Doce Sacrifício

Capítulo 24 - Just friends - Michelle I


Musica tema: For Baltimore [All Time Low]

"So mucj for keeping this, just friends, shut up and kiss me now"

O sol estava se pondo quando Michelle chegou ao túmulo da mãe. As lágrimas que ela segurava desde a hora que saíra de casa caíram de uma vez só. Ela não podia acreditar na merda que se transformara a sua vida. A sua família.

O fino relógio de ouro que Michelle usava no pulso esquerdo marcava 12:33 quando ela desistiu de esperar e pediu para sua empregada de meia-idade, Lauren, pôr a mesa do almoço. Michelle já estava se acostumando a comer sozinha quando estava em casa, mas aquilo ainda a aborrecia. Toda aquela solidão lhe tirava o apetite e logo ela já estava se retirando da mesa.

Michelle voltou pra sala a tempo de ver sua irmã mais nova adentrar a casa e teve que reprimir um grito de espanto. Ela não sabia o que era pior: a meia-calça preta cheia de rasgos, o short de couro minúsculo, a maquiagem pesada e toda borrada ou o cabelo loira que mais parecia um ninho de ratos.

– Mas o que foi que aconteceu com você?

Dakota esboça um sorrisinho, divertindo-se com o horror da irmã.

– Noite agitada. O coroa já chegou?

– Não. Acho que nem dormiu em casa.

– Provavelmente passou a noite num motel com alguma puta de luxo.

– Dakota!

– Estou mentindo por acaso? – ela retira seu par de coturnos dos pés e os joga num canto qualquer. – Agora se me der licença, estou morrendo de fome – a mais nova passa pela irmã, dirigindo-se até a sala de jantar, onde a mesa do almoço ainda estava arrumada.

Michelle passa a mão pelos cabelos e meneia a cabeça para os lados. Onde estava sua irmã doce e ingênua, viciada em cor-de-rosa? Porque aquele projeto de delinquente gótica não era a Dakota que ela conhecia.

Com uma mala em mãos, Lauren desce as escadas apressadamente, parando no primeiro degrau para tomar fôlego.

– Pra que a mala, Lauren?

– É pro seu pai. Ele pediu pra Paul levá-la até o aeroporto, onde ele já deve estar esperando impaciente.

– Aeroporto? Ele vai viajar?

– Por três semanas.

– Mas ele não me disse nada – Michelle diz em desalento. Na verdade ele não falava nada sobre muitas coisas. Ela nem conseguia se lembrar a última vez que os dois tiveram uma conversa decente.

Lauren a olha por um instante. Ela cuidava de Michelle desde pequena e odiava vê-la triste, mas não havia muito que ela podia fazer. Depois da morte de sua esposa, Mario nunca mais foi o mesmo. Nem a pequena Dakota, que começara a se rebelar.

– Vou pedir a Paul pra levar a mala pro carro, com licença.

Lauren passa pela porta, deixando uma Michelle estática no meio da enorme sala, encarando a mala de seu pai, sentindo-se sufocada.

As lágrimas não cessaram desde que Michelle chegara ao cemitério. Quanto mais ela olhava para as letras na lápide, pior ela ficava. Ela sentia tanto a falta da mãe.

A loira levanta num pulo, decidida a se esquecer da porcaria de família que sua mãe deixara pra trás.

~”~

O Sr. e a Sra. Everdeen estavam em sua sala, sentados confortavelmente no estofado de cor creme, conversando animadamente com Linda e seu marido Billy, enquanto esperavam Marta terminar o jantar.

No andar de cima, Jessica e David matavam tempo, longe da conversa chata dos adultos. A garota não parecia de bom humor, reorganizando seus enfeites e caixas nas prateleiras, enquanto David olhava sua coleção de CD’s, fingindo não prestar atenção na hiperatividade da outra, afinal ele sabia muito bem o porquê daquele comportamento e talvez ele não devesse tocar no assunto, mas os pais dela estavam lá embaixo, juntamente com sua mãe, qualquer coisa era só gritar por socorro.

– Você falou com Alison depois de sexta? – ele pergunta assim que Jessica senta ao seu lado no tapete verde felpudo.

– Não – ela responde vagamente, passando os olhos pelos títulos dos livros postos na estante ao seu lado.

– E quando pretende ouvi-la?

Jessica suspira. De todos os assuntos que David podia começar, esse era o pior. Ela não queria brigar com ele, não hoje.

– Não tão cedo.

– Deixe a garota se explicar, Everdeen.

– Isso não tem explicação, Dave! Ela contou, fim da história – ela sabia que estava exagerando um pouco, mas é que ela não conseguia entender. Alison nunca se incomodou com isso, às vezes ela até acompanhava a amiga. Alison dissera várias vezes que não se intrometeria enquanto Jessica não passasse dos limites e ela estava longe disso. Então por que ela contou?

– Pois eu ainda acho que você deveria agradecê-la, aquilo ainda ia acabar com você – David a tira de seus pensamentos, repetindo o que ele sempre dizia em relação a isso.

– Não começa, por favor – Jessica revira os olhos e deita em seu tapete, com os joelhos dobrados, que logo viram suporte para o braço direito de David; outro folgado.

– Porta! – a voz de Erick é ouvida do corredor. Jessica levanta-se e abre a porta de seu quarto, voltando a se sentar ao lado de David logo em seguida.

O garoto a olho com o cenho franzido, claramente confuso.

– Ele só está puto comigo – ela revira os olhos mais uma vez, para mostrar como a atitude do pai era desnecessária. – Nada que uma madrugada jogando Battlefield com ele não resolva – Jess esboça um sorriso divertido, sendo acompanhada pelo garoto.

– Vocês têm uma maneira bem peculiar de resolverem as coisas – ele observa, passando a mão pelos cabelos da garota, após ela deitar-se em seu colo.

~”~

Michelle desce de seu carro, trancando-o e guarda a chave no bolso de sua jaqueta preta. Ela passa pelos carros, procurando por um em específico e tem um momento de alívio ao notar que ele não estava ali.

Ir ao E-Zine a procura de Harry era realmente uma ideia muito estúpida, que ia contra tudo o que ela dissera a sua irmã: sobre ser mais responsável e pensar nas consequências. Mas ela realmente não estava dando a mínima para isso no momento.

Ela só precisava não encontrar com nenhum outro conhecido, mas como Murphy nunca foi muito com a sua cara, toda a alegria que a garota sentiu no estacionamento evaporou ao olhar para a quadra de basquete mais a sua frente: Raphael estava ali, jogando com outros garotos.

Michelle dá meia volta, levando seus saltos caros para a direção contrária. Aquele lugar era enorme, pode ser que eles não se encontrem de novo. A loira realmente contava com isso.

Um vento gelado passa por ela e Michie agradece mentalmente pela jaqueta preta e a blusa xadrez vermelha que colocara por cima da regada branca antes de sair de casa. Casa: o lugar para o qual ela não pretendia voltar essa noite.

Escorado na parede do galpão que dava acesso a piscina, Harry observava o fluxo de pessoas entre uma tragada e outra de seu cigarro.

– Harry! – ele olha na direção que viera a voz, encontrando uma Michelle andando apressada até ele. O garoto desencosta-se dali, indo até a loira, parando a poucos centímetros dela.

– Procurando por sua irmã? – ele questiona, ajeitando o gorro em sua cabeça com a mão livre. – Eu não a vi hoje.

– Não – Michie passa os olhos ao seu redor, procurando um ponto para fixá-los, qualquer um. Por algum motivo ela não conseguia fitar aquelas íris negras. – Eu vim te procurar, mas não é pela Dakota.

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Raphael fecha o zíper de sua jaqueta e guarda seu celular num dos bolsos da mesma. Ele e Logan andavam pelo estacionamento do E-Zine, ambos rindo sobre algo que Miller acabara de contar.

Não tão distante dali, Harry abre a porta do carro de Michelle para que essa pudesse sair, mas antes de fazê-lo, ela pega o gorro do garoto que estava jogado no banco do motorista e o coloca em sua cabeça. Ele sorri e levanta-se do banco, saindo atrás da garota, que se apóia num dos veículos a sua frente, pois ainda estava tonta.

– Tudo bem Michie, pode me devolvê-lo agora.

– Então vem buscar – Michelle dá alguns passos para longe dele, andando de costas, até que acaba batendo em alguma coisa. – Opa! – ela começa a rir, mas pára assim que se vira e vê no quê, ou melhor: em quem ela havia esbarrado.

Raphael fita os olhos castanhos dilatados da loira a sua frente e então por cima de seu ombro, vendo que Jones vinha em sua direção. Ele fica confuso com a cena. O que os dois estavam fazendo ali? A camiseta de Harry colocada do avesso lhe deu uma noção e Raphael não gostou nada da descoberta.

– Uma não era o suficiente? Tinha que arrastar as duas irmãs com você?

– Não começa Duncan, não começa – Harry revira os olhos e tira seu gorro da cabeça da garota, colocando-o de volta na sua própria.

O ato faz com que alguns fios do cabelo de Michelle ficassem bagunçados e Raphael precisa reprimir sua vontade de arrumá-los. Eles pareciam tão macios. O garoto balança a cabeça para se livrar daqueles pensamentos gays.

– Me abraça? Estou com frio – Michelle passa seus braços em volta da cintura de Raphael, que olha furioso para Harry.

– E depois você quer que eu não diga nada!

– Eu disse pra ela ir com calma, não tenho culpa se ela não me ouviu – Harry dá de ombros e esboça um sorrisinho, só para provocá-lo.

– Você é um imbecil, sabia? – Raphael dá um passo em sua direção, com ainda mais raiva.

– Opa! Calma aí – Logan, que até agora só observava a conversa, decide intervir antes que seja tarde. Ele coloca uma mão no ombro de Raphael e olha para Harry. – É melhor você ir agora se quiser chegar inteiro em casa.

Ouvindo isso, Michelle vai até o garoto, segurando-lhe a mão e lhe dá um beijo na bochecha.

– Tchau Harry. Dirija com cuidado. E não se esqueça: as árvores têm preferência na hora de atravessar a rua.

Ele e Logan riem pela última fala da garota e Harry passa a mão por seus cabelos, bagunçando ainda mais os fios.

– É um amor de garota.

– Vaza Jones! – ele dá uma piscadela na direção de Michie antes de fazer o que Raphael disse.

– Confessa que assim ela fica muito mais legal – brinca Logan, observando a garota virar a cabeça para olhar as estrelas de tal forma que ele e Raphael acharam que ela ia acabar caindo pra trás. – Ela não vai conseguir chegar em casa sozinha desse jeito, acho melhor eu levá-la.

– Não precisa, eu faço isso.

– Tem certeza? – Raphael só balança a cabeça afirmando e Logan dá de ombros. – Tudo bem então. Tchau Michie.

– Tchau Logan – ela sorri pra ele e dá um tchauzinho com a mão. – Minha amiga gosta muito de você. Dê um abraço na sua mãe por mim.

– Certo – o garoto precisa segurar o riso pra garota que agora mantinha os braços esticados na horizontal, girando sem sair do lugar, ainda olhando para o céu. – Boa sorte aí cara – ele dá dois tapinhas nas costas de Raphael antes de deixar os dois sozinhos ali.

– Tudo bem Michelle. Hora de ir pra casa – Rapha segura seu braço esquerdo, fazendo-a parar de girar e se apoiar nele, ainda mais tonta do que estava antes. Ele a leva até o seu carro, abrindo a porta do passageiro para ela entrar, depois dá a volta no veículo e senta no banco do motorista, estendendo a mão direita na direção da garota. – Cadê a chave? – ela coloca a mão no bolso da jaqueta, tirando sua chave com um chaveiro do Finn* dali de dentro e a depositando na mão do garoto.

Durante o percurso nenhum dos dois falam mais nada. E em meio ao silêncio, enquanto olhava pela janela, Michelle ia aos poucos retomando sua lucidez. Mas ela só percebeu o caminho que fizeram quando o carro parou numa rua que não era a sua.

– Pensei que você ia me levar pra casa.

– Sim, pra minha casa. Ou você quer que a Dakota te veja desse jeito? – ele olha diretamente para ela, com uma sobrancelha arqueada e Michelle dá de ombros, olhando para algum ponto fixo a sua frente.

– Aposto que ela nem ia notar. Ninguém liga pra mim naquela casa.

– Isso não é verdade. Tenho certeza que seu pai liga.

A loira solta uma gargalhada por aquela ideia absurda e só pára ao notar o semblante sério do garoto ao seu lado.

– Oh, você estava falando sério. Mas relaxa aí porque ninguém se importa comigo.

Raphael se ajeita no banco, virando o corpo de frente para ela.

– Eu me importo.

– Mesmo?

– Mesmo – ele chega mais perto e ela inconscientemente faz o mesmo.

– Bastante?

– Bastante.

Michelle fecha os olhos, nem um pouco convencida.

– Mentiroso – e então ela os abre, surpresa ao sentir os lábios do garoto contra os seus.