“Com uma gota, vive-se dez anos. Com um gole, mais cem anos! Se beber tudo, vive-se para sempre!”

Foram essas as primeiras palavras que ouvi de Ban, a Raposa do Pecado da Ganância, ou simplesmente Ban. Ao subir o monte atrás da Fonte da Juventude, ele pretendia roubá-la e destruir a Floresta Mágica consigo. Mas eu estava errada quanto as suas intenções..

Pensando que Ban era apenas um bandido qualquer atrás de poder sem limites, eu o repeli da montanha, jogando-o ladeira abaixo. Porém, a Floresta o estava ajudando: conseguiu sobreviver à queda e escalar novamente sem maiores problemas. Ele subiu e me encarou com olhos de raposa, insaciáveis.

—Não o deixarei destruir meu lar!- gritei, preparando-me para a luta.

Ban continou com aquela expressão, suavizando-a ao poucos, como se percebesse algo de diferente. Despreocupado, inclinou a cabeça para o lado e, notei, pela primeira vez, o quão bonito ele era.

—Destruir seu lar? Eu só desejo o poder da Fonte.- E permaneceu me encarando como se eu fosse uma amiga próxima.

—Bandido! Não sabe que a Fonte é o que mantém a Floresta intacta?!

Ele piscou, sem alterar a pose despreocupada.

—Não sabia... Bom, então vou ter que esquecer de vez a imortalidade.

O patife virou de costas para mim e começou a caminhar para longe da Fonte. Não podia acreditar! Ele simplesmente achava que seria enganada de modo tão banal?

—Ei! Não acredito em você!

Ele parou onde estava, com um pé equilibrado no ar. Acreditando que iria lutar, me joguei para o lado e observei suas ações. Contudo, Ban virou apenas uma parte do rosto em minha direção e sorriu largamente.

—Qual o seu nome?

Me endireitei e fiz uma pose autoritária, ainda desconfiando.

—Elaine.

—Muito bem. Estou indo, Elaine- Ele pronunciou meu nome de uma forma tão carinhosa... Nem parecia com um humano maligno.

Dessa vez, ele pulou até um arbusto próximo e se foi. Essa não seria a última vez em que o veria.

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Todos os dias, ele vinha me visitar, e parecia que havia largado de vez a Fonte da Juventude. Ele disse que sabia qual seria o destino da Floresta, então, abriria mão de sua ganância. Suas ações eram muito diferentes de vários humanos malucos que vinham atrás de mim para me derrotar e conseguir luxo e poder. Quero dizer, Ban era humano, mas sua essência era tão... pura

Mal percebi que já estava apaixonada. Deitava o dia inteiro, esperando o momento da chegada de Ban com enorme alegria. Ele me trazia flores, sempre aquelas cujas cores pareciam vívidas. Perguntava como as conseguia, e ele sempre dava a mesma resposta: Não sei. Eu as encontro na Floresta somente quando estou feliz.

Um dia, fiquei observando as flores e não o percebi chegar. Ban caminhou silenciosamente entre os arbustos, com a graça e destreza de uma verdadeira raposa selvagem. Ele circundou a Fonte e limpou a garganta. Pulei com o susto e me agarrei com todas forças na árvore mais próxima.

-O que está fazendo?! Podia só me avisar que chegou.

-Mas assim não tem graça- Sua voz estava mais mansa que o normal.

Ele me encarou em uma expressão maliciosa e fingiu esticar a mão para pegar o Cálice da Fonte, na tentativa de me irritar.

—Eu sei que você nunca faria isso- Disse num tom sarcástico.

Porém, minha confiança nele estava caindo drasticamente. Ao perceber que seu plano estava funcionando, ele fez um rápido movimento com o braço e agarrou o Cálice, sempre me observando para saber como eu reagiria. Estava blefando, pensei.

—Ei, você está conseguindo me irritar mesmo.

Andei em passadas largas até Ban, cuja pose estava intacta. Parei em frente a ele e ergui o rosto para encará-lo: era muito alto, tinha 2 metros e pouco.

Ele passou os olhos entre mim e o líquido contido no Cálice. Comecei a flutuar e subi, até ficar cara a cara com ele. Seus olhos sempre demonstravam calma.

—Ban!

Ele sorriu, sabendo reconhecer uma derrota. Pôs o cálice, com muita cautela, em seu devido lugar na Fonte. Ele endireitou-se e voltou a me olhar, com os olhos de raposa vidrados nos meus de fada. Por um longo momento, senti uma vontade irresistível de beijá-lo. Porém, quem a realizou primeiro foi Ban.

Nossos lábios se tocaram quase que instantaneamente, e pude sentir a real essência daquele humano gentil. Ele me puxou para mais perto, não sendo mais necessário flutuar. Ficamos assim, abraçados, como se nada mais importasse nesse mundo. Mesmo que uma bomba caísse ou que a Floresta inteira fosse devastada, sabia que teria Ban ao meu lado.

Levantei a cabeça para ele e sorri como uma boba.

—Você é mesmo humano? Não se parece em nada com os outros.

Levemente surpreso, ele preferiu me beijar de novo ao invés de me responder. Claro, eu não me importei nem um pouco. Ele tocou gentilmente em meu longo cabelo, fazendo nozinhos com as pontas dos dedos. Toquei com as duas mãos o seu tórax definido, me perguntando sombriamente quais exercícios ele fazia para manter-se em forma.

Passamos a noite juntos, deitados próximos à Fonte observando o pôr do sol. Pela primeira vez em anos, após a partida de Arlequin, sentia-me verdadeiramente feliz. Não podia nem ao menos sonhar que aquela seria nossa última lembrança antes da chegada do demônio.

Foi o dia em que o Demônio trouxe o Caos. Eu e Ban estávamos morrendo, mas ele implorou para que quem bebesse do Cálice fosse eu. Arrastei-me até a Fonte e entreguei o líquido da juventude através de um beijo. Meus lábios tocaram os de Ban e ele, enfim, conseguiu a imortalidade.

Já na Necrópole, as pessoas me perguntaram o porquê eu optei por morrer e deixar a Floresta devastada. Ergui o queixo para o céu e respondi, sem hesitar.

—Eu sei que Ban cuidará da Floresta.

Essa não era a resposta completa. No fundo da minha alma, é onde se encontrava o final.

Ban tem um bom coração. Isso é o que o difere de todos os humanos de má intenção. Além disso, ele revogou os seus sonhos e desejos para proteger quem ama, apesar de ser o pecado da Ganância. Sei que ele continuará os planos das pessoas de boa índole.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.