Fate / Chain Reaction

Vítimas do passado: Sucessão


O grande momento chegou, eu estava sentindo as dores do parto e já me encaminhava para a sala de parto para ter o meu menino, o John parecia simplesmente perdido e o médico prevendo possíveis dramas impediu sua entrada na sala. Quase tive que ligar para o taxi eu mesma em casa e ampará-lo pois parecia que ele desmaiaria, nem parecia que ele era um tenente da aeronáutica americana.

Ainda persistia minha preocupação com a maldição, apesar de todos os exames médicos e outros mágicos, não detectei nada de anormal e tudo transcorria normalmente comigo e com a criança. As preocupações pararam quando a dor começou, mas perto do que sofri semestre passado esta era até que tolerável. Após todo meu esforço, o médico coloca meu menino nos meus braços que chorava muito, mas se acalmou quase que de imediato assim que ouviu minha voz.

— Conseguimos meu menino, seu nome será: Allan, como deseja o seu pai — beijei sua testa, para abençoar a nova vida. Talvez ele mal soubesse, mas passamos por muitos problemas para chegar até ali.

— Senhora receio que seu marido vá se atrasar um pouco pra ver a criança, ele desmaiou ao receber a notícia — disse o médico com ar de riso ao entrar na sala de parto — vamos fazer os exames de rotina no meninão? Do jeito que as coisas foram provavelmente vocês estarão em casa hoje mesmo!

Nós voltamos para nossa casa quase que perto da noite do mesmo dia, o Allan era perfeitamente saudável, pra minha felicidade. Podia ver a mansão se aproximando de dentro do carro em movimento, o John apesar de ser uma pessoa normal era detentor de muitas posses, na verdade entrou para a aeronáutica apenas para não se tornar mais um empresário na sua família. Ele comprara aquele lugar assim que chegamos nos EUA, apesar de que a vegetação não era tão bonita quando eu cheguei, mas foi ideal para instalar meus novos familiares, tanto humanos quanto insetos. As abelhas em pouco tempo revitalizaram as plantas, com seus dons que a mãe natureza conferiu. Ao descer apresentei meu filho para o lindo lago que ficava logo em frente de casa, “Bem-vindo ao lar querido”.

Aproximadamente 10 anos depois

O tempo foi passando e eu cada vez mais me sentia realizada com meu marido e meu filho, sabia que jamais me arrependeria de ter deixado o clã Vorzak, mas se havia alguma certeza esta se concretizava agora. Minha ex-família entrou para a marginalidade graças a membros como Odd Vorzak, este era um maluco que pretendia criar um exército de mortos-vivos usando abelhas como vetores de alguma espécie de maldição. Ao perceber as intenções terríveis que a família estava conduzindo para o nosso conhecimento em magia, fugi de Nova York e levei comigo a relíquia mais importante, que era o pingente da Abelha Ancestral. Na verdade isto foi um ato de muita sorte, já que logo em seguida Vorsak foi morto por um “acidente” aéreo em que seu avião explodiu sobre o oceano e os membros da família em Nova York foram mortos misteriosamente, acredito eu por obra de Magus Killer.

Mudei o meu sobrenome para Deborah, desci o país e me refugiei na Flórida, onde conheci John Robert Bean que servia próximo ao Cabo Canaveral. Nós nos conhecemos melhor e ele cobviamente ficou muito assustado com a minha condição de maga, mas não foi empecilho para que nós nos casássemos. Até então mantive relações cortadas com qualquer coisa relacionada a magos, até que se prove o contrário todos os alvos principais foram neutralizados em Nova York. Não queria que soubessem que eu era como uma sacerdotisa naquela família, aquela escolhida para guardar a maior lembrança da “musa” de toda nossa produção mágica.

Observava o pequeno Allan com agora nove anos, quase dez em poucos dias, brincando no lago. Ele tem cabelos e olhos castanho claro como os meus, seu rosto tinha traços mais arredondados novamente como eu, a única herança de John pelo visto era a teimosia.

Fui eu quem o ensinou a nadar e nós nos divertimos muito principalmente nas tardes de verão nas águas límpidas. Apesar de a contragosto de John, eu iniciei o nosso filho na magia, não sabia que tipo de problemas ele poderia enfrentar e não estaria sempre ao seu lado para poder protegê-lo; Embora fosse razoavelmente bom, eu sabia que para os homens é um pouco mais difícil controlar os familiares, pois as abelhas estão acostumadas a seguir uma rainha. Inclusive houve um incidente em que as abelhas o perseguiram por quebrar um dos ninhos, quando ele muito confiante foi tentar tirar mel diretamente da colmeia. Acho que isso deve ter gerado algum trauma ou bloqueio, pois ele tinha receio de se aproximar por alguns dias das abelhas e não conseguia ditar ordens para elas.

Mas apesar disso, Allan parecia muito promissor com as habilidades de melhoria da performance física, sendo que o peguei escalando árvores na beira do lago e planando para a água. Meu marido ficou louco e eu forcei o garoto a parar... Pelo menos enquanto papai estivesse em casa. Neste exato momento John estava sentado numa cadeira desmontável lendo um livro a beira do lago, enquanto eu estava no pequeno píer próxima ao Allan na água.

— Mãe vem nadar, a água está ótima! — Convidou jogando água.

— Calma, vou colocar um maio e já volto.

— Não precisa, mais tarde você bota pra secar!

Ri de sua proposta, eu caminhei até o começo do píer e comecei a correr até o lago, iria me jogar com tudo na água, quando na metade do caminho eu sinto um choque se espalhar por todo o meu corpo, fazendo eu cair quase de cara no chão. As imagens... Aquelas sensações malditas... Tudo voltou com a mesma intensidade por breves segundos. Sentia muita dor, não conseguia me mover, quando ouvi um baralho e vi Allan se afogando.

— SOCORRO JOHN — reuni forças para gritar. Senti a ponte vibrando com os passos largos, ele fez menção de me ajudar a levantar mas apontei para a água e ele pulou para acudir Allan que já afundara.

Eles emergiram e o menino logo retornou cuspindo a água para fora dos pulmões. Eu ainda estava no chão curvada, John nos colocou lado a lado e perguntou.

— Vocês estão bem, o que aconteceu??

— Pai está doendo, eu ouvi uns gritos na minha cabeça e de repente tudo começou a machucar — ele colocou as mãos nos olhos chorando. Eu que neste ponto estava mais recuperada, o abracei e olhei para meu marido. Seu olhar era de dúvida, mas logo em sua mente veio a fatídica lembrança e uma sombra de desespero percorreu seu rosto.

— Nós vamos ao médico... Agora! — Ordenou, ele pegou Allan no colo e me ajudou a levantar.

Sabia que nada disso adiantaria, durante estes anos eu procurei entender o que aconteceu naquela cidade, mas a única resposta que obtive foi: Guerra do Cálice Sagrado. Não me importei a princípio, só conclui que era uma grande excentricidade de altamente nociva aos que estão ao seu redor, prova disto é que aparentemente nada mudou, exceto para os cordeiros sacrificados que apenas perderam. Muito em breve possivelmente nós dois nos juntaríamos ao rebanho infeliz

Como previ o médico não soube responder o que aconteceu conosco, passamos a manhã e boa parte da tarde fazendo exames e eles não apontaram nenhum problema. Apenas o médico fez alguns curativos em pequenas escoriações que consegui com a queda, nada que eu mesma não teria cuidado. Frustrados voltamos para casa, eu já sabia o que deveria ser feito, mas antes precisava confirmar. Induzi meu menino ao sono e o levei até a estufa de flores onde ficava o apiário, coloquei-o deitado numa mesinha e tirei sua roupa deixando apenas de cueca, eu retirei minha camisa ficando apenas de sutiã. John nos acompanhou e aguardava em silêncio.

— Amigos, revelem o que está oculto! — Ordenei às abelhas que a esta hora já estavam todas recolhidas.

O enxame saiu da colmeia e desceu, cobrindo o corpo do meu filho, meu marido fez um gesto de desconforto mas não fez nada. As abelhas foram de Allan para mim, senti que elas liberaram uma pequena quantidade de secreção e logo voltaram para o seu ninho.

Coloquei minha mão sobre o corpo da ainda adormecida criança e ativei meus circuitos, o mana percorreu seu corpo por toda a secreção liberada pelas abelhas. Finalmente da metade pra baixo do seu corpo, marcas vermelho vivo e pretas apareceram, cada uma com escritas indiscerníveis, mas algumas eu reconhecia como maldições poderosas. Fiz o mesmo gesto em mim e assustadoramente recebi o mesmo resultado.

— O que quer dizer isto? — Finalmente meu marido se manifestou.

— Que a maldição está voltando.... Vejamos o padrão de crescimento — peguei uma pequena flor de um jarro e toquei as marcas, várias pétalas caíram, restando 9 — temos aproximadamente nove dias até que ela termine conosco — acariciei os cabelos de Allan com a outra mão.

— Mas não há nada que possa ser feito?? Espere, seu remédio não deveria ter dado um jeito nisso dez anos atrás?

— E ele deu, mas apenas estendeu nossa expectativa de vida por certo tempo, pelo menos era o que uma dose incompleta poderia ter feito contra uma maldição tão forte.

— Pois então faça mais! Vocês não podem morrer por causa da minha ideia estúpida de passar a lua-de-mel no Japão, justamente naquela maldita cidade!

Ele parecia já perder o controle e lágrimas corriam pelos seus olhos, eu me mantinha calma e puxei do meu bolso o pingente. John sabia que não era possível fazer mais.

— Não é sua culpa, poderia ter acontecido com qualquer um, só estávamos na hora errada e no lugar errado... — Toquei o seu rosto — temos apenas mais meia dose que completará a de dez anos atrás, eu vou dá-la ao Allan durante a cerimônia de sucessão.

— Mas querida, não há nada realmente que possamos fazer?? — Ele me abraçou, gesto que retribui e deixei as emoções aflorarem, deixando as lágrimas rolarem.

— Não querido, mas não podemos deixar que isso nos abale, depois de amanhã é o aniversário de dez anos do nosso filho, precisamos nos manter firmes para que ele ainda tenha a lembrança feliz de sua mãe pelo menos em mais um aniversário.

— Fa-farei o que for preciso, querida.

Tinha pouco tempo, precisava preparar a cerimônia de sucessão e todo material para que ele treinasse em minha ausência. Na manhã seguinte eu me levantei com dificuldade, tinha colocado um encantamento de inibição de dor e de falso sono na noite passada em Allan, para que ele não sentisse os pesares da maldição, mas não podia me dar o luxo do mesmo. Fui até a igreja mais próxima, pois lá estava um dos únicos poucos aliados: meu tio Claus.

Ele já era de idade avançada, mas era um dos que desertou da família mais cedo, casou e quando ficou viúvo se converteu à igreja. Não conseguiu grande prestígio pois não herdou a magia da família, mas era profundo conhecedor das práticas da família, principalmente do ramo mais puro que era o meu. Por suas habilidades limitadas ele conseguiu apenas dirigir uma pequena igreja, mas que sentia profundo orgulho e satisfação.

Claus estava sentado acompanhado, possivelmente descansando depois da missa matutina. Ele se virou ao sentir minha presença e me cumprimentou com um abraço.

— O que trás você aqui, minha sobrinha? — Mais de perto pude ver ele conversando com uma menina morena de cabelos negros e vestidinho azul-claro, ela segurava uma boneca. Conhecida pelos olhos verdes vivos.

— Tio, vim me confessar — usei a desculpa para ficar a sós com ele — olá Olivia, como vai?

— Vou bem tia — ela na verdade era neta de Claus, logo minha prima-sobrinha — cadê o Allan?

— Ele não veio querida, mas você vai no aniversário dele amanhã, não?

— Vou sim, vai ter bolo?

— Vai sim querida, agora pode nos dar licença? — Sorri diante da doçura da menina.

— Até mais vô, tia — fazendo uma reverencia com a saia e se retirando.

Sem mais delongas, expliquei a minha situação, Claus ficou estarrecido e até tentou alguns rituais de exorcismo, tudo em vão. Expliquei então que precisava que ele olhasse o Allen de vez em quando, como tutor de seu treinamento. Ele relutou, mas acabou aceitando.

No dia seguinte

— Querido apague as velas e faça um pedido!

Ele obedeceu e fechou os olhos. A festa foi ótima, com tudo que havia direito, os avós paternos do Allan vieram, muito elegantes, o padre e o pai de Olivia também. Estouramos piñatas com outras crianças da escola de Allan, outras brincadeiras, karaokê e comemos muitas porcarias! Claro que as crianças pareciam que estavam com a hiperatividade a mil, estava difícil acompanhar o pique. John cumpriu sua promessa, apesar de saber que ele chorava escondido.

Nós nos despedimos dos convidados quando a festa se encerrou e eu fui com o aniversariante até o píer, onde nos sentamos e ele ficou atirando pedrinhas na água.

— Mãe, você acha que se eu te contar o meu desejo ele não vai se realizar?

— O que vai realizá-lo é o que você fará a respeito, pode falar.

— Eu quis que nós: eu, você e o papai, pudéssemos viver pra sempre juntos aqui... Felizes.

Apenas ri e o abracei de lado, mas deixei uma pequena lágrima rolar.

7 dias depois

O prazo enfim chegou ao fim, conforme minhas projeções, a maldição avançou meticulosamente dentro do prazo. Eu estava na estufa sentada, olhando as flores e algumas abelhas fazendo seu trabalho, a dor era lancinante e os gritos também. Mas, apesar de tudo, eu tinha um sentimento de paz dentro de mim, que silenciava tudo isso, deve ser assim quando um moribundo está para morrer.

Pedi para John trazer Allan até aqui e aguardar lá fora, minha despedida do meu marido foi extremamente dolorosa mais cedo, mas eu precisava ser forte, meu filho precisava me ver forte antes que eu me fosse!

— O que foi mãe? — Ele entrou meio emburrado, possivelmente estava assistindo desenhos.

— Filho, eu queria te dar uma coisa, mas primeiro eu preciso que fazer uma coisa com você.

— O que mãe?

— Chegue mais perto.

Ele se aproximou e eu toquei a sua cabeça com as mãos nas laterais, provavelmente ele não estava sentindo nada, mas a maldição também devia estar no ápice nele.

— A partir deste momento, eu, Eva Deborah Bean, passo minha herança para Allan Deborah Bean!

As abelhas zumbiram forte de onde estavam, pude ver pela primeira vez os circuitos mágicos do meu filho se enchendo de mana cor amarelo brilhante: marcas de losangos nas costas que irradiavam linhas que iam até os braços e membros inferiores, círculos rodeavam os pulsos até o antebraço e alguns pontos das pernas. Beijei a sua testa e um pequeno hexágono se formou, "Esta é tua coroa, teu símbolo como sacerdote da Anthophila Ancestral".

Transpassado de geração em geração, a Coroa do Sacerdote é um Magic Crest da família cujo ultimo nome conhecido foi Vorzak, mas apenas para os membros que poderiam ser considerados dignos a honrar o conhecimento antigo. Normalmente passa de mãe para filha, raramente sendo ostentada por um homem.

Mesmo que ele achasse tudo aquilo muito bonito como um show de luzes, por outro lado eu fiquei emocionada... Ele era tão pequeno e jovem ainda. Os circuitos dele desativaram então, marcando o fim da transição.

— Tome filho, este é o seu presente — entreguei o pingente para ele — você deve ordenar "Liberar" e beber o conteúdo.

— É amargo mãe? — Perguntou fazendo uma careta.

— É geleia real filho, as abelhas também fazem e tem um gosto meio forte diferente do mel, mas esta veio da Abelha Ancestral, um ser muito importante pra nossa família, garanto que o gosto vai ser a última coisa que você vai notar.

— Abelha Ancestral? Aquela das histórias que você contava quando eu ia dormir? Que te ajudou a fugir do Incêndio de Fuyuki?

— Essa mesma, agora beba.

Ele cerrou os olhos observando o pigente e respirou profundamente — Liberar — a tampa tal qual comigo respondeu a sua ordem, liberando o lacre e abrindo. Apesar do sucesso ele parecia exitante, ele sempre enrolou para tomar remédios, mas bebeu todo o conteúdo de olhos fechados. Ele tremeu um pouco e pude assistir de outra perspectiva que não tive dez anos atrás: As marcas de maldição vermelho sangue que já assustadoramente chegavam a sua cabeça (invisíveis naturalmente), foram reveladas e converteram para dourado, trincando em seguida como craquelê e desaparecendo. O processo iniciado na gestação agora foi completado.

O abracei e chorei, não porque a dor estivesse no seu ápice e eu fosse desfalecer em breve, mas porque cumpri meu objetivo como mãe. O retive confuso em meus braços e John entrou pra me amparar também.

— Quero que vocês cuidem um do outro, por favor Allan obedeça seu pai e ouça o seu tio-avô, eles vão cuidar de você daqui em diante...

As abelhas estavam silenciosas. A maldição completou seu trabalhou em mim, mas minha mente não mais podia ser afetada, mesmo pelo Todo o Mal Deste Mundo.