Escondida entre as grossas cortinas, estava Renesme observando a vista fora da janela. Esme se aproximou devagar e viu que ela observava a chegada de Tanya e Carmen. Pela expressão de sua neta, ela não estava gostando nada do que via.

— Não sabia desse seu lado fofoqueiro. – Esme comentou e Renesme quase deu um pulo ao ser pega pela avó.

— Não é fofoca. Apenas quis saber quem iria nos visitar hoje.

— Carmen vai ser entrevistada comigo hoje. William não te contou?

— Não. Você não tem notado que Tanya tem ido cada vez mais no palácio? – Renesme falou voltando a olhar para as duas do lado de fora.

— Bom... Edward comentou que ela queria voltar a trabalhar mais ativamente para a monarquia. Acho que deve ser por isso.

— Hum.

Antes que a princesa pudesse dizer mais alguma coisa, Tanya entrou e ficou diante delas com uma cara de deslumbre. Esme se impressionava com a boa genética de sua sobrinha postiça. Com quase 63 anos de idade, Tanya continuava uma mulher belíssima. Alta, magra e com uma pela que poderia disfarçar bem sua verdadeira idade. Uma beleza única.

— Titia! – falou enquanto trocava beijos na bochecha com a rainha depois de uma reverência elaborada. Tanya nunca deixava o seu jeito exagerado e galante.

— Olá, querida. Como vai?

— Muito bem! Olá Renesme! – ela falou se referindo a princesa pela primeira vez.

— Oi.

— Vejo que sua barriga está enorme!

— Ah sim! Logo nascerá.

— Maravilha! Ainda bem que é um menino, não é? William deve estar muito satisfeito.

— Ele estaria também se fosse menina outra vez.

— Claro! Tia? Eddy está no escritório?

— Imagino que sim. Sua mãe onde está?

— Está lá fora com o jardineiro. Ela achou linda as rosas na entrada e queria umas mudas para plantar lá em casa.

— Certo. Eu mesma providenciarei isso pra ela.

— Ela vai ficar muito contente. Mamãe agora deu para se interessar por plantas. Deve ser coisa da idade. – sorriu. – Vou lá atrás do meu priminho. Tchau gente!

Tanya saiu palácio a dentro e Renesme fazia caretas engraçadas pelas costas da prima. Esme queria entender de onde tinha vindo essa antipatia. Não lembrava dela ter tanta raiva dela assim.

— A idade não trouxe nenhuma melhora para essa mulher. – falou.

— É aquele ditado, não é? Pau que nasce torto...

— Aposto que quer alguma coisa com o papai.

Agora tinha sido a vez de Esme sorrir. Não duvidaria que Tanya tivesse alimentado esperanças novamente com relação ao seu filho. Sempre soube que ela tinha uma queda por Edward, isso desde que eram adolescentes, porém, nunca foi correspondida. Agora estava surpresa por Renesme alimentar esse ciúme pelo pai agora.

— Está doida para virar rainha.

— Isso não tem nenhuma possibilidade de acontecer, querida. Seu pai não já disse que só haverá uma rainha quando à hora chegar? Além do que, ele não quis antes quando era mais jovem, não vai ser agora que vai querer.

— Seria maluco se quisesse. Mas ela é mais ainda por continuar insistindo.

— No passado, ela fez uma grande bobagem quando seu pai estava namorando a sua mãe. Quase perdi meu filho por causa disso e acredito que Edward tem uma excelente memória. Por isso, fique calma.

Renesme balançou os ombros desdenhando e pararam com assunto ao sentirem o barulho da bengala de Carmen cada vez mais próximo de onde estavam. A irmã de Carlisle agora sofria com problemas de locomoção que tinha lhe tirado muito de sua vitalidade. Antigamente, ela fora uma verdadeira musa. Pousara para revistas, era a mais bem vestida, sempre ativa em vários eventos e trabalhos para a realeza. Era impressionante como o tempo castigava as pessoas.

— Boa tarde, meninas! – saudou.

— Bem – vinda Carmen! Que prazer!

— O prazer é meu! Faz tantos anos que não venho aqui em Clarence. Estava com saudades.

— Imagino. Tivemos momentos tão bons aqui, não é?

— Oh aqui estão elas! – William saudou enquanto entrava pela porta da frente com a filha nos braços. – Achei que iria me atrasar. Essa garotinha aqui está se interessando por cavalos.

— Puxou a mãe. – Esme falou enquanto batia de olho para a neta.

— Por mim, ela seria inteirinha igual a mãe. – declarou William.

— Você é tão fofo! – Renesme falou derretida e em seguida deu um selinho no marido.

— Beso mama.

— Você merece muitos beijos, meu anjinho. – Renesme disse enquanto beijava a filha. A pequena Isabella soltava uma gargalhada contagiosa. – Agora vamos deixar o seu pai trabalhar, não é? Estou com fome. Você não está?

— Si. Cocoiate mama.

— Não é hora de chocolate, mocinha. Vamos encontrar outra coisa gostosa pra gente comer, sim?

Renesme se afastou acompanhada da filha para a cozinha. Esme virou a sua atenção para dois em sua frente.

— Me acompanhem para a sala de estar. Pedi que fizessem um chá da tarde delicioso para nós.

Todos seguiram e logo William a apresentou um monte de matérias antigas sobre as duas. Não se surpreenderia se assunto fosse justamente esse. Por anos, Esme tinha sido comparada com a princesa. O que ela achava terrivelmente engraçado, já que não havia nada a ser comparado em sua opinião. Era óbvio que Carmen se vestia melhor, falava com mais exatidão, tinha maneiras melhores, por anos ela havia sido preparada pra isso. Esme tinha acabado de chegar na rodinha e estava fazendo de tudo para aprender. Agora lhe irritava quando mentiras eram inventadas para provocar intrigas.

— Primeiro, eu gostaria de parabenizar a sua alteza. Sei que faz anos que lançou o seu livro biográfico, mas nunca tive oportunidade de parabenizá-la pela sua coragem.

— Obrigada. Eu também nem imagino como tive essa ousadia.

— Tudo aquilo foi necessário. As pessoas pensam que casos de relacionamentos abusivos, violência doméstica só acontecem com as camadas mais pobres. Mas não é bem assim. Você não só surpreendeu a todos nós como deu margem para que esse assunto fosse posto em discussão e deixasse de ser naturalizado.

— Foi uma surpresa até para nós, da família. Vivíamos com eles sempre e nem imaginávamos o que acontecia entre quatro paredes. Nem sei como continuou casada com aquele monstro por tantos anos.

— Nem eu. Eram tudo convenções sociais bobas. É como William falou. A gente, principalmente da nossa geração, foi criada para aceitar tudo por que fazia parte do que se entendia de uma relação a dois. “Ah não são apenas ciúmes”, “Os homens são grosseiros mesmo.” e tínhamos que aceitar.

— O que não é. – respondeu William.

— Não. Eu já estava com outra pessoa quando escrevi aquele livro. Na época, eu fui percebendo que tudo que eu achava que era aceitável, simplesmente não era. Eu estava descobrindo um mundo desconhecido e escrever a minha biografia foi um desabafo necessário.

— Lamento que tenha acontecido isso com a senhora.

— Eu também.

— Bom, é isso que estamos querendo fazer com a sua majestade. Ela vem se abrindo bastante e nos revelando coisas inimagináveis. Acho que todos deviam se dar essa chance.

— Esme teve uma vida boa. Pelo menos até onde sei, meu irmão era loucamente apaixonado por ela. A conexão que eles dois tinham era de dar inveja a qualquer um.

— Pelo que percebi era mesmo. Mas não falemos disso hoje. Quero saber como é o relacionamento de vocês duas?

— É ótimo! Esme sempre foi uma mulher e tanto, com um coração enorme.

— Obrigada, querida. William, nada que está nessas matérias é verdade. Nunca rivalizamos a nossa relação.

— Nem no começo? Digo, quando ambas se tornaram mulheres casadas e com suas famílias na linha de sucessão?

— Eu lembro de Eleazar desejar muito que as meninas tivessem todo o destaque, títulos e que fossem tratadas como princesas como eram. Houve até aquele episódio sobre Emmett lá trás, lembra Esme? Mas eu não. Sempre soube o meu lugar.

— Episódio sobre Emmett?

— Eleazar queria utilizar o infortúnio que aconteceu com Emmett na adolescência para usurpar o trono. Estava querendo articular com alguns políticos e com a imprensa. Lhe contarei melhor mais na frente.

— Esse acontecimento me motivou a me separar dele. Eu não podia mais continuar com uma pessoa que me feria e machucava a instituição em que fui criada e ainda mais a minha família.

— Por que vocês acham que os tablóides escreviam esse tipo de matéria sobre vocês duas então?

— São as polêmicas que dão audiência. Ninguém quer saber que coisas boas estão acontecendo. Então, inventam tudo. Na real nós nunca competimos.

— Não sei se sabe, Esme, mas as matérias dessa época foram coisas da mamãe. Ela estava muito irritada com você.

— Eu desconfiava que poderia ser.

— Então, nem tudo estava certo no paraíso. – concluiu William.

Esme: Sua Verdadeira História – Capítulo 18: Tudo Errado no Paraíso

Voltamos da nossa primeira turnê internacional com um belo sorriso no rosto. Carlisle me contava tudo que conversou com o rei da Espanha e com o primeiro ministro do país enquanto brincávamos com Emmett. O bebê estava agitado e tínhamos que entretê-lo de alguma forma para ele agüentar a viagem inteira. O Passávamos de um braço para outro e ouvíamos a sua risadinha infantil. Ele estava feliz e nós também. A sensação era de dever cumprido. Tínhamos certeza que chegaríamos em casa e todos estariam satisfeitos, afinal de contas, tudo dera certo. Formos bem recebidos. Firmamos alguns acordos, aprendemos muito e colocaríamos tudo em prática em breve. Pra falar a verdade, nós, Carlisle principalmente, estivemos tão empenhados com os trabalhos da realeza até então.

Bom ou ruim, diferente de hoje, que podemos ter acesso as notícias de qualquer lugar, na época ficávamos na surpresa a ter acesso a elas. Quando pisamos em terra firme, ao invés de recebermos elogios por nossa desenvoltura encontramos diversas caras fechadas. Pipocavam em vários meios de comunicação notícias ruins. Críticas principalmente a mim.

De repente, eu tinha virado a “duquesa difícil” por que supostamente eu queria que tudo fosse absolutamente do meu jeito. Que eu gritava quando escolhiam minhas roupas, pois não gostava de nenhuma. Levar Emmett tinha sido uma imposição minha e que eu tinha feito a rainha chorar nas vésperas da viagem. Fiquei de boca aberta. Por que tudo tinha que ser relacionado a mim? Por que tinham que inventar tantas mentiras? Chorei muito naqueles dias. Parece que a lua de mel entre a impressa e eu havia mesmo acabado.

— Eu só queria saber por que eu sou o assunto dessas notícias.

— São uns imbecis! – Carlisle falou com raiva.

— Não seria o caso de ter um gerenciamento de crise? – perguntei. – Tem alguém toda hora me dizendo o que fazer, o que vestir, como me comportar e ainda criticam tudo que eu faço. Devia haver alguém por aqui para ao menos controlar o que circula por ai. Sou um membro da família real agora e isso pega mal pra instituição.

— Eu concordo e quer saber? Chega de trabalharmos com quem os meus pais querem. Devemos montar a nossa própria equipe com pessoas que confiamos.

— Acho justo. Temos que reconhecer que somos importantes nessa instituição e se quisermos fazer um trabalho de verdade, do nosso jeito, temos que controlar nós mesmos o que acontece.

Assim anunciamos que pretendíamos mudar toda a nossa equipe e montar um escritório próprio para gerenciar os nossos trabalhos. Hoje em dia, aliais, desde que Carlisle se tornou rei na verdade, cada membro sênior da família real tem a sua equipe separada, porém unida a central. Queríamos algo assim. Um secretário para cuidar da nossa agenda, um assessor de imprensa para trabalhar na nossa imagem e controlar a mídia ao nosso redor, advogado, seguranças e tudo que nos era necessário.

— Não entendo por que não estão satisfeitos com as pessoas que trabalham pra vocês.

— Eles estão sobrecarregados, mãe. Imagina trabalhar para 6 pessoas? É muita gente e às vezes coisas importantes lhe escapam.

— Isso é coisa dela, não é? – a rainha falou apontando pra mim e eu nem me importei. Tudo no final era culpa minha mesmo.

— Eu estou sendo a mais afetada lá fora e a culpa é minha?

Elizabeth franziu a testa, eu sabia que ela queria mesmo era poder pular no meu pescoço. Tenho que admitir que lidar com uma pessoa teimosa feito eu, tendo mais teimosia ainda não era nada fácil.

Mais uma vez, houve muita gritaria, porém vencemos e podemos escolher os profissionais que trabalhariam pra gente e formar a nossa equipe. Carlisle e eu ficamos muito entusiasmados no processo de escolha. Queríamos pessoas que combinavam com a gente ao nosso lado. Que apoiavam causas sociais, que tinham experiência com gerenciamento de mídia pessoal. Gostaríamos de poder formar uma imagem forte perante as pessoas.

Posso dizer que formos bem sucedidos. Acho que tudo que construirmos de bom até o momento que nos tornamos monarcas foi obra de um trabalho de anos. O recado principal era: “somos diferentes do que vocês estão acostumados a ver.”. Podia até parecer um grande racha dentro da família real e pra ser sincera, foi isso mesmo. Porém, isso já existia desde que Carlisle ainda era solteiro e lutava pelas suas convicções sozinho. Estava claro que uma nova era estava nascendo e precisava de novos pensamentos. Queríamos seguir a multidão.

Passei um tempo com poucas turbulências desde que mudamos a equipe. Eu ainda sentia uma energia pesada em minha volta dentro do palácio. Quando passava, alguns reviravam os olhos, ou cochichavam. Tentei não levar em conta. Já não me bastava o relacionamento estremecido com os meus sogros.

Na leva da equipe, contratei uma pessoa que me aconselhasse e me desse algumas dicas importantes para o meu melhoramento pessoal quando estivesse em público. Isso me evitou alguns meses sem estar em alguma nota de jornal me chamando de desastrada, gaga, cafona, vulgar e uma série de outras coisas.

O ar de repente estava até mais agradável até que comecei a ver que a pauta tinha simplesmente mudado. Agora faziam comparações entre mim e minha cunhada, a princesa Carmen. No começo, era algo sutil como, “Olha quem se vestiu melhor na festa anual da primavera”, depois absolutamente tudo era motivo para capa de tablóides. Criaram uma verdadeira rivalidade entre nós duas. Vale lembrar que nos anos 80, a indústria de fofocas sobre pessoas públicas estava se tornando popular. Gerava, talvez, ainda mais dinheiro do que hoje com as redes sociais. Então, não era a toa que tudo virava notícia, até uma foto mal tirada que denunciasse um olhar estranho para outra pessoa.

Meu relacionamento com Carmen sempre foi muito bom. Mesmo ela sendo mais jovem do que eu, e mais imatura, porém, nos entendíamos bem. Nos primeiros meses após o meu casamento, ela foi minha guia, minha companhia mais próxima, já que na turbulência da minha agenda, eu mal podia ver minhas amigas de solteira. Além do que, ela sabia o que eu estava passando. Entendia como estar nesse mundo louco que para maioria era apenas um conto de fadas.

Nunca esqueci de quando tive uma crise de ansiedade no meu primeiro evento solo. Carlisle não estava e Carmen foi a primeira mão amiga que me foi estendida. Seu coração era acolhedor e sensível. Compreendeu o que eu estava sentindo no primeiro olhar.

— Isso vai passar, Esme. Acalme-se. Tudo vai se ajeitar.

Ela me abraçava enquanto eu respirava ofegante, achando que morreria em algum minuto. Eu ouvia sua voz e tentava voltar a luz. Suas mãos alisavam os meus cabelos e comecei aos poucos a me sentir melhor.

— Tudo parece aterrorizante quando fazemos algo pela primeira vez, mas se pensarmos bem. Por que devemos nos assustar? Aqueles repórteres, as pessoas que estão lá para nos receber são como nós. Não somos melhores e nem piores.

Eu admirava esse olhar doce sobre o mundo. Não dava para compreender como ela e Carlisle saíram assim, tão gentis, puros, e com uma simplicidade ímpar num meio onde havia tanta luxúria, hierarquia e jogos de poder. Eu só poderia dizer que era fruto de uma personalidade única. Tive sorte e reconhecendo isso, não hesitei em convidá-la a ser a madrinha do meu filho. E como ela amava Emmett. O enchia de presentes. Sempre que podia, ia até o nosso apartamento, correndo feito uma menina, o colocava no braço e o enchia de beijos. Muitas vezes o “seqüestrava” para levá-lo para diversos passeios. Meu menino a amava.

— Você é o bebê mais lindo de todos, sabia? – Carmen falou enquanto ajudava Emmett a dar os seus passinhos desajeitados.

— Diz isso, mas quando o seu bebê vier vai mudar de idéia. – falei.

— Emmett sempre terá o seu charme.

— Vai ter bastante tempo para aproveitá-lo enquanto ele ainda é um bebê. Mais tarde quando ele estiver indo a escolinha poderá ter uma criança e um neném favorito.

— Será antes disso.

— O que? Não me diga que está...

— Não ainda não. Mas Eleazar quer muito. E temos que ter logo um, você sabe, são as regras.

— Não acho que precisa se apressar. Uma das coisas mais importantes é poder ter tempo para vivenciar o relacionamento a dois nos primeiros anos de casamento.

— Sim, verdade. – disse com um rosto um tanto desconfiado. – Também não queria para logo. Há tantas coisas que eu queria fazer antes de engravidar. Mas quando acontecer espero que seja um menino. Eleazar enlouqueceria se não tivermos um principezinho.

Esse foi um dos problemas centrais na vida de Carmen. Ela sempre se deixava levar pelas vontades dos outros e nunca as dela. Seguia cegamente as convenções de sua família e isso a reprimiu bastante. Sei que posso falar sobre isso por aqui por que a mesma já reconheceu esse fato em sua biografia anos atrás.

Logo quando Carlisle e eu nos casamos, trataram de encontrar o par perfeito e a “altura” da família real para Carmen. Isso para acabar com a imagem que agora a realeza belgã abrira as portas para a entrada dos plebeus apenas. Sei que tínhamos diversos jantares e bailes com membros da aristocracia de tudo quanto era lugar. Na época, eu achava que isso era inteiramente parte da rotina da monarquia, mas hoje sei que não. Era uma estratégia dos meus sogros para caçarem um genro.

Carmen falou em seu livro que mal teve tempo de conhecer Eleazar quando se casaram em agosto de 1983. Ele era um marquês austríaco, rico, que tinha se tornado ainda mais do que um milionário com um título de um reino inexistente ao investir no ramo petroquímico no Canadá, onde morava na época em que conheceu a irmã de Carlisle.

Lembro do primeiro natal que passei junto a família em Clarence quando foi anunciado que haveria um convidado especial, era uma das primeiras apostas a noivo. Eleazar era galante, viajado, cheio de experiências de vida, apesar de seu semblante sério. Porém, nunca deixava de entreter com suas histórias de aventura. É claro que a jovem romântica e louca por novas vivências se apaixonaria logo. Carmen afirma ter se encantado com seu cavalheirismo e seu ar de mistério, ela nunca sabia com certeza o que ele estava sentindo. Tal como o Conde Drácula seduzia as suas vítimas antes de matá-las.

Compartilhei diversas vezes com Carlisle em nossos momentos de privacidade que não gostava muito de Eleazar. Para mim, ele parecia representar o que não era. Muita cortesia me parecia forçada e seu olhar me assustava em certos momentos, era dominador, me passava autoritarismo. Mas Carmen havia gostado dele e aceitou namorá-lo, mesmo que por cartas devido à distância. Ela sonhava que poderia ser tão feliz quanto seu irmão era comigo. Eu não poderia me meter onde não era chamada.

Eu sabia que o casamento viria logo. Eleazar já estava com trinta anos e queria avançar a fase de solteirice. Além do que, se tornar duque de um reino, era quase como recuperar os títulos de sua família na Áustria. Era como ser rei.

Pierino o amava. Seu genro era tudo que ele esperava que seu filho rebelde fosse e não era. Tudo estava muito perfeito. Carmen abriria sim mão de mais um desejo para fazer os outros felizes. O sonho dela era seguir na moda. Desde muito menina, tinha uma altura perfeita, postura e corpo de modelo, além do rosto lindo. Não era como aquelas magrelas, loiras que sempre víamos nos anúncios. Sua classe e gosto impecável na escolha dos figurinos denunciavam que ela daria muito certo na carreira. O que deu errado? Ela já era uma princesa. Tinha que fazer o que lhe era determinado na época. Participar de compromissos, cortas fitas, se casar, de preferência jovem, ter filhos e dar prosseguimento a linhagem. Estava presa ao seu destino.

Eu tinha plena certeza que ela sentia muito por poder não seguir com os seus sonhos. Por Carmen, ela viajaria pelo mundo conhecendo as especificidades de cada lugar, desenharia figurinos e mostraria seus dotes nas passarelas de Paris ou Roma. Mas sabia que seria terrível para a sua família se ela saísse do caminho traçado pra ela. Por isso também, aceitou se casar. Não pude acompanhar muito essa decisão dela e nem os preparativos do casamento por conta da minha gravidez turbulenta, mas me arrependo sinceramente de não tê-la aconselhado ao contrário. Diria: “Conheça-o melhor”, “Dê tempo ao tempo”. Mas o que está feito, remediado está.

Carmen engravidou em novembro de 1984. Lembro quanto todos ficaram eufóricos. As expectativas eram imensas. A rainha mimava Carmen de todas as formas, já fazia mil planos, mesmo o bebê sendo o quarto na linha sucessória na época. Eleazar já gritava aos quatro ventos que teria o seu herdeiro. Carmen o olhava aflita.

No momento, eu desconfiava que ela vivia num relacionamento extremamente abusivo. Eleazar tinha um ciúme absurdo dela. A vigiava a todo instante e achei aquilo horroroso quando presenciei, sem querer, ele discutindo com ela por que a tinha visto conversando com um homem numa festa no palácio. Tentei alertá-la.

— Isso não é normal, Carmen.

— É só um ciuminho bobo! É por que ele me ama muito.

Algum muito comum em relacionamentos abusivos é o agressor manipular a vítima para fazê-la acreditar que suas atitudes têm um motivo. Sempre há uma explicação para um insulto, um ciúme, e normalmente, nunca ele era o culpado. O que eu não sabia era que ela era vítima de violência doméstica também. Sofria agressões sempre que Eleazar se sentia ameaçado de alguma forma. Eu tinha certeza que ela não seria capaz de traí-lo, mas ele era um doente mental.

— Não tem vontade de fazer o ultrassom para saber o sexo do bebê? – perguntei certa vez.

— Não. Quero saber naturalmente.

Senti o medo em sua voz. Ela vivia apavorada com a idéia de apanhar se viesse uma menina, mesmo não tendo qualquer controle sobre isso. Me arrepio quando escutei Carmen falar que tinha medo de qualquer gesto de Eleazar porque ela nunca sabia o que poderia desencadear uma agressão. Qualquer coisa podia significar o começo de uma briga. Essa possibilidade a apavorou durante toda a sua gestação. Atrapalhou até o seu parto. Eu estava com ela quando sentiu as contrações. Sugeri que ela parisse no St Clair, pois ela estava muito tensa e poderia estar com a pressão muito alta. Mas ela se negou. Teria o bebê no palácio de Belgravia com uma parteira como mandava a tradição.

Segurei a sua mão enquanto Carmen fazia força. Eleazar estava numa partida de pólo e não poderia ou não queria fazer parte daquele momento importante. A rainha e o rei esperavam ansiosos na sala adjacente enquanto eu limpava o suor da filha deles e a acalmava. Depois de um tempo, veio o alívio, ou não, era uma menina.

Eleazar chegou quase de noite, Tanya tinha nascido no início da tarde. Entrou no quarto afoito e olhou para Carmen e para o bebê.

— Cadê o meu filho?

Carmen olhou para ele assustada.

— É uma menina. – anunciei.

Depois de Tanya, viria mais duas, Kate e Irina. Começaria mais um pesadelo na vida dela e não sabíamos nada disso até ela ter coragem de se separar dele, depois de anos de casamento, não sabíamos o que acontecia entre quatro paredes. Era doloroso imaginar que a minha cunhada se viu em silêncio por tanto tempo, incapaz de pedir ajuda. Por temor, ela acabou aceitando, baixando a cabeça. Como podia dizer algo? Todos o achavam um lorde, os pais dela repetiam o mantra de que ele era um homem bom, quem acreditaria no que ela dissesse?

Por isso, volto afirmar, se nem mesmo nós sabíamos o que acontecia ao nosso redor, imagine a imprensa. Na real, os tablóides sempre amaram pôr casos de família em pauta. Brigas, polêmicas, rivalidade feminina sempre despertam a curiosidade alheia. Não bastava o fato de estarmos sempre sendo observados, também tínhamos que servir de entretenimento barato. Podiam pintar um lobo em pele de cordeiro.

Posso dizer que esse é um arrependimento que levarei para o túmulo. Não ter percebido o que acontecia diante dos meus olhos e não ter salvado a minha amiga de anos de sofrimento. COMENTEM POR FAVOR! FAÇAM ESSA AUTORA FELIZ ;)