De repente um milhão de reviravoltas acontecem. Terminar com o namorado que você achava que seria parte de você pra sempre e ainda por cima entrar em conflito com sua própria identidade. Ou sexualidade, whatever, é muito pra uma adolescente de 19 anos entender, até porque as coisas acontecem tão rápido que nem dá tempo de perceber o quão grande seus problemas estão.

Ok. Vou explicar como tudo começou.

Estava prestes a fazer três anos de namoro, as coisas com o passar do tempo, querendo ou não, caem em uma coisa monótona e chata. Já não existia mais aquela paixão de antes, mas tudo são fases, certo? Ou assim eu pensava que fosse. Não existia mais restaurantes, cinemas, passeios especiais ou qualquer coisa que casais fazem para comemorar a data de namoro. Só era mais um dia comum, sentada no sofá da casa dele, esperando ele sair do banho e ir jogar seu vídeo-game, como se eu nem existisse ali. Então o celular dele começa a vibrar. Nunca fui dessas namoradas obcecadas, que vigia cada espaço da vida do ser, e nem tinha o costume de futricar o celular dele também, confiança é a base de qualquer coisa. Mas aí pensei "talvez seja algo importante, não custa nada ver". Pois é. No momento que abri as mensagens e vi o nome "Marcelle", do qual eu nunca tinha ouvido falar a respeito, fiquei um tanto curiosa.

"Amor, estou te esperando hoje à noite!"

"Amor, essa blusa fica bem em mim?"

"Adorei o presente, quero te ver logo"

"Morrendo de saudades do meu bebezinho, não paro de pensar em você!".

Talvez seja engano. Uma pessoa sem o que fazer. Mas ele respondeu. Ele digitou cada palavra que aparecia na tela.

"Oi amor, assim que o jogo acabar eu vou pra tua casa, morrendo de saudades."

"Comprei um chocolate pra você, me espera"

"Melhores 3 meses da minha vida ao seu lado".

Puta que pariu. Meu mundo caiu umas mil vezes. O pior é que eu não queria fazer cena e passar essa humilhação na frente dele. Apenas deixei o celular desbloqueado com uma mensagem no bloco de notas: "Acabou. A Marcelle agradece!" E sabe o pior? Ele nem se deu ao trabalho de ir se desculpar ou qualquer outra coisa. Nem uma simples ligação. O que foram esses três anos pra ele, então? Excluir as milhares de fotos nossas é que deu trabalho, além de ter que queimar todos os indícios de que ele existiu. Depois que um relacionamento termina você só quer ser a desapegada que vai pra balada e bebe até ter uma recaída e chorar feito louca... (Ok. Isso aconteceu apenas nas primeiras semanas). Depois fui pegando o pique e vendo o que perdi nesses três últimos anos. Até que então eu percebi que a vida era melhor sem ele, e que agora não fazia mais diferença. Matriculei-me em um curso de inglês, abri mais tempo para pensar na faculdade, conheci pessoas novas, comecei a sair mais, ir a uns lugares diferentes, essas coisas. Até que um dia, uma amiga falou pra gente ir a uma boate GLS, que era mais animada, não tinha homem querendo encher o saco o tempo inteiro, podia curtir de boa. Ela iria com um amigo dela e o namorado do amigo. Ok, claro que topei. Nunca fui preconceituosa, pra mim cada um vive a vida do jeito que quer. E até então, eu nunca tinha ficado com alguma mulher e sentido interesse – ou atração – por alguma. Isso nem cogitou pela minha cabeça. Até porque passei minha adolescência toda com o Felipe, o tal ex namorado. Eu tinha 13 anos quando o conheci, começamos a ficar quando eu tinha 14 e a namorar com 15. Minha cabeça nunca teve espaço pra outra coisa, além dele, e agora, prestes a fazer 19 anos, vejo como as coisas poderiam ter sido diferentes. Mas enfim. Chegando à boate, tudo parecia muito divertido. Umas pessoas bem loucas, com o estilo bem descolado, todo mundo estiloso. Dançamos, começamos a beber, até que em certo ponto da noite, percebi uma mulher me secando, do outro lado do bar. Ok né, é uma boate GLS, normal. Claro que as meninas vão chegar em meninas. Contei pra Maris, a amiga que estava comigo. Ela apenas riu e soltou uma de suas pérolas “pelo menos é bonita”. E até que era mesmo. Loira, com um milhão de pulseiras no braço, uma roupa super legal. Não dei muita ideia e continuei curtindo, olhando as pessoas ao redor. Muito louco. Resolvi ir ao banheiro, já tinha perdido a Maris e os amigos dela de vista mesmo. Até que trombei com a tal menina das encaradas.

— Estava te olhando já tem um tempinho, bem linda você.

— Ah, obrigada. Eu preciso ir ao banheiro agora... Mas obrigada pelo elogio!

Sai andando e ela pegou no meu braço.

— Ei, espera! Vamos conversar.

E sorriu.

— Ah, não. Desculpa, mas eu não sou... Não curto garotas. Só estou acompanhando uns amigos.

— Que pena então. Mas podemos conversar numa boa, sem segundas intenções, prometo.

Fomos pra um canto onde a música estava mais baixa e batemos um papo, super de boa. O nome dela era Naomi, tinha 23 anos, cursava Artes Plásticas... Trocamos o número de telefone e fim. A conversa foi tão boa que por um segundo esqueci que ela era uma guria que ficara afim de mim. Depois de muito tempo consegui achar o pessoal e fomos embora pra casa. No outro dia quando acordei a garota tinha me mandado mensagens. Começamos então a conversar diariamente, contando como foi o dia, desabafados, essas coisas. Saímos algumas vezes e eu comecei a enxerga-la de um jeito diferente. Ela tocava no meu braço com delicadeza, ria das coisas idiotas que eu fazia, era tão atenciosa. Uma vez resolvemos ir a uma festa. Ela queria ficar com uma garota e nesse momento eu senti o maior ciúme do universo. “Como assim você quer ficar com aquela dali? Muito feia pra você. Não, escolhe outra.” Ela ria e saia apontando pras meninas, mas eu sempre dizia a mesma coisa. Até que eu já estava bêbada demais e ela também.

— Emily, você já ficou com alguma guria?

– Já te disse que não curto.

“Talvez eu te curta, mas só.” Pensei por um segundo.

— Mas você não vai saber se curte ou não, se nunca ficar.

E aí nos beijamos. Puta merda. Foi a melhor sensação que eu já senti na vida. Os lábios dela eram macios, ela tinha uma delicadeza, as mãos dela deslizavam por minha nuca e eu não queria nunca mais parar de beijá-la. Meu Deus, como eu desejei ser apenas o efeito do álcool. Depois daquilo, ela dizia que era só uma curtição pra nós duas, coisa de amigas, mas eu sabia que tinha curtido até demais.

E foi aí que tudo começou...