First Snow

Quando fala o amor...


Quando fala o amor, a voz de todos os deuses deixa o céu embriagado de harmonia.

( William Shakespeare)

(Gong P.O.V )

Nunca tive uma boa visão de toques, nunca quis que as pessoas ficassem próximas demais porque afinal de contas o meu corpo era meu instrumento de trabalho. Mas de fato eu não sabia como evitar aquela proximidade sôfrega entre nós. Baro parecia ser algum tipo e mágico, pois tudo em que ele tocara desde que nos vimos mais cedo até o momento ganhou um bilho magnífico e agora parece que seria a minha vez. Inegável era o modo como ele sabia como me tocar, aquela delicadeza me tornava mais humano do que costumeiramente eu era considerado, mas tão cedo quanto teve início eu ousei colocar um fim.

Após minhas palavras a vida dele pareceu ser surrupiada e ele sorriu amarelo. O silêncio foi prolongado até estarmos em meu apartamento onde ele se acomodou confortavelmente no sofá, embora realmente aparentasse estar no mínimo incomodado com a situação. – Me desculpa. – O pesar em suas palavras veio num tom melódico que trouxe a mim um solavanco imediato. Não havia como ficar bravo com ele ou permitir que ele se sentisse mal... De forma alguma era possível. – Essas coisas acontecem. – Sentei-me diante dele, suas mãos estavam unidas por sobre as pernas do mesmo modo, ele agia educadamente mesmo debaixo do teto de alguém que não se dava o valor, era incrível. –Você gosta de mim só por conta daquele dia? – E ele assentiu timidamente. Não que eu não estivesse acostumado com paixonites, mas comparado aos demais rapazes de nossa idade amor puro era algo do qual eu não pretendia tirar proveito. – Qualquer um teria achado isso patético. – Notei que ele suspirou quando me manifestei e logo meus olhos foram tomados por uma expressão completamente fora do comum. Baro olhava para mim fixamente, as lágrimas ondulavam seu rosto tão límpido e notoriamente dócil. – Por que deveria ser patético? Só porque não sou como um urubu que te estende uma bolada de dinheiro para que você simplesmente abaixe suas calças? Isso não é patético, Gong? Não é patético deixar que eles te humilhem quando você vive apenas da maneira que pode?! – Tudo foi dito de uma forma tão natural que eu me espantei, que tipo de atitude era aquela que me colocava num amontoado de dúvidas e raiva... Raiva? Sim, raiva por ele ter sua parcial razão no que dizia. – Não é patético. – Insisti, mas Baro riu e enfim desfez-se da postura que mantinha com tanta rigidez e aproximou-se de mim de um modo decadente, expressando suas palavras. – Tem razão. Não é patético, é triste. Você não quis me beijar porque meu amor é puro, mas beijou o Jinyoung... Ele é sujo, e o dinheiro dele também. – Eu sabia melhor do que qualquer um o que aquele monstro era, não precisava de alguém que me dissesse isso. Eu não sabia o que dizer e quando dei por mim apenas o barulho da porta cortava o silêncio do meu lar me devolvendo ao cruel vazio e à violenta solidão.

Eu comia meu almoço sem nenhuma ambição pela tarde, o dia era feio do lado de fora do colégio e podia ver Jinyoung e ShinWoo em seus respectivos lugares, eles eram escandalosos e desnecessários quase que em tempo integral. Algumas vezes Jin voltava-se para mim e piscava cúmplice quase como se eu realmente gostasse de seu modo vulgar de agir.

Passei horas procurando Baro, não estava na cantina, não estava na sala e nem no galpão. Por fim decidi perguntar a um de seus colegas onde ele havia se metido e enfim descobri; enfermaria. Não era uma novidade que após seu diagnóstico ele fosse se sentir mal ou ter dores de cabeça constantes, e mesmo que eu bem me lembrasse dele saber que fui procurado para acompanhar sua morte por conta de um amor silencioso me deixava no mínimo comovido.

Quando cruzei a porta da enfermaria eu logo o notei, os fios clarinhos eram a única coisa que se podia ver já que suas mãos mantinham o lençol branco cobrindo a face. Aproximei-me cuidadosamente e tomei espaço à beira da cama, Baro não reagiu de início, mas se livrou do obstáculo que ofuscava sua visão e notei suas maçãs corarem na minha presença. – G-Gong... – Eu sorri diante daquela timidez tão boba e o assenti. – Fingir que está doente para não ter aulas... Quem nunca? – Ele me olhou repreensivo e eu sorri outra vez, cutuquei sua testa com o indicador e ele sorriu sem graça. – Não faço essas coisas. Mas o que veio fazer aqui? – Estava aí uma pergunta que eu não sabia responder. Novamente nossos olhos se cruzaram e ele se adiantou. – Vou sair logo, meu pai mandou me levarem para o hospital, acho que estou com febre. – Eu levei minha mão até sua testa e ele recuou, parecia incerto quanto a confiar numa opinião minha, ficamos algum tempo nos olhando e ele enfim cedeu, sua temperatura ficou clara quando ele permitiu que eu o tocasse, estava febril. – Você deve descansar, eu já vou indo. – Imediatamente ele agarrou minha camisa. – Não! Não me deixa. – Eu não sabia o que fazer perto de alguém que fazia parecer que somente eu existia, era estranho e ao mesmo tempo eu tinha medo. Quando olhei para Baro ele estava prestes a se desmanchar em lágrimas novamente, como conseguia ser um garoto tão chorão? – Fica comigo... – E me puxou mais forte. Nesse momento eu não pude pensar em muita coisa, apenas vi uma muralha desferir-se contra minha cabeça e se despedaçar facilmente, esfarelando como pão velho. Quando abri meus olhos eu o estava beijando, seus lábios eram macios e fazia jus à cor rósea, quase tão doce quanto o sabor que a tonalidade indicava. Baro correspondeu ao beijo tão calmo e puro sem muita audácia, apenas mantinha os lábios abertos o suficiente para que nossas línguas dançassem, eu sabia que era a primeira vez dele e tinha consciência do que aquilo causaria. Por minutos nós ficamos ali num mundo pequeno embora grande o bastante para nós dois e quando o ósculo surrupiou de ambos o oxigênio necessário nos separamos, nos olhamos e enfim ele indagou. – Por que isso agora? – Eu sorri, não sabia o porquê, mas sorri. – Porque seu amor é puro.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.