Discernimento

Capítulo 1


A bela e doce Jane Fairfax recebia todos os elogios da noite. Merecidos, claro. Porém pouco tolerados por Emma que se acostumara por receber ela mesma tais elogios.
Até mesmo seu grande companheiro, Mr. Knightley, a qual a opinião era das que mais respeitava, se inclinava pela moça pálida naquela ocasião.

— Nunca ouvi tão calorosa execução. Ela deve ter treinado arduamente para chegar a essa perfeição harmônica de notas.

Emma concordara.
Tinha escrúpulos o suficiente para reconhecer quando alguém fizera um bom trabalho. Mas olhava com certa inveja a garota sentada no seu próprio piano, recebendo a atenção que deveria ser dela.

"Ela nem ao menos tem um instrumento onde praticar. Apenas na escola de música ela teria a possibilidade de fazê-lo. O que era pouco, ela bem sabia, para chegar ao nível onde Jane Fairfax estava." Então logo permitiu-se acreditar que algumas pessoas são mais providas de “dom” do que outras e que essa seria a explicação do repentino talento da garota.

No dia seguinte, quando todos estavam em suas próprias casas, comentando o jantar que a família Woodhouse havia oferecido, Emma se grudara ao piano. Tinha convicção de que só sairia dali quando aprendesse a música a qual a outra tocara na noite anterior.
Foi daquelas motivações que duraram dois dias inteiros, mas no terceiro já não sobrava nenhum resquício.

Porém, logo outro jantar chegou e novamente a garota se sentiu rebaixada. Então desistiu. Que Jane Fairfax fosse a melhor pianista! Já não ligaria mais.
Era o que pensava, não o que sentia. Por isso os poucos convites que Mrs Fairfax recebia para visitar a casa dos Woodhouse foram novamente diminuídos.

Tentou Emma seguir pela arte. Retratos e mais retratos foram pintados, mas logo sentiu que não seria boa a ponto dos outros falarem dela nas reuniões e não da jovem a qual invejava, então desistiu.
E foi desistindo das coisas uma após a outra, entendendo de tudo um pouco e não tendo melhores qualificações em nada.

Em uma dessas visitas a qual não teve como negar que as velhas tias trouxesse sua amada sobrinha, Miss Fairfax e Miss Woodhouse andaram pelo bosque de seu terreno sem muito o que falar. Elogios de ambas se sucederam, sem grandes interesses de fato. Porém Emma lembrou de perguntar o que lhe passara em mente com a primeira performance da jovem a qual era obrigada a conviver.

— Como consegues ministrar tão bem um piano se em sua casa não tens um órgão? — Perguntou, sem interesse em ser sensível a dificuldade financeira da outra.

Jane, ruborizando com a pergunta, respondeu com grande sinceridade.

— Não treino o quanto queria, porém quando possível vou até a casa da senhora Ringston, minha professora de piano como sabe. Devo ser um incomodo, de verdade. Uma aluna que a segue até mesmo em casa, porém gosto mesmo dos sons dos acordes e não tendo eu mesma um órgão, uso da bondade dela para comigo.

Emma lembrou da ideia que tivera, de que a garota apenas tivesse o dom e não a capacidade de se dedicar e se martirizou pela mesma. Lembrou que era ela que não tinha tal capacidade e ficou ainda mais aborrecida com seu próprio discernimento.

— Quando tiveres vontade de tocar e quiseres vir a um destino mais próximo, fique à vontade de visitar-me. Papai adorará ter alguém que toque duas músicas para ele e eu mesma ficarei contente com isso.

— Não, imagina. Não traria tanto incomodo a sua casa. Não me parece justo.

— Realmente não parece. Então, se não for pedir demais, que tal se me ensinas alguma coisa como retribuição?

Jane Fairfax sorriu. Estava muito contente com a proposta e a aceitou de bom grado.
Estava decidido, viria três vezes por semana, em horário adequado, para treinar e ensinar miss Woodhouse.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.