Alfred começou a caminhar para fora do quarto, se sentindo bem como não sentia desde a chegada ao Vale Vermelho e o encontro com Kyle, que o interceptou na porta.

—Pode sair da minha frente? –Alfred questionou.

Char viu que os olhos de Alfred brilhavam com uma leve curiosidade e diversão. A garota imaginou o quão livre ele estava se sentindo por finalmente se ver liberto do Alpha.

—Você, por servir a ela, acha que pode me dar ordens? –Kyle afrontou.

Alfred suspirou, contento a irritação que começou a crescer. Kyle sempre o irritou com seus rompantes de raiva e sua autoridade exagerada, mas o que sempre irritou Alfred, mais que qualquer outra coisa que Kyle fizesse, era a superioridade que os olhos cinza traziam e que exigiam a um Lobo que recuasse, mesmo que Kyle estivesse errado.

—Eu acho, que por você estar no meio do caminho, eu posso pedir que saia da frente. –Alfred falou com toda a calma que conseguiu reunir.

A irritação que ele estava engolindo desde o reencontro com Kyle parecia amargar sua boca.

—Essa sua pose não irá durar muito, Alfred. –Kyle decretou, dando um passo adiante e parando em frente a Alfred, que ironicamente era um pouco mais alto que o Alpha. –Assim que você se transformar e ela ver o que você realmente é, irá correr.

—Acha que irei tentar devorá-la? –Alfred se fingiu de preocupado.

—Você vai! –Ele rugiu levemente.

Alfred deu um sorriso de canto, leve e irônico.

—Sinto desapontar, mas... –Ele deu de ombros. –Esse é você, Kyle, não eu.

Kyle fechou as mãos em punho, para evitar que tremessem de raiva.

—Você é um monstro! –Provocou, sabendo que Alfred nunca gostou do que se transformava.

Alfred suspirou, a raiva parecia queimar.

Charlotte encarou a cena a sua frente e decidiu ver o que aconteceria, Alfred estava desfrutando de sua liberdade e ela bem sabia o quão o gosto podia ser provocativo, por tanto não tinha o direito de se meter.

—Todos somos, Kyle. –Alfred decidiu, encarando o homem a sua frente. –A diferença é que eu me torno um monstro somente nas Luas Cheias. –Sorriu. –Você pode dizer o mesmo? –Kyle sentiu a mão voar em direção a Alfred, agarrando seu pescoço, mas seu corpo, que estava clamando para esmurrar Alfred, começou a pesar como se fosse feito de chumbo e ele não conseguia usar sua força.

Alfred arqueou a sobrancelha de leve, sentindo a mão de Kyle em seu pescoço, mas sem conseguir apertar, como se ele só mantivesse a mão ali. O braço de Kyle tremia por todo o esforço de continuar tentando lhe enforcar, mas a mão nem mesmo mexia.

—Você tem sorte que ela está te protegendo. –Kyle rugiu por entre os dentes. –Torce pra que eu nunca te encontre longe dela!

—Não sei por que você acha que isso me assusta. –Alfred nem mesmo se mexeu. –Sabe por que você continua sendo o Alpha, Kyle? –Alfred não se importava em jogar tudo para o alto naquele momento, estava deixando a mostra à raiva que ninguém quase nunca via. –Não é por sua força ou porque os Lobos devem algo a você. –Alfred segurou o pulso de Kyle e arrancou sua mão de onde estava, sentindo a ponta das unhas arranharem de leve a pele de seu pescoço. –É porque Christopher pede que ninguém vá contra o Alpha, que apesar de tudo você protege o Vale Vermelho. –Ele soltou o pulso de Kyle, que deixou o braço cair ao lado de seu corpo, sem conseguir se controlar. –Todos respeitam Christopher, ninguém faz por você. –Deu de ombros. –O respeito que você acha ser seu, é por pedido de Christopher e porque instintivamente, todo Lobo deve recuar diante a seu Alpha. –Ele riu. –Você não tem noção de quantos Lobos querem lutar contra você.

Charlotte ficou de queixo caído com a declaração de Alfred, tão surpresa que poderia ter batido palmas como se tivesse acabado de presenciar uma peça inacreditável.

Kyle ficou sem palavras, tamanho o ódio que sentia.

Alfred olhou para Char, que o encarava extremamente surpresa.

—Se precisar de alguma coisa, estarei lá fora. –Ele avisou e ela assentiu, sem falar nada.

Alfred passou pelo lado de Kyle, que tremia dos pés a cabeça. Percebendo o quão era estranho poder falar tudo o que sempre quisera para Kyle de modo tão aberto, mas era libertador.

Charlotte encarou Kyle, sem conseguir esconder o risinho.

—Isso foi... Interessante. –Ela comentou, deixando Kyle mais irritado.

—A humilhação que ele me fez passar? –Kyle rosnou.

—Essa parte também, na verdade. –Ela riu e se ergueu.

—Como você...?

—Pode relaxar, Kyle. –Ela riu. –Você parece tão tenso.

Kyle explodiu.

—VOCÊ ACHA ISSO UMA PIADA?

—Um pouco, na verdade. –Ela deu de ombros.

—ELE ME DESRESPEITOU!

—Não sejamos tão excessivos. –Ela comentou, mantendo a voz calma, apesar da fúria de Kyle. –Você o provocou, ele revidou.

—COMO?

—Vocês homens ficam tão dispostos a se mostrarem melhores uns que os outros em situações como essa, que acabam se excedendo. –Ela sentou na cama e sorriu. –Você, o ex Alpha furioso que acha que pode mandar em sua matilha, que eles lhe devem obediência absoluta e uma vassalagem mais que absurda. –Ela deu de ombros. –Alfred, o ex submisso que finalmente pode expressar o que sente por seus abusos, simplesmente porque Alfred tem mais minha atenção que você. –Ela arqueou as sobrancelhas rapidamente. –É irônico, não é? Você achava que eu seria sua e somente sua...

—VOCÊ É MINHA!

Charlotte suspirou.

—Primeiro, vamos parar de gritar, antes que eu realmente entre nessa de ver quem tem mais autoridade, até porque nós sabemos que sou eu. –Ela esclareceu. –Segundo, eu não sou sua...

—É dele então? –Ele baixou o tom, mas o ódio estava impregnado em cada palavra.

—De quem? –Ela fingiu confusão. –Você tá falando do Alfred?

—De quem mais seria, Charlotte? –A voz do rapaz subiu uma oitava e ela riu.

—Sou tão do Alfred quanto alguém consegue prender o vento, Kyle. –Ela sorriu. –Eu não sou de ninguém, é isso que você precisa entender.

—Mas você vive com ele!

Charlotte riu novamente e se ergueu, andando até Kyle e colocando a mão no peito do homem.

—Eu posso chegar a beija-lo. –Ela sussurrou, se aproximando da boca de Kyle, que estava congelado por seu toque. –Posso dormir com ele, posso chegar a viver com ele... –Ela sorriu, muito próxima a ele. –Mas eu não sou dele. –Os olhos verdes brilharam. –Eu não tenho donos, eu não sou um objeto. –Ela se afastou.

—VOCÊ É MINHA!

—Se não sou de Alfred que compreende tudo o que quero, sou menos ainda sua! –Ela bufou.

Charlotte sentiu as mãos de Kyle lhe agarrarem os braços, quase a fazendo se encolher, tamanha força que o rapaz usara e a dor que provocou.

—VOCÊ É MINHA! E NÃO É UMA OPÇÃO!

Char franziu o cenho, sentindo o aperto nos braços ficar mais forte e a dor mais aguda, mas ela somente suspirou, começando a sentir raiva.

Kyle não somente a via como um objeto, mas achava que ela existia para seguir suas instruções, não se preocupando nenhum pouco em machuca-la para conseguir que ela ficasse. Char não sentia medo desse tipo de atitude, sentia nojo e raiva. Kyle nunca a amara e aquele gesto só indicava o quão perigoso era o que ele dizia sentir por ela.

—Você não entende, não é? –Ela questionou, com uma calma assustadora. –Não se prende ninguém, Kyle.

—EU NÃO ME IMPORTO! –Ele rugiu. –VOCÊ NÃO IRÁ MAIS A LUGAR ALGUM!

Charlotte sentiu as mãos coçarem com aquele fogo invisível que brincava em suas palmas quando ela se irritava.

—Sabe a parte divertida de toda essa estupidez que você tá causando? –Ela apoiou as duas mãos na barriga do homem e riu, apesar da dor nos braços.

—Do que você tá falando? –Exigiu, sem se preocupar com os machucados que estava lhe causando.

Char sorriu, fora algo tão desprovido de bons sentimentos que Kyle se assustou, mas antes que tivesse qualquer iniciativa, sentiu como se fogo lambesse sua pele, o queimando sem que ele conseguisse ver de onde vinha e a pior parte, sem conseguir se mexer.

A dor era excruciante e ele só conseguiu berrar. O grito de dor rasgou sua garganta.