Diário de um Fantasma

Cartas de um Fantasma


Como um astro da ópera, caro diário, eu fui o centro das atenções durante a festa de despedida dos Monsieurs Debienne e Poligny. Não sei se seria meu eu egocêntrico ou meu eu egoísta (são diferentes um do outro, confie em mim), mas eu com certeza não gostaria de um outro assunto falado caso eu fosse o diretor do teatro. Claro, astro da ópera, centro das atenções, há hipérbole em... tudo! Christine Daaé. Verdadeira astra da ópera. Verdadeira centro das atenções. Não irei (ou tentarei) mencionar nenhum jovem que entrara no camarim de minha amada. Já estou satisfeito com a morte que causei hoje, e não quero dar uma má impressão para meus futuros... "gerentes". Eles hão de saber como irão me recompensar.

Novamente, fui de penetra em outra reunião. As bailarinas estavam... indiferentes? Diferentes? Algumas com taças de champanhe na mão para preparar um discurso. Outras cuja quinze primavera a fez esquecer a morte e... a mim! Não é legal se sentir abandonado. Mesmo como penetra, sorri para ela. Ela empalideceu.

– O fantasma da ópera! - gritou a pequena chamada de Jammes, que apontava para uma multidão de casacas negras, - O fantasma da ópera! O fantasma da ópera!

A festa ia tão... bem, digamos, e todos estavam tão... sóbrios, que riram e me ofereceram bebida.

Mas eu não estava mais lá.

Como um fantasma, eu estou em todos os lugares.

Sem sucesso, todos me procuravam. Todos tentavam acalmar a pequena Jammes, e aquela chamada de pequena Giry gritava. E a famosa bailarina Sorelli, que não pode terminar seu (ridículo, se me permitem dizer) discurso, estava furiosa.

Ah! Como é bom ser o astro.

Depois disso, poucas coisas aconteceram. Eu saí, para fazer meus afazeres (leia-se escrever cartas) enquanto os srs. Debienne e Poligny davam aos srs. Armand Moncharmin e Firmin Richard minúsculas chaves.

Por que, caro diário, eu escrevia cartas para os novos diretores, com letra vermelha. Tão vermelha quanto sangue. Aquela carta era para o monsieur Firmin, em especial.

Prezado diretor,

Peço desculpas por vir perturbá-lo neste momento tão precioso em que o senhor decide a sorte dos melhores artistas da Ópera, renova importantes contratos e conclui novos; e isso com uma visão tão apurada, uma compreensão do teatro, uma ciência do público e de suas preferências, uma autoridade que esteve bem perto de deixar pasma a minha velha experiência. Estou sabendo do que o senhor acaba de fazer para Carlotta, para Sorelli, para a pequena Jammes e para algumas outras a quem vislumbros as admiráveis qualidades, o talento e o gênio.

Carlotta? Sorelli? Jammes? ...ou minha amada?

– (Sabe bem a quem me refiro quando escrevo essas palavras. É evidente que não é à Carlotta, que canta mal como uma gralha e nunca deveria ter deixado o Ambassadeurs nem o Café Jacquin; nem à Sorelli, que deve seu sucesso sobretudo à carroceria; nem tampouco à pequena Jammes, que dança tão bem quanto um bezerro no pasto.

Como tenho certa... relação amistosa (digamos) com a mãe da pequena Giry, poupei sua filha do discurso.

Também não é à Christine Daaé, cujo gênio é incontestável, mas que o senhor afasta com zelo ciumento de qualquer criação importante.) -

Modéstia a parte, caro diário. Eu sou um fantasma da ópera? Eu sou um astro da ópera? Todas os adjetivos escritor por mim me descrevem.

Enfim, o senhor é livre para administrar seu pequeno negócio como bem entender, não é mesmo? Ainda assim, gostaria de me valer do fato de que o senhor ainda não mandou Christine Daaé para o olho da rua para ouvi-la esta noite no papel de Siebel, já que o de Margarida, desde sua consagração do outro dia, lhe está proibido, e solicitarei ao senhor para não dispor do meu camarote nem hoje nem nos próximos dias, pois não poderei terminar esta carta sem acrescentar o quanto fiquei desagradavelmente surpreso, nestes últimos tempos, ao chegar à Ópera e descobrir que meu camarote havia sido alugado - na bilhereteria -, por ordens suas.

Me desculpem nunca tê-lo contado antes, caro diário. Eu sempre preciso do camarote nº 5 e de 240 mil francos como meu salário. Mas nada aconteceu, na última apresentação.

Mas sou bonzinho... as vezes.

Não protestei em primeiro lugar porque detesto escândalos e, em segundo, porque imaginava que seus predecessores, os srs. Debienne e Poligny, que sempre foram gentis comigo, haviam esquecido, antes de deixarem a Ópera, de falar com o senhor sobre minhas pequenas manias. Ora, acabo de receber a resposta dos srs. Debienne e Poligny ao meu pedido de explicações, resposta que me prova que o senhor etá a par do meu caderno de encargos e, por conseguinte, está zombando de mim de modo ultrajante. Se quiser que vivamos em paz, não deve começar retirando meu camarote! Sob condição dessas pequenas observações, queira me considerar, meu prezado diretor, seu humilde e obediente servo.

Oh, a doce e velha ironia.

Assinado: Fantasma da Ópera.

Junto, uma correspondência da Revue théâtrale: "F. da Ó.: R. e M. não têm desculpa. Nós os prevenimos e lhe entregamos em mãos o seu caderno de encargos. Saudações!"

O monsieur Firmin foi informado pelo seu secretário que o camarote nº 5 teve uma reserva de última hora, quando ele o queria enviar para os antigos donos.

Outra carta foi escrita por mim, após o espetáculo cujo camarim nº 5 foi reservado para meu uso.

Prezador diretor,

Obrigado. Noite encantadora. Daaé extraordinária. Cuide dos coros. Carlotta, magnífico e comum instrumento. Logo lhe escreverei sobre os 240 mil francos.

Seu servo,

Fantasma da Ópera.

Em outra noite de espetáculo, eles olhavam para o meu camarote. Vazio.

Por quê?

Assim como estou em todos os lugares, estou em lugar nenhum.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.