Stella

O ar faltou em meus pulmões, dando-me a certeza de que algo está errado.

Logo que abro os olhos, preferia tê-los mantido devidamente fechados. Sinto o sangue passando por minhas veias e artérias, misturado com o metal. É uma dor impossível de se descrever, que se torna cada vez mais forte, conforme os segundos se arrastam.

Pisco diversas vezes, tentando não gritar. A última vez que senti essa dor, eu tinha dez anos.

E acredite, foi menos doloroso do que agora.

– Stella! - reconheço a voz, sendo de Aurora, e quase no mesmo instante sua figura entra em meu campo de visão. – Como está se sentindo?

Não respondo de imediato, pois sei que posso acabar perdendo o controle (ou na pior das hipóteses, vomitando).

– Acho melhor não falar com ela agora – uma voz desconhecida se pronuncia.

O metal já está em meu sangue novamente, circulando como se fosse parte de meu corpo.

Pelo menos a dor passou.

Meus pulmões parecem normais, tal como o restante dos órgãos que me compõe. Nada fora do lugar, ou fraturado.

A lembrança da minha última luta roda em minha mente, fazendo-me estremecer pela conclusão menos agradável de todas; eu realmente tinha morrido.

E o mais inoportuno da situação, é que usei a técnica proibida sem perceber. Tecnicamente, me “desliguei” propositalmente para não morrer de verdade.

Sei que é confuso. Até mesmo eu não entendo como sou capaz de fazer isso.

Ouço conversas paralelas, identificando, por vezes, a menção de meu nome.

Deduzo que estamos na S.H.I.E.L.D, e que NovaHead está fora de perigo. Basta saber o que houve e por quê.

Fecho os olhos, imaginando um lanche do McDonald’s, e com tristeza lembro-me que a última vez que comi alguma coisa, foi bem antes do ataque acontecer.

Bom, talvez seja uma boa hora para encontrar uma Praça de Alimentação por aqui.

(...)

Depois de devorar um maravilhoso lanche, já não sou mais uma “morta”, digamos assim.

Aurora, Zack, Simon e Ashley me falaram sobre os Destroyers, sobre os vilões que voltam à vida e principalmente, sobre Clarissa e James não estarem dentro do grupo de heróis.

Entretanto, o que mais me surpreende, é o fato da Lady Assassina ter aberto mão de seus hábitos, mesmo que por meros instantes, para trazer-me de volta.

– Eu pensei que ela ia fazer algum tipo de exorcismo em você – desdenha Zack, arrancando risadas dos outros.

Termino meu lanche, em completo silêncio. Imagino se todos já sabem dos “empréstimos” que fiz/faço para a Wayne. Como se lesse meus pensamentos, Aurora assume uma expressão mais séria, que dá certo medo.

– Quando pretendia nos contar sobre as armas que andava contrabandeando para a Lady Assassina? – seus olhos semicerrados, e o tom de voz levemente ameaçador, não são detalhes me instigam a responder.

Contrabandear é uma palavra muito forte – encolho-me, um tanto aflita.

Ashley bufa.

– Então o que foi que você andou fazendo? – me questiona de modo reprovador. – Liquidação? É um insulto eu não ter sido chamada. – E embica os lábios.

Simon se inclina para frente.

– Stella, você é muito ingênua – ele me encara com certa pena, algo que me irrita profundamente. – A Wayne não é nenhum exemplo de garota que possua qualquer tipo de compaixão por alguém.

Abro a boca, querendo dizer que ela me ajudou, mas Aurora, taxativa como é, me interrompe.

– Ela só fez isso para que você continue sendo o “animal de estimação” dela. Acorde, Stella! Graças á você, Clarissa já matou milhares de pessoas!

Arregalo os olhos por breves instantes, no entanto, nenhuma palavra sai em favor de Clarissa.

No fim, Aurora está certa. Como sempre.

(...)

Mesmo não fazendo parte da equipe, James Turner ainda corre atrás de Aurora (e por sinal, ela não parece tão insatisfeita com isso).

Soube, por conta de uma conversa entre Dylan e Fury, que Clarissa permanece detida em uma cela da S.H.I.E.L.D, por motivos superiores.

Talvez eles achem que a Lady Assassina possa se unir aos vilões, ou algo do gênero.

Já são quase cinco da manhã, e eu ainda não acredito que o ataque à NovaHead ocorreu há apenas poucas horas.

Neste momento, divido um dormitório classificado como “Feminino” com Aurora, Ashley e Sophia.

Esta última, ao contrário das outras, não dorme. Encara a cama acima da sua, onde Ashley repousa com um monte de cremes na cara.

– A Clarissa é sua amiga? – Ela me encara, timidamente. Deve ser a primeira vez que puxa assunto com alguém.

Hesito um pouco em responder, refletindo sobre sua questão.

– A Clar não tem amigos – digo, vendo a expressão da loira, indicar sua confusão. – Eu a considero uma amiga, mas ela não faz o mesmo. – encolho os ombros. Sophia assente, voltando os olhos para o estrado da cama de cima mais uma vez.

Essas foram ás únicas palavras que trocamos até ela finalmente adormecer.

Olho para o relógio digital acima do criado-mudo. Já são cinco e meia.

Lentamente, sem fazer um barulho sequer, saio da cama. Tiro o pijama (doado pela S.H.I.E.L.D) e visto as roupas de heroína que trajava em NovaHead.

Abro a porta do dormitório, tendo certeza de que as três ainda dormem, e escapo para o lado de fora.

A base da S.H.I.E.L.D se encontra totalmente silenciosa. Alguns agentes estão de plantão, no entanto, cuidam apenas do setor de controle desta nave.

Espreitando pelos corredores desertos, alcanço as portas que guardam a cela mais protegida da base. Sem esforço algum faço com que o campo onde devo digitar a senha, me obedeça.

O que você queria? É metal, baby.

Adentrei a sala, onde uma escada inclinada até um piso impecável se estende para mim, ligando-me até um patamar cheio de controles, para comandar a cela.

Percorro o piso, encarando a prisão de vidro esverdeado, que mais parece um pote de azeitonas.

Lá dentro, Clarissa está largada no piso da cela, com os olhos voltados para o teto, e sua máscara firme em sua mão.

– O que está fazendo aqui? – pergunta, sem nem ao menos encarar-me.

– Por que você me ajudou? – revido, com o cenho franzido.

– Porque sim – Responde, fitando-me por fim. – Eu não tenho motivos. Faço porque faço. Da mesma forma que eu posso te ajudar, você pode me ajudar.

Afasto-me da cela, perplexa com suas palavras.

– Aurora está certa sobre você – afirmo reprovadora. – Deveria ter acreditado desde o início que não havia conserto com relação à Lady Assassina. Ao menos tentei ajudar a Clarissa Wayne.

Recuo, me arrependendo por virar as costas para Clarissa. Posso ser ingênua, no entanto, é inevitável não pensar na possibilidade dela parar com seu “hobbie” (matar, destruir e aniquilar).

Subo as escadas e abro a porta, sem olhar para trás uma vez sequer.