Esmeraldas

Bafo de Cadaver


Eu me encostei-me em uma das colunas da varanda. Ela ainda não tinha me visto, estava na penteadeira arrumando o cabelo.


- Minha nossa! - ela gritou quando me viu - Por que ainda está por aqui? Achei que tinha dito para você se mandar.


- Não acha que já é um pouco tarde para sair, Suzannah? – eu disse tentando parecer que a converça não tivera começado agora.


- Hmm – ela fez, tirando o capuz. - Olha só, sem querer ofender, Jesse, mas isto aqui é o meu quarto. Que tal você tentar se mandar? E que tal deixar que eu cuide da minha vida?


Eu nem me mexi. Eu queria respostas não perguntas...


- Sua mãe não vai gostar de saber que você está saindo tão tarde da noite.


- Minha mãe? - E ficou olhando para pra mim, lá em baixo, pois era surpreendentemente baixa para alguém que está viva, perto de mim ela parecia uma anã - Que é que você sabe da minha mãe?


-Gosto muito da sua mãe - disse calmamente. - É uma boa mulher. Você tem muita sorte de ter uma mãe que a ame tanto. Acho que ela ficaria muito preocupada em ver que você está se expondo ao perigo.


- Tudo bem. Segura esta agora, Jesse. Há muito tempo eu saio de noite e minha mãe nunca disse uma palavra so­bre isto. Ela sabe perfeitamente que eu sei cuidar de mim.


Se a mentira fosse proibida com a tal da droga aposto que ela já deveria estar presa e por tempo indeterminado...


Mesmo estando morto eu não fico por fora das novidades. Eu sabia onde ela estava indo mesmo que tenha ficado o dia inteiro no mar eu meio que fiquei ‘antenado’ no que estava acontecendo com Suzannah, e deixe-me dizer: Não foi um dia muito agradável...


- Sabe mesmo? – eu perguntei, erguendo dubitativamente uma das sobrancelhas. Não pude deixar de perceber que ela ficava olhando para uma das minhas sobrancelhas com certeza ela olhava a cicatriz pequena que tinha em uma delas. Dei um risinho de satisfação e disse: - Acho que não sabe não, hermosa. Não neste caso.


Ela levantou as duas mãos para cima.


- OK. Para começo de conversa: não fale comigo em es­panhol. Número dois: você nem sabe onde eu estou indo, de modo que sugiro que largue do meu pé.


- Mas eu sei perfeitamente onde você está indo, Suzannah. Você está indo para o colégio para tentar falar com aquela garota que está tentando matar o rapaz, aque­le de que você parece estar... Gostando. Mas estou lhe avisando, hermosa, você não agüenta com ela sozinha. Se tiver mesmo de ir, devia levar o padre com você.


Falei devagar para que ela entendesse. Finalmente eu achei uma palavra que a descrevesse perfeitamente: Hermosa.


- O quê? Como pode estar sabendo de tudo isso? Por acaso você está... Perseguindo-me?


Eu provavelmente não devia ter dito aquilo. Fiquei ereto, não que aquela posição me incomodasse.


- Não sei o que significa esta palavra, perseguindo. Só sei que você está se expondo ao perigo.


- Você anda me seguindo - insistiu, apontando para mim um dedo acusador. - Vai dizer que não anda? Tenha dó, Jesse, eu já tenho um irmão mais velho, não preciso de outro não. Não preciso que ande por aí me espionando...


- Oh, claro - disse, com todo sarcasmo. - Esse irmão cuida muito bem de você. Quase tão bem quanto cuida do próprio sono.


- Espera aí! - exclamou, saindo em defesa do irmão, contra todas as probabilidades. - Ele trabalha de noite, está sabendo? Está economizando para comprar um Camaro!


Viz um gesto grosero e falei novamente:


- Você não vai a lugar nenhum.


Ah, é mesmo? – desafiou-me, rodando no calcanhar e saindo porta afora. - Tente me segurar, bafo de cadáver.


Quando ela colocou a mão na maçaneta eu usei minha força mental e fechei o trinco. Ela ficou parada olhando a maçaneta tentando absover o que acabara de acontecer. Quando se deu conta respirou fundo duas vezes e provavelmente estava contando metalmente até dez. Ficava virando a maçaneta como se ainda não tivesse entendido completamente.Respirar fundo parece ter ajudado pois logo depois ela disse:


- OK - disse, voltando-se. - Jesse, isto não é nada legal.


Fiquei sem graça. Eu não queria que ela fosse, mas também não queria que ela ficasse triste ou nervosa.


- Eu não posso... – eu disse, agora eu estava bem na frente dela - Suzannah, não vá. Essa mulher... essa garota, a Heather, não é como os outros espíritos que você pode ter encontrado. Ela está cheia de ódio. Se puder, vai matá-la.


E com toda a certeza eu não queria ver o fantasma de Suzannah rondando por ai como eu. Ela iria ser como eu se ela morrese, sem o calor do corpo, palida, e os olhos iriam perder o brilho perfeito...


Ela sorriu tentando me encorajar.


- Aí mesmo é que eu devo acabar com ela, não? Vamos lá, abra a porta.


Eu hesitei. “talvez eu devesse abrir a porta”, ficava pensando. Mas eu fiquei parado, sem graça, mas firme.


- Como quiser - disse, e me contornou, caminhando direto para a janela.


Botou um pé no assento que o Andy havia feito e levantou a persiana da janela. Já estava com uma perna passando sobre o peitoril quando agarrei o pulso dela com força o suficiente para faze-la parar.


- Suzannah...


Ela ficou olhando a minha mão em seu pulso. Eu queria terminar a frase dizendo quenão queria a ver rondando por ai como um fantasma e que ela tinha um futuro longo pela frente, mas não o fiz, só fiquei parado olhando ela. Eu olhei o que ela estava olhando só ai me lembrei que tinha agarrado o seu pulso. Soltei-o subtamente, agora minha mão estava latejando, novamente eu tinha me queimado com a quentura de seu corpo.


Ela desceu a varanda e pulou do telhado aterrisando na terra macia. Espera. Ela tinha me chamado de Bafo de cadaver?


Magoado fui me desmaterializando...