Emma

Capítulo 3 - 209


Tentei ignorar as patricinhas de Beverly Hills a minha frente. Sean estava mudo ao lado de Claire. As três só sabiam fofocar sobre algumas meninas que também estudavam aqui, pelo que eu pude ouvir. A secretaria da escola ficava dentro da recepção. Quando pude me localizar sozinha, despedi-me deles.

Dois alunos e uma aluna já estavam sentados nos sofás pretos da recepção, provavelmente esperando a única secretária acabar de falar com um outro aluno. Sentei numa poltrona e comecei a ler o livro que trouxera - Macbeth. Após alguns minutos, a secretária estava livre pra mim. Guardei o livro e levei a bagagem comigo. A mulher era baixa e gordinha, seu cabelo preto estava preso num coque.

—Em que posso ajudá-la? - sua voz não era muito receptiva.

—Eu gostaria de saber onde é meu quarto. Queria também o horário das aulas - falei. - Err, meu nome é Emma Mitchell, acho que me esqueci de dizer. Terceiro ano.

—Bem, sta. Mitchell - ela digitava algo no computador. - seu quarto fica no lado Oeste, com os outros dormitórios femininos. Número 3, quarto 209, segundo andar - ela me entregou a chave. - Sua companheira de quarto se chama Emily Scott.

Fiquei um pouco surpresa com a notícia de que teria uma companheira, mas, no fundo, eu já esperava.

—A sta. Scott já passou por aqui, acho que deve estar lá agora - ela olhava para impressora, estava acabando de imprimir alguma coisa. Ela pegou o papel e me entregou. - aqui tem um pequeno mapa do campus da escola. A senhorita é nova, não é? - ela não me esperou responder. - Aqui ficam os dormitórios. Deste lado ficam os dormitórios masculinos e - ela apontou para o lado oposto - ficam os femininos. Você está aqui, a escola fica quase ao lado - disse apontando para um enorme prédio que ficava um pouco afastado na diagonal do que me parecia ser um estádio.

Legal, a recepção ficava mais perto dos dormitórios masculinos, o que significava mais tempo de caminhada, para o outro lado do campus, embaixo de um sol escaldante. Soltei um arquejo.

—Esses são os seus horários - ela apontou para a tabelinha abaixo do mapa. - Você pode almoçar e jantar em algum dos restaurantes da escola, tem de tudo, italiana, mexicana, chinesa, japonesa, brasileira, fast food e etc. No mapa você pode ver - ela apontou para alguns. - Se quiser pedir no quarto, todos os telefones estarão em uma folha na escrivaninha. Aqui fica o refeitório – ela me mostrou. – o café da manhã é servido nele e é a única refeição inclusa. Vai das 7h às 9h e as aulas começam às 9h30m. E, por favor, não se atrase para a palestra de boas-vindas do reitor. Será as 17h no estádio.

—Tudo bem, muito obrigada - sorri, me despedindo.

Saí da recepção, tive uma vaga sensação de que o sol estava mais forte. Respirei fundo, prendi meu cabelo num coque e voltei a andar. Passei pelo Mc Donald's, pelos dormitórios masculinos, pela escola e pelo Italian Now. Senti meu estômago roncando. Eu torcia muito para que houvesse os cardápios dos restaurantes nos quartos também. Enquanto eu passava, sentia os olhares dos alunos queimando em mim. Todos os meninos que passavam me encaravam de cima abaixo e podia jurar que também observavam minha bunda. Reparei até em algumas meninas fazendo o mesmo.

Quando finalmente cheguei ao dormitório 3, fiquei muito aliviada porque no saguão havia ar condicionado. Muitas meninas estavam lá e havia malas espalhadas. Fui até o elevador. Percebi que o dormitório 3 só tinha três andares contando com o saguão. Apertei o 2 e uma menina ruiva entrou também, porem não apertou nenhum dos três, em vez disso, apertou o botão para fecharem as portas. Então, elas fecharam-se e o elevador começou a se mover.

—Você - ela hesitou. - você é nova aqui? - ela perguntou.

—Sim - dei uma risadinha. - você também mora nesse andar?

—Na verdade sim! - ela sorriu. Como se estivesse surpresa por eu ter falado com ela. - moro no 207.

—Ah, vizinhas de porta! - tirei minhas malas do elevador, esperei por ela. - estou no 209. Err, você sabe pra que lado fica o meu quarto? - dei uma risadinha.

—É para direita - riu. Ela tentava apontar com a mão ocupada, sua mala parecia pesada. - eu vou com você, o meu também é.

Ri da situação.

—Ok - falei.

—A propósito, meu nome é Maya.

—Emma.

Maya entrou no quarto dela momentos antes deu entrar. Parei em frente à porta com uma plaquinha 209 na frente. Tirei a chave do bolso do paletó e tentei girá-la para esquerda, emperrou. Depois me toquei de que a porta não estava trancada. Virei a maçaneta e a porta abriu com facilidade. Observei algumas malas no meio do quarto, deveriam ser de Emily. Entrei com as minhas coisas.

O quarto era razoavelmente grande. Nele, havia duas camas. Uma do lado direito do quarto, com a cabeça para a parede, e uma do lado esquerdo, que já estava feita. A cama dela era virada horizontalmente para a parede. Levei minhas malas para mais perto da cama desocupada. Ao lado dela, havia dois armários. Um estava aberto, algumas roupas estavam nele. Comecei a arrumar a minha cama. Vi a porta do banheiro se abrindo ao lado da cama de Emily. Uma menina loira saiu dele. Ela não tinha a aparência como a de todas as meninas daqui. Seu cabelo era escorrido, repartido no meio. Usava óculos de grau fora de moda e vestia o uniforme escolar de modo extremamente formal desnecessariamente. Ela levou um pequeno susto ao me ver.

—Ah, oi! Eu não sabia que estava aqui – ela meneou as mãos. – Emily Scott – se apresentou.

—Emma Mitchell. Sou nova aqui – sorri.

Ela sorriu.

—Bom, sempre estudei aqui, se precisar de alguma coisa – ela ofereceu.

—Bom, na verdade, eu queria saber se a gente recebe os cardápios dos restaurantes no quarto? – ela pareceu achar graça. Permaneci sem me mover.

—Não – ela riu. – Mas gostei da sua ideia, bem que podia ter.

Desviei o olhar de Emily e sentei na cama vazia.

—Mas então, já conheceu alguém? – ela tentava puxar assunto. – O que acha da escola? Quero dizer, por enquanto.

—Bom, achei a escola legal, só que é muito grande, fiquei meio perdida. Mas amei a ideia dos mapas, me ajudou muito – afirmei, mostrando o meu. – Ããã, um garoto, não sei se você o conhece, Sean, e a namorada dele, Claire. Ela e as amigas delas são meio... bom, não sei bem descrevê-las.

—Claire Hanover? É melhor não se envolver com ela – percebi a mudança em seu tom.

—O que quer dizer? Elas não parecem ser uma ameaça.

—Elas podem parecer super legais e super inocentes, mas de inocente elas não tem nada. De verdade.

Forcei-me a manter minha expressão facial normal. Era quase hilário o quanto ela era exagerada, no entanto, me contive. Até parece que ela podia ser do tipo Regina George de Mean Girls. Ela era claramente menininha, bom, pelo menos eu acreditava fortemente naquilo.

—Até parece – soltei uma risadinha. – Você quer que eu acredite que elas são más?

—Não más. Não disse isso. Disse que é melhor não tê-las por perto.

Ergui uma sobrancelha. Ela continuou;

—Você vai se deslumbrar com o fabuloso mundo da Claire. Ela é popular, namora os mais bonitos, vai a todas as festas, incluindo a Premium Party VIP...

—Premium Party VIP? Como é que é? – ri. – O que é isso?

—É tipo a melhor festa do semestre. São sempre festas épicas.

—Épicas? – ri mais um pouco.

Ela começou a ficar irritada.

—É sério, todo o colégio quer ir a essas festas. Porque são absurdas. Bom, quase todo. Eu não faço muita questão, mas isso não vem ao caso. Voltando a Claire. Ela é falsa e não serve como amiga.

Eu sinceramente preferia ficar ouvindo meu iPod ao invés daquela baboseira. Provavelmente, Emily deve ter tido algum desentendimento com Claire no passado e guarda rancor até hoje. Ou talvez só esteja interessada no Sean, ou ir nessas tais festas Premium, só que nunca fora convidada. Não levei seu papo muito a sério apesar de ter achado Claire bem idiota.

—Agora fala pra mim. O que ela fez pra você? – perguntei.

Ela revirou os olhos, com raiva.

—Será que você não escuta o que eu digo?! – a fúria representada em sua voz.

—Calma, calma – ri. – Tá bom. Relaxa. Vou ter cuidado, prometo.

Ela não respondeu. Terminava de colocar as roupas no armário. Àquela altura, minha cama já estava arrumada. Puxei minha mala de roupas e abri-a em cima da cama. Comecei a fazer o mesmo que Emily, quando senti meu estômago roncando. Lembrei de que não havia comido.

—Vai querer comida chinesa? – perguntei após a longa pausa.

—Pode ser – ela sorria.

Sorri pra ela e peguei o telefone. Antes que eu perguntasse ela falou “Na gaveta da escrivaninha”. Agradeci e peguei o número no papel plastificado com todos os números. Disquei o ObaYakisoba. Ouvi chamar três vezes.

—ObaYakisoba, posso ajudar? – a atendente perguntou monotonamente.

—Olá, eu gostaria de fazer um pedido – falei.

—Qual dormitório e quarto, senhorita? – seu tom não mudara.

—Dormitório 3, 209 – disse.

—Na conta da sta. Scott ou sta. Mitchell? – ela perguntara.

—Como assim? – não entendi.

—Qual das duas irá pagar? – explicou ela.

—Um minuto – pedi.

—Emily! – chamei.

Ela virara para mim.

—Sim? – ela perguntou.

—Quem paga? Tem como pedir separado? – perguntei.

—Tem, pede um de cada vez.

—O que você vai querer? – perguntei, o segurando na parte debaixo do fone, impedindo a atendente de nos ouvir.

—Dois rolinhos primavera com catupiry e dois rolinhos primaveras de camarão.

Assenti duas vezes com a cabeça.

—Alô? – voltei ao telefone.

—Olá – a atendente disse. – Já decidiu quem vai pagar?

—Vou pedir separado.

—O que a sta. Scott quer? – perguntou ela amavelmente.

—Dois rolinhos primavera com catupiry e dois rolinhos primavera com camarão.

—E a sta. Mitchell? – disse ela. Depois de repetidos “uhum”.

—Você sabe me dizer qual o prato mais pedido? Não sei muito bem o que pedir.

Houve uma pausa. Ela deveria estar consultando.

—Frango Crispy, que a senhorita pedir acompanhamento, como: batatas fritas; arroz; salada e feijão.

—Pode pedir todos os acompanhamentos? – ri.

—Sim – ela também deu uma risadinha, quase inaudível.

—Seu pedido deve chegar em aproximadamente vinte minutos, tenha uma boa tarde. Adeus.

Ela desligara antes mesmo de eu responder. Chamei Emily outra vez.

—A mulher não disse quanto a gente tem que pagar – falei, confusa.

Ela riu de mim.

—Você não vai pagar por nada aqui. Vai para um registro e seus pais recebem a conta no fim do mês. É como um cartão de crédito.

—Ata – disse. – Nossa, vocês são evoluídos por aqui – avaliei.

Ela dera uma risadinha. Fiquei realmente espantada do quão essa escola era boa. Não era a toa ser uma das melhores do estado.

Antes da comida chegar, nós duas já havíamos acabado de arrumar as coisas. Nossas malas já estavam guardadas nos compartimentos do armário, mas minha bolsa grande teve de ficar debaixo da cama. Eu arrumara minha maquiagem na penteadeira do quarto.

—Deixei duas gavetas da penteadeira pra você, pode colocar sua maquiagem – falei.

—Eu não uso maquiagem – ela baixou a cabeça.

Arregalei os olhos, por pouco fiquei boquiaberta.

—Como assim?! – eu estava incrédula.

—Eu não...

—Pode parar! Você agora vai usar minha maquiagem, Emily – apelidei-a.

A campainha tocara, depois ouvimos uma voz dizer “Entrega de comida”. Fui até a porta e a recebi. O entregador despediu-se de mim.

—Tá bom. Quando acabarmos, darei uma repaginada em você!

—Repaginada? – ela me pareceu querer vomitar.

—Emily, não se preocupe. Você vai adorar – disse sorrindo.