Diário de Uma Dama de Copas

Está Entediante? Vamos Voar na Garganta dos Outros


Passaram-se alguns dias entediantes e confusos. Cheios de chá e discussões entediantes com reis e condes e duques e não sei mais o quê. O mais incrível foi que eles realmente não tinham medo de mim, por isso achei interessante debater com eles sobre essas coisas de execuções e tortura.

Não consegui impressioná-los? Então comecei a dar um ataque de histeria quando falaram algo ridículo do antigo rei ser melhor do que eu, pra variar foi uma das vadias que ficavam com ele. Se não fosse por uns guardas idiotas eu ia direto na garganta dela com a faca de manteiga.

Ah, foi divertido fazer uns talhos nas roupas e até nos rostos deles. Além de ouvir os ridículos gritinhos histéricos das servas e condessas, princesas, rainhas velhas etc.

Fiz mais umas loucuras e digamos que cansaram de vir aqui, ou ficaram finalmente amedrontados, sei lá. Já sou a Rainha louca pelo menos. Saí em alguns jornais e até me entrevistaram, mas depois enjoaram e até os deixei no vácuo porque estava dormindo.

Julian tentou se aproximar de mim várias vezes, mas seu irmão tem brigado tanto com ele. É assombroso. E eu nunca consigo dizer nada. Frustrante, irritante, confuso. Por que eu sou a razão de suas brigas? Por que Julian continua me procurando? Por que Antony têm medo?

Eu somente fujo pra meu quarto seguro e leio uma entediante história, um romance impossível pra mim em que a garota é claro, a boazinha. E o garoto é um príncipe ou alguém mal que ela faz bem. Por que sempre um conto entediante assim? Eu nunca poderei viver um, porque sou a má da história, ela termina com um horrível destino em todas as vezes.

Acho que deve ser isso, meu destino.

Mas eu achei chato demais uma certa coisa suspeita: porque Julian continua me procurando se isso fere seu amado irmão? Por que continua sorrindo e me dizendo coisas boas?

Isso foi suspeito demais e me cansei de vê-los brigando e fugir. Eu não queria mais isso.

É horrível ser a causa de uma dor, por algum motivo. Talvez porque eles sejam irmãos, eu quero que sejam felizes juntos. Mas estrago isso sem querer.

— Vossa Alteza, não gostaria de ver uma certa pessoa? Soube que você e Will têm se distanciado – falou Julian do nada, andando atrás de mim, como sempre, com as mãos nas costas.

Era uma terrível verdade, Will têm andado tanto com Marianna que não tenho coragem de me aproximar, eu sei que vou chorar apenas por vê-lo sorrir ao lado dela.

— Por que está preocupado? – perguntei sem notar nada de anormal.

— Ah, acho que dois amigos não deveriam brigar ou estar afastados – disse.

— Acho que dois irmão não deveriam brigar ou estar longe nem um pouco – retruquei.

— De novo? – Antony apareceu e por incrível que pareça, desta vez nem se aproximou, apenas saiu cabisbaixo quase correndo.

Vi o quão duro eu estava sendo com os dois, somente por existir. E me irritei.

— Por que vocês continuam brigando por minha causa?! – xinguei – Idiotas! Sempre me deixam confusa e fazem chorar, com essa culpa... Por que brigam tanto? Estou cansada de correr, cansada de fugir!

Antony parou de correr e ficou parado, Julian cabisbaixo com os cabelos ruivos sob o rosto sombrio, dava pra sentir uma estranha aura de tristeza misturada à uma certa raiva e descontrole. O que era aquilo?

— Meu irmão não sabe o quanto eu o amo – repetiu a frase de antes, levantou a cabeça e pude ver seu verdadeiro rosto, com aqueles olhos carmim cheios de ódio e ardor – Eu o farei ver o quanto eu o amo.

Nunca imaginei o quanto era odiada pelas pessoas que maltratei, mas hoje, vi isso estampado nos olhos rubi dele. Não era como um desprezo cego como o de Antony, era uma sede de morte que me paralisou. Finalmente caiu aquela máscara falsa daquele garoto. Tudo se esclareceu. Era sempre assim, ele só me odiava, com aquele sorriso, com aquelas palavras mentirosas. Sempre me odiou, ainda mais intensamente que seu irmão. Por isso ria e me perseguia com uma faca escondida na roupa simples, o ódio escondido no sorriso doce e na preocupação confusa.

Me atacou tão repentinamente que não consegui me mover, só o que vi foi seus olhos vermelhos ameaçando consumir minha alma e um vulto que me derrubou no chão. Não fosse ele, eu morreria.

Antony saltou por cima de Julian e o segurou pra conter sua ira doentia. Ele sabia? Por isso tinha medo?

— Pare com isso Julian! – ordenou tentando segurá-lo direito.

— Ela os matou, Tony! Na nossa frente! – gritou o outro apavorando-me.

— E você quer ser como ela?! Tornar-se um assassino?! – disse.

— Ela me tirou tanta coisa, te tirou tanta coisa. Você mesmo a odeia! – chorou Julian – Poderia acabar com isso já, poderíamos ser até mesmo reis e daqui pra frente...

— Eu não quero que meu irmão seja um assassino! Bastardo!

Antony lhe deu um tapa, estava chorando, realmente impediu Julian de ser um assassino. Mas ele não tinha raiva? Não me detestava o suficiente pra me matar?

— Por favor, mano, eu te amo demais pra ficar quieto vendo você chorar todas as noites – falou Julian ainda querendo me matar – Eu odeio ela! Eu odeio que você chore pelo que ela fez!

— Cale-se! Eu te amo demais pra deixar que se torne um monstro como ela! – reclamou Antony – Não quero isso! Não quero que você se machuque, nem que machuque os outros! Quero... eu estou tão confuso...

— Por que não me deixa matar essa bastarda? – indagou o outro.

— Porque ela não é nada, esqueça-a, nós estamos vivos! Não quero ser rei ou irmão de um bastardo assassino!

Julian me olhou de leve, chorando, derrotado.

Nunca pensei que me odiasse assim, nunca pensei que seria salva por Antony ou que os dois iriam ficar chorando abraçados num tapete de uma sala de meu castelo.

Enquanto a falsa “Maravilhosa Rainha” olhava pra os dois estranhos irmãos sentada no chão um vestido tão grande e pesado o que eu vestia, não consegui levantar.

— Por que você é sempre um idiota?! – xingou Antony chorando e tentando esconder as lágrimas, mas estava tão sentimental como nunca o vi – Por que faz essas coisas por mim?! Não entende que isso não me importa?! Só que se você... e se você morrer?!

— Por favor, não chore Tony...

— Você é tão idiota pra me deixar sozinho com essa bobagem?!

— Por favor, pare...

— Eu te odeio! – começou a chorar mais, como um condenado, Antony afundou o rosto no peito de Julian.

— Você me odeia tanto que chora abraçado em mim? – perguntou o outro debochando.

— Calado! Bastardo!

Ah, que entediante vê-los assim;

Não sei se eu desejava morrer mesmo. E se eu tivesse um irmão? Imagino se seria assim. Eu queria saber o que há com esse meu conto de fada. Eu deveria morrer logo? Será que há mais tristeza em minha vida? Só posso saber vivendo...

Ah, só sei que é entediante demais.

Por que não sair voando na garganta de alguém com uma faca? Até Julian fez isso.

No fim, somos todos muito ingênuos por esse tipo de coisa.