Dentro do Violino

Capítulo 1 - Pelo lado de Vanya


Eu estava confusa. Sentia como se tivessem trocado meu cérebro por um labirinto sem saída... como se estivesse dentro da matemática... como se tivesse acabado de cair do 5º andar de um prédio e estivesse inconsciente... sentia como se de repente eu tivesse que me vingar de todos os meus infelizes seis irmãos. Se eu tivesse controle sobre as pessoas e o tempo, voltaria lá trás e faria que meu pai adotivo, Sir Reginald Hargreeves, não fosse louco da cabeça de querer salvar o mundo e criar sete de 43 crianças abandonadas por mulheres -- na maioria solteiras, que não exibiam sinais de gravidez.

E sabe porque? Sir Reginald Hargreeves, aquele filho de uma p*ta, não amava nenhum de nós. Fomos usados como puros ratinhos de laboratório. O que eu sempre me questionei: Por que meu pai adotou sete crianças, para botar poder em só seis delas? POR QUE EU TINHA QUE SER A QUE NÃO TEVE PODER? Oh céus. Como essas perguntas me enchiam de raiva, stress e ansiedade. Me obrigava a tomar calmantes todos os dias. É um trauma de infância absurdo, que não deveria ter se intensificado de tal maneira que fez com que eu não passasse um dia sequer sem pensar nisso. Quando tinha 10 anos, eu tocava violino nos momentos que meus irmãos precisavam "salvar o mundo". Era o que me mandavam fazer. Isso não foi justo. Não por enquanto.

O Umbrella Academy, nosso grupo no qual eu praticamente não fazia parte, havia se separado desde a morte de Sir Reginald Hargreeves. Não vi diferença. Quando eu era pequena, um dos únicos momentos que eu não gostaria de apagar, é quando Pogo me disse que eu era única, exclusiva, era diferente dos outros. Aquilo me fazia pensar horas e horas. Mas eu ainda não estava satisfeita.

Anos depois, em meu apartamento, recebi uma ligação do Teatro Icarus, de um homem de voz aclamante, alta, maliciosa e que me provocava um certo temor, me chamando para fazer uns testes com instrumentos. Contudo, eu decidi que era hora de fazer alguma coisa e eu fui até o teatro, onde acontecia importantes recitais, peças e concertos.

—Olá, Vanya.

—Quem está aí? O que é isso? Você é algum tipo de pervertido?

—Toque alguma coisa. Qualquer coisa.

—Eu não toco, tipo, há uns doze anos...

—Mas é o que você tem de extraordinário.

Respirei fundo, abri a mala do meu violino, e com uma certa segurança, fiz minha primeira corda. Fui fazendo mais e mais notas, era incrível, pela primeira vez me senti bem dentre tantos anos desperdiçados. Para minha surpresa, uma grande plateia começou a abrir uma salva de palmas. Me questionei de onde todo aquele povo apareceu. Todos eles eram esquisitos, usavam máscaras e roupas de gala pretas, e dentre eles, um homem, aparentava ser o mesmo que havia me ligado para fazer os testes. Ele tinha listras na boca como um piano, usava um terno e uma capa...

—Humpf. Carece de sutileza, mas... é adequado. Posso convencê-la a destruir o mundo?

Na mesma hora eu estava perdida, gelada, suava frio, não sabia o que dizer, se fugia ou se ficava pra ver mais detalhes da proposta... Mas fiquei. Aquela visão de uma plateia intrigante e peculiar me deixava curiosa para ver aonde aquilo tudo iria dar.

—Somos a Orquestra dos Malditos!—disse em um tom aclamante._ Estou escrevendo uma nova canção chamada A Suíte Do Apocalipse. E para ficar em um tom perfeito, resta você. Você é perfeita. Você nos completa!!!

Achei insignificante. De repente eu já não estava tão interessada. Sempre soube da minha inconstância.

—Encontre outro violino para você, e não me siga. _disse eu procurando logo a saída do Teatro Icarus.

Inesperadamente tomei a decisão de que iria ver como estavam meus irmãos. Afinal eu não tinha raiva dos meus irmãos, e sim do meu pai. Peguei um táxi e quando estávamos passando pelo Parque de Diversão do Dr. Terminal, tomei meus remédios de sempre. Foi aí que percebi a luz avermelha que se refletia na janela do táxi.

—P*ta que pariu! O parque está em chamas! Só pode ser minha família.

Eu me arrependi muito de ter parado o táxi ali mesmo numa hora tão inconveniente para visitar meus irmãos. Quem é que faz a estupidez de encontrar os irmãos novamente depois de anos, em um parque de diversão no meio de uma batalha?!

—SPACE! _disse eu, chamando meu irmão mais velho.

—Vanya?! _disse Spaceboy com um olhar incrédulo.

Na mesma hora Kraken me jogou com toda a força no chão para evitar que eu me ferisse (irônico), me encarando com um olhar de fúria e raiva, jogando na minha cara o que eu "não deveria ter feito", segundo ele, ter ido embora.

—Eu pensei que tinha uma irmã. _disse Kraken melodramaticamente.

—Aquela era Vanya? _Allyson disse surpresa, enquanto segurava a mão das crianças que estavam sem proteção no parque.

—Não, era só uma cidadã comum._Kraken deu de ombros.

Decidi fugir novamente. Não sabia onde ia parar com essa história de vai e vem. Entretanto, desconsolada após o confronto e a rejeição do Kraken, que na minha cabeça, as palavras dele diziam por todos, fui parar novamente no Teatro Icarus. Decidi de vez, que ia ser violinista. Aquela decisão, transformou minha vida. Eu estava preparada para fazer algo grandioso.

Chegando no Teatro Icarus, já fui falando de prontidão:

—Eu pensei que tinha família... Mas não tenho ninguém. Vamos-lhes fazer uma performance como nunca viram.

—HAHAHAHAHAHAHA!!!!!!_riu maquiavelicamente o condutor da Orquestra dos Malditos._ Seja muitíssimo bem-vinda!

Fui dirigida a um laboratório escuro e sombrio, onde havia uma máquina cheia de bugigangas estranhas e velhas, me deitaram na maca, que mais parecia uma maluquice sexual masoquista. Nessa hora eu estava estrando em pânico. Me arrependi por um instante de ter voltado atrás e aceitar ser violinista, mas não tinha volta. Começaram a tirar minhas roupas, a me amarrar nos cintos de couro da maca. Felizmente (e infelizmente) começaram a colocar uns 50 tubos ligados no meu corpo inteiro. Comecei a sentir muito frio.

—Sabe, a Orquestra estava destinada a falência desde o seu começo. Nossas almas são impuras, medíocres e todos nós somos de uma singularidade tediosa. Se vamos destruir o mundo, precisamos de algo como você. Algo cândido, genuíno. SORRIA!

Depressa, só conseguia enxergar uma luz branca, como se fosse uma explosão, como uma faísca meio um céu escuro, como algo grande. Ouvia um som profundo, intenso e alto de um violino. Me senti como se tivesse controle sobre TUDO.

—SENHORAS E SENHORES! LHES APRESENTO O MAIOR INSTRUMENTO MORTAL DO MUNDO! A MAIOR E MELHOR MARAVILHA CIENTÍFICA QUE VOCÊS JÁ VIRAM! ORQUESTRA DOS MALDITOS, conheçam La Viole Blanche, ou se preferirem... A VIOLINO BRANCO!

Sentia como se todos tivessem parado e depois de uma eternidade, assumissem meu valor em mim. Eu poderia ser chamada de a mais poderosa do mundo. Em outras palavras, a mais perigosa do mundo. O melhor sentimento. Apresentei meu número. Com uma simples nota no violino, eu destruía o que havia na minha frente. Parti o condutor da orquestra ao meio. Era incrível. Todos aplaudiram, encantados.

—Irmãos e irmãs! Ouçam-me! Reúnam seus trompetes, seus violoncelos, suas harpas! Emprestem-me suas vidas e preparem-se para a morte... Pois nós vamos destruir a Umbrella Academy... e amanhã... o MUNDO!!

Ninguém nunca tinha sentido esse gosto, esse prazer... ninguém jamais sentiu como é o êxito de provar a todos que estavam errados de uma maneira tão revolucionária. Agora eu usufruo de como é ter um poder, uma importância. Eu superei o Umbrella Academy. Eu era suprema. Eu poderia dizer com toda a confiança: EU SOU MUITO MELHOR QUE O UMBRELLA ACADEMY.

Levei a Orquestra dos Malditos ao escritório da Umbrella Academy.

—Devemos bater antes de entrar. _disse eu, colocando o arco do violino para tocar, causando uma grande destruição na parte superior do escritório. Pogo apareceu na janela.

—Você estava certo Pogo... Eu sou especial.

Fiz outra nota com o violino. Espalhei os miolos do Pogo por todos os lugares, fazendo uma grande mancha de sangue pelas paredes. Pogo estava morto. Não me arrependo de minhas maldades. Não me arrependo de nada.

—Que imundície. Vamos embora. Isso foi um aquecimento.

O Umbrella Academy tentando fazer seu papel de bombeiro resgatando o gatinho do galho da árvore, decidiram que deviam fazer alguma coisa, afinal eu era o fim do mundo. No meio de um dos meus recitais, uma flautista anúnciou que Kraken estava atrás de mim. Ele apontou uma faca em meu pescoço, falando que eu tinha que parar. HAHAHAHA! ELE ACHAVA QUE COM UMA FACA IRIA ME FAZER MUDAR DE IDEIA... Que piada.

—Estou te impedindo de cometer uma estupidez. Diga-me um motivo para não cortar sua garganta, v*dia.

—Porque eu te amo... _falei com um sorriso ardiloso._ Porque eu sei que é um blefe.

Kraken estava prestes a cortar minha garganta, mas ingênuo e ignorante como ele, sua faca passou por um dos cordões do violino de meu corpo, e fez uma nota. Rapidamente peguei o arco e meu violino, e joguei ele contra a parede, destruíndo o muro. De repente os meus irmãos apareceram. Spaceboy, Seánce, Allyson e Número Cinco.

—Você parece um cachorrinho abandonado..._disse Spaceboy ao Kraken.

—O meu irmão mais velho finalmente veio a um dos meus recitais! Que emocionante... Só espero isso a 19 anos.

—Vanya, por que você não larga esse violino para conversarmos melhor?

—Você devia ter me dito isso na primeira vez... Eu estava tão nervosa... Dei a primeira nota e ninguém se importou... Pogo estava lá... Vocês eram bem íntimos, não é Space?

—Eu ouvi um boato que... _Allyson, numa tentativa falhada de argumentar.

—E VOCÊ CALA BOCA!

Joguei Allyson longe com o violino. Sangue se espalhava por todos os lados e eu estava nem aí. Quem são eles pra acharem que vir me "visitar" era uma boa ideia!? Será que já não deixei claro o suficiente que não é bom aparecer em situações inconvenientes quando apareci no meio de uma batalha no parque de diversões depois de tantos anos?! Eles só se importaram comigo quando me perderam de vez. E agora tinham perdido de verdade. Nunca mais eu iria amar aqueles ingratos do cac*te.

—Vamos dar uma pausa, Malditos! Podem esticar suas pernas, alongar os braços, estralar seus dedos, está na hora de ver sangue.

Quando vi, Kraken e o Número Cinco estavam matando vários dos meus músicos. Aquilo não poderia estar acontecendo. Mas, eu continuava confiante. Eu continuava sendo o instrumento humano mais perigoso do mundo. Do que adiantava lutar se todos nós iríamos morrer...

—Dessa vez você passou dos limites, mocinha... _disse alguma voz enigmática...

—Seánce?

—Não. É o papai. Preciso levar essas crianças da Orquestra Infantil de Manchester de volta para jantar. Estamos aqui para impedir que você toque A Sagração da Primavera, em um ritmo muito específico.

—NÃO. VOCÊ VAI FICAR! NÃO VIRE AS COSTAS PARA MIM HARGREEVES.

—Ah era comigo? Sinto muito, mas eu só estava aqui para acabar com o seu faniquito.

—FANIQUITO?? VOCÊ CHAMA ISSO DE FANIQUITO? EU ESTOU PRESTES A DESTRUIR O MUNDO!

—Não, você não está. Você está enlouquecendo. Você foi uma decepção como criança, um estorvo como adulta... Então, você está tocando violino. Tsc. Bela droga. Você sabe nem destruir o mundo adequadamente, admita, Vanya. Você é um fracasso.

—Vanya, não dê ouvidos a esse canalha, ele nunca nos amou. Nunca se preocupou com nós, só se estivesse nos planos dele. Isso não importa, enquanto alguém te amar.

—Esta é a parte onde todos nós vamos pra casa e fingimos ser uma família feliz?

De repente urge um som muito alto. Algo parecido com um tiro. Uma dor inexplicável... Alguém havia atirado na minha cabeça. Alguém fez isso... Sério? Por que? Será mesmo que eu era um fracasso? Eu não era tudo aquilo que achava que era? Eu era destrutível? Muitas perguntas sem resposta. Não admito que eu era um fracasso novamente. Meu ego me deixa em dúvida. Meu ego f*de minha cabeça. Estava tudo perdido. Voltei a ser quem eu era. Voltei a ser a confusa de sempre. Que merda. Mas não acabou ainda.

—É tarde demais... Eu poderia impedir isso, mas não sinto meus dedos... Mas até uma apresentação mal-sucedida tem seu... finale. _falei com dificuldade, pois a dor já tinha tomado meu corpo.

Depois de um tempo descobri que aquele "papai" que havia acabado com a minha auto-estima, era na verdade Seánce. Ele havia se fantasiado de Reginald Hargreeves e feito todo um teatro para fazer com que eu desistisse logo de uma vez com todo o meu plano de destruir o mundo. Esperto ele. Não perdoei. Mas reconheço sua esperteza.

Agora sim, parecia que eu havia caído do 5º andar de um prédio e ficasse inconsciente. Eu não sabia o que fazer, como reagir... Se eu desistia e me entregava ao Umbrella Academy, como as coisas ficariam no final de tudo... E esse foi, o meu maior arrependimento. Não foi desistir. E sim ter começado com essa parada toda de violino.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.