Era Uma Vez... Uma Ilusão

38. Dizem que há uma linha bem tênue entre o amor e o ódio.


22|05|1809 Lobau, Viena

O caos da guerra instaura-se nas vilas de Aspern e Eßling. Tiros de baionetas e explosões de canhões ecoam por toda a região próxima, principalmente à medida que a derrota austríaca torna-se cada vez mais inevitável.

Os franceses são ferozes, seus generais, implacáveis; defendem sua posição com a força de um leão. Tanto que o próprio imperador infringe uma ofensiva contra os austríacos, sendo apoiado tanto pela cavalaria quanto pela artilharia.

As linhas austríacas são gradativamente rompidas; a unidade do exército ser ameaçada... Os generais austríacos até tentam se manter firmes; impedir o avanço francês e mantê-los longe da margem norte do Danúbio. Mas parece impossível...

Uma nova derrota parece iminente... Até que o arquiduque Karl toma corajosamente a frente de suas vacilantes tropas e avança com os granadeiros da reserva rumo ao campo de batalha. O resultado é um feroz combate entre as artilharias, onde o general francês Saint-Hilaire acaba mortalmente ferido.

Eßling, porém, continua sendo ferozmente controlada pelos franceses, contribuindo assim para a resistência do cada vez mais cansado exército francês. Mas as forças de Bonaparte não resistirão para sempre. É necessário ajuda...! Mas ela nunca chega...

Quando o sol começa a se pôr, Bonaparte não encontra-se apenas sem reforços, mas também sem o general Pouzet — decapitado por uma bala de canhão — e o marechal Lannes, que não sobreviverá muito tempo sem a perna.

Tudo torna-se tão desastroso, principalmente com a tomada de Eßling pelos austríacos, que Bonaparte ordena a suspensão do ataque e uma retirada para o outro lado do Danúbio assim que o sol se põe.

Pode parecer surpreendente, quase inacreditável, é inacreditável, mas os austríacos ganharam a batalha. Napoleão Bonaparte foi finalmente derrotado numa batalha.

*****

Junho|1809 Oldenburg House, Londres

Colocando chá, chocolate quente e bolos numa mesa, os criados fazem uma mesura e deixam a sala de visitas. E o silêncio instaura-se quase absoluto, sendo quebrado apenas por Cathrine ao piano. Isso enquanto cinco das damas de companhia encaram fixamente as três "alemãs".

— Será pecado se alegrar com a morte de alguém? — questiona jocosamente Lady Paston, servindo o chá para as amigas.

— Se esse alguém é o usurpador torna-se até próprio — Aceitando o chá, Lady Cavenbush bebe um gole e suspira. — Pena que nenhuma bala o atingiu.

— O que seria pior, hein? — As damas voltam-se à viscondessa Chartents, que zomba: — Um imperador pigmeu ou um imperador aleijado?

E as cinco caem na risada, deixando as alemãs completamente horrorizadas. Elas zombam não apenas do usurpador, mas também de quatro homens mortos! Uma mulher foi deixada viúva e crianças órfãs! Mas faz parte da natureza britânica.

— Devemos focar na vitória, não no fato do usurpador continuar vivo. — Cathrine intervém no assunto, embora focando apenas no piano. — Napoleão Bonaparte não é tão invencível assim e Aspern-Essling é a prova disso.

Ninguém é invencível e, após anos vencendo, o usurpador finalmente teve o gostinho amargo da derrota. Uma definitiva? Não. A guerra continua e os desprazeres da vida de Cathrine também. Ela começa a sonata para piano n⁰ 34 de Haydn:

— É uma vitória alegre! — a baronesa von Frieden comenta, sorrindo para Cathrine — Enche nossos corações de esperança!

— Embora seja apenas uma vitória. — As alemãs franzem o cenho para Lady Wilmington, que bebe do chá. — Não acho que os austríacos aguentarão sozinhos por muito tempo.

— Não que os britânicos estejam melhores — a baronesa Gabriele von Eden retruca, tornando-se o foco da ofensa britânica. — Além da Península Ibérica, estão em guerra com a Rússia e a Dina...

Errando propositalmente uma nota, Cathrine cala a von Eden mais jovem, que, como todas as damas, faz uma dolorosa careta. A Guerra das Canhoneiras é um assunto vetado na frente dela e Cathrine não terá pena alguma de castigar quem ousar mencioná-la!

— Lady Carlisle mandou notícias? — Forçando alguma preocupação, Cathrine deixa o piano e aproxima-se do chá. — Fiquei tão preocupada com o mal-estar dela ontem.

— Deve ser preocupação — responde Lady Newport, ousando servir-se com chocolate quente. — Nenhuma mãe gosta de ver um filho indo para a guerra.

Principalmente quando esse filho é o jovem, galante e bonito Frederick Howard; o pobrezinho vai lutar na Península Ibérica. Esse assunto é o bastante para fazer o silêncio se instaurar na sala, tal como é bom e agradável.

O príncipe e seus ministros estão reunidos numa outra sala, discutindo assuntos de Estados, então que as anfitriãs deles tenham alguma paz... Mas nem todas elas apreciam o silêncio como Cathrine.

— Meu primeiro marido morreu em Hohenlinden. — Cathrine, bem como as outras, franze o cenho para a Sra. Karinberg, que suspira. — Bem... será que o príncipe já aceitou a revolta?

E a atenção volta-se a Cathrine, que sorri e simplesmente bebe do seu chocolate quente. Ela ouviu Richard e Robert discutindo sobre o assunto, foi pouco depois do batismo de Sophia Karolina, mas... pouco importa. A verdadeira questão é: qual será o argumento deles?

*****

— O levante contra a ocupação bávara já começou, e não apenas no Tirol, mas também em Vorarlberg — o barão von Frieden declara, sorrindo como se fosse óbvio. — É o momento que esperávamos, meu príncipe!

Os ministros olham com expectativa para Richard, cujo silêncio é brutal. Já faz dois anos que Niedersieg foi anexado pela Baviera e, naturalmente, esses homens esperam uma ação mais... militar. Porém... Richard apóia-se na cadeira e suspira.

— Lembremos que Viena foi ocupada pelos franceses. — Isso antes mesmo de Aspern-Essling. Os ministros se entreolham confusamente, fazendo Richard acrescentar: — O usurpador está a um pulo de Niedersieg, cavalheiros.

— Mas está ocupado demais com os austríacos — von Eden responde, recebendo assentimentos dos outros. — Isso sem contar nas inúmeras tropas francesas enviadas para a Espanha e Portugal.

— O desejo do usurpador é vingança por Aspern-Essling — Eduard Carrelli acrescenta, rindo com ironia —, então dificilmente ele ajudará a Baviera.

— Que saiu terrivelmente fragilizada da invasão austríaca. — Encarando Richard com determinação, Karinberg fala: — São agricultores tiroleses que estão vencendo os bávaros, meu príncipe. Já em Vorarlberg... É Württemberg que está suprimindo a revolta!

As demandas por uma ação dificilmente continuarão sendo ignoradas. Mas Richard simplesmente fecha os olhos e levanta. Que situação mais estressante! Sob o atento olhar dos ministros, Richard segue para uma janela e observa melancolicamente o Tamisa.

— Confesso que não há momento mais auspicioso para agirmos. Mas... — Hesitando um momento, Richard nega. — Não podemos nos basear apenas na aparente vitória rebelde.

Seria uma tolice e eles sabem disso! Atrás dele, os ministros rapidamente se entreolham e, no final, von Eden toma a dianteira no lugar de von Frieden.

— Qual o seu medo, meu príncipe?

— Nós não fazemos guerra, Eden, e, consequentemente, também não fazemos revoltas. — Encarando-os com profunda seriedade, Richard nega. — É necessário apoio militar numa situação dessas e não temos isso.

— Mas temos dinheiro — é O'Ryen quem responde, extremamente arrogante. — Confie quando dizemos que tudo está preparado, meu príncipe.

— Como assim "tudo preparado"? — Os olhos do conde arregalam, tanto que Richard franze o cenho. — Não lembro de mandar organizar revolta alguma!

Olhares furiosos são direcionados para O'Ryen, que ri tensamente. Mas o estrago já foi feito e não há mais volta. Richard deseja saber imediatamente o que significa isso, tanto que ele volta para junto de von Frieden.

— Situações críticas exigem ações críticas, meu príncipe! — o barão responde, horrorizando Richard... Mas não o suficiente. — A revolta já está armada, esperamos apenas sua permissão.

Completamente horrorizado, Richard cai sentado na cadeira. Ele só consegue negar, incapaz de acreditar nessa... traição! Mas os ministros mantêm o silêncio, tornando tudo ainda pior. Realmente, os políticos aproveitam cada oportunidade.

— Imagino que tudo começará em Smaragdberg, onde há menos tropas. — Von Frieden assente para Richard, que apóia-se na cadeira e reflete: — Serão niedersiegers lutando por niedersiegers.

— Uma solução caseira sempre é preferível — responde von Frieden, recebendo um distraído assentimento de Richard. — O imperador sabia que não tínhamos seu consentimento.

— Ele mostrou-se então meu maior aliado. — Nessa situação, pelo menos. Mas a expectativa dos ministros continua, até que Richard suspira cansado. — Façam sua revolta; sabe Deus se o errado aqui não sou eu.

Queira Deus que o errado seja ele. Caso o contrário, as consequências serão desastrosas para os niedersiegers.

— Tirol e Vorarlberg estão vencendo, meu príncipe — Karinberg fala, sorrindo confiante —, nós também venceremos.

— Mas e se eles perderem? — O sorriso do coronel morre, fazendo Richard acrescentar: — Viena caiu, Aspern-Essling foi uma vitória e os austríacos foram expulsos da Itália. E se revolta fracassar?

Qual será a desculpa deles? Richard tem total consciência do que acontecerá, mas e eles? Nenhuma resposta é dada pelos ministros, fazendo um tenso silêncio instaurar-se na sala. Quanto ao resultado, só o tempo o revelará.

*****

14|08|1809 Prisão Jesuíta, Smaragdberg

Ao som de tambores, três homens vestidos da forma mais grosseira possível são conduzidos pelo pátio principal do Mosteiro Jesuíta de São Dimas — desde 1775 convertido em prisão — até uma parede já marcada pelo tempo e sangue.

O pelotão de fuzileiros franceses já se encontra à postos, enquanto os oficiais e soldados bávaros mantêm-se alertas para reprimir qualquer comoção indesejada. Uma pequena multidão assiste tudo do claustro e das extremidades do mosteiro; foram pessoas escolhidas a dedo para estarem no local.

Assim que os tambores param, fazendo o total silêncio instaurar-se no pátio, um oficial francês sobe num pequeno tablado e recebe do ajudante a sentença dos criminosos.

— ... Tobias Sandfor, Johann Jakob Glaser e Sigmund Schneider são considerados culpados pelo crime de alta traição ao incitarem a sedição e desordem contra Sua Majestade, o rei Maximilian, e os aliados franceses! — Tudo decidido numa corte marcial, que, inclusive, os condenou a: — ... morte por fuzilamento!

Tal como é próprio para ex-soldados da extinta Guarda do Príncipe. Dito isso, o capelão da Capela de São Dimas aproxima-se dos homens.

No claustro, os observadores assistem com silêncio e pena, embora todo o choro limite-se apenas a algumas das mais pobres senhoras. A mensagem, de qualquer forma, é muito bem clara aos espiões do príncipe de Niedersieg.

— Não temos medo da morte, obrigado. — É a resposta que um soldado bávaro recebe ao trazer as vendas. — É de nossa vontade que eles vejam a vida deixando nossos olhos.

A obstinação é uma qualidade louvável em soldados, mesmo que às vezes traga consequências longe de desejáveis. Foi isso que os colocou nessa posição; eles continuaram em sua rebeldia mesmo ao serem traídos.

Napoleão Bonaparte é, de fato, um homem implacável; é impossível agir contra ele e sair vitorioso... E a Áustria, bem como seus aliados alpinos, também sabe disso agora... A multidão escuta as ordens sendo dadas ao pelotão, até que, ao som do "atirar", todos fecham os olhos e...

*****

Outubro|1809 Stuttgart, Württemberg

Fogos de artifício explodem no céu de Stuttgart, enquanto os comemorativos tiros dos canhões têm seu som abafado pela música e alegre aclamação do povo pela Königstraße.

O povo apenas louva apenas o rei cavalgando em gloriosa procissão pela avenida, mas também joga flores e confete para o príncipe herdeiro e o príncipe Paul logo atrás. Na verdade, o motivo disso tudo é eles, por terem suprimido a revolta em Vorarlberg.

Logo atrás na procissão, guardada pelos mais valentes soldados do reino, a rainha Charlotte acena de uma carruagem dourada, tendo consigo a apática princesa herdeira e a doce princesa Paul.

— Enfim a vingança de Württemberg sobre a casa d'Austria! — Durante todo o percurso pelo Königstraße o povo aplaude seus "príncipes guerreiros".

— A semente de Ferdinand III finalmente teve sua retribuição! — Aplausos dados também para o rei e sua família. — Nossas humilhações passadas foram retribuídas em Wagram, Schönbrunn e Vorarlberg!

Tudo só começa a diminuir quando a procissão chega na Igreja Colegiada, onde a realeza é recebida pelo reitor, que os conduz para dentro. Logo começará o culto de agradecimento pela vitória.

— Não costumo dizer muito isso, mas estou satisfeito, filho. — Franzindo o cenho, Fritz volta-se ao rei, que esboça um pequeno sorriso. — Você e Paul trouxeram glória para a casa de Württemberg.

Surpreendente, e se fosse um elogio dado diretamente para Paul seria mais ainda. Mas Fritz simplesmente volta-se para frente e observa os últimos preparativos para o início do culto.

— Foi a designação que recebemos e, como ordenado, a cumprimos. — Apesar do corso ser o "líder supremo" deles. O silêncio instaura-se, até que Fritz suspira: — Espero que eles sejam tratados com misericórdia.

— Os vorarlbergers? Isso não é problema nosso — o rei responde e, seguindo o olhar do filho, encara Anne e a rainha. — Parte daqueles gritos foram para ela.

— E para os meus filhos também — observa Fritz... voltando-se suplicante para o rei. — Desejo profundamente vê-los, pai!

A última vez foi na Páscoa e antes disso no Natal! É uma distância tão angustiante quanto prejudicial. Charlotte e Anne podem até amá-lo incondicionalmente, mas Wilhelm o odeia e Auguste o vê como um estranho. Tudo é demais para um pai aguentar.

— Seus problemas são com Anne, não comigo. — O olhar do rei torna-se censurador, tanto que ele acrescenta: — Tudo isso são as consequências das suas ações.

— Mas são meus filhos, devo vê-los também! — Fritz defende-se e, fechando fortemente os olhos, nega. — Tente me entender como pai...!

— Sua mãe seria melhor em entendê-lo, garanto. — A súplica de Fritz torna-se um furioso olhar. Mas a censura também não deixa o rei. — Você fugiu! Deixou eles à mercê do mundo!

— Conheço todos os meus pecados, obrigado! — Principalmente com Anne constantemente o lembrando. Respirando fundo, Fritz volta a súplica. — Me aconselhe, por favor... Como pai.

Tomado pela surpresa, o rei só consegue franzir o cenho com o pedido do filho. As coisas nunca funcionaram assim para eles... Para nenhum dos filhos, na verdade. E o silêncio acaba se instaurando entre os dois.

— Esqueça esse assunto. — Fritz franze o cenho para o pai, cuja seriedade é profunda. — É o melhor, pelos menos por agora. Vá para Kassel, passe uma temporada com Katharina; fará bem para ambos.

Para ele e Anne, ou para ele e Katharina? Mas o rei simplesmente se afasta e segue para o seu lugar ao lado da rainha. Enquanto Fritz continua parado e pensativo. Viajar? Deixar os filhos dele e ir se divertir em Kassel?

Parece tão... O olhar de Fritz recai sobre Anne, sendo igualmente observada por Anton Belgärd... Fritz franze o cenho e, bufando, segue para junto de Anne; ele fez sua escolha.

*****

20|10|1809 Orange Hall, Ilha de Wight

Num ritmo mais que lento, Robert vagueia pelo escuro corredor azul até chegar numa porta e parar. Há um certo receio nele... Para falar a verdade, é mais medo que receio, tanto que ele aperta fortemente a caixa de metal que traz consigo.

Há exatos 45 dias as coisas tomaram um rumo, ou talvez conclusão, muito difícil de suportar. Eles já deveriam até ter voltado para Windsor, mas... Tomando coragem, Robert enfim entra no berçário.

— Os aldeões de Rangefield mandaram doces de laranja.

Sentada ao lado do berço vazio, Sophia volta-se na direção dele e esboça um fraco sorrisinho. Mas é o luto que domina os olhos dela, bem como os efeitos de uma fraqueza recente. Robert sente a garganta fechar ao vê-la assim.

— Quanta gentileza; vou mandar um porco para eles como agradecimento. — Ela continua sorrindo, mas mesmo assim Robert pega um banquinho e senta ao lado dela. — Eu estou bem, Robert.

— Sei que está, mas ainda assim fico preocupado. — Encarando-a fixamente, Robert acaricia o rosto dela e nega. — Não é bom ficarmos aqui, só trará sentimentos ruins...

— Mas é inevitável — Sophia responde e, fechando fortemente os olhos, leva uma mão para a mão dele. — Foi tão repentino e... Não pudemos fazer absolutamente nada!

Lady Simoham — governanta do berçário — simplesmente acordou e encontrou Sophia Karolina... Foi uma dor sem igual, tornando-se pior principalmente porque George Adolphus teve o mesmo destino seis meses antes.

— Dói tanto, não é? Parece até que tiraram... — Mas Robert não consegue e simplesmente abraça Sophia.

— Uma parte de mim. Sentimos a mesma coisa, embora de formas diferentes — Sophia responde, abraçando ele e sussurrando: — Já é a quarta vez que isso acontece, Robert. E se nunca tivermos filhos?

Nunca ter filhos...? Afastando-se delicadamente de Sophia e encarando-a, Robert nega e... Ele sorri para ela, não mostrando afetação alguma.

— Teremos um ao outro, é o suficiente para mim. — Filhos não são sinônimos de felicidade matrimonial. Há o dever, claro, mas... — Nosso amor é muito mais importante que Kendal.

— Ou a fortuna e as propriedades — sussurra Sophia num doce sorriso... Mas que logo morre. — E quanto a Niedersieg?

E o sorriso dele também falha, não por causa de Adam, mas por ser apenas Adam. Richard e Cathrine não escondem que ressentem-se disso, mas a sociedade colocou em Robert e Sophia o peso da continuidade. Mas...

— Niedersieg é problema de Richard e Cathrine, não nosso — afirma Robert, encarando com seriedade Sophia. — Há Adam e... Você não será a égua parideira dessa família!

— Não fale com tanta repulsa, o amanhã pertence apenas a Deus. — A resignação na voz dela é notável. Mas Sophia suspira e pergunta: — E os preparativos para o banho de mar em Cowes?

— Sabe que não recuso um banho de mar. — Principalmente junto dela. Sophia ri com as palavras de Robert, que levanta do banquinho. — Fará bem; e precisamos estar saudáveis para o Jubileu de Ouro do rei.

Será dentro de cinco dias e, após tantos desastres na Áustria, Holanda, Niedersieg e até em casa, será bom um momento de festa. Robert estende a mão para Sophia, que aceita e também levanta.

— Desejo mudar a decoração desse berçário, de todos eles, na verdade — Sophia fala ao observar o lugar com uma careta. — O verde dessas paredes me dá náuseas.

Todos os berçários dão, na verdade... principalmente os verdes. Mas Robert assente e eles deixam o berçário, o que fez ele lembrar:

— Pergunto-me como Richard está reagindo a Schönbrunn, — Sophia franze o cenho para Robert, que nega. — como eles estão reagindo.

A Áustria rendeu-se à França e fez um novo tratado de paz. O resultado: a Áustria entrou para o Bloqueio Continental e tornou-se inimiga da Inglaterra. A reação dos londrinos dificilmente foi, ou está sendo, pacífica.

*****

25|10|1809 Frogmore, Windsor

Tomado pela escuridão da noite, o Castelo de Windsor fica cada vez mais distante à medida que a carruagem dos Bristol segue pelo Home Park rumo a Frogmore House. Há tochas iluminando o caminho, revelando até... Encarando com desprazer o tomate podre no meio da janela, Richard suspira.

— Eu havia esquecido o quão injustas são as pessoas do sudeste deste país. — Negando, ele fecha a cortina e encara Cathrine. — Além de muito falsas, por sinal.

— Faz parte da natureza britânica — responde Cathrine, sequer olhando para ele.

É triste ver a que ponto eles chegaram, e torna-se mais ainda quando Richard lembra que tudo parece um sobe e desce de emoções. As vezes é melhor ficar de boca fechada, porque nada realmente mudou.

Mas é inútil pensar nisso. Richard desvia o olhar de Cathrine — excessivamente brilhante com um vestido prateado — e foca na outra janela. Está limpa, surpreendentemente; os londrinos não gastaram todas as suas verduras.

— Nunca antes vi tamanha raiva para conosco, não depois de 1795 — Richard fala e, não aguentando, volta a encará-la —, mas naquela época tudo real causava revolta.

Embora nunca um Tudor-Habsburg tenha sofrido linchamento, nem depois de Campo Formio. De fato, Schönbrunn foi algo terrível... Principalmente para eles. A Áustria é uma inimiga agora e, consequentemente, os Tudor-Habsburg também.

— Eu sei o que é suportar o desdém britânico — comenta Cathrine, voltando-se friamente na direção dele —, principalmente quando demonstrado em caricaturas.

— Não existe alteza neste país isenta delas. — Ao contrário da Dinamarca e sua censura governamental. Mas Richard nega e sussurra em aviso: — A aristocracia não será gentil.

— E quando ela foi? — Richard franze o cenho, mas Cathrine desvia o olhar. — Pensava que o objetivo dessa festa fosse comemorar o aniversário de ascensão do rei.

O que não significa a falta de críticas ou preconceitos. Na verdade, o jubileu de ouro apenas disfarçará os resultados da Paz de Schönbrunn, que chegou a Londres faz poucos dias.

Quando eles chegam em Frogmore House, cuja fechada já está fortemente ocupada por carruagens, Richard oferece ajuda para Cathrine descer da carruagem, mas ela recusa. Então os dois seguem para os jardins, onde instantaneamente tornam-se o foco dos mais desconfiados olhares.

— Como é agradável ser o centro das atenções — comenta Richard, profundamente irônico, com os olhares e sussurros das pessoas. — Dizem que há uma linha bem tênue entre o amor e o ódio.

— Sou obrigada a concordar. — Richard franze o cenho para Cathrine, que abre o leque e olha para os lados. — Onde está a rainha?

— Se preparando para sua "entrada triunfal" — é Robert quem responde, aproximando-se com Sophia, vestida de branco e dourado. — Como foi o ódio pelo caminho? Eu apenas ri e acenei.

— Ele pediu para ser apedrejado, isso sim — provoca Sophia, ganhando uma negativa de Robert. — Surpreendentemente chegamos cedo... Robert não escovou o cabelo hoje.

O olhar que Robert dá a Sophia é de mais profundo horror, mas ela esconde o rosto com o leque e começa a rir. Não demora muito e, mesmo negando, Robert sorri também. É de dar inveja isso... Richard sente inveja, afinal ele e Cathrine...

— Sua Majestade Real, a rainha! — A atenção, bem como os pensamentos, de todos voltam-se à entrada dos jardins.

Ladeada pelas princesas Augusta e Elizabeth — ambas de branco e dourado, a rainha entra nos jardins com um brilhante sorriso... Ou talvez seja apenas o vestido dourado dela. Todos fazem uma mesura a consorte, que inicia um breve discurso:

— Hoje, 25 de outubro, é uma data extremamente especial: comemoramos o maior reinado da história britânica. Foram anos de conquistas, glórias e grandes mudanças. A era dos George's viveu, e ainda vive, seu melhor momento, com o rei sendo uma presença sempre constante. Então, em nome do rei, dou início ao quinquagésimo ano da ascensão de George III!

E animados aplausos irrompem pelo jardim, mesmo com a alarmante falta do rei. A rainha sorri em agradecimento, embora muito fracamente. Enquanto Richard olha para Cathrine, cujo olhar é sério e muito distante dele.

*****

Palácio de Ludwigsburg, Ludwigsburg

— Não gosto dessas roupas. — Bordando confortavelmente num recamier, Anne volta-se para Wilhelm, nada satisfeito com os babados e mangas longas da roupa. — Por que preciso usá-las? É apenas o vovô e a vovó.

As babás, vestindo as três crianças, olham com horror para Wilhelm. Mas Anne simplesmente ri e deixa de lado o bordado.

— Não é apenas o vovô e a vovó, Wilhelm, mas também o rei e a rainha — explica Anne, deixando o filho carrancudo. Suspirando, ela acrescenta: — A corte também jantará conosco.

— E por que eles não mandam a corte embora? — a pequena Anna pergunta, ganhando uma negativa da mãe.

— Porque eles precisam dela — é Charlotte quem responde. — Não existe rei e rainha sem corte.

— Para os observar comendo? — zomba Wilhelm, recebendo uma careta de Charlotte. Anne ri e retorna ao bordado. Até que... — Ele também vai estar presente, mamãe?

Parando novamente o bordado, Anne encara o filho, cujo olhar é preocupado. Isso acaba trazendo também a atenção de Charlotte e Anna, igualmente curiosas. Se ele estará presente? Anne pensa um momento e...

— Fui dispensado do jantar — o próprio Fritz responde, entrando subitamente no berçário. A princesa Adelheid e as babás instantaneamente curvam-se, mas ele foca nos filhos. — E os abraços?

Não é preciso nem pedir de novo e Charlotte e Anna correm para abraçar o pai, que as ergue nos braços. Quanta alegria; Anne força um sorrisinho e, sinalizando para o desconfiado Wilhelm acabar de se vestir, deixa o dormitório.

— Podemos conversar, Anne? — Prestes a deixar a antecâmara, ela é chamada por Fritz... muito sério. — Será breve, muito breve, na verdade.

— E qual o assunto? Saiba logo que não estou com ânimo para discussões...

— Vim me despedir. — Anne franze o cenho para Fritz, que explica: — Partirei amanhã para Kassel; vou passar uma temporada com Jérôme e Katharina.

Com o filhote de usurpador? A surpresa é tão grande que Anne fica em silêncio, tentando ao máximo descobrir o que significa isso. Mas é inútil, principalmente com o olhar sério e desprovido de segundas intenções de Fritz.

— Que apropriado — responde Anne, dando as costas e saindo. — Faça boa viagem...

— Não acabei ainda. — Mas Fritz a agarra pelo braço, encarando-a tão friamente que Anne semicerra os olhos. — Sabe por que estou indo?

— Imagino que por minha causa. — Retribuindo o olhar, embora com mais desdém, Anne solta-se dele e zomba: — Tenho esse efeito nos homens.

Eles a odeiam, ou... eles a odeiam. Há apenas uma espécie de homem que ama Anne: os que ela também ama de alguma forma. Mas Fritz simplesmente nega, nunca deixando de lado a frieza.

— Estou indo por conta dos meus filhos. — Qual a lógica nisso? Anne ri com escárnio, irritando profundamente Fritz. — Irei a Kassel e... Prometo que nossa guerra será ainda pior quando eu voltar.

— Ótimo — provoca Anne, novamente rindo —, Württemberg precisa mesmo de um sobressalente.

A raiva que domina nos olhos de Fritz é profunda, tão furiosa que, por um momento, Anne teme pela própria segurança. Mas ela simplesmente dá as costas e se afasta dele. Fritz é incapaz de machucá-la... pelo menos, fisicamente.

— Posso ao menos me despedir deles... Todos eles? — De fato, ele é incapaz de machucá-la. O tom dele torna-se triste. — Não sei quando volto e...

— Mandarei trazerem Auguste pela manhã — Anne avisa, ainda de costas e, pensando um momento, acrescenta: — Cuide-se lá, por favor.

Anne precisa dele vivo para se tornar rainha. O silêncio domina na antecâmara, o assunto entre os dois acabou... E Fritz retorna para o dormitório, deixando Anne pensativa.

*****

Frogmore House, Windsor

O Jubileu de Ouro não celebra hoje apenas o rei, mas também a grandeza da Britannia. E isso é visível desde a trupe indiana — dançando com tochas, caminhando sobre brasas e engolindo espadas, até o templo greco-romano no meio do lago de Frogmore.

— Abacaxi eu até entendo, mas coco e... banana!? — Uma fruta tão amarela e... estranha. Richard nega e acrescenta rindo. — Talvez a rainha tenha se empolgado demais.

Cathrine, porém, continua em silêncio, e um silêncio tão frio e profundo quanto a própria noite. Mas ela percebe isso, tanto que, fechando fortemente os olhos, acaba virando-se na direção dele.

— Devem ser amostras de Kew — Cathrine fala, fazendo Richard assentir com um sorrisinho de lado. Ela também acaba sorrindo. — Eu gostei da...

E um dos artistas indianos cuspe uma chama próximo deles, fazendo Cathrine gritar assustada e abraçar fortemente o braço de Richard, que a puxa para um abraço. Os dois se encaram ofegantes, por conta do susto... E não desviam mais os olhos.

Essa proximidade... Os corpos juntos... É impossível para eles se separarem por conta própria. Até que alguns se aproximam para assistir o cuspidor de fogo. Afastando-se, Richard e Cathrine até tentam fazer o mesmo, mas...

— Temos um problema, minha princesa! — Lady Newport se aproxima, com Lady Chartents junto. — Georgina descobriu que Lady Castlereagh espera um convite para um lugar na sua casa!

— O lugar de Lady Carlisle — supõe Richard, ganhando um assentimento das damas. — Castlereagh estava junto?

Elas negam para Richard, que suspira aliviado. Seria muita insensatez de Castlereagh dar as caras logo depois de... Ele nega e olha para Cathrine, cujo olhar é preocupado, para não dizer indeciso.

— Seria próprio a esposa de um par irlandês na minha casa? — Não há precedência, embora Lady Spencer fosse irlandesa. Mas Cathrine encara Richard e nega. — Pior ainda, a esposa de Lord Castlereagh!

— O duelo dele com Canning foi há pouco mais de um mês! — exclama Lady Chartents, olhando para Richard, em seguida. — Diga que não é adequado, meu príncipe!

Oh, mas isso Richard não esperava. Tomado pela surpresa, ele encara as damas e depois Cathrine, também encarando-o com curiosidade. Bem, tecnicamente, considerando que Portland renunciou e um novo ministério Tory foi formado, Castlereagh não é mais Secretário da Guerra. Mas o duelo...

— Não cabe a mim interferir na Casa da Marquesa — Richard enfim responde, encarando fixamente a esposa. — Toda e qualquer decisão é apenas de Cathrine.

Se ela desejar chamar Lady Castlereagh para substituir Lady Carlisle, que assim seja. É o bastante para a atenção focar em Cathrine, que sorri em agradecimento e responde:

— Vou vê-la. — E Cathrine segue para frente... soltando o braço dele. — Sozinha, por favor.

Parado no mesmo lugar, Richard observa impassível Cathrine seguir rumo a viscondessa Castlereagh, que aprecia o templo muito certamente projetado pela princesa Elizabeth. Pois bem, Richard suspira e segue para a mesa das bebidas, não muito longe de onde as duas conversam.

Bebendo num só gole uma dose de conhaque e servindo-se novamente, ele analisa a festa. Não é uma visão agradável: os jovens flertam entre si, o príncipe de Gales e os duques reais soltam galanteios para as damas casadas e Robert e Sophia... Richard novamente bebe o conhaque inteiro.

— Que degradante. — O ciúme da felicidade alheia e... Richard bebe outro copo, o uso do álcool para mascarar a frustração. — Terrivelmente degradante!

Mas não há nada ruim que não possa ficar pior... Os pensamentos de Richard começam a ficar nublados pelo álcool, tanto que ele perde a noção do tempo e do quanto bebeu. O fato é que, quando volta a razão, Richard está abraçando Cathrine e beijando seu pescoço.

— Champagne, amor? — E Richard arregala os olhos, à medida que o silêncio o deixa profundamente envergonhado.

*****

Não apenas de fofocas e comentários maldosos sobre os Tudor-Habsburg vive a alta sociedade inglesa, mas o próprio príncipe de Gales também torna-se o foco da atenção, afinal... Sorrindo arrogantemente, ele expõe sua nova amante, a marquesa de Hertford, para o mundo.

— Toda essa atenção me lisonjeia — Lady Hertford comenta, rindo timidamente para o príncipe —, mas é desnecessária. Quando fui uma novidade?

— São seus encantos, Isabella. — Atrás deles vem também o marquês de Hertford, totalmente apaixonado pela esposa. — Eles sempre atraem toda a atenção...

— Principalmente comigo ao seu lado. — Uma paixão que George não dá a mínima importância. Beijando a mão da marquesa, ele vira-se ao marquês. — Traga-nos algo para beber. Quero algo com abacaxi.

O príncipe sorri, sugestivo, para Lady Hertford, que timidamente ri. Naturalmente Lord Hertford não fica nada satisfeito, mas obedece. É o momento de George, que bufa na direção do marquês.

— Seu marido é uma coisinha extremamente irritante, sabia? — O sorriso de Lady Hertford treme, mas ele não percebe. — Quase me dá prazer ver os chifres...

— Francis é meu marido — a marquesa lembra, sorrindo, em seguida. — Mas o príncipe é meu senhor.

Satisfeito, George pega a mão de Lady Hertford e ternamente a beija, praticamente esquecendo as rugas. Parecem até um casal... Mas não por muito tempo.

— Lady Hertford, como sempre, uma presença poderosa. — A atenção deles volta-se a Lady Grenville, aproximando-se com o marido e Lord Grey. — E seus netos, como vão?

A marquesa sequer tenta sorrir para a baronesa, cuja beleza não é invejável, mas ainda possui juventude. É o tipo de rivalidade que apenas mulheres conseguem perceber, tanto que o príncipe continua sorrindo.

Mas os cumprimentos formais seguem com toda a educação, tanto que em dado momento Lady Grenville leva Lady Hertford rumo ao templo, para elas se curvarem ao retrato do rei. Os cavalheiros ficam sozinhos.

— Ela não é a mulher mais bela e inteligente? — comenta George, partindo rumo aos aperitivos. — Tenho muito prazer na amizade dela.

— É uma mulher impressionante, cujos inimigos precisam tomar cuidado. — Grey e Grenville continuam atrás do príncipe. — Notamos a falta do rei, ele está bem?

— Mais que bem, não parava de rir e falar na última vez que nos vimos. — Eles se encaram com as palavras do príncipe, que come um aperitivo. — Oh, abacaxi. Deveria provar também, Grenville.

— Já comi o suficiente, obrigado — responde Grenville, ofendido. Mas, respirando fundo, ele acrescenta: — Sentimos pela falta do rei, afinal entramos no quinquagésimo ano da...

George boceja altamente e pega uma taça de champagne. Sinal melhor que esse impossível. Está claro que o príncipe de Gales pouco se importa com eles. Sendo assim... Grenville e Grey assentem um para o outro.

— Não minta para nós, senhor! — Franzindo o cenho, George volta-se ao conde. — Sabemos da doença do rei e que ele está a cada dia pior.
— Os milordes estão...

— Falando apenas a verdade — o conde Grey concluiu, sorrindo com desdém. — Que Deus me perdoe, mas o rei está ficando louco!

— Incapaz de estar presente até mesmo em seu Jubileu de Ouro — Grenville acrescenta e semicerra os olhos na direção do príncipe. — E se... houver outra crise?

O príncipe de Gales arregala os olhos com a pergunta de Grenville... Mas essa surpresa não tarda para desaparecer e virar um sorrisinho. Tal como eles imaginavam.

— Será necessário uma ação. Estamos numa guerra e o governo não pode parar. — O príncipe bebe o resto do champagne e os encara. — Qual a sugestão dos milordes?

— Precisamos estar preparados para uma hipotética ação emergencial — responde Grey, tocando um olhar com Grenville e continuando: — Uma regência...

— Lord Grenville, Lord Grey, mas que alegria! — A rainha aparece e, agarrando o braço do filho, sorri falsamente para eles. — O que estão tramando?

E a rainha ri com suas próprias palavras, obrigado-os a fazer o mesmo. Ela ouviu toda a conversa, principalmente a última parte. Mas isso não será mencionado, nada de regência...

*****

Tão vermelha quanto uma tomate madura e tremendo quase como alguém com febre, Cathrine encara Richard, cujos os olhos estão arregalados, e volta-se a sorridente Lady Castlereagh. O silêncio continua supremo. Até que...

— O amor é algo realmente lindo! — comenta Lady Castlereagh numa risadinha. — Principalmente na juventude, quando é vivaz e impetuoso.

Não há crítica alguma nessas palavras, e muito menos desaprovação, mas a vergonha de Cathrine aumenta mais ainda. Eles estão chamando demasiada atenção e... Cathrine encara furiosamente Richard; ele ainda a abraça.

— E-eu... Desculpe, eu... — Soltando-a e recuando para trás, Richard fecha os olhos e nega. — Acho que vou vomitar, com licença.

Richard foge para longe, desaparecendo em dado momento da vista delas. Mas não o suficiente para matar a vergonha de Cathrine, que abre o leque e começa a caminhar com Lady Castlereagh rumo ao templo. Elas até cruzam, surpreendentemente, com Lady Hertford e Lady Grenville.

— Perdão pelo inconveniente — Cathrine fala, assim que elas param em frente a pintura do rei. — Acho que ele bebeu demais e... Foi ridículo!

— Eu achei corajoso. — Lady Castlereagh sorri para Cathrine, encarando-a com horror. — Inadequado, de fato, e muito repreensível, mas corajoso.

— Não tão corajoso quanto deveria — ela sussurra, desviando o olhar e afastando-se da pintura.

Foi ofensiva, isso sim; uma afronta a personalidade dela. E pensar que Cathrine estava... Lady Castlereagh, observando-a por trás com uma triste expressão, apenas nega e aproxima-se da princesa. As duas observam as pessoas no jardim.

— O casamento é algo extremamente complicado. Às vezes Robert está tão focado no trabalho que eu digo: "assim você vai enlouquecer", mas de nada serve. — Lady Castlereagh ri com suas próprias palavras e suspira. — Somos tão parecidas nesse aspecto.

— Mas não em todos — Cathrine frisa e, suspirando, volta-se a viscondessa. — Qual o seu conselho?

O sorriso no rosto de Lady Castlereagh é imperturbável, mas nenhuma resposta é dada inicialmente por ela. Cathrine chega até a negar, pensando que...

— Sei o que é competir com o dever, e sei também o que é ser "traída"; eu tomei a causa irlandesa, enquanto Robert a reprimiu. — Mesmo sendo mais irlandês... e irlandês. — Não deixe os problemas impedirem sua felicidade conjugal.

— O príncipe e eu somos muito felizes. — Considerando a intimidade como sinônimo de alegria conjugal.

— Então aproveite essa felicidade. — Cathrine franze o cenho para Lady Castlereagh, cujo sorriso torna-se melancólico. — Eu não fiz isso plenamente e... Somos felizes, mas não tanto quanto poderíamos.

Ela refere-se à falta de filhos deles ou a outra coisa? Cathrine, porém, nada consegue responder, as palavras da viscondessa começam a afetá-la. Porque... Lord e Lady Castlereagh são tão felizes, mas... não plenamente?

— Dê minhas lembranças ao visconde. — Voltando-se a viscondessa, Cathrine estende a mão e sorri. — Espero a milady em Amelian na segunda.

A animação toma de conta de Lady Castlereagh, que aceita a mão da marquesa e faz uma leve mesura. Cathrine tem sua nova dama das vestes. Mas agora... Respirando fundo, ela deixa o templo e vai atrás de Richard pelos jardins.

Mas ele não se encontra nos jardins, e nem perto das bebidas. É na casa que Cathrine encontra Richard, sentado num banco na biblioteca da rainha.

— Cathrine, eu... — Tomado pela surpresa, Richard levanta e vem na direção dela. — Perdão, por favor. Eu me deixei agir pelas emoções e... fui um completo cachorro...

— Não diga mais nada, por favor — repreende Cathrine, aproximando-se dele com uma expressão cada vez mais emotiva. — Esqueça esse assunto! Esqueça tudo! Apenas...

Negando veemente, Cathrine abraça o pescoço de Richard e o beija com toda a emoção. Inicialmente ele fica muito surpreso, mas logo começa a retribuir o beijo e abraçá-la... As mãos de Richard percorrem todo o corpo de Cathrine...

*****

Castelo de Windsor, Windsor

Há pouco o relógio bateu doze vezes, mostrando que deu meia-noite e o 25 tornou-se 26... Mas, estranhamente, a rainha, que deveria estar na festa em Frogmore, cruza um dos escuros corredores de Windsor e entra num quarto.

— Como está sendo a festa? — É os aposentos do rei, que levanta de uma poltrona e se aproxima da rainha.

— Estamos sem o principal convidado, então não está tão boa assim — a rainha responde com um sorriso... que não se sustenta. — Todos notaram sua falta.

— E notarão mais ainda, a julgar pelo andamento das coisas. — Fechando os olhos e negando, o rei estende tira um papel do bolso. — Estive lendo uma carta de Amélia e...

— Não se maltrate dessa forma, George; Amélia está bem. — Mas a rainha pega a mão do marido e, com uma dolorosa expressão, tenta verdadeiramente sorrir. — Vamos aproveitar esse momento, por favor.

Sem problemas, sem filhos e... sem fantasmas. O rei sorri para a rainha e, agarrando-a pela mão, a leva na direção de uma janela. Windsor está escuro, apenas as luzes de Frogmore são perceptíveis, mas é como se eles pudessem ver todo o império construído no último meio século.

— Parabéns para mim! — o rei sussurra para a rainha, que apóia-se no braço dele.

Meio século de glórias, vitórias e mudanças nunca vistas antes. A Era Georgiana viveu seu auge e, nessa nova década que se inicia, viverá seu momento mais esplendoroso... Mas não na liderança e George III…

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.