Descendants - In Reverse

XX - Sentimentos Cruéis


Andrew se lembrava da última vez que tinha chorado. Ele tinha doze anos de idade, era meio metro mais baixo, e tinha uma pequena massa gordurosa se formando acima do quadril. Ele tinha sido desafiado por Cindy a pegar uma flor para ela.

Naquela época, Andrew faria tudo por Cindy, assim como qualquer outra pessoa em Auradon. Era impossível resistir aos encantadores olhos da princesa Charming. O problema é que Cindy não queria qualquer flor. Ela queria uma das rosas azuis premiadas da sua avó, a única alegria dela durante os anos que passou sem a filha, guardadas em uma estufa vigiada por cães ferozes.

Ele nem precisava comentar que aquilo não acabará nada bem. Ele acabou no quarto, com um braço todo mordido, e um espinho de rosa no polegar, com a proibição de sua avó de que qualquer um, incluindo seus pais, fosse ajuda-lo a se recuperar. Então ele aprendeu a fazer isso, a tirar um espinho do dedo, e a ler os rótulos dos frascos de remédios para descobrir o que poderia usar naquelas mordidas.

Naquele dia ele aprendeu que não valia a pena, em hipótese alguma, por motivo algum, nem por garota nenhuma, arriscaria desafiar ou desapontar sua avó novamente.

Então ele se tornou perfeito. O príncipe que todos esperavam, o cumpridor das normas e defensor dos fracos. O capitão do time, com o melhor abdômen, a melhor namorada e o cabelo mais lambido. Até que Jullie apareceu e acabou com tudo que ele construíra. Pela primeira vez em muito tempo ele tinha motivos para quebrar aquelas barreiras.

E mais uma vez, Cindy Charming conseguiu arruinar tudo que estava perfeito. Ele tinha a impressão que, como nunca esqueceu o que ouve aos doze anos, nunca esqueceria aquela tarde.

“Você não vai apenas dar um fora nela, Andrew” Cindy comandará “Você vai ser tão cruel quanto qualquer um deles poderia ser, tão cruel que fará ela se arrepender do dia que se apaixonou por esse seu rostinho bonito. Tão cruel que ela duvidará do príncipe em você, e então você vai firma-lo de volta. Escolhendo-me como sua princesa”

Ele nunca, em todos os anos de treino pesado, havia batido em uma garota. Mas ele queria muito que Cindy fosse um garoto naquela hora, para poder quebrar todos seus dentes com um soco.

“Ou então, sua avó vai ver o que você anda fazendo quando deveria estar estudando”.

O que ele podia fazer? Ele não podia simplesmente deixar que Cindy levasse aquelas fotos para sua avó, ela não acabaria apenas com ele. Ela acabaria com Jullie, a mandaria para algum lugar ainda mais intocável do que a Ilha dos Perdidos. Um lugar onde a pequena ladra de corações não teria nenhuma possibilidade.

Ele não deixaria que isso acontecesse. Mesmo que isso custasse seu coração.

Ás vezes era mesmo um saco ser tão nobre.

...

Boa sentou-se em frente à Dany na cantina vazia, poucos minutos antes da hora do jantar, sorrindo de orelha a orelha como uma psicopata.

—Tenho uma notícia para você – falou ela – Uma muito boa!

—Estou vendo – riu a menina, fechando o livro que lia e olhando para sua futura rainha – Me deixe adivinhar: Não vai ser preciso usar salto na coroação?

—Hmmm, não, não é isso. Mas é uma ótima ideia – riu Boa, nervosa – Lá vai. Eu falei com meu pai, que falou com Cinderella e o Príncipe Charming, e todos concordaram que esse é um momento histórico e todos os seres de Auradon deveriam poder comparecer na minha coroação... Incluindo seus pais!

—O que? – Dany perguntou, arregalando os olhos – Meus pais? Meus pais vão... Vir para a sua coroação?

—Sim – Boa assentiu – Bem, vai ser apenas algumas horas, mas... É um começo, não é? Meu ai disse e vai tentar discutir para que eles pelo menos se mudem para minas mais perto da cidade.

—Você... Minha Fada Madrinha, Boa... Você não sabe o quanto isso é importante para mim – Falou Dany, guardando seu livro na bolsa e fazendo a volta para abraçar a menina – Eu tenho que contar isso para o Ethan, eu... Você é incrível!

Boa sorriu, enquanto via a menina se afastar. Pelo menos tinha conseguido fazer uma coisa boa.

—Rindo sozinha, majestade? – perguntou Laurent, que enchia algumas travessas de comida no centro da cantina.

—É, é, as coisas estão indo bem – ela falou, sorrindo – Você ouviu?

—Ouvi sim – ele assentiu, dando um sorriso de lado – Isso deve ou não chegar aos ouvidos de Cindy?

—Com certeza – Boa falou, sorrindo.

—O que infernos está acontecendo nessa escola? – grunhiu Cindy, marchando naquele mesmo minuto para dentro do refeitório com meia dúzia de outras meninas loiras atrás dela – Eu estava caminhando para cá, quando Danielle passou correndo e quase me derrubou no chão!

—É isso que dá ficar tanto tempo longe dos pais – falou uma das meninas – Ela não tem nenhuma educação.

—Nisso eu sou obrigada a concordar – Falou Cindy, sentando ao lado de Boa enquanto as meninas se espalhavam no outro lado da mesa – Você não fala nada? Não vai dizer que ainda está brava por sábado?

—Não estou brava com você Cindy. Eu sei como isso pode ser difícil para alguém coo você – falou Boa, calmamente, juntando suas coisas – E sobre Dany, se quiser, pode falar com os pais dela sexta!

—Falar com os pais dela... – Cindy falou calmamente, tentando processar a informação – O que?

Boa deu os ombros, se levantando, enquanto a cantina se enchia de alunos famintos demais para Cindy poder contornar com seus “sapatinhos quase de cristal”

....

—Dany – cumprimentou Maison, abrindo a porta do quarto – Ethan está ai dentro!

—Obrigada – ela falou, passando por ele e encontrando Ethan sentado no chão com centenas de desenhos em volta dele – Uau... O que é isso?

—Tenho vinte e um vestidos para fazer. Vinte e dois, se contarmos o da irmãzinha do Andrew – ele falou, pegando um dois papeis e anotando alguma coisa – Maison me ajudou com os desenhos, mas ainda tenho que decidir o que fazer.

—Então, não dá mais tempo de encomendar o meu? – perguntou ela, brincalhona. Ele se levantou do chão com um grunhido, sorrindo para ela.

—O seu vestido, minha cara, está dentro desse armário – ele falou, batucando os dedos na porta de madeira – Mas você não vai vê-lo antes de sexta feira.

—Isso é injusto – ela grunhiu.

—Injusto, é depois de todo o trabalho que eu tive para te ensinar a passar delineador, você seguir usando esses óculos – ele falou, tirando os óculos dela e sorrindo, deixando a mão livre repousar na bochecha da menina – Bem melhor...

—Você é impossível – ela riu, revirando os olhos – Tenho uma coisa pra te contar!

—Tem? – ele perguntou, enquanto ela se afastava e sentava na cama de Maison – Bem, então fale. Vamos ver se consegue me impressionar.

—Boa conseguiu que meus pais viessem para a coroação dela – ela falou, se sentindo maravilhada por poder repetir aquilo para alguém – São apenas algumas horas, mas ainda sim... Ah, Ethan, faz tanto tempo que não os vejo!

—Isso sim é uma grande notícia – ele falou, sorrindo junto com ela. Era impossível não sorrir, ele nunca a tinha visto tão espontaneamente feliz antes. – Lúcifer! Isso é maravilhoso Dany!

—É, é sim... Nem acredito nisso – ela respirou fundo. Ele se levantou, e pegou dois pedaços de tecido em cima de uma cadeira.

– Então, que gravata eu deveria usar para conhecer seus pais?

Ela perdeu aquele humor etéreo, se virando para ele – Você quer... Conhecer os meus pais? – ela perguntou temerosa – Ethan, eu...

—Não quer? – ele perguntou, desfiado, enquanto ela desviava os olhos – Por quê?

—Ethan, meus pais foram embora há muito tempo. A vinda de vocês para cá é uma das dezenas, centenas de coisas que eles terão para se acostumar em um dia – ela falou, calmamente – Quando eles foram embora, eu era uma menininha... Não quero que se assustem!

Ele riu debochado – Então, está dizendo que eu vou assustar os seus pais?

—Você é filho da Rainha Má! – falou ela, quase suplicante – Eles podem... Não aceitar isso de início, podem... Eu não sei... Querer me levar embora com eles, ou algo do tipo!

—Eu assusto você? – perguntou ele, ignorando tudo que ela falará antes – Responde, Danielle, eu assusto você?

—Eu nunca, em nenhum momento, senti medo de você Ethan – ela falou, claramente – Acha que estou com medo que você os assuste? Estou com medo de eu assusta-los! De acharem que eu... Mudei...

—Mas você mudou!

—Mas eles não precisam saber disso! – ela exclamou, arregalando os olhos.

—Então, você não vê seus pais há quase quatro anos e na primeira oportunidade vai mentir para eles? – perguntou Ethan, cético. – É esse o dia maravilhoso que você sonha?

—EU SÓ QUERO PASSAR UM DIA COM A MINHA FAMÍLIA, ANTES QUE ELES SEJAM MANDADOS EMBORA POR SEI LÁ MAIS QUANTOS ANOS! É PEDIR DEMAIS? – ela gritou com toda a fora de seus pulmões, e depois deu um passo para trás, assustada – Um dia que eu possa apenas abraçar minha mãe, e a deixar saber que eu estou bem e feliz, para poder guardar isso quando for embora. Para que meu pai saiba que estou em segurança.

Ele ficou calado, vendo enquanto ela soltava tudo aquilo.

—Não um dia que, quando acabar e eles forem embora, chorem por terem falhado comigo, por eu não ter tido tempo de explicar as coisas do jeito que elas são – ela afirmou – Eu só quero protege-los!

—Eles são seus pais, você não deveria protege-los – ele falou, dando um passo em direção a ela – Tinha que ser ao contrário.

—Mas ele não podem me proteger. Não podem, por que eu errei em desafiar as leis da princesinha Charming, e ela os mandou para longe daqui – ela deu um passo em direção a ele, parecia prestes a desabar, com os olhos cheios de lágrimas. Dois passos e poderia beija-la, ele pensou, , quando Maison abriu a porta, entrando com Jullie e Carly.

—Ethan, precisamos conversar sobre... – Maison começou a falar, mas se calou assim que viu a cena em sua frente.

—Desculpe, nós voltamos depois – falou Jullie, mas Dany se pronunciou antes que pudessem se mover.

—Não precisam, eu tenho muito que fazer, já estou indo – ela falou, erguendo os olhos e encarando Ethan, desesperada por um sinal. Qualquer coisa que mostrasse que estava tudo bem. Não havia nada. – Desculpe.

Ele fechou os punhos, enquanto ela dava as costas e saia apressadamente do quarto. Ele queria ir atrás dela, e a beijar, mas ele já tinha perdido três oportunidades apenas naquela noite.

—O que você fez dessa vez? – perguntou Jullie, sentando no chão com as pernas cruzadas e pegando um dos desenhos – Por que eu nunca vi aquela menina tão abalada!

—Obrigada por jogar isso na minha cara, Jullie – ele grunhiu, sentando-se na própria cama – Os pais dela vão vir para a coroação, eu queria conhecer eles, mas ela não quer... Acha que podem ficar decepcionados.

—Sua mãe ficaria – Carly anunciou, sentando-se na cadeira da mesa de costura – Ou vai negar.

—Eu não tinha visto as coisas por esse lado – ele confessou, e depois de um minuto de silêncio chutou o baú em frente à cama com tanta força que ele bateu na outra parede. – Sabe o que é pior? Tudo isso é culpa daquela princesinha idiota!

—Você bem que queria ficar com a princesinha idiota – murmurou Jullie, recebendo um olhar reprovador – Tudo bem, se quer mesmo saber ela pode ser a primeira a morrer!

—Concordo – falou Carly, deixando de lado as amostras de tecido de Ethan – O que nos leva ao plano.

—Temos que esperar até o auge da decoração pra pegar a varinha – falou Jullie, e estendeu um mapa no chão – Vai ser quando a Fada Madrinha vai tirar ela da redoma e abençoar Boa. Então vamos ter que sair.

—Isso inclui passar pelos guardas – falou Carly, se aproximando e sentando na cama de Maison, olhando para o mapa – Pelo jardim, e chegar até o estacionamento.

—Onde pegamos um carro, e vamos para a Ilha – concluiu Maison – Alguma pergunta.

—Como vamos atravessar sem a ponte? – perguntou Ethan.

—O plano é que a varinha consiga erguer a ponte – falou Jullie – Mas por via das dúvidas, é melhor roubar um dos carros oficiais!

—Mas a questão é, como nós vamos sair da cerimônia com a varinha? Os guardas vão estar armados até os dentes – Carly falou, pisando em cima do desenho da Ilha no mapa.

—É Auradon – Jullie desfez.

—Mesmo assim... É o evento mais importante desde o casamento da Bela e a Fera – Carly afirmou – Maison, não tem nenhum feitiço de tele transporte no seu livro?

—Maison? – perguntou Jullie, se levantando e parando atrás dele, tocando o ombro do amigo – O que é isso?

—É só, uma coisa para depois da coroação – falou ele, dando os ombros – Quando os vilões dominarem, e acabarem com tudo que é bom e belo... Bem, Boa não vai mais precisar ser a rainha. Ela poderia ter a chance de fugir e levar outro tipo de vida. Mas se ela seguir apaixonada por mim, ela vai querer ficar... E isso parece cruel demais!

Todos ficaram em silêncio, olhando-se um pouco confusos.

Maison queria não ter dito nada. Ele sabia, sentia nas suas veias que seus amigos nunca tinham desejado tanto aquele momento quanto antes, eles nunca desejaram tanto a ruina de Auradon. Por que tinham se machucado e visto as pessoas que amavam se machucarem.

E nada podia tornar uma pessoa mais cruel.