Descobrindo a própria luz

Capítulo 17- Ganhamos uma viagem da mãe Terra


[ Os meninos me ajudaram com o ombro e viajamos em direção a praia, nosso próximo destino. Maat adicionou um novo colar com uma pérola azul no meu pescoço e eu contei toda a história para eles. (...) ]

Estávamos lanchando em uma lanchonete não muito distante da ponte. E algo que há muito tempo eu previ que aconteceria estava acontecendo. Os meninos estavam brigando. Era a primeira desavença real entre Nico e Maat, e eles pareciam loucos para descontar toda a raiva acumulada dos últimos dias.

Desde a casa de Mernie, Maat não perdia a oportunidade de lembrar o quanto eu estive encrencada, por dar ouvidos a Nico e não a ele.

– Você está dizendo então que eu sou o culpado pelas coisas darem erradas? – Ironizou Nico, elevando o tom de voz.

– Mas é claro que é. Sempre que você tem uma de suas fantásticas ideias, quase morremos!

– Eu não sei se você percebeu, mas é a SUA namorada que tem uma séria dificuldade de fazer as coisas certas.

Eu absorvia cada palavra que eles berravam completamente estática. Aquilo não podia estar acontecendo. A briga acabaria logo, menos nessa circunstância. Maat não suportava que outras pessoas me criticassem em sua frente, nunca suportou. Por isso, o que veio em seguida não me surpreendeu.

– Primeiro : Limpe essa sua boca de merda para falar dela ! - Maat gritou ainda mais alto. – Segundo: Você não parecia tão incomodado com a Isabelle durante as milhares de vezes que deu em cima dela.

Aquilo pegou Nico desprevenido. Ele abriu a boca uma porção de vezes para responder. Não com medo, mas como se decidisse se isso valeria ou não a pena.

– Então você não se garante? – ele perguntou por fim, com a voz perigosamente calma.

Por um instante, foi como se eu pudesse absorver todos os detalhes que estavam a minha volta. Eu pude escutar os pingos de água gotejando na pia da cozinha e a caneta da garçonete deslizando por um bloquinho de anotação. Enxergava os risquinhos nos ladrilhos do chão e os mínimos detalhes das pupilas azuis de Maat. Senti as pessoas se virarem para gente, e algumas se levantando, talvez para interferir. Era como se eu estivesse vendo o mundo por um ângulo a parte. Foi quando avistei uma sombra negra atrás de Maat, dançando pelas paredes.

– O que foi que você disse? – Escutei Maat. Sua voz saia abafada e distante, como se estivéssemos em baixo da água.

A sombra prosseguiu rodando pela parede ate descer pelo pilar central que sustentava todo o local. Eu sentia algo forte emanar dali. Uma energia extremamente poderosa.

– Foi o que você ouviu – Nico disse, ainda mais longe. – Você não é o tipo de cara para Isabelle. Na verdade, você não é o tipo de cara para garota alguma!

A sombra desceu para a base da coluna e se espalhou por todo o chão. Eu senti Maat tenso do meu lado.

Em seguida, tudo aconteceu rápido de mais. No mesmo instante que Maat avançou para cima de Nico, eu soltei um grito esganiçado e sobrenatural. Era como se outra pessoa estivesse gritando por mim.

Um soco. E a sombra se esparramava por todo salão.

– Parem – pedi.

Outro soco. Senti todo o chão estremecer sobre meus pés e uma lágrima quente escorrer por minha bochecha.

– Por favor – disse mais uma vez, agora um pouco mais alto.

Nico revidou e chutou Maat. As colunas balançaram e o tremor se intensificou. Mais forte, bem mais forte, a ponto de separar os dois.

– Eu disse pra vocês pararem! – eu berrei.

À medida que minha voz ecoava por todo lugar, o piso começou a ceder, dando lugar a uma rachadura profunda. As pessoas procuravam desesperadamente pela saída, enquanto um circulo negro se abria em torno de nós três.

Maat e Nico me olharam preocupados e ambos deram um passo em minha direção.

– Não encostem em mim! – eu disse ainda mais alto. – Por que vocês tinham que fazer isso, hã? POR QUE?

Os tremores se intensificaram ainda mais. Eu senti o chão ceder. Um vento muito forte me rodeava. A essa altura, só havia nós três dentro do estabelecimento.

– Alguém tem que fazer ela parar – Escutei Nico.

– Agora você quer a minha ajuda ?

– CALEM A BOCA! – eu me ouvi gritando, enquanto as mesas se desprendiam do chão.

O chão cedeu e os meninos me empurraram, segundos antes dele me engolir. O buraco ia aumentando e sugando tudo que estava próximo para dentro.

– Isabelle – Maat chamou me sacudindo.

Eu o ouvia e sabia que deveria sair de perto daquilo, mas algo ali, uma força me atraia.

“ Olhem só, como são idiotas.

Eu tinha outros planos para essa viagem. Mas vocês realmente estão pedindo.

Obrigada garota, por me ajudar a canalizar meu poder. Você seria muito útil se soubesse escolher o lado certo.

Agora, façam um bom passeio no tártaro.’

– Gaia – ouço Nico murmurar.

Era mais forte que eu. Tudo aquilo clamava por mim, ia me consumindo.

– Isabelle- Maat chama mais uma vez.

Mas ele está longe, muito longe. Eu estou submersa nesse poder. Isso. É como nadar em um rio escuro e não conseguir voltar para superfície.

Senti cada vez o ar mais próximo de nós. Todas as paredes caíram ao nosso redor. Por instante, fechei os olhos, esperando o que quer que fosse. Mas quando os abri, fiquei extremamente surpresa. Uma espécie de parede de escudos estava formada em torno de nós três. Ela era negra assim como as sombras, mas parecia inofensiva. E havia algo a mais nela. Lampejos dourados de luz.

E foi quando eu entendi. Maat e Nico. Juntos, eles haviam formado uma campo de força ao nosso redor.

– Vamos Isabelle – Maat pediu mais uma vez. – Não iremos conseguir, se você não parar.

Foi quando eu entendi o que aconteceria. Iríamos para um lugar, de onde não poderíamos mais sair. Gaia queria nos jogar no tártaro.

Quando recobrei a consciência, prendi minha mão na mão de Maat.

Eu estava lutando com aquela força escura. Eu sentia minha energia ir de encontro com o abismo. Era uma batalha que certamente eu já havia perdido.

Me concentrei da melhor forma que eu pude, enquanto o ar desacelerava ao meu redor. Mas eu não conseguia parar aquilo. Não sozinha, certamente.

Eu segurei a mão de Nico também e juntei o resto da minha energia com o campo de força.

Estávamos nessa como um só. Juntos, nos levantamos, com nossa parede negra, cinza e dourada e andamos em direção ao abismo.

Lentamente, fomos quebrando barreira por barreira de ar. Até que por fim, todo vento foi sugado, e a cratera se fechou.

“ Haverá volta”

Foi tudo que eu pude escutar antes de cair exausta no chão ao lado dos meninos.

Ficamos um tempo assim, com a respiração descompassada, fitando o nada.

O que houve em seguida, me surpreendeu ainda mais.

– Desculpe – disseram Nico e Maat em uníssono.

Eles se atrapalharam com o pedido de desculpas, mas eu tive a certeza, de que agora estávamos bem.

Eu não pude evitar sorrir com aquilo.

– Seus idiotas – brinquei – Formamos um belo time.

Maat me envolveu protetoramente pela cintura, e eu fui mancando lentamente com Nico ao meu lado.

Juntos, caminhamos para a avenida com a doce ilusão, de que mais nada surpreenderia a gente nesse dia.

Eu revirei os olhos quando me deparei com aquilo, e vi que estava novamente errada.