movimento, ele disse: ‘Não é justo que muitos dos nossos morram por causa de uma estrangeira. A polícia não está sendo eficiente! O Karl fez o que era certo, mas não teve a proteção da polícia, e acabou perdendo a vida por causa da ineficiência da Scotland! Então já que eles não conseguem pará-los de um jeito, então o façam de outro, entreguem a moça e o Pen Drive!!

Nossa equipe flagrou o momento em que tropas de choque chegaram para conter a multidão que cada vez mais se amontoava na frente da instituição, apesar da chuva forte. Dentro de minutos a violência se instalou nas ruas. Homens montados em cavalos usavam porretes contra a multidão enfurecida. Bombas de efeito moral e balas de borracha foram usadas contra os manifestantes. A vidraçaria da porta da entrada do prédio estava toda destruída. O cenário era de caos e desordem. Os líderes do movimento foram presos e levados sob custódia para delegacias separadamente.

O chefe de segurança da Federação Inglesa deu uma coletiva de emergência. Ele pediu calma à população, e prometeu que em breve os responsáveis por isso seriam presos e a justiça seria feita. Por enquanto ele pediu para que as pessoas não entrassem em pânico e aguardassem as investigações. Ele encorajou que os restantes se entregassem à polícia, pois teriam a proteção necessária. Segundo ele, o que ocorreu com o jovem Karl foi uma fatalidade. Ele também reforçou que quaisquer atos contra a moça não seriam tolerados, como também a divulgação pública de seu nome seria condenado como crime de alta traição.

No momento não temos novas informações, conversamos também com algumas testemunhas presentes no momento da explosão….”

A televisão estava ligada e a jornalista dava o relatório do que se passou naquela manhã e início de tarde. Mary estava comendo a sobremesa sentada no sofá pela segunda vez, enquanto Rosie dormia. Ela assistia apreensiva o repórter. John caminhava de uma lado a outro da sala, com o telefone nos ouvidos. Estava claramente nervoso.

— Ele ainda não respondeu? -perguntou Mary. John retirou o telefone da orelha e suspirou profundamente.

— Ainda não. Está caindo em caixa postal. Já perdi as contas de quantas vezes tentei ligar.

John ainda falava quando bateram na porta de sua casa. Ele olhou para Mary e foi atender a porta. Ficou surpreso ao ver Sherlock em sua porta. O detetive entrou no apartamento e mal cumprimentara Mary, quando John começou a reclamar com ele:

— Onde você estava? Eu vi você na televisão! Seu celular só caía na maldita caixa postal! -John reclamava como um pai reclama com o filho por ter chegado tarde em casa.

— Ele descarregou de novo. Nunca sei direito a hora de carregar esse aparelho.

John bufou, dando um sorriso cansado. Pensou como é que uma mente feito a dele não sabia cumprir as tarefas mais básicas da vida. John viu que o detetive mancava discretamente. Ele perguntou, com a expressão preocupada:

— O que houve?

Sherlock explicou tudo o que acontecera desde sua ida à fábrica, até o evento daquela manhã, omitindo sua proximidade com Emanuelle, claro.

O sr Watson passou a mão pela cabeça, e prosseguiu, claramente preocupado:

— O que pretende fazer agora?

— Você fez a lista que eu pedi?

John foi até o armário, abriu a gaveta e retirou um papel dobrado, entregando-o ao detetive. Sherlock leu rapidamente a lista, enquanto John falava:

— Wilson disse que não foram coisas de muito valor, e outras um pouco estranhas. Dentre elas alguns produtos químicos e eletroeletrônicos quebrados de uma loja de velharias. Inclusive alguns dos produtos foram dessa fábrica que você foi ontem.

Sherlock nada dizia, apenas olhava para aquela lista. Celulares, imãs, fiações elétricas. Na lista havia muito mais produtos relacionados à eletrônica do que produtos químicos primários para a fabricação de bombas. Se ele mostrasse essa lista para qualquer pessoa, ela nunca diria que seriam os produtos de interesse de um terrorista, mas sim de qualquer nerd que adorasse construir robôs. Sherlock não achava um padrão lógico naquela lista. Ele precisava pensar. Entretanto ir para casa não era opção. Ela estava lá. Sherlock sabia que algo o afetava quando chegava perto daquela jovem. Ele prometeu a si mesmo que manteria distância até descobrir o que era.

— Preciso pensar John -disse o detetive, esfregando os olhos.

— Vá para casa então, pense e ache…

— Não posso ir pra casa -bufou Sherlock.

John olhou desconfiado para o detetive, perguntando pausadamente:

— Porque não pode?

— Não temos tempo. Me deixe sozinho por um instante em algum quarto.

— Mas Sherlock…

— Não temos tempo John -disse o detetive, já invadindo o corredor que dá acesso para os quartos.

Sherlock observou os cômodos, escolhendo ficar no escritório de Watson. Ele observou o chão por um momento, sentou-se sobre o carpete, e colocou a lista aberta em sua frente e do lado o objeto que achara no chão arenoso do galpão da fábrica . Watson estava na porta observando o detetive. Holmes fechou os olhos, respirou fundo e dispensou Watson, sem abrir os olhos:

— Tudo bem Watson, já estou acomodado. Feche a porta quando sair.

Watson revirou os olhos, e alfinetou para Holmes antes de sair o fechar a porta.

— Tente pelo menos deixar meu escritório inteiro.

Então saiu, e deixou Holmes com seus pensamentos.