Em Busca do País das Maravilhas

Capítulo 11 - Quem robou as tortas?


Escuridão. As pálpebras cansadas de Martin se abrem lentamente, suas pupilas azuis se dilatam se esforçando para conseguir pegar algo em meio à penumbra. Um vento sopra na direção oposta ao penteado do seu cabelo loiro, agora ele vê uma luz, é a do sol reluzindo no grande sino da igreja Christ Church. O vento continua correndo para dentro do local atrás da porta principal aberta.

- Deus está comendo o vento.

Martin não conseguiu disfarçar o pulo, havia uma garotinha do seu lado, de cabelos escuros até o ombro e vestia roupas vitorianas, parecia ter saído de uma velha fotografia.

Alice.

- E-Estou sonhando? – Ele também não conseguiu disfarçar o nervosismo.

- Estamos vivendo um sonho criança.

Alice sorriu graciosamente e voltou para a penumbra. O sino começou a badalar, voltando à atenção do garoto para a igreja.

Ele caminhou em direção das portas antigas, o piso todo rangeu assim que ele botou os pés nas tábuas desgastadas.

Fracos raios de sol passavam pelos vitrais dando uma fraca percepção do lugar que ele havia estado antes, algo brilhava no fundo do grande salão.

Sim, havia alguma coisa, por debaixo do altar, parecia uma fechadura, era ali. O sino começou a tocar, Martin se lembrou do dia da torre, aquilo o fez ter uma sensação ruim. Ele quer sair dali, ele não consegue andar. Seus pés deslizam involuntariamente até o altar.

Seus olhos observam o grande crucifixo antigo com a madeira já totalmente sem cor, a imagem sagrada do messias está encantadora. Tão viva, tão bem elaborada, tão... Realista. Parece até estar se mexendo, parece até que o sangue da coroa de espinhos está escorrendo, o corpo da escultura já está coberto pelo líquido escuro e viscoso, o estranho sangue cor-de-piche continua a escorrer e chega o chão se espalhando por todo o altar.

A pequena Alice reapareceu boiando em meio à poça sangrenta.

- Você não deveria ter seguido o Coelho Branco.

*

O som do sino ecoando repetitivamente na cabeça de Martin assim que ele deu um pulo da cama encerrando o pesadelo.

Ele passa os dedos por volta do seu pescoço para se certificar de que não estava molhado pelo estranho sangre sagrado, para seu alívio era só suor.

O som dos ponteiros do relógio de cabeceira pareciam mais altos do que nunca, era uma madrugada silenciosa. Lucas não estava roncando.

- Lucas...? – Martin tentou se certificar e como já esperava não houve resposta.

Ele se levantou ainda com as pernas bambas e saiu pela porta. Mesmo de pantufas ele podia sentir o piso gelado fazendo ter calafrios.

Ele desceu as escadas, passou pelas salas de estudos e foi na direção do corredor que separava a área dos dormitórios com a área principal de Oxford.

Antes mesmo de dobrar a esquina ele percebeu pelo canto dos olhos que a porta do refeitório estava aberta.

Antes mesmo de terminar de atravessá-la já pode reconhecer os cabelos ruivos e o corpo enrolado por um roupão roxo.

- Oi.

- Oi. – Martin se sentou ao lado dela.

- Não consegue dormir não é?

- Não, pesadelos.

Nicole assentiu.

- Comigo é um pouco diferente, sinto-me observada a qualquer momento. Eu ainda não consigo acreditar no que está acontecendo - ela virou a cabeça na direção dos vitrais. – Porque você quer ainda continuar com isso Martin?

- Por que... – o garoto olhou para o chão e respirou fundo – Praticamente toda minha vida foi sendo formada a partir da literatura, praticamente todas as decisões e caminhos que eu tomei foi pelos livros. Agora, uma coisa tão importante como Alice... Eu preciso muito saber o que está escondido.

- Você quer dizer como se isso faria sua vida realizada?

Martin assentiu ainda olhando para o chão.

- É sério que não está animada com tudo isso?! Roubamos um manuscrito, invadimos lugares, estamos sendo perseguidos por uma sociedade secreta e estamos prestes a desencadear um dos maiores mistérios que a história até hoje considerou uma lenda urbana.

- Esse também é o meu sonho.

Martin calou-se no mesmo instante, Nicole havia dito aquilo tão espontaneamente que ele até se assustou.

- Sempre foi. – continuou – eu vim para Oxford com esse objetivo.

- Então, esse é o nosso sonho. – disse Martin.

- Sim, e você pode ter certeza que eu estarei ao seu lado, e farei de tudo para que possamos realizar juntos, por Alice... – Nicole falou rápido, tropeçando nas palavras.

Martin apenas encarava os seus olhos claros.

- Meu Deus, eu me sinto num livro do Dan Brown.— Nicole começou a rir, Martin a acompanhou.

Em seguida silêncio.

- O baile é no final desta semana – Martin olhou para Nicole.

- Sim, parece que você não gosta muito de dançar.

- Eu nunca dancei.

Nicole fez uma careta.

- Eu sou o tipo de pessoa que vive esperando pelo inesperado, infelizmente o inesperado só acontece quando não estamos esperando.

- O quê? – Nicole se assustou ao ouvir algo assim de Martin tão repentinamente.

- Não é nada – Martin riu – Só algo bobo que eu costumava repetir para mim mesmo muitas vezes quando era mais novo. Sonhando alto, caindo alto... Sem esperanças...

Nicole apenas assentiu, ela não podia saber, mas Martin sabia que aquilo era a melhor situação que o inesperado já havia lhe proporcionado.

***

A semana passa ao mesmo tempo os primeiros flocos de neve começam a cair. Martin corre contra o tempo para entregar as redações e os inúmeros trabalhos atrasados.

Em todo lugar que ele vai, dentro ou fora de Oxford, o faz sentir-se observado, então enquanto uns saem para a gandaia ele opta por passar os últimos dias do primeiro ano letivo dentro de seu dormitório.

Martin também constantemente vivencia os mesmos pesadelos de antes, sempre entrando na igreja e vendo o brilho no altar seguido pela a imagem religiosa sangrando. Toda noite ele acorda de mesmo jeito, assustado e suando frio.

Até que finalmente o dia do baile é anunciado mais uma vez nos alto-falantes que ecoam pelos imensos corredores.

Lucas está em frente ao espelho a mais de meia-hora emplastando o cabelo de gel enquanto Martin ajeita as mangas do terno.

- Se eu fosse o seu cabelo já daria um jeito de aprender a falar só para te xingar. – Martin tirou o pote de gel das mãos de Lucas – Isso daqui precisa durar até o final do ano, mocinho.

Lucas fez uma careta.

- Eu preciso ir mesmo nesse baile? Roupa chique me aperta. – ele parecia uma criança fazendo birra.

- Bem, você não precisa, não tem par mesmo.

Lucas bateu o pé.

- Vamos logo. Daqui a meia-hora já começa a primeira dança – Martin abriu a porta puxando Lucas para o lado de fora.

*

Embora o frio estivesse predominante o tempo continua como nos outros dias, apenas pequenos flocos cortavam o céu de vez em quando.

A festa estava ocorrendo no grande ginásio, como era um baile de inverno, o lugar estava repleto de decorações toscas de flocos de neve de papelão.

Todas as garotas pareciam ter saído de uma mesma loja, pois estavam sempre usando um vestido preto ou branco.

Lucas e Martin logo encontraram na entrada Lacie que estava com um vestido azul com estampas de floco de neve e renas, a coisa mais brega do mundo.

- Olá meninos! – Ela demonstrava entusiasmo ao balançar o braço.

- Olá Lacie! Você também irá dançar? – Assim que terminou a frase, Martin lembrou-se do dia na passagem secreta onde além de ver o culto estranho pode ouvir a voz de Lacie os convidando para entrar. Logo veio a sua mente a possibilidade de ela também estar vigiando os seus passos.

- Não, não. O funcionário aqui não tem direito a nada. Só ajudei na decoração, o quê acharam?

"Uma droga." Pensaram os dois amigos juntos.

- Muito boa! – sorriu Lucas.

- Ah, obrigada – ela deu mais pulos de empolgação – Bom, então... Divirtam-se! – terminou gesticulando as mãos para eles entrarem

Lucas e Martin sorriram e seguiram para dentro do salão onde se esbarram com muitas pessoas até avistarem Nicole e Sabrina.

Ao chegarem, viram que Sabrina estava acompanhada de Jake, o seu "par-espião".

- Olá Jake. – Martin sorriu achando que de algum jeito aquilo iria atingi-lo indiretamente.

- Olá Martin. – respondeu com o mesmo tom.

Houve bastante silêncio após isso, o que criou um clima tenso entre o grupo.

- Bem, Nicole. – a pegou pelo braço – Vamos nos preparar para a dança?

Martin puxou Nicole para o outro lado da pista.

- Eu acho que já sei aonde devemos usar a chave. – disse ele erguendo a mesma.

- Onde? – perguntou abaixando a mão dele escondendo o objeto.

- Em Christ Church. Um pouco depois de termos descobrindo-a comecei a ter vários sonhos sobre algum tipo de fechadura por debaixo do altar, então dei várias pesquisadas rápidas na internet e descobri informações históricas que afirmam a existência de câmaras subterrâneas por debaixo da igreja e que a mesma está interditada há quase um século porque só pode ser aberta por a partir de uma chave específica que está desaparecida.

- Acha que é a nossa chave?

- É claro, Lewis Carroll foi uma das pessoas mais importantes na história daquele lugar. É óbvio que ele se aproveitaria da grandiosidade do local para deixar uma marca sua, nós já vimos isso no dia que fomos até a torre do sino!

- Como vai senhor Roque? – uma voz familiar interrompeu Martin por trás. Os dois viraram-se e se depararam com a professora Louis, Gardnet e o instrutor Hector.

- A-ah O-olá Gardnet... Senhora Louis...

- Lembra-se do Hector aqui?

- Olá Martin. – ele esboçou um sorriso forçado. Hector estava com a mesma expressão preocupada e nervosa de antes no dia na lanchonete. – Senhores, se me dão licença, eu gostaria de dançar a primeira música com... Você. – foi quando ele apontou para Nicole.

- Comigo? – Nicole se espantou.

- Com a Nicole? – todos tiveram a mesma reação.

Hector olhou virou-se na direção dela e a pegou pela mão.

- Se me permitem?

- Ok. – Martin olhou para os lados. Nicole lançou lhe um olhar de preocupação. Martin rebateu com outro para acalma-la e em seguida saiu de volta ao encontro de Lucas e os outros.

Hector levou Nicole até o centro da pista, começou a guiar Nicole no ritmo da música clássica na qual estava tocando. Quando percebeu que Gardnet e os outros membros da seita estavam observando ele atentamente, ele puxou Nicole para mais perto dele e começou a cochichar em seu ouvido.

- Olha, eu não tenho muito tempo. Não é seguro para eu estar aqui. Eu só quero lhe dar um último aviso, parem de procurar pelo livro.

- O quê? – Nicole começara a ficar inquieta.

- Shhh... Continue fingindo, não olhe para os lados, estamos sendo observados por mais alguém além da seita dos Carrollianos. Eu que eu quero dizer é que tem muito, mas muito mesmo em jogo por esse livro. É algo muito mais obscuro e terrível no qual você não quer descobrir.

A música começou a parar e Hector se desgrudou de Nicole. A garota olhava ainda abalada para ele.

- Apenas guarde isso que eu acabei de falar. Vocês não irão querer acabar como eu acabei. – Hector tirou um relógio de bolso de dentro do casaco e saiu na direção oposta.

- Ei! Espere. O que quis dizer com isso?

Foi quando os olhos dela se viraram para o que Hector segurava. Ao entrar em contato com a luz, a superfície dourada do relógio revelou uma espécie de marca d'água que era muito parecido com o símbolo do brasão do País das Maravilhas, mas desta vez um pouco diferente.

Nicole continuou observando ele até Hector sumir em meio à multidão. E quando virou foi surpreendida por todos os seus amigos atrás dela.

- O quê foi que ele disse? – questionou Martin com uma sobrancelha erguida.

Nicole pensou em contar tudo o que havia escutado e dizer o quanto havia ficado assustada e intrigada, foi quando percebeu a presença de Jake de mãos dadas com Sabrina.

- Nada, só um tanto de bobagens. Ele tinha cheiro de bebida. – mentiu.

Sabrina e Lucas pareciam mais aliviados enquanto Martin e Jake mantinham uma sobrancelha para cima.

- Jake, porque você e a Salem não dançam a próxima música? – Nicole deixou escapar uma piscada de olho para Sabrina.

- É mesmo, eu quero muito. – Sabrina o segurou o braço dele entrando na onda. Jake respirou fundo.

- Ok.

- Pronto. Isso já nos dá bastante tempo. – afirmou Nicole observando enquanto os dois se afastavam.

- Isso está com cara de um plano. – refletiu Lucas.

- Sim, nós descobrimos aonde temos que usar a chave. – afirmou Nicole - Você fica aqui, dando cobertura. Eu e Martin iremos voltar a Christ Church.

— O quê?! Já estão me excluindo do grupinho?!

- Não, você é importante. Garante que os Carrollianos não irão nos seguir, Ok?

Lucas murmurou um "ok" forçado.

- Vamos Martin, enquanto é tempo.

*

O portão enferrujado estava fechado por algumas correntes sem cadeado. Nicole as lançou longe e Martin abriu espaço suficiente para os dois passarem. Eles atravessaram o jardim que agora durante a escuridão da noite parecia sem vida.

Uma das portas laterais estava aberta, quem quer que seja que era responsável por guardar aquele local não dava a mínima para ele.

Não havia nenhum tipo de iluminação no grande salão, a luz do luar que entrava pelos vitrais fazia desenhos no chão o que tornava tudo mais assustador.

- Não vamos demorar muito. – Martin levou Nicole até o altar. – Deve ter algum tipo de portinhola ou alçapão que leve para a parte debaixo da igreja por algum lugar.

- Já achei. – Nicole fez um gesto para Martin se aproximar.

E de fato havia uma pequena porta de pedra na parte de trás do altar. Martin tirou a chave do bolso e girou na fechadura, um estalo rígido se ouviu e os dois começaram a puxa-la através de uma barra de ferro perto da tranca.

O estridente som da pedra sendo arrastada no piso de mogno atingiu os seus ouvidos, um cheio de poeira e umidade veio ao ar. Agora eles estavam de frente para uma escada que descia em um túnel escuro e gélido.

- Eu vou primeiro – disse Martin espremendo-se no lugar enquanto ajustava a luz do celular.

Nicole veio logo atrás dele, não foram muitos lances de escadas até atingirem superfície plana. O cheiro de poeira e umidade aumentou.

- É uma cripta. – afirmou Nicole enquanto passava a sua luz por cima de restos de crânios no chão.

- Tem razão, e são corpos de várias pessoas importantes para Oxford e a igreja do século passado. – Martin apontou para uma placa no qual havia dizeres entalhados.

- Você acha que Lewis Carroll está entre um deles?

- Não, Lewis Carroll fechou a cripta antes de morrer para assim esconder a chave. O corpo dele de verdade está enterrado no cemitério de Guildford.

Martin topou com a figura de um crucifixo onde havia pregado uma escultura do messias, a imagem o fez ter arrepios ao lembrar-se do sonho onde via o sangue escorrendo da coroa de espinhos.

- Eu não estou vendo nada parecido com um livro por aqui – Nicole o pegou pelo braço.

- Espere um segundo.

Martin tirou do bolso do paletó a carta da Rainha de Copas, ele olhou através da camada de plástico e nada viu. Foi quando virou seus olhos para cima e a carta revelou várias escrituras gravadas nas laterais das paredes. Martin começou a lê-las em voz alta.

- "O Valete só terá um chance entre três opções, de três portas, duas não têm nada." Três portas?

- Sim, olhe ali. – Nicole apontava para uma fenda entre os ossos, havia sim uma pequena portinha. – É como na história precisa usar a chave dourada para chegar ao jardim da Rainha de Copas.

Martin olhou para os outros lados e pode encontrar as outras duas portas.

- Isso eu entendi, Temos que escolher a porta certa.

- Sim, isso meio que complica tudo...

Martin se dirigiu até uma das portas, foi quando virou a cabeça para cima e viu que havia uma pequena janelinha que servia como passassem de ar e luz.

Ele ficou na ponta dos pés e esticou o pescoço, olhou através da janela e pode ver o belo jardim da igreja do outro lado.

- É aqui. – afirmou.

- Como pode ter tanta certeza? – disse Nicole observando.

- Lembra-se do livro? Lewis Carroll disse que através da pequena porta havia o "mais belo jardim que Alice já vira" o jardim da Rainha de Copas. Agora olhe por essa janelinha, ela leva diretamente ao gramado da igreja, justamente o local que o autor se inspirou para fazer a tal passagem na história.

- Uau! Realmente, faz todo sentido.

Os dois se agacharam rumo à porta.

- Tem certeza de que é aí, Martin? Duas das portas não tem nada.

- Sim, tenho.

Ele já tirava a chave do bolso quando foi interrompido novamente por Nicole que agarrou sua mão.

- E se essa for mesmo a certa, mas mesmo assim não tiver nada aí dentro...?

Martin respirou fundo e olhou nos olhos dela.

- É o que vamos descobrir agora. – e girou a chave na tranca.

As dobradiças da pequena porta rangeram, Nicole passou a luz por dentro dela.

- Sim! Tem algo lá no fundo!

Martin esticou o braço por dentro da grande fenda e seus dedos alcançaram algo áspero, ao retirar de lá de dentro, depararam-se com um velho caderno de uma capa de couro desbotado e seco com as iniciais do autor gravadas: C L D (Charles Lutwidge Dodgson)

Os dois ficaram boquiabertos, sem palavras, teriam eles realmente achado o tão misterioso terceiro volume no qual vem tido tantas controvérsias e mistérios ao longo dos séculos?

- Martin Roque. – A voz fez as espinhas dos dois ficarem geladas, num pulo eles se viraram.

Era Gardnet, juntamente com Jake, Louis, professor Taylor e Mary. Eles estavam encurralados.

- Não se aproximem! – Martin berrou por impulso guardando o livro nas costas – Eu achei o livro, ele é meu por direito.

Nicole apertou o braço dele, Gardnet começou a se aproximar com calma.

- Fique calmo... – disse fazendo um gesto com as mãos – Nós não queremos machuca-los.

- Ah, claro que não! Acham que eu não sei o que fazem escondidos nos porões. Rituais, espiando os alunos...

- O quê?! Não, você entendeu tudo errado, querido! – disse Mary também chegando perto – Acho que nós devemos nos apresentar...

Gardnet assentiu com a cabeça. Todos os outros do grupo de puseram mais perto e fizeram uma reverência.

- Nós somos os Carrollianos, um grupo de estudiosos de obra de Alice e seu autor, Lewis Carroll. Mas... – continuou Gardnet aumentando a entonação – também somos investigadores de lendas urbanas em torno da história.

- Investigadores? – Nicole soltou o braço de Martin.

- Sim queridos. O que realmente queremos dizer é que não somos pessoas más, sabíamos que vocês estavam naquele dia no porão secreto. – Mary explicou.

- Então porque deixaram a chave para nós, se sabiam que ela levaria vocês ao livro? – Martin ergueu a sobrancelha determinado a começar um interrogatório.

- Porque nós sabíamos que vocês já haviam descoberto muita coisa além do que nossa sociedade, e vocês provavelmente saberiam como usar a chave assim nós levaríamos ao livro.

- E aquela coisa toda macabra que mais parecia um ritual?

- Todo admirador de Alice, sabe que o próprio Lewis Carroll estava relacionado com religiões ligadas à magia. Nós não cultuamos aquilo como religião e sim temos o costume de seguir hábitos que o autor fazia.

- Porque querem o terceiro volume? Fama? Dinheiro?

- Compreensão. – afirmou o senhor Taylor se dirigindo aos dois – Nós somos a maior sociedade de Alice no mundo! Mesmo com tantos documentos e objetos importantes nada conseguiu nos levar a uma resposta do porque do autor ter escondido o livro ao invés de publicá-lo.

Martin e Nicole se olharam, havia sinceridade nas palavras dos professores, mas eles ainda precisavam questionar mais.

- Se são historiadores tão grandes assim porque não conseguiram achar o livro antes? Porque justamente eu, que nem sou um profissional conseguir descobri isso tudo agora?

Todos se olharam e suspiraram fundo.

- Nós também não sabemos senhor Roque. É por isso que nós estávamos com as suas fichas de inscrição naquele dia. Estávamos investigando vocês... – Gardnet olhou para o chão.

- Correção, me espionando! – Martin se irritou.

- Não! O quê isso! Nunca espionamos vocês! – Jake finalmente se manifestou.

- Então por que eu vi uma pessoa encapuzada de vermelho como vocês quando o peguei um trem para Guildford e quando estava na casa de Lewis Carroll?

- O quê?! – Todos do grupo se assustaram.

- Não fomos nós Martin! – Taylor indignou-se.

- Ele tem razão – continuou Louis – Nós só começamos a ir atrás de vocês depois que descobriam a casinha de bonecas, foi quando Jake os contou de vocês para nós.

- O quê?! – Nicole e Martin deram um pulo ao mesmo tempo.

- Se não foram vocês, quer dizer que tem mais alguém me espiando há muito mais tempo. – Martin estava confuso.

- Mas, quem seria? – Mary olhou para Gardnet.

Foi quando Nicole arregalou os olhos e soltou as palavras que estavam presas em sua garganta.

- É o Hector.

- Hector?! O mesmo Hector instrutor de vocês? – Gardnet perguntou.

- Sim, quando ele me tirou para dançar começou a falar coisas do tipo para eu parar de procurar pelo livro e que eu e os outros iriamos acabar terminando como ele.

- Meu Deus, então temos que procurar por ele! Mas, antes... Poderia me conceder a gentileza de ver o livro? – Gardnet estendeu a mão na direção de Martin.

Martin tirou o livro de trás das costas e estendeu para os outros. Logo todos se juntaram e volta de Gardnet, todos queriam ver a grande descoberta.

- Espera isso aqui não é o terceiro volume! – Gardnet surpreendeu-se enquanto folheava o caderno.

- Não?! – Martin questionou.

- Não, mas é ainda melhor. É o diário de Lewis Carroll! O diário que esteve desaparecido por todo esse tempo! Vocês praticamente nos deram o caminho para o livro!

- Então quer dizer que ainda não acabou. – refletiu Nicole – ainda teremos de descobrir mais enigmas para chegar ao que queremos de verdade.

- E isso com certeza adiantará metade do caminho. – disse Jake apontando para o diário.

Foi quando todo um raciocínio foi interrompido por um barulho vindo de fora. Era um som bem familiar, uma sirene.

- Polícia? – Martin ficou atento.

- Ou ambulância. – falou Louis fechando os olhos se concentrando no som.

- Não... – Gardnet fechou o caderno – São os dois e está bem perto daqui. Vamos voltar. Algo está acontecendo.