Daquele dia em diante, se tornou praticamente impossível manter Giane e Fábio afastados. Suas bocas pareciam ter imãs, seus corpos pareciam se atrair, seus risos pareciam se completar. A menina-moleque da Casa Verde, afinal tinha encontrado alguém com quem podia se abrir e ser tudo que quisesse.

Ele não se importava de passar o dia inteiro na floricultura, observando-a trabalhar, conversando com Wesley, ajudando a mover vasos e aprendendo a fazer arranjos de rosas e plantar orquídeas. Qualquer coisa era incrível e maravilhosa, desde que ela estivesse com ele.

Érico e Renata eram seus fiéis escudeiros, os quatro muitas vezes saindo juntos para o cinema, para passear no parque, ir ao shopping. Muitas vezes ficavam no bar dos pais do mais velho, comendo batatas fritas e jogando conversa fora.

Giane começou a ensinar o namorado (ele adorou a primeira vez que ela se referiu a ele assim) a jogar futebol, já que ele era péssimo de bola. Passavam horas a fio no campinho de cimento batido, tendo como gol duas pedra. Quando a discussão inevitável chegava, ele a empurrava para dentro de uma grade que havia ali, prensando-a na parede e começando a beijá-la.

Não demorou muito para que o namoro da menina chegasse aos ouvidos do pai dela, mas Silvério não precisou pressionar a filha. Ela mesma contou a ele sobre Fábio, e o brilho diferente naqueles olhos de jabuticaba deram a certeza e a tranquilidade que o homem precisava.

E então chegou o dia em que os dois se conheceram. Já era noite quando Fábio estacionou sua moto em frente à casa da namorada, encontrando ela e o pai na varando, conversando e rindo. Sorriu para a cena, logo sendo percebido.

_ Temos visitas. – riu o senhor, apontando o rapaz no portão. Giane virou o rosto, abrindo um sorriso que Fábio sabia, era só para ele.

_ Chegou cedo, fraldinha. – ela desceu as escadas rapidamente, abrindo o portão para ele e recebendo um beijo rápido.

_ Bárbara estava torrando meu saco para sair com a Mel, preferi tomar meu caminho depressa. – garantiu ele, a abraçando pela cintura e subindo as escadas – Muito prazer em conhecê-lo, seu Silvério.

_ O prazer é todo meu, filho. – o senhor sorriu de volta, apertando a mão do genro – Se eu soubesse que você vinha, tinha dado uma arrumada na casa. A Giane é meio desligada nisso.

_ Pai. – a morena guinchou, corando levemente. Fábio riu, apertando mais a cintura da namorada.

_ Já imaginava... Desleixada desse jeito, deve ser uma zona dentro de casa. – o rapaz continuou a brincadeira, recebendo uma fuzilada – Me olha de cara feia que não dou seu presente.

_ Que presente? – ela arqueou a sobrancelha, enquanto ele sacava algo de dentro da jaqueta de couro – O que é isso?

_ Ora, abra e veja. – ela obedeceu, abrindo o envelope com cuidando e puxando o conteúdo. Seus olhos brilharam imediatamente – Não sei se eu já disse, mas... Sou são paulino.

_ Essas coisas você conta antes de começar o namoro. – ela riu, observando os ingressos para o clássico Corinthians X São Paulo, que seria dali há alguns dias – Eu amei.

_ Fico feliz, amor. – o apelido espontâneo não a surpreendeu ou assustou, apenas a fez sorrir mais e puxar o rosto dele, lhe dando um beijo carinhoso. Silvério sorriu para a cena.

_ Bom, eu estava querendo testar uma receita de panqueca doce que a Salma me deu. – comentou o mais velha, casualmente – Gostariam de se juntar a mim?

_ Panqueca tem cara de café da manhã. – comentou Giane.

_ Não vejo mal em tomar café da manhã a noite. – garantiu Fábio – Além do que, estou azul de fome.

_ Mas é um esganado, não é possível. Veio aqui em casa só pra encher o bucho, certeza. – a corintiana se soltou do abraço dele, entrando em casa, seguida pelos dois homens, que riam.

Uma coisa que Fábio mais gostava em Giane era que, mesmo agora que estavam namorando, ela não perdia o jeito e a marra. Ela o xingava direto, lhe dava socos e beliscões, gritos e portas na cara. Ele, é claro, não deixava barato. Era tão esquentado quanto ela, e sua melhor reação, era subir na moto e acelerar, deixando a corintiana gritando com o vento.

_ Era um romance improvável. Ela era uma garota de um bairro pequeno do interior, ele era da alta sociedade brasileira e americana. Tinha o mundo aos seus pés, enquanto ele não tinha um centavo.¹ - Giane continuou sua leitura, observando atentamente as reações do homem a sua frente.

_ E isso importava? – ele questionou, coçando o joelho distraidamente. Ela sorriu para o gesto dele.

_ Naquele momento, não. – garantiu a senhora – Mas um dia, os mundos diferentes iriam acabar pesando. – completou com um suspiro, antes de voltar sua atenção ao livro.

_ Vem, Fabinho. Nós vamos nos atrasar. – Giane corria animada, enquanto os dois iam para a área VIP do estádio, onde ficavam os lugares comprados pelo rapaz.

_ Maloqueira, falta duas horas para o jogo, se acalma. – ele ria da afobação dela – Não tem ninguém no estádio ainda, olha isso.

_ Por isso eu quis chegar mais cedo. – explicou ela, indo entrelaçar seus dedos – Não quero entrar no meio do tumulto e da confusão, quero ver o aquecimento tranquila, a preparação da imprensa...

_ Você parece uma criança na manhã de Natal. – Fábio sorriu, enquanto entregava as entradas ao segurança, que lhes indicou seus lugares – Você nunca veio a um jogo?

_ tá ligado que ingresso tá caro, e pão também né? – ela arqueou a sobrancelha – E também, meu pai não tem mais idade para me acompanhar nessas coisas. Sempre sai treta, galera zicando... Seu Silvério já tá velhão pra isso.

_ Bom, agora você tem alguém que te acompanhe. E que pague seus ingressos. – ele riu, mas Giane fechou a cara.

_ Não quero ser sustentada não, valeu aí. – avisou ela – Não sou dondoca, sei muito bem me virar. O que consigo, é pelo meu trabalho, tamo entendido? Aceitei o presente hoje, porque você me deu na boa vontade. Mas nem começa a achar que vai me sustentar, que do teu dinheiro, eu quero distância.

E se voltou para o campo vazio, ficando os olhos no gramada. Ele pensou em responder, pensou muito e em várias coisas. Mas se tinha uma coisa que sabia sobre a namorada era que o melhor a fazer era deixá-la se acalmar, ou então iriam brigar feio. E não tinha ido até o Morumbi para brigar, e sim para ver um clássico.

Ficaram em silêncio um tempo, observando as coisas começando a acontecer no estádio. Não tardou para a torcida do Timão aparecer no local, fazendo a algazarra esperada. Giane sorriu maravilhada para aquilo, enquanto Fábio revirava os olhos.

_ Bando de galinha preta. – resmungou, recebendo uma fuzilada – Não você, amor. Você é um gavião, bem lindo e imponente. – ela riu da afirmação dele, voltando a relaxar. Se acomodou melhor na cadeira, se aninhando a ele.

_ Gosto mais de águias. – Giane suspirou – São animais tão majestosos.

_ A águia é o símbolo de Zeus, o rei do Olimpo. – o rapaz lembrou de algo que havia visto em uma aula de história – Por isso, ela é a rainha das aves.

_ Jura?

_ Uhum. Para os celtas, era o símbolo do renascimento, e para os antigos egípcios, significava vida eterna. – ela se admirou com o conhecimento dele – Mas para a maioria das pessoas, ela representar coragem e força.

_ E como você sabe tanto sobre as águias? – perguntou uma Giane maravilhada.

_ Na escola, um dia estávamos estudando sobre mitologia e o professor falou a ligação da águia com Zeus. E se empolgou, falando mais e mais sobre a ave. – ele recordou, um brilho diferente no olhar – Mas eu gostei mesmo quando ele falou sobre as fênix.

_ Você realmente gosta de mitologia. – admirou-se a corintiana.

_ Acho fascinante a capacidade que os gregos tinham de encontrar uma explicação divina para tudo, mas a fênix não tem muito a ver com isso. – ele explicou – Ela é inspirada em um pássaro da mitologia egípcia, chamado Bennu.

_ E o que você gosta tanto na fênix? – o estádio ia se enchendo, mas os dois estavam mais interessados e focados naquela pequena conversa entre eles.

_ Acho que tudo. Digo, ela pega fogo quando chega a hora de morrer, apenas para renascer das próprias cinzas, o que é uma metáfora maravilhosa para a vida: se reergueu das cinzas, das decepções, renascer. Ela também é muito forte, capaz de carregar cargas extremamente pesadas, e suas lágrimas tem poderes curativos. Se você parar e analisar a fênix de uma maneira mais profunda, é... É fantástico.

Ele virou o rosto para Giane, que tinha os olhos brilhando de admiração. Quem olhasse Fábio e sua pinta de badboy, com jaqueta de couro e cara de emburrado, não diria que ele era assim: estudioso, esperto, interessado em tantas coisas diferentes. O entusiasmo e gosto que ele tinha ao falar sobre as coisas que lhe interessavam, que não eram poucas, era algo bonito de se ver.

_ Mas, se você me disse que prefere ser uma águia, eu abro mão da fênix com prazer, e serei uma águia com você. – ele sorriu para Giane, acariciando sua mão.

_ Não. Seja uma fênix, e eu serei uma águia. E nós sempre vamos dar um jeito de ficar juntos. – prometeu a moça, enquanto Fábio sorria.

_ Eu sempre disse que, assim que eu fizer 18 anos, vou tatuar uma fênix nas minhas costas. Acha que vai ficar feio?

_ Feio, não sei. Mas chamativo, com certeza. E se fizer toda colorida, vai ficar parecendo alegoria de escola de samba. – ele riu da comparação – Eu queria fazer uma águia, aqui na nuca. Mas não sei se teria coragem.

_ Você? – ele riu debochado – Do jeito que você é, capaz de pegar a máquina do tatuador e fazer por conta própria, só pra ser mais difícil.

_ Idiota. – ela empurrou o braço dele – Olha, os jogadores vão aquecer.

Ela se sentou na ponta da cadeira, observando tudo animada. Fábio sorriu, acariciando as costas dela distraidamente, ainda desfrutando do momento doce de minutos antes.

Era fácil constatar o quão bem Giane fazia a Fábio. Seus olhos brilhavam sempre, seu sorriso era constante, sua animação era permanente. Ela lhe mostrava todos os prazeres simples da vida, há muito esquecidos por ele, desde que fora inserido naquele mundo podre de gente rica e mesquinha.

Uma noite na praça do bairro, com os adultos tocando músicas gostosas e dançantes. Uma fugida para a cidade de Brotas, onde mergulharam nas cachoeiras com Érico e Renata. A tentativa de ensinar a namorada a dirigir, mesmo sem idade, no velho e gasto carro do pai da moça, pelas ruas da Casa Verde.

_ Mas havia algo de peculiar naquele jovem casal: Eles não se entendiam. Raramente concordavam em algo, brigavam sempre e se desafiavam todos os dias. Mas apesar das diferenças, tinham algo importante em comum... – a voz da mulher morreu na garganta, quando Fábio completou sua frase, sorrindo distraído.

_ Eram loucos um pelo outro.² - ela concordou, enquanto ele a encarava os olhos brilhando.

Aquele dia realmente tinha tudo para ser muito bom.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.