Dragão da areia

Capítulo 1 - Amoras da Neve


Apertou de leve o galho de amoras da neve. Vigilance se jogou contra o arbusto, latindo e abanando o rabo, e as frutinhas esmagadas espalharam seu cheiro no ar. Mizira deu uma risadinha breve, erguendo o rosto e tentando capturar algo do calor do sol no cobre escuro de sua pele.

As amoras da neve sempre a faziam pensar nele. Quando sairam para o ar gelado da noite depois de terem terminado sua vingança, pararam ao lado de um arbusto de amoras - o forte estava cercado delas. Enquanto conversavam sobre o retorno a Whiterun, ele arrancava frutinhas do galho, distraído. Seu olfato de loba a fez sentir o cheiro de amoras que vinha da direção dele por todo o caminho de volta. E também quando...

-Eu aqui congelando minha bunda por você, e seu pensamento naquele peludo fedido diante da lareira em Jorrvaskr.

Fez um sinal obsceno para Stenvar, que riu enquanto terminava de juntar as coisas do acampamento da noite.

-Vilkas é tão guerreiro quanto você e eu, ou não teria o direito de estar naquele Hall. E você me segue por causa dos tesouros de cada mina abandonada, caverna, tumba e buraco de Skyrim, não por mim.

-Estamos de acordo sobre o peludo ser fedido então.

-Stenvar!

Continuaram andando na direção do topo da montanha. Havia contratado o mercenário, de fato, muitos meses antes, mas o contrato já não existia mais e ele não havia partido. Amizade e um esquisito senso de dever era o que o mantinha no mesmo caminho que Mizira. Um senso de dever baseado naquilo que Stenvar mais prezava: sua sobrevivência.

Subiam a estrada da montanha, e deveriam ter mais algumas boas horas de escalada até chegarem a seu objetivo. Vigilance ia correndo e latindo em volta deles, fazendo impossível qualquer aproximação furtiva. Não havia motivo para não ocupar o tempo conversando. Mizira tentava colocar em ordem as ideias, tentando decidir o que fazer diante da quantidade de decisões que precisava tomar. Stenvar preferia distrai-la com qualquer provocação barata que pudesse e reclamando de quanto tempo fazia desde a última caneca de hidromel que tinham bebido. De tempos em tempos cruzavam com uma matilha de lobos que os atacava, ou a trilha de um sabercat. O tempo passado treinando com Aella vinha se provando valioso.

E talvez, apenas talvez, Hircine estivesse sussurrando sobre a Caçada em seu ouvido.

Parou, apoiando a mão na árvore mais próxima, e respirou fundo algumas vezes, tentando acalmar as batidas do coração. Foram apenas uns poucos segundos, mas sua garganta agora estava seca.

-Acho, se é que posso achar alguma coisa sobre isso, que ou você aceita sua condição como uma benção e para de evitar a transformação, ou procura um jeito de se curar de uma vez.

Mizira acenou uma negativa.

-Ainda não, meu amigo. Eu… ainda preciso me manter assim.

Skyrim vinha se mostrando muito mais perigosa do que parecia quando atravessou a fronteira e acabou presa ao lado de Ulfric Stormcloak. Não bastavam os dragões, a guerra civil, ser a Dragonborn, se tornar a Emissária dos Companions, o culto do dragão tentando mata-la, e então os vampiros começaram a aparecer. E como as maldições de Hircine e de Molag Bal se anulam, sua condição permitia ser imune ao vampirismo. Não apenas à doença em si, mas à tentação de aceita-la.

Com o rugido do lobo nos ouvidos, era mais fácil saber que uma maldição é sempre uma maldição, não importa que vantagens um daedra faça parecer que ela tem.

-Vamos, Stenvar. Ainda temos umas duas horas de subida antes de chegar até o topo.

-Quem sabe assim você se convence a comprar cavalos para nós.

-Você sabe que eu não tenho sorte com cavalos.

Stenvar riu apontando o precipício próximo.

-Você tenta fazer seu cavalo voar como um dragão e chama isso de falta de sorte?

Ela deu de ombros, os pensamentos atribulados empurrados para o fundo da mente enquanto a floresta dava espaço para as primeiras neves do cume da montanha.

-Era uma curva muito brusca e não dava para perceber no escuro.

Descansaram na sombra do rochedo. Vigilance dormiu enrodilhado a seus pés, enquanto não tirava os olhos do céu. Era como se algo dentro de si reverberasse, como uma lâmina que soava quando atingia outra lâmina.

Ele estava perto. Não podia ver ainda, mas sabia que estava em algum lugar, girando devagar no céu. E em seu íntimo sabia que ele também reconhecia sua presença.

Estava descansada. Tirou o largo machado das costas, observando o fio perfeito que só o aço da Skyforge era capaz de manter. Verificou sua pesada armadura de ébano para ter certeza de que tudo estava no lugar. Começou a enlaçar seu pensamento em uma prece, mas parou no meio. Onsi ou Shor? Talos? Estava em Skyrim, não em Hammerfell. Nunca mais em Hammerfell. Ainda devia fidelidade aos seus deuses? Ou os deuses dos Nord agora deveriam ser os seus deuses?

Não tinha tempo para pensar nisso agora. A sombra das asas apontou no céu, e manchou a tarde com os sons de medo de tudo que ficava no caminho do dragão.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.