Havia duas semanas que havíamos sido reclamadas. Já estava me acostumando com a ideia de ser uma deusa. Eu estava bem feliz com minha situação, considerando que a vida no acampamento é ótima, e eu estava namorando o Nico Di Angelo.

Eu e Gina passamos a dormir no chalé de Poseidon, com o Percy, o único semideus filho de Poseidon. Por falar no meu querido meio-irmão: nossa, a cara que ele fez quando viu os símbolos pairando sobre nossas cabeças... Pelo que ele me contou, Atena e Poseidon não se dão bem... Como explicar eu e Gina? Melhor nem perguntar.

Essas duas semanas foram ótimas! Eu treinava esgrima, fazia canoagem, escalava na Parede de Escalada, conversava com as meninas, queimava meu jantar para os deuses...

E depois do jantar, Nico sempre me levava para ver as estrelas, na beira do lago de canoagem... Ficar sentada, de mãos dadas com ele, observando o céu noturno: é um programa perfeito para mim. Ah, mas para mim, Nico é perfeito!

Ele chegou no chalé 3, surgindo do nada ao meu lado, enquanto eu lia um livro deitada na cama.

- Ah Nico! – gritei – De onde você surge? Como faz isso?

- Coisa de filho de Hades – ele deu um sorrisinho – Vamos dar uma volta?

Concordei, saímos do chalé em direção ao lago. Meu lugar preferido no CHB. Ficamos sentados e vimos o sol se por, tão lindo!

- Eu amo esse lugar – comentei, suspirando – Acho que é meu lugar preferido.

- Meu lugar preferido é onde você esteja – ele disse, virando-se para mim. Fofo!

Abracei-o, apoiando a cabeça em seu ombro. Isso foi um momento tão perfeito... Por isso, alguma coisa tinha que acontecer.

Comecei a ouvir passos . Muitos passos. Passos que pareciam ensaiados, todos ao mesmo tempo. Isso só poderia ser uma coisa: um exército.

Nico olhou para trás e murmurou:

- Ah. Meus. Deuses. – e algo que não consegui entender, acho que um palavrão em grego.

Olhei para trás e fiquei espantada: havia um exército invadindo o CHB! Notei um símbolo nos escudos dos soldados, um raio. Imediatamente entendi o significado disso, mas não queria acreditar: era um exército mandado por Zeus!

- O que está acontecendo? – gritei para Nico, o som dos passos estava muito alto, e eu podia ouvir o início de um confronto.

- Acho que nosso querido tio Zeus está nos atacando. Por causa de vocês.

Compreendi que o ‘vocês’ se referia a mim, Gina e Bella. Mas fiquei me sentindo culpada quando ele disse isso, os campistas seriam prejudicados apenas porque nós três estávamos lá! E eu nunca havia pensado nisso, mas Nico e eu somos... primos. Estranho, mas tudo bem, família dos deuses é assim.

Nico pegou sua espada de ferro estígio (nem me pergunte onde estava) e começou a lutar com um dos guerreiros. Me desesperei por um segundo, por não ter nenhuma arma em mãos, porém me lembrei que, sendo uma deusa, eu tenho poderes. Como se fosse um reflexo involuntário, joguei um jato d’água em alguns soldados que se aproximavam, fazendo com que eles caíssem.

Vi de relance alguns campistas chegando e começando a lutar. A medida que os soldados eram derrotados, mais iam chegando. “Isso não acaba?”, me perguntei, aflita. Olhei para os lados. Onde estava Nico? “Maravilha” resmunguei em pensamento “Me perdi dele!”.

Continuei combatendo os soldados que se aproximavam. Mas, para meu azar, um soldado maior, em altura e largura, veio em minha direção, carregando uma espada muito grande e com aparência pesada. Eu estava sentindo minha energia diminuir, mas podia contar apenas com meus poderes. Senti a água correndo por minhas veias e ataquei o enorme guerreiro. Ele caiu no chão, encharcado. Fugi antes que ele se levantasse.

Pude ouvir que ele me seguia. Para a minha infelicidade, tropecei em uma (maldita) pedra e cai com tudo no chão, ralando meus joelhos e braços. “Ai!”, foi meu único pensamento.

O guerreiro apareceu de repente, bem na minha frente, e me golpeou com seu escudo, acertando minha cabeça. O local do impacto doía e minha visão ficou um pouco turva. Gastei o resto de minha energia produzindo uma onda que ‘varreu’ o soldado para longe. Depois disso, vi o vulto de uma mulher de armadura completa, e desmaiei.

Acordei com o barulho de uma discussão.

- Angelina, me escute. Precisamos conversar. – ouvi a voz de uma mulher.

- Nós não temos nada para conversar. – respondeu minha irmã. Seu tom de voz mostrava irritação.

- Não fale nesse tom. – repreendeu-a um homem.

Os três falavam muito alto.

- Vocês podem parar de gritar? Vão acabar acordando a Annie! – reconheci a voz de Nico, próxima a mim. Os outros se calaram, e nesse momento Nico notou que eu havia acordado.

- Annie, como se sente? Ficou deitada por dois dias! – ele parecia preocupado.

- Ah – me sentei na cama – Estou bem. O que houve? – notei minha irmã ao meu lado, ela sorriu para mim, e na minha frente estavam uma mulher de cabelos castanhos e olhos acinzentados e um homem de cabelos escuros, barba e olhos verdes. Ambos vestiam túnicas gregas. – Quem...

O sorriso de Gina desapareceu. Ela adivinhou minha pergunta e respondeu, séria:

- Esses são Poseidon e Atena.

- Viemos conversar com vocês. – a mulher, Atena, disse.

Ficamos todos em silencio por alguns minutos, até Atena se virar para Nico:

- Sr. Di Angelo, poderia nos deixar a sós?

- Ah – ele parecia relutante – Claro. – ele saiu da enfermaria, deixando apenas eu, Gina e dois deuses, que por acaso eram nossos pais.

Atena esperou até que ele sumisse de vista, e começou:

- Minhas filhas já estão tão grandinhas! Já tem até namorados.

- Não gosto muito da parte dos namorados. – Poseidon resmungou.

Eu fiquei vermelha, mas Gina deu de ombros.

- Estão aprendendo a controlar seus poderes? – Atena perguntou.

Balancei a cabeça afirmativamente em resposta. Gina parecia não querer nem abrir a boca.

- Aqueles exército era mesmo de Zeus? – Poseidon entrou na conversa – Ele adora se meter onde não é chamado...

Olhei para Gina, sua expressão irritada demonstrava que ela não aguentava mais a conversa.

- Por que vocês agem como se nada tivesse acontecido?! – ela gritou, surpreendendo os deuses.

- O que foi? – Poseidon não sabia o que dizer.

- E você ainda pergunta? – Gina respondeu, encarando Poseidon – Vocês nos abandonaram! Ficamos 15 anos sem saber nada sobre nossa origem, e agora vocês aparecem como se isso não fosse nada!

- Isso foi uma decisão muito difícil... – Atena parecia chateada com as palavras de Gina, mas minha irmã não tinha terminado.

- Se foi tão difícil, por que tomaram essa decisão, por acaso? – agora ela encarava Atena.

- Haveriam muitos problemas se vocês fossem para o Olimpo... – Atena começou – Zeus...

- Eu estou cansada disso! Zeus sempre é um problema! Vocês não poderiam nem ter o enfrentado, admitido que tiveram duas filhas, para tentar nos proteger? Além disso, Zeus não tem toda essa moral para dizer nada, já que ele traiu Hera tantas vezes, não é? – Gina não parecia preocupada com a opinião que Zeus poderia ter sobre essa conversa, se a escutasse.

- Angelina, pare de gritar! – Poseidon estava se irritando.

- Não me chame de Angelina! E eu não vou parar até vocês me darem um bom motivo para terem nos abandonado!

- Nós não abandonamos vocês, continuamos observando e tomando conta, mas a distancia! – Atena respondeu.

O clima estava bem ruim. Terrível, para definir melhor. Eu não tinha palavras. Me levantei e fiquei ao lado da minha irmã.

- Agora estamos aqui. Ainda somos sua família, lembra? – Atena sussurrou. Poseidon parecia não saber o que dizer.

Gina encarou Atena, o rancor era visível. Percebi lágrimas se formando em seus olhos.

- A Annie e a Bella são minha família. A Sra. Russel é minha mãe, porque foi ela quem cuidou de nós, nos amou e foi amada por nós! - uma lágrima desceu pelo rosto de minha irmã. Notei que os olhos de Atena estavam úmidos.

- Annmarie, diga alguma coisa! – a deusa pediu.

Eu não sabia o que poderia dizer. Percebi que eu não havia sentido tanta mágoa, até encontrar meus pais frente a frente.

- Eu... às vezes eu me perguntava, naquele orfanato, se meus pais não me queriam, ou não podiam cuidar de mim, ou se estavam mortos. Tive medo de ter sido abandonada, por não me quererem... – eu estava sentindo um nó se formar em minha garganta, a visão ficando embaçada por causa da água em meus olhos – Eu ainda não entendo... Por que nos deixaram, se poderiam ter cuidado de nós? Zeus não é uma justificativa para tudo. – só quando disse isso, eu percebi a mágoa que eu sentia em relação a meus pais.

- Por favor, não desistam de nós... – Atena estava com os olhos marejados – Vamos fazer o melhor que pudermos...

Gina estava realmente magoada. Ela olhava para o chão, enquanto lágrimas corriam por seu rosto. Eu sentia as lágrimas por meu rosto.

- Tudo bem... – minha voz saiu rouca – Talvez, um dia, nós aprenderemos a te chamar de mãe...