CAPÍTULO XI

No segundo em que Kambriel abriu os olhos, assustou-se quando percebeu que estava em um cenário bem diferente de como se recordava, era a sala de uma casa; isso ele pôde perceber ao dar-se conta de que estava deitado em um sofá escuro. Aos poucos ele se sentou, correndo os olhos ao redor do novo ambiente, as paredes eram de uma cor pastel e clara deixando o ambiente com um ar aconchegante e sofisticado, o restante dos móveis era de uma cor escura também, combinando com sofá e com todo o ambiente daquela sala. Mentalmente ele se questionava aonde estaria e como viera parar ali, quando sua última lembrança era de estar tendo uma conversa nada agradável com Alana.

O que vinha depois dessa mesma lembrança era uma verdadeira confusão de pensamentos e imagens confusas, boa parte delas ele nem mesmo sabia dizer se eram reais.

Sua cabeça parecia girar um pouco, dando-lhe uma sensação de tontura e moleza, o corpo humano parecia mais fraco do que se recordava, os braços longos pareciam pesados e suas pernas sequer seguiam seus comandos, o arcanjo então se perguntou o que teria acontecido para estar sentindo-se daquela maneira. Sua boca estava seca, ele conseguia sentir como se seus lábios estivessem esticados ao ponto de dar-lhe uma sensação de estarem sendo cortados.

Reações humanas para um corpo humano, pensou consigo mesmo.

— Oh, você finalmente acordou! — A voz gentil de Alana o atraiu, seu rosto virou-se na direção exata em que ouvira a voz da moça; uma reação inesperada de seu corpo. Algo que ele não compreendeu muito bem como poderia acontecer, mas percebeu que ficou bem mais relaxado ao vê-la ali. — Como está se sentindo?

Perguntou num tom leve de preocupação, seus olhos castanhos fixos em seu rosto lhe causando uma sensação mais leve e acolhedora; algo que ganhara uma resposta positiva de seu corpo humano. O coração bateu um tanto mais rápido quando a viu se aproximar, em uma das mãos ela segurava um copo de vidro com água e dois cubos de gelo e logo o esticou em sua direção, dando a entender que ele deveria beber o líquido oferecido.

— Um pouco estranho — Admite com confusão, tentando entender exatamente o que houve para que viesse parar naquela casa. — Obrigada.

Ele agradece ao pegar o copo da mão da moça e levá-lo até seus lábios, dando apenas um gole curto, rapidamente sentindo quando seu corpo reagiu de uma maneira inesperada quando o líquido gelado desceu por sua garganta. Era uma sensação boa, diferente do que já sentira antes, mas ainda sim boa. Um frescor interno que o forçou a tomar mais outro gole.

— O que houve? Eu não consigo me lembrar de muita coisa. — Diz olhando-a durante alguns instantes, percebendo que ela sentou-se na poltrona solitária localizada à frente do sofá aonde ele estava sentado. Seu cenho se franziu brevemente, os olhos atentos e curiosos da morena permaneceram fixos nele até que ela finalmente lhe responde.

— Me diga você, descemos do carro e quando dei por mim, estava desmaiando. — Seu tom de voz continha uma pequena fagulha de preocupação que ele julgou um tanto desnecessária, afinal era um arcanjo, um guerreiro. Mas então recordou-se de que estava mesmo sentindo-se enfraquecido quando saiu do carro para falar com ela, o corpo que carregava já não parecia mais conter a mesma força de antes e era muito provável que o desmaio fora causado por causa da ausência de alimento em seu organismo. — Eu pensei em levá-lo para o hospital, mas não queria voltar para lá depois do que houve e não sabia se você iria se sentir confortável por voltar também, então eu o trouxe para minha casa.

A revelação de onde estava fez com que sua percepção do lugar mudasse drasticamente, seus olhos correram novamente pelo ambiente que o cercava e pôde agora perceber novos detalhes que não havia notado quando acordou, como uma foto de Alana e provavelmente seu pai. Ambos estavam sorrindo com grande felicidade, algo que parecia ser palpável até; ela trajava uma roupa estranha de cor preta e um chapéu da mesma cor, em suas mãos ela segurava um tubo longo e azul. Seja lá o que fosse que aconteceu naquele momento em que a foto fora tirada, era um momento de grande alegria para os dois; algo que também deixou o arcanjo alegre.

Ele tentou recordar-se do momento exato em que perdera a consciência e desmaiou, mas quando tentava fazer isso tudo o que vinha em sua mente eram pensamentos confusos e nada que fizesse algum sentido para ele. Kambriel pareceu um tanto frustrado com isso, mas tentou não demonstrar tal sentimento.

— Quando foi a última vez que comeu alguma coisa, Kambriel? — A morena questionou com gentileza, arqueando uma sobrancelha enquanto o olhava de maneira analisadora, o rapaz percebeu isso e não gostou nada dessa sensação de estar sendo observado assim tão de perto.

Um pouco envergonhado, ele coça a cabeça, olhando-a de volta, mas fazendo isso muito rapidamente. Seus olhos se voltam para o copo em sua mão já completamente vazio, onde os dois cubos de gelo já estavam menores por terem derretido. O rapaz cogitou a ideia de contar a ela que, desde seu primeiro dia na terra não tinha se alimentado, mas ele não sabia como ela iria reagir com uma revelação como aquela e decidiu seguir um caminho mais fácil e rápido, indo contra seu último juramento feito. Mentir.

— Ontem pela manhã. — Diz sem olhá-la nos olhos porque temia que ela percebesse que estava mentindo de forma descarada novamente. Sua mão fechou-se ao redor do copo com mais firmeza ao sentir-se como um verdadeiro ser humano; um perfeito mentiroso.

Internamente ele torcia para que ela acreditasse em suas palavras, mesmo sabendo o quão estava sendo em mentir assim.

— É, eu imaginei que desmaiou por ter ficado fraco mesmo. — Ela diz e isso o surpreende. Era uma verdade que estava enfraquecido, afinal estava a dias na terra e não conseguira se alimentar como um humano normal deveria e, a falta do alimento mostrou-se um problema com uma consequência péssima da qual evitaria dali para frente. Mentalmente marcou que se alimentar era uma necessidade que precisava ser feita diariamente. — Eu fiz um pouco de comida, imagino que deva estar com fome então...

Alana não completa sua fala e com a mão livre indica a direção de onde ela viera. Kambriel segue o gesto até avistar um novo cômodo de sua casa e novamente percebe mais detalhes que antes foram deixados de lado; como o odor agradável de comida. Esse mesmo cheiro fez seu estômago acordar, soltando um som estranho que o constrangeu, seu rosto ganhou um tom avermelhado e ele torcia para que a morena não percebesse isso. Contudo ela pareceu tê-lo ouvido, pois esboçou um riso divertido em seus lábios, deixando-o ainda mais constrangido.

A filha do pastor Jacob West se colocou de pé e então gesticulou para que ele a acompanhasse até o outro cômodo da casa e, tomado por uma vergonha que parecia tê-lo dominado por inteiro ele o fez. Levantando-se com cautela do sofá e colocando-se de pé logo atrás dela, a seguindo sem deixar de olhar tudo à sua volta e sentir-se estranhamente familiarizado com tudo o que o rondava. Mesmo que fosse tudo muito diferente de tudo o que já viu antes.

A cozinha era um cômodo diferente da casa, espaçosa e sem muitos detalhes como era o outro, haviam dois armários grandes que se seguiam por duas paredes, como se fossem apenas um e o mesmo podia ser dito sobre as bancadas, elas se completavam dando a entender que eram uma só e ele achou aquilo muito incomum. A mesma era redonda e consideravelmente grande, quatro cadeiras apenas e duas delas estavam puxadas; mostrando seus lugares. Como Alana lhe dissera, ela realmente havia preparado algo para que ele comesse, mas existiam dois pratos postos, o qual ele imaginou que o segundo poderia ser dela.

O cheiro era ainda mais agradável de perto e o fez aspirar com mais força o forte odor de comida, ele fechou os olhos sentindo que aquele mesmo cheiro ficaria gravado em sua mente por um bom tempo.

— Fique à vontade. — Ela diz, gesticulando para uma das cadeiras, permitindo que ele escolhesse o lugar que acharia melhor e ele o fez. Escolheu a cadeira vazia que permitia uma visão mais ampliada daquele ambiente.

Kambiel esperou por ela e quando Alana também se sentou e pegou os dois talheres, ele a imitou e começou a se alimentar. Logo na primeira garfada que dera sentiu como se algo completamente inédito acontecesse dentro de si, ele conseguia sentir o sabor do que estava comendo com tanta facilidade que, sequer se dera conta de que comia mais rápido do que realmente deveria. Estava faminto, isso era uma verdade e, após experimentar uma única colherada daquele alimento, pôde perceber que realmente precisava daquilo em seu organismo.

Ele apenas não sabia medir quanto.

O arcanjo sentia o peso do olhar da moça sobre si e sabia que existia ainda as tantas dúvidas sobre o que houve martelando em sua mente, conseguia sentir a curiosidade e a desconfiança se misturarem e a deixarem inquieta em seu lugar. Estavam próximos um do outro, numa distância pequena de exatamente um braço a separá-los e mesmo assim o rapaz tinha a percepção de como ela ainda reagia diante dos recentes acontecimentos.

Já era esperado que, a morena começasse a fazer suas centenas de perguntas, apesar de não compreender de onde poderia vir tanta curiosidade assim em uma única pessoa, admirava isso nela, essa ousadia que Alana tinha em querer respostas e persistir nisso. Eles as responderiam? Era impossível para que ele soubesse, fizera isso antes e bem sabia que não tinha dado a ela todas as respostas que ela buscava.

Mas agora as coisas mudaram, ela viu mais do que qualquer humano viu e presenciou algo que precisava esconder dos olhos humanos. Como explicaria isso a ela? Mentir era uma decisão já há muito descartada, não faria isso com ela, até porque estaria a chamando de estupida, como ela mesma dissera quando saiu do carro.

— Eu consigo sentir sua inquietação, Alana. — Ele diz após fazer uma pausa, estava quase terminando de comer. Seus olhos rapidamente se voltam para a jovem próxima a ele, ela também o encara.

— E entende que eu tenho um ótimo motivo para estar assim, certo? — Sua resposta é uma pergunta, mas não uma que precisasse que fosse respondida, até porque Kambriel sabia o motivo e talvez, poderia até mesmo dizer que entendia seu lado. Mas não completamente.

Ambos retornaram ao silêncio de antes, a humana estava agindo diferente ali, se lembrava muito bem de como ela ficou alterada quando ainda estavam dentro do carro e perguntou-se aonde essa mesma pessoa estava nesse momento. Alana estava com uma expressão neutra em seu rosto, os olhos castanhos não mais tinham aquela mesma curiosidade de antes, ainda que houvesse nela a mesma agitação que a dominava desde que estiveram no hospital.

— Eu gostaria que entendesse o motivo de eu querer tanto ter respostas — Ela volta a falar, seu tom estava também diferente, não era nervoso ou demonstrava qualquer sinal de que ela poderia acabar se alterando. Era calmo e ao mesmo tempo agitado. — Eu não consigo simplesmente ignorar tudo isso, Bill, o policial que nos contou sobre... Ele não acreditou no meu depoimento quando relatei o ataque que sofri de Vívian e até mesmo minha melhor amiga acha que o que aconteceu comigo não foi real e, você passou pela mesma situação que passei antes, eu sei que também não consegue deixar isso de lado. É impossível!

O arcanjo fechou os olhos e suspirou, nenhum dos dois continuaram a comer.

— Eu passei a entender no instante em que entrou no quarto e viu o que acontecia. — Admitiu, sua mente trouxe de volta a imagem de como o rosto da moça estava ao ver a cena perturbadora. Com sua fala, a expressão de West mudou novamente, era como ver uma criança cheia de esperanças. — Acredite, eu queria que nada disso estivesse acontecendo com você, especialmente depois do que houve com seu pai...

Sua fala não foi completada, Kambriel une seus lábios respirando fundo. Esquecendo-se totalmente de que não havia terminado de comer e nesse momento isso não pareceu ter tanta importância assim; já se sentia saciado e com sua força recuperada.

— Existe sim uma explicação para o que viu acontecer e eu tenho duas opções — Ao retornar a falar, o rapaz volta seus olhos na direção de Alana, encarando-a com atenção. — Eu posso te contar a verdade e aceitar que isso fará com que tenha muitas outras perguntas ou, eu posso inventar uma mentira que explique de forma mais lógica o que presenciou no hospital e eu sei muito bem qual das opções irá escolher.

Ele acompanhou o movimento de suas feições, as duas sobrancelhas se unirem enquanto seus olhos ao mesmo tempo se estreitavam, deixando claro que ela o escutava com atenção.

— Você era filha de um pastor, então imagino que seu pai a tenha ensinado sobre religião. — Diz, apontando para o colar de crucifixo que ela carregava em seu pescoço, o pingente tão pequeno que era quase escondido pela gola de sua blusa. Alana toca o pequeno colar e logo balança a cabeça num sim como resposta.

— Ele se formou em teologia então sempre tentou me ensinar tudo sobre religião, mesmo que eu não tenha me tornado uma praticante muito voltada. — Responde levemente envergonhada e Kambriel não entendeu o motivo, afinal, os humanos tinham livre arbítrio, eles poderiam escolher seguir algo ou não. Como ela fez.

Seu corpo se agitou internamente e ele precisou fechar ambas as mãos formando um punho com elas para tentar esconder seu nervosismo. Estava tomando um caminho sem volta, um que quebrava muitas regras, as mesmas que jurou que jamais quebraria. Seu coração bateu mais forte, ele nem mesmo sabia se isso era possível e percebeu que isso pareceu causar um tipo de reação em cadeira com seu eu interno, era como sentir um amontoado de sensações, mas apenas uma o dominava.

O arcanjo respirou fundo uma vez, desviando seus olhos do rosto da humana porque não sabia como iria prosseguir com aquela conversa, na realidade, estava pensando se realmente deveria fazer o que estava prestes a fazer. Reavaliou suas opções e consequências, Alana de certa forma já estava envolvida e o demônio que matou a senhora Glesser deixou claro que existia um interesse na moça, isentá-la não era mais uma opção viável e muito menos adequada. Poderia mentir, mas isso era outra opção que simplesmente descartou porque não suportaria o peso de mais uma mentira em sua consciência.

Poderia fugir dali, simplesmente sumir do caminho da jovem e evitá-la até finalmente colocar um fim naquele caos... Essa era uma péssima escolha e também fora rapidamente descartada.

— Alana o que estou prestes a contar para você vai mudar toda a sua perspectiva do que vê e sabe, mas precisa entender que, eu não tenho permissão para falar sobre isso com ninguém, como já sabe, essa conversa sequer deveria estar acontecendo — Diz, fazendo uma pausa muito breve para respirar fundo novamente, suas mãos agora estavam levemente trêmulas, deixando claro o profundo nervosismo que parecia apenas crescer dentro de si.

Alana por sua vez, respirava mais lentamente, os ombros subiam e desciam num ritmo mais tranquilo, apesar de estar visível em seus olhos que ela também se encontrava agitada com aquela conversa e ele gostaria de saber quanto.

— O que aconteceu com a senhora Glesser é o que vem acontecendo com as outras pessoas, essas mortes que têm ocorrido aqui em Grória, na verdade, é o mesmo caso, assim como o cheiro de enxofre que sentiu na sua casa antes de ser atacada e quando sentiu também no hospital, esses dois fatores estão ligados à uma única situação. — Ele suspirou ao fazer uma pausa curta e Alana move a cabeça positivamente, parecia estar acompanhando sua fala. — Quando perguntei sobre o ataque, você tentou descrever qual era a aparência da senhora Glesser e que era algo semelhante a uma aparência demoníaca e realmente era algo demoníaco.

Kambriel precisou fazer mais uma pausa quando viu o rosto de Alana mudar, o que antes era uma pessoa prestando atenção no que estava sendo falado, mudou para uma pessoa confusa. Ela uniu os lábios e mordeu o inferior com força notável, seus olhos desviaram para a superfície da mesa e os dois pratos com a comida deixada de lado. O rapaz conseguiu captar quando a mente dela pareceu começar a trabalhar para associar melhor suas palavras.

Nisso, o arcanjo agora travava uma batalha interna entre o continuar a falar o que não deveria e a decisão de sair daquela casa. Seu lado guerreiro praticamente o forçava a sair dali, mas o seu lado humano mostrou-se ser mais forte em fazê-lo continuar na casa.

— Então quer dizer que aquilo foi causado por um...

— Um demônio? Sim. — Ele completou a fala por ela quando viu que a palavra simplesmente não iria sair de seus lábios com facilidade. — O pastor Jeffrey não passou mal como havia dito e você sabia que era mentira, o que realmente houve com ele foi um tipo de ataque, só que mais fraco. Não como o de Vivian, mas algo que o feriu também.

— E as mortes?...

— Todas causadas por demônios também. — Seu tom soa mais tenso e pesado, a mudança sendo algo do qual o fez sentir-se desconfortável. A revelação a fez levar ambas as mãos para a boca em espanto, seus olhos se arregalaram e ela parecia tremer, mas ele não tinha muita certeza disso.

Kambriel fica em silêncio por um tempo, deixando que Alana reaja e associe suas palavras com mais calma, afinal ela precisava de alguns minutos para entender melhor o que lhe fora contado e ele daria o tempo que fosse necessário; isso seria bom para ele também, já que, estava quebrando uma regra importante que lhe fora decretada antes de descer à terra.

— Eu posso fazer uma pergunta? — Ela questiona depois de um bom tempo em silêncio, não o olhava naquele momento.

— Claro.

— O que fez no quarto quando a senhora... Quando o demônio estava vindo na minha direção, você o expulsou, não foi? — Ela esperou que ele concordasse e somente nesse momento voltou seus olhos para ele, quando o viu balançar a cabeça continuou. — O que eu vi você fazer não foi... Normal e não tente negar isso, já que está sendo franco comigo espero que seja sobre isso o que vou perguntar.

Houve concordância de sua parte, mesmo que houvesse um grande temor sobre qual poderia ser a pergunta que ela lhe faria. A expectativa do que viria era algo estranho, causando nele um frio inédito em sua barriga; algo que ele não sabia ser possível de sentir.

— Você é como eles, não é? Um demônio? — Sua pergunta causa nele um tipo de tremor inesperado, surpreso e até mesmo um tanto desprevenido, ele finalmente percebeu que a humana estava ultrapassando suas expectativas quanto a eles. Alana sabia quais perguntas fazer de maneira que, ele ficasse encurralado e sem outra saída que não fosse respondê-las.

Ela queria respostas e ele finalmente aceitou que não poderia mais fugir disso.

— Não. — Responde com calma, deixando a palavra única sair de seus lábios com lentidão, o tremor ainda continuava e o motivo estava ficando cada vez mais óbvio para ele. O rosto da moça imediatamente ganha um ar mais tranquilo e aliviado, ela pareceu até suspirar aliviada. — Eu sou um arcanjo.

A nova revelação a pega completamente de surpresa e isso já era algo esperado por ele, uma mistura de descrença e espanto veio sobre a face jovem da moça juntamente com um sentimento estranho que ele não conseguiu decifrar. Seus olhos permaneceram fixos nele, o mesmo peso que sentia antes estava presente ali também, mas agora era algo quase insuportável de se sentir.

— O quê? — A voz feminina saiu levemente trêmula, mas não por causa do sentimento de medo e sim por causa da surpresa pela revelação dada.

Kambriel se arrumou na cadeira, unindo as mãos sobre a mesa tentando disfarçar o tremor que lhe dominava; se estivesse em um lugar aberto, conseguiria até sentir o Céu a lhe julgar por estar revelando sua verdadeira natureza para uma humana.

— Vim para a terra em uma missão, essas mortes que estão acontecendo chamaram a atenção do Céu e por isso desci, para colocar um fim nesse terror antes que se torne algo ainda pior do que já está. — Conta, seu tom carregava um peso gigante somente sentido por ele, consequências viriam por estar fazendo aquilo, mas nesse momento, a preocupação pareceu não ser grande coisa para ele. Seu interesse maior estava na forma como Alana o encarava enquanto prosseguia com sua fala. — Menti sobre o envolvimento de seu pai, estava procurando por ele porque o pastor Jacob viu uma dessas mortes acontecer de perto e acreditava que ele poderia me ajudar quanto a isso, me guiar em uma cidade tomada por um caos que vocês desconhecem, mas não sabia sobre sua morte.

Ele faz uma pausa, imaginando que a moça iria querer dizer algo a respeito e até mesmo esperava por isso, mas quando percebeu que seu silêncio iria se prolongar, continuou falando.

— A encontrei por acaso naquela noite, estava vagando pela cidade, um pouco perdido porque não sabia aonde procurar por seu pai, até que entrei na lanchonete aonde trabalha. — Continua, era possível ver aos poucos a expressão da West mais nova mudar conforme ela o escutava. — Assim como a sua morte, saber que era filha dele também foi uma grande surpresa para mim, então acho que agora entende o motivo da minha relutância em envolvê-la nisso, mas quando me contou sobre o ataque... Quando você perguntou se eu também estava sentindo aquele cheiro no quarto do hospital, eu percebi que isso já não estava mais em minhas mãos, de alguma forma você foi envolvida nisso também.

Cada palavra que saía de sua boca era como se estivesse sendo julgado por seus irmãos, estava rumando para um caminho sem volta e perigoso demais, sabia disso e como. Mas entendeu que, não tinha mais como deixá-la de fora, não quando ela já estava envolvida, apesar de ele não fazer ideia de como ou do motivo e talvez, envolvê-la não fosse algo assim tão ruim. Lembrou-se de Zarael e do demônio que o atacou mais cedo, o motivo do interesse em Alana era desconhecido e era algo que ele precisava descobrir e para isso, a manteria por perto.

Mesmo que isso significasse deixá-la exposta a uma situação como aquela.