E lá estava eu imóvel. O botão na parede se tornou vermelho e a porta de aço reluzente se abriu bem na minha frente. De dentro do elevador saíram duas senhoras que conversavam sorridentes. Eu entrei basicamente impulsionado por um desejo intrínseco do ser humano em saber a verdade.


Eu estava cônscio de como eu era covarde e que mesmo não sendo aparente eu era frágil, poderia esse ser um choque maior do que eu poderia suportar.




A porta automaticamente se fechou e eu me dei conta que estava sozinho, sozinho e prestes a encarar os fatos. Levantei o braço e direcionei meu indicador a apertar o número dezessete. Estava feito. O elevador deu um leve solavanco indicando que começara a subir.




Naquele momento eu senti como todas as células em mim presentes eram contrarias aquela atitude. Pra quê eu precisava saber? Por que será que eu tinha que forçar meus olhos a ver?


Bem, provavelmente porque só assim eu me convenceria do que estava acontecendo. Mas pensando bem, eu já havia passado bastante tempo ignorante a isso, poderia permanecer assim, não poderia?



NÃO.



Definitivamente não. Olhei para cima e estávamos ainda no terceiro andar. O pequeno número de néon vermelho me encarava como o mais cruel dos juízes. Eu tinha que começar a encarar as coisas de frente, e se esse era o primeiro passo, vamos lá.




Eu não fazia idéia que daquele momento em diante eu faria parte da pior combate da minha vida. Eu contra eu mesmo, entre o percurso do térreo ao décimo sétimo andar.


Comecei sentido um leve tremor nos dedos, estralei todos eles até o mindinho, seguido por um constante aperto de mãos. Minhas células sudoríparas também começaram a marcar presença indicando o quanto eu estava nervoso. A essa altura estava no quinto andar.




Por mais que eu tivesse dignidade o suficiente até ali para entrar naquele elevador, quanto mais os números subiam mais ela se esvaziava de mim. Eu olhava constantemente para o marcador dos andares.




Nesse momento meu coração batia num ritmo feroz, bobeando freneticamente oxigênio para minhas artérias. Eu comecei a ofegar. Por um minuto comecei a achar que eu tivesse um princípio a claustrofobia. Na verdade não era isso, eu só queria sair dali, não queria ter que passar por aquilo de novo. Eu precisava ir embora já.


Ok. Eu tinha que manter a calma, eu necessitava manter a calma.




Sétimo andar.



Era isso, eu precisava de algum bom motivo para permanecer neste elevador e seguir em frente, ou eu pularia fora no próximo andar. Nesse segundo milhares de motivos apareceram em minha mente, mas eu precisava de opções razoáveis, lógicas. Nada do tipo: você esqueceu de dar comida para seu cachorro


Comecei a sentir que aquelas paredes de aço começavam a ficar mais apertadas. Normalmente quanto um elevador tem de largura?



Dois metros talvez menos?


Oitavo andar.


Tanto faz.



Novamente comecei a imaginar uma possível claustrofobia escondida em meu inconsciente. Ergui meus olhos e me forcei a olhar para o teto claro, branco, translúcido. Abaixei a cabeça, agora estava tonto e parcialmente cego. Provavelmente eu sempre fora cego, um cego estúpido e covarde. Talvez fosse por isso que eu era sempre o último a reparar, a saber. Como nos meus quatorze anos quando meus pais estavam e processo de separação e até o porteiro sabia, menos eu.Seria realmente porque eu não era dotado de muita perspicácia ou porque não tinha fibra suficiente para encarar a verdade?


Décimo andar.


O que é pior que a ignorância? O ódio? O egoísmo? Eu achava que sim, mas agora me parece mais razoável dizer que nada é pior do que ela, porque ela é o contrário do amor. Sim, com certeza e não o ódio. Pois esse também é um sentimento, mesmo ruim, ele é. A ignorância não, não passa do nada, do descaso e total desprezo de emoções.


Décimo primeiro andar.




Parecia-me agora que havia se passado uma eternidade desde a hora em que pus os pés neste elevador. Quanto tempo até chegar ao décimo sétimo? Quanta angústia mais eu teria que experimentar, quanto mais esforço físico e emocional eu teria que ceder até chegarmos lá?


Décimo segundo andar.



Passei a mão pela minha têmpora retirando uma gota de suor que escorria.




Me coração ao contrário do que eu pensava persistia em seu ritmo frenético. O fato é que comecei a reparar que desde que comecei a subir nenhuma vez o elevador havia parado. Como é possível em dezessete andares ninguém pegar o elevador?


Décimo terceiro andar.


Novamente comecei a ofegar, não sabia se era porque estava finalmente me aproximando ou porque não gostava do número treze.




Por Deus, quanto tempo demora a um elevador chegar ao maldito décimo sétimo andar?



Diabos.



Eu me sentia exausto, fatigado. Eu havia entrado no prédio da minha noiva e em seguida me dirigido ao elevador simplesmente para confirmar sua traição. Agora eu digo confirmar, porque a essa altura eu já não acredito que isso seja apenas uma suspeita. Porque eu não poderia ter contratado um detetive particular, o mandado tirar umas fotos e acabar com isso de uma vez?


Porque eu sou o tipo de pessoa que sempre faz do jeito mais difícil.



Décimo quarto andar.



Agora ela poderia estar com ele. Enrolados nos mesmos lençóis em que nós costumamos nos enrolar, se beijando ardentemente enquanto eu estou a três andares abaixo. E se isso realmente estiver acontecendo, o que eu vou fazer? Gritar? Simplesmente ir e deixá-los?



Talvez um pouco de mediocridade a essa altura não faça mal.


Décimo quinto andar.



O elevador para. Fiquei surpreso. A porta abriu me mostrando a silhueta de uma mulher. Ela era muito bonita, estava segurando uma caixa de papelão. Sorri pra mim e diz:


- Ta subindo?



Eu balaço a cabeço dizendo que sim.



- Ah. Então ta.



Ela se afasta e novamente o elevador persegue seu caminho.


A menos de dois andares sinto que adoraria ter uma dose de vodka aqui comigo. Meu corpo todo exige que isso termine logo, que toda essa dor se dissipe. Que de alguma forma eu posso sair daqui. Eu penso na garota do décimo quinto andar, não sei por quê.



Décimo sexto andar.



Sinto uma ânsia intensa de chorar, sinto as lágrimas vindo devagarzinho aos meus olhos. É humilhação demais começar a chorar a essa altura, eu sei. Mas eu estou cansado, meu corpo está quase pendendo. E o que me matem em pé? Porque tudo tem que ser tão difícil?


Dói.



Dói muito.


Décimo sétimo andar.



A porta finalmente se abre me mostrando o corredor. Eu saio. Senti-me como naufrago que após muito tempo pisa em terra firme. Andei até o apartamento da frente. Coloquei a mão sobre a maçaneta e a girei lentamente. Estava aberta. O que estranhei porque isso não costuma acontecer. Abri bem devagar mostrando aos poucos a imagem do apartamento da qual já estava tão acostumado. Meu coração rugia em expectativa. E lá estava ela.



Estava deitada sobre o sofá, o controle remoto pendendo da mão quase caindo e a TV ligada. Estava sozinha, adormecida e enrolada por um lençol velho.




Inconscientemente suspiro, e faço isso com tanta força que chega a doer, como se fosse a primeira vez que o faço.


Fecho a porta e vou até ela. Ela desperta e eu a beijo apaixonadamente.


Nos abraçamos, e assim também me recosto no sofá. Ela deita de novo colocando a cabeça sobre minhas pernas e sem dizer nada adormece novamente. Eu desligo a TV e fico acariciando seu cabelo macio. E enquanto fico olhando para meu reflexo difuso na tela negra, me vem à mente a garota do décimo quinto andar, não sei porque.





Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.