CAPÍTULO50

- Nasceu, cambada, nosso irmão nasceu! - anunciava Palhoça para a
casa toda ouvir; Jaraguá e Joinville saíram de seus quartos, de pijama e
juntaram-se a ela no corredor. Nada mais precisou ser dito, o abraço
coletivo entre as três irmãs foi o suficiente.
- Doutora - perguntou Blumenau aflita ao colocar os olhos em Ana
Luísa -, como estão as coisas?
A médica pôs-se a explicar, pausadamente:
— Bem, Blumenau, o parto transcorreu sem nenhum problema, sua mãe está
bem; mas o bebê nasceu com o peso muito baixo, teve complicações
respiratórias, teve que ser internado na UTI neonatal aqui do hospital!
Eu não quero alarmar vocês, mas eu preciso deixá-las a par do que está
acontecendo; o quadro é delicado!
— Doutora - perguntou Lages, desolada -, a senhora está querendo dizer
que o bebê corre perigo de vida?
— É cedo pra dizer qualquer coisa; agora nós temos que esperar as
próximas quarenta e oito horas, e principalmente, evitar que ele venha a
contrair qualquer tipo de infecção!
São José não soube dizer por quanto tempo ficou ali, olhando seu
filho através do vidro; não queria acreditar, de alguma forma, o pai de
família se culpava pelo que aconteceu. Pensava em Florianópolis,
imaginava o quanto foi difícil pra ela ouvir as provocações de Criciúma;
de alguma forma, ele era culpado sim:
— Se acontecer alguma coisa com o meu filho eu não vou me perdoar,
filha! - desabafava São José com Blumenau; ela agora estava ali, olhando
o irmão:
— A gente precisa ter fé, pai! Ele nasceu muito pequenininho, teve
problemas como a doutora explicou mas isso não significa que...
— Eu me sinto culpado, Blumenau! Criciúma não tinha nada que ter ido lá
afrontar a sua mãe!
— Ela esteve lá em casa?
— Esteve; sua mãe colocou ela pra fora com as próprias mãos; ela apanhou
da sua mãe, literalmente!
— Eu não sabia disso, pai!
A notícia do que estava acontecendo com o pequeno São Joaquim logo
se espalhou; através da amiga Camila, Chapecó acabou sabendo o que
aconteceu e não teve dúvidas. Na manhã seguinte, passou pela casa de
Joinville antes de ir pro trabalho:
— Eu não podia deixar de vir - dizia a engenheira ao pé do ouvido da
amada, que sem dizer nada, aproveitava ao máximo o conforto do abraço
dela -, pelos seus pais que nesse tempo acabaram se tornando meus,
pelas suas irmãs, e principalmente por sua causa; você não saiu do meu
pensamento a noite toda!
— Obrigada; é bom saber que você está aqui!
— O que aconteceu?
— Ela saiu de casa ontem no começo da noite, sentindo as dores, foi pro
hospital, ele nasceu já era muito tarde!
— Você já viu sua mãe?
— Não, ainda não! Eu estava indo agora pro hospital pra ver como estão
as coisas!
— Eu te deixo lá se você quiser!
— Se você puder fazer isso, já vai me ajudar muito!
As duas conversaram o tempo todo abraçadas na porta da cozinha; Chapecó
deixaria Joinville no hospital e iria trabalhar em seguida.
Durante os dias que se seguiram, Florianópolis recebeu muitas
visitas, muito amor, muitos abraços; era muito querida por todo mundo
que a conhecia. Brusque, a mãe de seu genro, fez questão de ir até o
hospital quando soube do acontecido; viu o bebê pelo vidro, conversou
com Florianópolis, foi solidária como poucas vezes conseguiu ser em sua
vida. São Joaquim continuava internado na UTI, seu quadro era grave mas
havia muita esperança; ele ainda precisava ganhar peso para poder ter
alta.
Alguns colegas de universidade de Blumenau e Joinville também
estiveram com elas; bem como alguns colegas de escola das duas mais
novas. Jaraguá pôde contar com o namorado o tempo todo; era ele quem
sorria e comemorava com ela quando as notícias eram boas, era ele quem
lhe enxugava as lágrimas quando as coisas não davam tão certo.
São Joaquim realmente era um guerreiro; suas primeiras quarenta e
oito horas de vida correram bem, sem nenhum problema; o pequeno foi aos
poucos se recuperando, ganhando peso, e depois de alguns dias de vida do
menino, São José e Florianópolis puderam entrar e ver seu filho de
perto.
Ele era lindo, uma perfeita mistura dos dois:
— Quando será que eu vou poder levar ele pra casa? - murmurou
Florianópolis ao lado do ex-marido, junto à o leito de seu pequeno:
— Logo logo a gente sai daqui com ele! Eu tenho certeza que ele vai sair
daqui logo, Deus não vai dizer não pra gente!
— Ele é perfeitinho; o nosso filho homem, o homenzinho da casa!
— Florianópolis, eu quero te pedir desculpas; Criciúma não tinha nada
que ter ido te afrontar naquele dia...
— Vamos esquecer isso; o importante é que nosso filho está bem, está
ganhando peso, logo logo ele vai pra casa!
São Joaquim permaneceu internado durante um mês; e todos os dias,
seus pais iam até o hospital no horário de visitas. No dia em que o pequeno recebeu alta, suas
irmãs arrumaram toda a casa para sua chegada. Foi uma verdadeira festa;
Jaraguá, Palhoça, Joinville e Blumenau tornaram-se as melhores irmãs
mais velhas do mundo, fazendo questão de ajudar a mãe com o bebê.
- Confesso que na hora que eu percebi, meu mundo desabou! - dizia
Chapecó para a amiga Camila; as duas estavam no carro indo para o super
mercado. A enfermeira dirigia com atenção, sem deixar de ouvi-la:
— Mas a gente conversou tanto sobre isso, minha amiga; a doutora Ana
falou que podia não dar certo na primeira tentativa!
— É, realmente, nós conversamos, a doutora me deixou bem claro que podia
não dar certo assim, de primeira! Mas eu tinha esperanças de conseguir,
eu tinha esperanças de conseguir engravidar na primeira tentativa!
— Só que tem que continuar tentando, Chapecó; não foi dessa vez, pode
ser na próxima! E Joinville, como está?
— A gente conversa de vez em quando; eu não posso ficar longe dela, mas
eu sei que eu preciso resolver a minha situação com Itajaí antes de
qualquer coisa!
— Você chegou a conversar com Itajaí?
— Conversei! Fui no apartamento dela, deixei bem claro que não existe a
menor possibilidade da gente reatar, falei que eu amo Joinville mas
Itajaí nunca foi de se acovardar; ela não vai descansar enquanto não
conseguir destruir a minha vida!
— E o que é que ela ganha com isso?
— Não sei, Cami! Mas Joinville também não está bem, eu sei que ela está
sofrendo assim como eu!
E a vida seguia; enquanto Florianópolis vivia a alegria de estar com
seu pequeno em casa, Chapecó sofria com a falta de Joinville, a obsessão
de Itajaí, e como se tudo isso não fosse suficiente, ela não conseguiu
engravidar naquele primeiro mês de tratamento. Sabia que com a
inseminação artificial, como no método natural, poderia não conseguir na primeira
tentativa; mas se sentiu frustrada.
Joinville se inclinou junto a o bercinho de seu irmão e ficou ali
por bastante tempo, olhando para ele; São Joaquim, ainda bebê, não fazia
ideia do quanto era amado pela família, dormia tranquilo.
Florianópolis entrou no quarto silenciosa, ali estavam dois de seus
filhos:
— A gente era calma assim como ele? - perguntou Joinville, sorrindo de
leve para a mãe:
— Você e Jaraguá eram um poço de tranquilidade, só choravam mesmo quando
batia a fome; Blumenau sempre foi geniosa, mesmo quando era recêm
nascida; e Palhoça, essa sempre foi travessa, levada como ela só! Mas
era calma também, fazia serenata de vez em quando até altas horas, mas
era tranquila!
Mãe e filha se sentaram na cama:
— Ah, mãe! As vezes parece que a minha vida está toda errada!
— Você fala isso por causa de Chapecó?
— Não só por isso! A gente fez planos, estava-mos procurando
apartamento, meu pai saiu de casa, sei lá, parece que de uma hora pra
outra virou tudo do avesso!
— Mas a gente precisa ficar forte, meu amor, e principalmente, se
adaptar às mudanças que a vida prega na gente de vez em quando! Seu pai
fez a escolha dele, e vai continuar sendo seu pai independente disso;
cabe a nós saber lidar com isso, com essas escolhas, com essas mudanças!
O pequeno chorou no berço e Joinville se incarregou de pegá-lo no
colo; tinha jeito pra coisa, e enquanto ela acalmava o irmão,
Florianópolis permaneceu como estava, sentada, observando sua filha:
— Você leva jeito! - comentou a mãe, comovida:
— Ele está se acalmando, mãe; os bebês, principalmente os prematuros
como ele, precisam sentir o aconchego do colo da gente pra se sentirem
seguros; eu li isso em algum lugar!
Não estava nada fácil para Chapecó encarar o afastamento de
Joinville; jamais imaginou que o fim de um relacionamento lhe traria
tanta saudade e tanto sofrimento.
Em uma sexta feira a noite, Camila e Ana Luísa bateram na porta do
apartamento da engenheira. Nada havia sido combinado, mas as três
acabaram pedindo uma pizza, a dona da casa colocou um vinho no gelo e
estava tudo pronto.
De vez em quando, Chapecó dava uma olhadinha discreta no celular como se
esperasse por um sinal, uma mensagem, um boa noite que fosse:
— Você sente falta dela, né, amiga? - deduziu Camila:
— Muito - respondeu Chapecó soltando o celular e voltando a pegar a taça
de vinho -, vocês não sabem o quanto!
— Mas o que foi que aconteceu a final? - perguntou calmamente Ana Luísa:
— Ana - explicou a engenheira -, Jaraguá foi atropelada a alguns dias
atrás, foi pro hospital, e na hora do acidente ela estava com o namorado
e o garoto viu quem estava dirigindo! Pela descrição dele era Itajaí;
Joinville decidiu se afastar de mim por insegurança, ela disse que me
deixaria livre pra resolver a minha situação com aquela desequilibrada
que poderia ter matado a irmã dela! Mas eu não tiro a razão dela,
meninas; ela é completamente apaixonada pela família, acho que no lugar
dela eu faria a mesma coisa!
Naquela noite, as três jovens ficaram conversando até as duas da
manhã; tudo o que Chapecó não queria era ficar sozinha no apartamento,
seu coração implorava para que as duas amigas não fossem embora. Mas
elas tinham que ir.