Docinho

Capítulo Único


Príncipe Chiclete andava pelos corredores do castelo a passos pesados. Sua cabeça latejava de maneira irritante e ele se pegou desejando não ter gritado tanto com as guardas do castelo. Que elas podiam ser tontas o príncipe já sabia, mas passarem o dia inteiro correndo atrás de uma criança caramelo que estava pregando peças nos cidadãos doce era um novo recorde. E isso, combinado com o estresse causado pela nova receita que estava preparando e os deveres de manter a paz entre os reinos vizinhos, fez com que Chiclete perdesse a paciência e estourasse, passando os últimos dez minutos gritando na sala do trono.

Ao entrar em seu quarto ele bateu a porta e parou por um segundo, suspirando profundamente. O peso do que acabara de fazer começou a vir como uma grande onda que envolvia seu corpo e Chiclete se sentiu envergonhado por perder a cabeça daquele jeito.

— Um príncipe não deve se descontrolar assim, não importa sob que quantidade de estresse ele esteja – disse, se jogando na cama ainda perfeitamente arrumada.

Fixando seu olhar no teto rosado, ele se pôs a pensar no que diria para se desculpar com todos, pois sua atitude havia sido terminantemente inaceitável. Poderia voltar para a sala do trono naquele momento, mas não tinha nem sequer um pingo de vontade de estar na companhia de mais ninguém. Tudo o que queria era que o dia acabasse.

— Vossa Majestade parece exausta – uma voz profunda tomou conta do silêncio que fazia no cômodo. O tom irritante de deboche era familiar demais para Chiclete, que logo se viu sentando na beirada da cama para encarar a criatura que flutuava no batente de sua janela. – A vida de príncipe anda muito difícil? – O sorriso diabólico que acompanhou a frase fez o príncipe fuzilar Marshall Lee com os olhos.

— Se algum dia você realmente se responsabilizasse por seus deveres você estaria da mesma maneira.

— E se você relaxasse de vez em quando talvez não estivesse com essa cara de goma mascada.

— Eu não estou... – Chiclete parou. Não se deixaria levar por aquele imbecil. – Posso saber por que está aqui?

Marshall, então, flutuou para dentro do quarto, parando bem à frente do garoto doce.

— Fionna me pediu pra te entregar isso – ele tirou um pacotinho de seu bolso, segurando-o ao alcance de Chiclete.

— Minhas amoras vulcânicas! – exclamou com um sorriso, esticando a mão para pegar, mas no último instante Marshall flutuou mais alto, deixando o pacote fora de seu alcance.

— Lento demais – o vampiro ria da expressão irritada que o outro fazia.

— Marshall, eu não estou com paciência para brincadeiras.

— Você disse brincadeiras? Engraçado, não sabia que vossa Majestade conhecia esse tipo de vocabulário – ele balançava a mão, provocando-o.

— Estou falando sério, me dê isto!

— Por que não tenta pegar?

Vendo que o garoto não cederia, Chiclete bufou e tentou se levantar, ainda em cima da cama. Seu cansaço, no entanto, o deixara desastrado e, antes mesmo que Marshall pudesse tirar o pacotinho de seu alcance mais uma vez, o que ele tinha certeza de que aconteceria, o príncipe pisou em falso na beirada. O susto foi substituído pelo medo do impacto, que nunca veio.

— Vossa Majestade precisa tomar mais cuidado – Marshall ria enquanto segurava o rosado pelas costas de sua camisa. Chiclete não disse nada enquanto olhava para o chão a apenas centímetros de seu rosto, mas à medida em que ouvia a risada alta e irritante do outro, sua impaciência começou a retornar.

— Me coloque no chão, seu maldito! Isso é tudo culpa sua! – ele se debatia, tentando sair daquela posição.

— Culpa minha? – Marshall perguntou, o deboche novamente em sua voz. – O fato de você ser desastrado não tem nada a ver comigo.

— Se você não fosse tão irritante e tão... tão abestalhado nada disso aconteceria!

— Ah, tá bom! – o vampiro revirou os olhos, soltando Chiclete na cama e jogando o pacote em cima dele. – Hoje você está mais chato que o normal, quem foi que te mordeu?

Devagar, o príncipe se sentou novamente e suspirou. Ele sabia que andara uma pilha de nervos nos últimos dias. Talvez precisasse de um tempo longe de todas aquelas obrigações reais.

— Ninguém me mordeu, eu só...

— Posso fazer as honras, então? – num piscar de olhos, um vulto passou pelos olhos do príncipe, que se viu estático ao sentir a respiração de Marshall em seu pescoço, presas e olhos demoníacos provavelmente à mostra.

Ele sentiu suas mãos suarem enquanto seu coração pulava como louco em seu peito. O que é isso?, se pegou pensando na sensação que tomara conta de seu corpo. Medo seria a opção mais provável, mas não era bem isso. Havia algo que, levando em conta a situação, parecia ainda mais perturbador, algo como... expectativa? A risada em seu ouvido o tirou de seus devaneios.

— É brincadeira, eu nunca faria isso – Marshall se afastou, deitando em pleno ar e colocando as mãos atrás da cabeça, se fazendo confortável. – Além do mais, se eu lhe tirasse toda a cor você não seria mais o meu Chiclete, seria?

— O seu Chiclete? – o príncipe o observou, de olhos arregalados.

— O quê?

— Você disse que eu não seria mais o seu Chiclete – nesse momento ele viu os músculos de Marshall ficarem tensos. O vampiro logo tentou disfarçar, mas já era tarde demais.

— Não foi isso o que eu disse.

— Foi sim. Eu posso ser feito de doce, mas não tenho nenhum açúcar tapando meus ouvidos. Eu sei o que ouvi – e essa foi a vez de Chiclete sorrir, se deliciando com o visível desconforto do outro.

— Eu acho que todo esse estresse está fazendo você ouvir coisas. Vou te deixar descansar.

Ele já ia flutuando em direção a janela quando Chiclete se deu conta de que, na verdade, não queria que ele se fosse. O vampiro poderia ser a criatura que mais lhe dava nos nervos de todos os reinos, mas quando estavam juntos, e não estavam discutindo, por algum milagre, o príncipe podia sentir todo o peso em seus ombros simplesmente se esvaindo. E era disso que ele precisava no momento.

— Marsh, espera! – Chiclete se levantou depressa e correu até Marshall, segurando sua camisa antes que ele pudesse desaparecer noite adentro.

O vampiro se virou, surpreso, e Chiclete não pôde deixar de perceber o modo como suas bochechas haviam corado. Os dois se observaram por um instante.

— Faz tempo que não te escuto me chamar assim.

— É... – ele sorriu, sentindo suas bochechas arderem também. De repente, todo aquele traje real parecia quente demais. – E-eu sinto falta... daqueles tempos - terminou, tomando cuidado para não dizer você.

— Sente? – Marshall parecia ainda mais surpreso.

Chiclete apenas assentiu e, ao desviar o olhar, finalmente percebeu que ainda segurava a camisa de flanela do outro, soltando-a como se estivesse em chamas. Seu coração voltara a enlouquecer e ele suspirou fundo, tentando acalmá-lo.

— Vossa Majestade, você parece um pouco nervoso – Marshall brincou, evidentemente prendendo o riso.

— Até quando vai me chamar disso? – Chiclete o fitou.

— Não é assim que eu deveria chamá-lo? – o tom formal em sua voz não combinava nada com o sorriso charmoso que exibia.

— Não. E será que você não consegue ficar mais de cinco segundos sem fazer uma piadinha? – suspirando, o príncipe se afastou e se jogou na cama mais uma vez, o cansaço voltando a bater.

— Mas você ama minhas piadinhas!

— Que absurdo, eu as odeio!

— Ah, é mesmo? – Chiclete o ouviu indagar e, como se fosse déjà vu, se viu cara a cara com o vampiro, que o encarava com um brilho diferente naqueles olhos penetrantes, seus rostos cada vez mais perto um do outro. – Talvez o que você ame seja outra coisa...

Engolindo em seco, o príncipe permaneceu parado, sem reação quando, num movimento rápido, mas ainda assim delicado, seus lábios foram tomados e sentiu seu mundo virar de ponta cabeça, com seus pensamentos a mil por hora.

— Hm – ele murmurou, levando a mão até o peito de Marshall e empurrando-o para que se separassem. – Isso não é mais uma de suas brincadeiras, é?

— O que acha? – rebateu Marshall, parecendo sério pela primeira vez naquela noite.

Ao observá-lo, Chiclete sentiu suas mãos formigando de antecipação e não perdeu mais tempo. Pegando na gola de sua camisa, ele puxou o vampiro, colando seus lábios novamente e levando ambas as mãos até sua nuca, onde enterrou os dedos doce nos fios negros de cabelo em sua nuca. Imerso nas sensações, Chiclete simplesmente se entregou ao sentir a língua de Marshall passando por seus lábios, saboreando, e logo suas bocas se encontravam em uma dança lenta e sensual, arrancando murmúrios de apreciação dos dois.

Conforme o beijo se alongava e mãos exploravam corpos, Chiclete sentiu a pegada firme de Marshall em seu quadril, puxando-o e causando fricção entre eles. A sensação lhe fez arfar, interrompendo o contato entre seus lábios, e foi aí que o príncipe percebeu que não mais sentia o contato da cama em suas costas. Ao olhar para o lado ele viu que flutuavam e uma risada logo se formou em sua garganta enquanto ele envolvia os ombros de Marshall com seus braços e enlaçava suas pernas na cintura do vampiro.

A risada rouca em seu ouvido e a fato de que agora desciam devagar até a cama fez o estômago de Chiclete se revirar de forma calorosa. O sorriso em seu rosto não mais podia ser contido, nem se tentasse.

Assim que se encontrou deitado novamente, o príncipe parou para observar o vampiro à sua frente. Seus cabelos bagunçados, seu sorriso sedutor e os olhos irresistíveis que o encaravam de volta, tudo aquilo trazia um peso gostoso em seu peito. Um peso que, ao mesmo tempo, o deixava leve como uma pena. Isso não faz sentido nenhum, ele pensou.

— Marshall?

— Hm?

— O que isso significa? - Chiclete perguntou enquanto via Marshall se desvencilhar de seus braços e ajoelhar no meio de suas pernas.

— Significa que tenho uma quedinha por doce – ele respondeu, já se pondo a flutuar outra vez. – A gente se vê... docinho.

E assim, com um sorriso estonteante e uma piscadela, Marshall se foi, atravessando a janela e desaparecendo na noite, deixando o príncipe jogado na cama, com as mãos suadas, o corpo aquecido e as bochechas doloridas pelo sorriso que insistia em não ir embora.

— No que eu fui me meter? – ele lamentou consigo mesmo, rolando na cama e agarrando seu travesseiro para esconder o rosto corado.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.