Final Fantasy X-3 - Os Hinos

Capítulo 7 - Macalania


Yuna saiu e deparou-se com a pequena fé à sua espera.

– Então, encontraste-te com a tua outra metade? – perguntou o menino, enquanto Yuna sentava-se numa das escadas, para ficar ao nível dos olhos dele.

– Não desapareças como bem te apetece, desta vez. – pediu Yuna – Eu preciso de algumas explicações.

A fé anuiu a cabeça. – Mas, Yuna, nós não somos deuses, nem sempre temos respostas para o que nos perguntas.

– Eu sei disso. Vou tentar ser simples. – disse Yuna – A Lenne é a minha outra metade. Aquela de quem me falaste?

– Sim. – respondeu ele – Ela é a tua outra metade. Ficaste decepcionada por não ser o sonho?

– Nada disso. – Yuna desviou os olhos – Sabes o que ela me disse?

Mais uma vez, o rapaz anuiu com a cabeça.

– Disseste que a minha outra metade me iria dizer como parar o que está a acontecer com o Tidus. – lembrou Yuna – Mas ela só me soube dar explicações.

– Isso quer dizer que não existe uma solução para o teu problema. – disse a fé – O que é que tencionas fazer, Invocadora?

– Estás a perguntar-me se vou “enviá-lo”? – perguntou Yuna, um pouco surpreendida – A Lenne disse-me que tu serias capaz de explicar-me melhor o porquê de o Tidus ter voltado como um “não-enviado”.

– O Tidus morreu. – disse o rapaz, assustando Yuna – Ele morreu há muito, muito, muito tempo atrás, quando o Sin foi criado e destruiu Zanarkand. Quando nós fomos transformados em fés para preservar a memória de Zanarkand antes de ser destruída.

– Mas ele…antes…

– Antes ele era um sonho que o Aaron trouxe de volta. – interrompeu o rapaz – Um sonho que desapareceu quando nós acordamos. Tu sabes isso. Mas o corpo dele pereceu há muitos anos.

– Ele está morto… - murmurou Yuna, olhando para o chão.

– Nós não conseguimos trazer pessoas de volta à vida. – disse o rapaz – No entanto, conseguimos trazer o corpo, os sentimentos, as memórias. Mas ele não sabe que morreu. Que já está morto. O que é que vais fazer, Invocadora?

– Se trouxeram o corpo, os sentimentos e as memórias, isso não quer dizer que ele está vivo? – perguntou Yuna, mesmo sabendo a resposta.

– O Seymour também tinha o corpo, os sentimentos e as memórias. – lembrou a fé, fazendo Yuna virar a cabeça – Conforme os teus ensinamentos de Invocadora, isso quer dizer que ele estava vivo mesmo depois de morrer uma vez?

– Queres que o envie? – perguntou Yuna – É o que devo fazer? Mesmo depois de ter perdido tanta gente?

– Fizeste um pedido egoísta. Disseste que tinhas saudades dele. Que querias vê-lo outra vez. – lembrou a fé, quando Yuna olhou para ele com os olhos cheios de lágrimas – Nós atendemos a esse pedido egoísta porque o sonho ajudou-nos. Mas tu já o viste outra vez. Quando matares as saudades que tinhas dele, podes enviá-lo.

Yuna levantou-se rapidamente e limpou algumas lágrimas que tinham escapado dos seus olhos.

– Disseste que ele ia desaparecer, mas ele já entrou em dois Templos e está bem! – exclamou Yuna – Logo que ele não permaneça lá dentro, não vai desaparecer!

– É verdade. Eu menti-te. Ele não vai desaparecer se entrar nos Templos. Logo que não fique lá durante muito tempo. – confirmou a fé – Mas ele estava mesmo bem quando saiu do segundo Templo?

Yuna lembrou-se que ele tinha ficado cansado. O que a fé já devia saber, mesmo sem ela mencionar.

– Este não é o tempo dele. – continuou o menino – As memórias que nós trouxemos do tempo dele em Spira contigo vão começar a desaparecer. A cada passo que ele deia, vai começar a esquecer-se de onde está, do que é que está a fazer aqui, de quem és tu…

– Só se ele entrar nos Templos! – insistiu Yuna, vendo a fé a anuir.

– A cada passo que ele deia, vai começar a esquecer-se da vida que teve como um sonho e como um “não-enviado”. – continuou a fé – Pior do que isso, vai começar a lembrar-se da sua vida anterior, como jogador famoso em Zanarkand, do ataque do Sin, de como morreu. O que é que achas que acontece depois?

– O que é que acontece depois? – perguntou Yuna, com medo da resposta.

– Uma pessoa que sabe que não pertence a este tempo e lembra-se de morrer? – perguntou a fé – Pergunto-me o que aconteceria, então…

– Ele…

Antes de Yuna ter tempo de dizer mais alguma coisa, a fé desapareceu, deixando-a sozinha.

Ansiosa, apressou-se pelas escadas e fez uma vénia rápida ao guarda que a tinha deixado entrar, antes. Desceu a estrada quase a correr até encontrar. Tal como Lenne lhe tinha dito, os Guados estavam a olhar desconfiadamente para Tidus – o “não-enviado”.

Quando viram a expressão de Yuna, ambas, Rikku e Paine souberam que tinha acontecido alguma coisa. No entanto, quando ela parou ao lado do grupo, forçou o sorriso e disse a Wakka que, infelizmente, o guarda não podia deixar entrar mais ninguém.

– Mesmo sendo a Invocadora Suprema a pedir-lhe? – perguntou Wakka, um pouco desconfiado.

– Sim. – respondeu Yuna, simplesmente, começando a puxar Tidus pelo ombro, para que eles saíssem dali o mais depressa possível – Agora, podemos continuar.

– Porquê tanta pressa? – perguntou Rikku, sabendo que depois de saírem de Guadosalam se deparariam com as Thunder Planes. Apesar de ter acampado lá durante uma semana, ainda não se tinha habituado ao som estridente e à luz ofuscante que apareciam de repente. Apesar de já não ter medo…

– Se o guarda não vos deixa entrar nas Farplanes, não há mais nada para ver em Guadosalam. – justificou Yuna, puxando Tidus ainda com mais força – Hei, lembras-te quando me viste pela primeira vez?

Tidus olhou para ela com as sobrancelhas franzidas. – Claro que me lembro. Foi quando saíste do quarto no Templo de Besaid. – ele riu-se – Meti-me em problemas por ter lá entrado sem ser um Guardião.

Mais descansa, Yuna abrandou o passo e saiu de Guadosalam com um sorriso nos lábios.

– Então, e lembras-te de como chegaste a Spira? – perguntou Yuna, inocentemente – Naquela altura em que entraste no barco dos Al Bhed e conheceste a Rikku.

Tidus continuou a caminhar ao lado de Yuna, mas olhou para o ar quando sentiu a chuva, como se estivesse a tentar lembrar-se de alguma coisa.

– Mas eu acordei no mar de Besaid, não foi? A primeira que conheci aqui foi o Wakka, não foi? – perguntou Tidus, fazendo Yuna olhar para cima – Depois do Aron me ir buscar…o Aron… - ele levou o indicador e o polegar à testa – O Aron…foi a Zanarkand e…depois…eu fui ter a Besaid. Só conheci a Rikku mais tarde. Certo?

Yuna virou a cabeça para baixo e, apesar de continuar encostada ao braço de Tidus, já não sorria.

– Agora que me lembro. – murmurou Yuna – Sim, acordaste em Besaid e mostraste os teus dotes de jogador de blitzball ao Wakka. Ele ficou de boca aberta.

Tidus sorriu. – Por momentos, achei que me estava a esquecer de alguma coisa.

– Não deves pensar muito no passado. – advertiu Yuna, com o lábio inferior a tremer – Deves forcar-te no futuro.

– E tenho grandes planos para o futuro. – completou Tidus, pondo o braço por cima dos ombros de Yuna – Mas o que é que aconteceu? Nem mudaste de roupa. Pensei que não gostavas de usar a tua roupa de Invocadora, agora.

– Estou a pensar nos meus deveres como Invocadora. – murmurou Yuna, apertando o bastão que levava na outra mão – Afinal, ainda sou uma.

– Não tens de continuar assim. – disse Tidus – Depois de esta jornada acabar, podemos voltar para Besaid e viver uma vida pacifica. Aposto que as pessoas vão acalmar-se não tarda nada e vão deixar-te em paz.

– Sim. – por momentos, Yuna sorriu – Podemos viver uma vida normal. Eu não tenho de ser uma Invocadora, nós não temos de viajar mais pelo mundo. Podemos ser pessoas normais.

Yuna permitiu-se sonhar um bocado. Antes dos oficiais de Bevelle os apanharem, eventualmente, ela podia sonhar com uma vida normal com ele ao seu lado. Quando começariam a viver juntos? Em que cabana é que iriam viver? Quando se iriam casar? Aonde se iriam casar? Quantos filhos é que ele queria ter?

Yuna sorriu e fechou os olhos enquanto deixava que ele a conduzisse. Sabia que não seria tão fácil. Nunca poderiam ter uma vida normal porque nenhum deles era normal.

– Nunca me vais esquecer, pois não? – perguntou Yuna, ainda com os olhos fechados.

– Do que é que estás a falar? – perguntou Tidus, passando a mão livre pelo cabelo molhado dela – É claro que nunca te vou esquecer. E também nunca vou deixar-te sozinha.

Yuna anuiu com a cabeça. – É uma promessa.

Depois de uma longa jornada através das Thunder Planes, seguia-se uma longa caminha pelas Macalania Woods. Ao contrário do resto do grupo, Yuna não ficou chocada quando eles entraram e a floresta voltou a ter o seu ar natural. Afinal, o recipiente das fés estava mesmo ao seu lado. Mas perguntava-se se aquilo contava como um Templo. Como não viu nenhuma parte de Tidus a ficar transparente, decidiu que não contava.

– Pensei que a floresta estava a morrer porque as fés tinham desaparecido. – disse Wakka, olhando de lado para Yuna – Mas de repente entramos e a floresta reganha a sua beleza? Coincidência?

– Sim! – interveio Rikku, imediatamente – É mesmo uma grande coincidência, não é?

– Eu queria visitar um sítio. – anunciou Tidus – Posso deixar-vos sozinhos por alguns momentos e levar a Yuna comigo?

– Eu? – perguntou ela, confusa – Onde?

– Anda. – Tidus puxou-a até àquele pequeno lago onde tinham partilhado o primeiro beijo, depois de Yuna se rebelar contra Yu Yevon.

Quando entraram lá, Yuna corou um pouco, mas os seus olhos começaram a brilhar imediatamente quando viu a vida que aquele lugar tinha perdido, de volta.

– Porque é que querias vir aqui? – perguntou Yuna, depois de Tidus largar a mão dela e mergulhar no lago.

– Porque tu estás assim. – disse Tidus, referindo-se à roupa dela – E eu estou de volta. Queria relembrar-te de que tudo o que aconteceu no passado não foi mau. Agora, anda.

– Mas…vou ficar molhada. – hesitou Yuna.

– Na altura, não te importaste. – lembrou Tidus.

– Na altura estava deprimida. – Yuna suspirou, pousou o bastão, tirou os sapatos e começou a entrar no lago em bicos de pés até Tidus a agarrar e a puxar com força – O que é que estás a fazer!?

– A acelerar o processo. – disse Tidus, vendo o cabelo dela a pingar – Quero que tudo esteja perfeito.

– Como é que tudo está perfeito!? – gritou Yuna, começando a chorar – Não está nada perfeito!

Tidus levou uma mão ao rosto dela, levantou-a e, tal como antes, beijou-a até ela parar de chorar e se acalmar. Enquanto ela limpava as lágrimas, Tidus afastou-se um bocado.

– Yuna. – chamou Tidus, fazendo com que ela olhasse para ele – Queres casar-te comigo?

Yuna abriu a boca e perdeu a cor na cara. – O que é que disseste?

– Perguntei se queres passar o resto da tua vida comigo. – explicou Tidus – Se dás-me a honra de seres a mãe dos meus futuros filhos. Se…

– Já percebi! – interrompeu Yuna, corando intensamente de uma vez só. Ela fechou os olhos e abraçou-o com força – Quero. Mas, desta vez, não podes desaparecer.

– Não vou a lado nenhum. – prometeu Tidus, abraçando-a também – Mas será que tens de te divorciar primeiro. Afinal, casaste-te com o Seymour, antes.

– Estúpido. – disse Yuna, começando a soluçar outra vez.