Flawless

19. Cuidado com as garotas com ferro de marcar


O Estúdio de ioga Montanhas de Morango ficava num celeiro adaptado, do outro lado de Rosewood. Na sua ida até lá, de bicicleta, Aria passou por uma ponte coberta, cor de tabaco, e pela fileira de casas do departamento de artes de Holli. Eram casinhas decrépitas, em estilo colonial, estavam salpicadas com tinta de vários tons de roxo, rosa e azul. Ela colocou a bicicleta no suporte, que já estava quase lotado, em frente ao estúdio de ioga; todas as bicicletas ostentavam adesivos nos quais se lia CARNE É ASSASSINATO e PETA colados em seus quadros.

Ela parou no saguão de entrada do estúdio de ioga e olhou para as meninas desarrumadas, sem maquiagem, e para os meninos peludos e flexíveis. Ela seria louca de seguir as instruções de A — Estúdio de ioga Montanhas dos Morangos. Esteja lá — literalmente? E estaria pronta pra ver Meredith? Talvez A a estivesse fazendo de isca. Talvez A estivesse ali. Aria tinha visto Meredith apenas três vezes: primeiro, quando Meredith foi ao coquetel de professores e alunos de seu pai; depois, quando pegou Meredith e o pai juntos no carro; e, fi-nalmente, no outro dia, na Victory. Mas ela a reconheceria em qualquer lugar. Naquele exato momento, Meredith estava parada em frente ao armário do estúdio, arrastando colchões, co-bertores, blocos e fitas. Seu cabelo castanho estava preso num rabo de cavalo bagunçado, e havia aquela teia de aranha tatuada do lado de dentro do pulso.

Meredith notou a presença de Aria e sorriu.

—Você é nova, certo? — Ela olhou nos olhos de Aria e, por um terrível momento, Aria teve certeza de que Meredith sabia quem ela era. Mas aí ela desviou o olhar, debruçando-se para pegar um CD dentro de um aparelho de som portátil. O som de uma cítara indiana tomou conta do lugar.—Você já fez Ashtanga antes?

— Hum, sim — respondeu Aria. Ela notou uma grande placa na mesa, que dizia: AULA INDIVIDUAL US$15, e pegou uma nota de dez e uma de cinco, e as colocou em cima da mesa, pensando em como A poderia saber que Meredith estaria lá, e se A realmente estaria lá.

— E eu acho que você já conhece o segredo, hein? — Meredith sorriu.

— Co... como é? — sussurrou Aria, seu coração disparado. — Segredo?

— Você trouxe seu próprio colchão. — Meredith apontou para o colchão vermelho debaixo do braço de Aria. — Muitas pessoas usam os colchões do estúdio. Eu não digo nada, mas você pode raspar os fungos de pé dos nossos colchões e fazer queijo.

Aria tentou sorrir. Ela tinha trazido seu próprio colchão para as aulas de ioga desde que tinha ido pela primeira vez a uma com a Ali, no sétimo ano. Ali dizia que você corria o risco de pegar uma DST nos colchões das comunidades de ioga.

Meredith olhou para ela com mais atenção.

—Você é da minha turma de desenho?

Aria fez que não, percebendo, repentinamente, que o lugar cheirava a uma mistura de chulé e incenso. Este era o tipo de estúdio a que Ella iria. De fato, talvez Ella já tivesse ido.

— Qual é o seu nome?

— É... Alison — disse Aria depressa. Ela não tinha o nome mais comum do mundo e ficou com medo de Byron já tê-lo mencionado para Meredith. Esse pensamento a fez parar. Será que Byron falava dela para Meredith?

—Você se parece com uma menina da minha turma de desenho — disse Meredith. — Mas as aulas mal começaram e eu confundo todo mundo.

Aria pegou um panfleto do seminário "Conheça seus chacras".

— Então, você faz faculdade?

Meredith confirmou.

— Estou fazendo MBA.

— Qual é a sua, hum, área?

— Bem, eu faço todo tipo de coisa. Pintura, desenho. — Meredith olhou para alguém entrando atrás da Aria e acenou. — Mas, recentemente, comecei a trabalhar com marcação.

— O quê?

— Marcação. Eu soldo dois ferros de marcação, feitos sob encomenda para formar palavras, aí eu os aqueço e queimo as palavras em grandes blocos de madeira.

— Como se fossem marcas de gado?

Meredith abaixou a cabeça.

— Eu tento explicar isso, mas a maioria das pessoas acha que sou louca.

— Não — disse Aria, rapidamente. — É muito legal.

Meredith deu uma olhada no relógio da parede.

— Nós temos alguns minutos. Eu posso te mostrar umas fotos. — Ela pegou uma bolsa de pano listrada, que estava perto dela, e tirou seu telefone celular de dentro. —Vai olhando estas aqui...

As fotos eram de blocos de madeira clara. Alguns com apenas algumas letras e outros com coisas curtas escritas, tais como vem me pegar e manipulador. As letras tinham um formato um pouco estranho, mas ficavam muito legais queimadas na madeira. Aria mudou para a foto seguinte. Era um bloco mais longo que dizia: Errar é humano, mas parece divino.

Aria olhou para cima e disse:

— Mae West.

Meredith pareceu animar-se:

— Uma das minhas frases favoritas.

— Uma das minhas também. — Aria devolveu o celular dela. — São muito legais.

Meredith sorriu.

— Fico feliz que tenha gostado. Eu devo fazer uma exposição em alguns meses.

— Eu est... —Aria fechou a boca. Ela ia dizer: estou admirada. Ela não esperava que Meredith fosse assim. Quando Aria imaginava Meredith, apenas atributos ruins vinham a sua cabeça. A Meredith imaginária número um estudava história da arte e trabalhava em uma galeria abarrotada e sem graça, em algum lugar da Main Line, vendendo paisagens da Escola Hudson River para senhoras ricas. A Meredith imaginária número dois ouvia Kelly Clarkson, amava Laguna Beach e, se a incentivassem, levantaria a camiseta para ficar como uma das Garotas Selvagens. Aria nunca pensaria que ela fosse do campo das artes. Por que Byron precisaria de uma artista? Ele tinha Ella.

Quando Meredith cumprimentou outro aluno de ioga,Aria foi para a sala principal do estúdio, que tinha teto alto, deixando expostas as vigas de madeira do celeiro, tinha piso de madeira caramelo brilhante e grandes tecidos com estampas indianas pendurados por todo lado. A maioria das pessoas já tinha sentado em seus colchões e estava se deitando de costas. Estava estranhamente silencioso.

Aria olhou em volta. Uma garota de rabo de cavalo e coxas grandes estava se dobrando para trás. Um cara esguio mudou da pose do cachorro para a pose da criança, respirando com di-ficuldade pelo nariz. No canto, uma menina loira fazia uma torção sentada. Quando ela olhou para a frente, seu queixo caiu.

— Spencer? — perguntou.

Spencer empalideceu e ajoelhou-se.

— Ah — disse ela. — Aria. Oi. Aria engoliu em seco.

— O que você está fazendo aqui? — Spencer olhou para ela confusa.

— Ioga?

— Não, eu sei disso, mas... —Aria balançou a cabeça. — Quer dizer, alguém falou pra você vir aqui, ou...?

— Não... — Spencer estreitou os olhos, como quem suspeitava de algo. — Espera aí. a que você quer dizer?

Aria piscou. Imaginando quem sou eu? Estou mais perto do que imagina.

Ela olhou de Spencer para Meredith, que estava conversando com alguém no saguão, depois de volta para Spencer. Sua cabeça começou a funcionar, rodando. Alguma coisa naquela história estava muito, muito errada.

Seu coração disparava enquanto ela saía da sala principal. Ela correu para a porta, trombando com um cara alto, barbudo, que usava um macacão. Do lado de fora, o mundo não estava nem aí para o seu pânico — os passarinhos cantavam, os pinheiros balançavam, uma mulher caminhava com um carrinho de bebê, falando ao celular.

Quando Aria correu em direção ao suporte onde estava sua bicicleta e a destravou, sentiu a mão de alguém apertar seu braço com força. Meredith estava parada perto dela, lançando-lhe um olhar penetrante. Aria ficou boquiaberta. Ela engoliu em seco.

—Você não vai ficar? — perguntou Meredith.

Aria fez que não com a cabeça.

— Eu... hum... emergência familiar. — Ela chacoalhou a bicicleta para soltá-la e pedalou em direção a sua casa.

— Espere! — gritou Meredith. — Deixe-me devolver o seu dinheiro! Mas Aria já estava na metade do quarteirão.