Eu não notei Diego até ele já estar na minha frente. Espiei por cima do livro, vendo-o sentado na poltrona perto da janela, os cotovelos apoiados nos joelhos.

O esconderijo secreto de Klaus não era mais tão secreto.

—Olá. -Saudei lentamente, deixando o livro fechado no colo. -Precisa de alguma coisa?

—Você é psicóloga, né?-Aonde ele tinha ouvido isso?

—Não me formei, mas...

—Mas estudou psicologia.

—Sim. Por quê?-Deu de ombros.

—Eu só tava pensando em... -Parou.

—Bom, eu posso te ajudar a escolher um profissional que...

—Não, sem essa. Não confio em gente que não conheço, mas confio em você. -Apontou pra mim. Ser digna de confiança era ótimo. Ser digna de confiança de Diego Hargreeves, que tinha um lado muito desconfiado, era incrível.

—Obrigada. Mas não acho que possa ajudá-lo de maneira profissional.

—Como amiga pode?-Assenti lentamente, tentando não parecer surpresa. -Legal.

—Sobre o que quer falar?-Se ajeitou na poltrona.

—Você acha que eu tenho mesmo complexo de herói?

—Bom... Acho que você sempre quer fazer seu melhor. Cresceu sendo educado para ser um herói. Mas não faria mal ouvir o que as outras pessoas tem a dizer. Às vezes o que você acha certo não é, e precisa de pessoas de confiança para te ajudar a entender isso.

—Então eu não devia ter tentado salvar o Kennedy?

—Espera, o que?

—Deixa pra lá. -Fez uma pausa. -Acho que não tem nada de errado em heróis... Quer dizer, o mundo precisa da gente. É pra isso que eu passei essa infância de merda: pra fazer a diferença.

—E isso é admirável, quando é necessário. Às vezes há certas situações em que... Olha, eu passei dois meses ao lado de um herói. O Doutor não salvou apenas a minha vida. Aprendi muito com ele. Inclusive que não se pode forçar uma salvação.

—E o que eu faço? Paro de ser um herói?

—Uma vez você disse que instinto é o meu negócio. Talvez devesse ouvir melhor o seu. -Assentiu. -Confie mais em si mesmo. -Coçou a barba.

—Isso é algo que a Grace diria. Ela tinha ótimos conselhos... Sabe, uma mãe mesmo. -Olhou pra longe. -Ela... Ela faz falta.

—O que aconteceu com a Grace?

—Se foi. Ela era um robô, sabe. -Olhou pra mim. -Mas tão, tão humana. Passei 13 anos longe de casa e quando voltei... Acho que ela pirou, do jeito que os robôs piram. Não lembrava de umas coisas, não percebia outras... Eu a desliguei. -Fechou as mãos em punhos. -Achei que seria melhor. Então Pogo a religou e... Quando a Vanya... -Fez uma pausa. -Enfim, Grace está morta.

—Sinto muito.

—Ela nem era de carne e osso...

—Mas foi sua mãe. Você aprendeu a amá-la por que se sentiu amado por ela, tinha uma conexão com Grace e isso foi seu bote salva vidas, não foi?-Assentiu. -Algumas crianças tem amigos imaginários que as ajudam a passar pela infância. Você tinha uma mãe robô.

Não sei quanto tempo conversei com Diego. Ele tinha muita coisa para dizer e eu me esforcei para ser a melhor ouvinte do mundo. O número 2 da família Hargreeves contou sobre a ex namorada, falecida, detetive Patch; sobre ter passado um tempo no hospício nos 60; a relação com Lila que começou com uma mentira ou outra; sobre o pai...

Foi uma tarde longa, mas ver alguém como Diego se abrindo era bom. Ele finalmente conseguia falar sobre si mesmo. Isso salvava vidas. Ninguém precisa se trancar dentro de si. Compartilhar ajuda, ser ouvido ajuda.

Ele deve ter comentado com os irmãos sobre, por que Vanya, Luther, Cinco e Allison vieram me procurar nos dias seguintes. Foi uma semana terapêutica para os Hargreeves, e eu fiz meu melhor, distribuindo conselhos e dando toques curativos pra todo mundo.

Se havia jeito melhor de eu aceitar meus poderes, não saberia dizer.

Naquela tarde os Hargreeves começaram a se juntar na sala de estar. Tentei não olhar para o lugar em que eu quase sangrei até a morte uns dias atrás.

—Todo mundo reunido assim me faz lembrar do funeral do papai. -Klaus comentou. Ele não parecia nem um pouco triste.

—Você é estranho pra caralho. -Diego avisou, sentando no sofá.

—Obrigado. Por que a reunião? O mundo não tá acabando de novo não, né? Vanya, você tá com vontade de explodir alguma coisa?

—Não. -Ela respondeu.

—Tem certeza? A gente te paga uma terapia, sei lá.

—Eu estou bem.

—Só checando.

—Tenho novidades. -Allison avisou, animada.

—Você e o Luther finalmente se pegaram?

—O que? Klaus!-Ele deu de ombros. -Estou tentando um papel para um filme novo e acho que vou conseguir.

—Tentou usar o rumor?

—Você nunca cala a boca?-Cinco perguntou.

—Não vou usar meu rumor. -Allison afirmou. -Vou conseguir o papel com meu talento. Se eu conseguir, talvez fique fora uns meses, até o fim das gravações, viagens de divulgação...

—Isso pode levar um bom tempo. -Luther disse. A animação de Allison deu uma balançada.

—Bom, nós temos que voltar ao normal, não é? Não pode ser tudo sobre o fim do mundo ou vilões... Precisamos retomar nossas vidas. -Um celular começou a tocar. -Deve ser meu agente. -Saiu da sala rapidamente.

—Ela tá certa. -Vanya disse, ficando de pé. -Vamos voltar para nossa vida normal.

—Qual é o seu normal?-Klaus perguntou. -Causar apocalipses?-A número 7 suspirou.

—Espero que não. Tenho aulas de violino para dar e talvez consiga voltar para a orquestra da cidade.

—Você pode voltar para a primeira cadeira já que o seu ex namorado psicopata matou aquela metidinha. -Diego sugeriu.

—Não é engraçado. Vejo vocês mais tarde. -E saiu também. Klaus se espreguiçou ao meu lado.

—Não precisamos delas. -Afirmou. -Irmãos Hargreeves unidos... Mally, você é uma garota de sorte.

—Na verdade, eu tô fora. -Cinco avisou, levantando e usando seu poder para sumir.

—Que? E qual é o normal dele? Assassinato? Bem, parece que fomos reduzidos...

—Foi mal, tô fora também. -Diego interrompeu.

—E o que é que você pode ter pra fazer?

—A cidade precisa de mim. -Ficou de pé.

—Ah, ótimo. O Batman voltou. -Se jogou para trás no sofá.

—Você é um idiota. -E saiu.

—Você vai nos abandonar também, grandão?

—Vou. -Luther respondeu, levantando.

—Mas... Não. Você nem pode voltar pra lua!

—Posso encontrar um novo “normal”.

—Luther, você não tem um normal! Quando tentou achar um, acabou doidão numa festa e transou com uma desconhecida. -Ergui uma sobrancelha.

—Nós não vamos falar disso. -Saiu da sala.

—E ficamos só nós... -Ouvi o som da TARDIS se materializado.

—Bem... -Comecei.

—Ah, qual é? Você também não.

—Eu volto logo. -Fiquei de pé. -Só preciso conversar com o Doutor. Consegue ficar alguns minutinhos sem fazer bobagem?

—Vou tentar.

—Ótimo. Eu já volto.

Encontrei o Doutor no jardim. Ele estava sentado num banco e guardou a chave de fenda sônica quando me viu.

—Tudo calmo?-Perguntou.

—Com os Hargreeves? Nunca. -Parei na frente dele. -Precisamos conversar.

—Vá em frente.

—É sobre a Babá.

—Missy. O nome dela é Missy.

—Não importa o nome. Quem é ela? Como você a conhece?-Desviou o olhar. Evasivo de novo. -Ela tentou matar todos nós. Eu quase morri há alguns dias, bem ali. -Apontei para a mansão. -E o que? Não posso ter respostas? Você ficou irritado quando Diego a esfaqueou, mas não te vi fazer nada quando me viu sangrar aos pés dela.

—Missy era minha amiga.

—O que?

—Há muitos anos, em Gallifrey. Era minha melhor amiga. Mas nós escolhemos caminhos diferentes. Escolhi ser bom. Ela escolheu ser má. Desde então nos encontramos por aí, ela tenta me matar, eu tento impedir seus planos malignos... Esse é nosso relacionamento agora.

—E você a escolheu.

—Não. -Me encarou. -Mas não vou matar a Missy, se é o que acha certo. O que eu disse é verdade, ela vai voltar. Com outro corpo, outro rosto, e mais furiosa. Mas não vou matá-la. Também não vou deixá-la machucar vocês. -Cruzei os braços.

—Ela podia ter nos matado...

—Não vou retribuir o favor. -Ficou de pé. -Você confiou em mim muitas vezes... Pode confiar só mais uma?-Assenti lentamente. -Ótimo. -Começou a se afastar em direção à TARDIS.

—Ela vai mesmo voltar?-Virei para encará-lo.

—Vai. E se eu fosse vocês, ficava atento. Missy nunca deixa pontas soltas, não sem querer.

***

—Nós vamos numa festa. -Klaus contou, aparecendo na minha frente.

—O que?

—Todos estão voltando para os seus “normais"... Esse é o meu!-Abriu os braços, sorrindo.

—Eu nunca fui numa festa.

—Bom, está na hora de ir. Quer dizer, você já passou dos 30. Onde fica a diversão?

—Existem outros tipo de diversão...

—E eu vou te apresentar um hoje. A primeira coisa é te arrumar algo que não seja um suéter de vovó.

—Você não vai desistir, não é?

—Não. -Pegou minha mão, me puxando com ele. -Vamos lá...

Fomos até o quarto de Allison. Ela não estava lá, mas ainda não tinha viajado para fazer o filme. Havia uma mala aberta no meio da cama com algumas roupas.

—Por que estamos aqui?-Perguntei. Klaus começou a revirar o armário.

—Allison tem as melhores roupas, depois de mim. Adoro pegar emprestado...

—Emprestado?-Deu de ombros.

—Ela é minha irmã, eu não preciso pedir.

—Você está roubando minhas roupas de novo?-Allison perguntou, parada na porta.

—É pra Mallory. -Apontou pra mim. -Vamos numa festa e ela precisa ficar mais gata ainda.

—Tudo bem, mas só por que é pra ela. Você nunca devolveu minha saia.

—Tem certeza que quer de volta? Eu não estava usando nada por baixo. -Allison fez uma careta engraçada de nojo.

—Quer saber? Fica pra você. Agora, você, -Apontou pra mim. -vamos te produzir...

Allison era realmente boa nisso. Depois de colocar Klaus para fora do quarto, procurou em seu guarda roupa e prometeu uma transformação completa.

Pouco depois eu estava com uma saia preta, uma blusa azul escura toda brilhante, e, felizmente, de manga longa. Avisei que era um desastre total com salto alto (juro, eu caí feio uma vez numa festa de natal e passei a ceia no pronto socorro com o tornozelo ferrado), então Allison disse que eu podia usar um dos meus sapatos que fosse confortável, e a escolha foi um tênis todo preto e baixo, e fazia parte das minhas “roupas de sair”.

—Obrigada. -Agradeci, me olhando no espelho, um pouco admirada por usar maquiagem pela primeira vez em anos. -Você teve um trabalhão, quando devia estar arrumando as malas.

—Imagina, eu gosto disso. Vanya não é o tipo de garota que aceita uma pequena intervenção de moda e Claire é muito pequena, tento evitar que ela pule essa fase da infância de qualquer jeito.

—Bom, um dia ela vai ser uma adolescente que tem uma mãe com bom gosto. -Sorriu.

—Obrigada.

—A reunião feminina não acabou?-Klaus perguntou, batendo na porta. -Eu queria ir na festa antes do próximo apocalipse.

—E esse é o mais dramático da família. -Abriu a porta. -Pronto, não precisa surtar.

—Ah, Ally, você ainda não me viu sur... -Olhou pra mim. -Minha amada Gloria Gaynor, Mallory, você tá muito gata!-Ri.

—Obrigada. -Murmurei.

—Vai ser a mais gata da festa, eu não terei a menor chance.

—Agora você tá exagerando.

—Não, eu não tô. Você já se viu no espelho? É melhor a gente ir antes de... Certas distrações. -Franzi a testa.

—Essa eu entendi. -Allison avisou. -Você é um idiota.

—Obrigado. -Klaus agradeceu. -Vamos?

***

—Você acha mesmo que é uma boa ideia?-Perguntei, enquanto Klaus me puxava pela mão, empurrando algumas pessoas enquanto passava. -A cidade não tá mais em quarentena, mas ainda assim...

—O número de casos na cidade é zero. E nós estamos usando medidas de segurança: nossa temperatura foi medida, passamos álcool em gel... E hoje nem tá tão cheio, normalmente tem o dobro de pessoas aqui dentro. -Me soltou, parando de andar. -Bem vinda à sua primeira festa!

Sweater Weather começou a tocar em volume alto, uma coisa meio ensurdecedora e imersiva, como se houvesse apenas a música e mais nada.

Klaus disse alguma coisa e segurou minhas mãos.

—Dança, garota, vai!

Eu não era uma boa dançarina, mas gostava de dançar no meu quarto quando era adolescente, onde ninguém podia me ver. Agora, no meio de tanta gente, eu estava com vergonha dos meus passos terríveis.

Mas Klaus tinha ficado tão animado em me trazer na minha primeira festa... Eu não queria decepcioná-lo.

Fechei os olhos, sentindo a música como se estivesse no ar e fosse algo palpável, então meu corpo começou a se mover praticamente sozinho, como se soubesse o que fazer.

Eu estava dançando.

As coisas outras coisas sumiram: minha preocupação boba por ter poderes, minha irmã cometendo um homicídio e desaparecendo, a Babá e seu retorno certeiro, minha quase morte...Nada disso podia existir agora.

—Viu só?-Klaus perguntou. -Você já parece de casa. -Ri.

—Obrigada, por me trazer. Acho que precisava disso.

—Conta comigo, Mally.

As horas foram passando como um borrão de felicidade e música alta. Klaus e eu dançamos, rimos e ele até me convenceu a pedir uma das bebidas da casa – depois de jurar que não havia nada extra no copo.

Perto da uma da manhã, meu celular vibrou na bolsa até eu ser trazida de volta para o mundo real.

—Acho que é minha irmã. -Comentei, apontando para o celular. Klaus assentiu.

—Você devia atender. O banheiro tem proteção acústica, o som é bem mais baixo lá.

—Eu já volto.

Atravessei a pista de dança com o celular na mão e me apressei para o banheiro de luzes azuis. Klaus estava certo, o som era baixo ali dentro, distante.

—Alô?

—Mallory. -Sorri. Era mesmo Marie.

—Como você está?

—Bem. Na medida do possível.

—Você falou com nossos pais?

—Há umas duas semanas.

—Eles disseram que a polícia australiana não desconfia de você sobre... A morte de Jeremy. O resultado da autópsia fala em parada cardíaca. -Ela ficou em silêncio por um tempo.

—Fui eu, Mallory. Eu fiz aquilo. Ainda não entendo como, mas fiz. Meu poder é... Destrutivo. Posso explodir coisas sem nem tocar nelas.

—Isso... É... Surpreendente. -Riu.

—Muito diferente do seu poder. Você cura, eu destruo e...

—Não importa o poder, importa o que faz com ele.

—Acho que tem razão. Você tem sido muito compreensiva comigo. Não mereço isso, depois da maneira como te tratei todos esses anos...

—Você ainda é minha irmã e eu te amo. Aquilo é passado.

—Desculpa... Desculpa, eu estava tão cega...

—Marie... Está tudo bem. Escuta, se quiser vir pra cá... Será bem vinda. Não importa o que aconteceu antes. Você merece seu recomeço.

—Obrigada. Preciso desligar agora... Estava pintando o cabelo, num quartinho de hotel barato... E decidi te ligar. É bom ouvir uma voz amigável.

—Pode contar comigo sempre que precisar.

—Até mais... Irmã.

—Até. -Desligou.

Abaixei o celular, me olhando no espelho, tentando imaginar Marie, lá do outro lado do mundo, com uma nova realidade e poderes que tinha acabado de descobrir.

Eu tinha a perdoado, claro que tinha. Esperava que ela viesse para os Estados Unidos e pudéssemos conversar, nos acertar, fazer coisas de irmãs... Sentia falta dela como sentiria falta de algo meu que tivesse sido arrancado de mim. Sempre sentiria.

Saí do banheiro guardando o celular e procurando Klaus onde tinha o deixado, mas não conseguia encontrá-lo entre a pequena multidão da boate. Ele não estava no bar, nem na pista de dança.

—Você precisa de ajuda, colega?-Virei para o lado. Uma mulher alta, de cabelos negros e longos estava com um copo na mão e parada ao meu lado. A bandeira trans desenhada em sua bochecha parecia brilhar com glitter.

—Perdi o meu amigo.

—Aqui dentro ou ele... Morreu?

—Aqui dentro.

—Ah. -Suspirou, aliviada. -Menos mal, isso a gente pode resolver. Sou Kathya.

—Mallory.

—Certo, Mallory. Vamos procurar o seu amigo. Como ele é?

—Ele tem... Mais ou menos 1,80, está usando preto, tem cabelos castanhos até os ombros... O nome dele é Klaus...

—Klaus Hargreeves? Eu conheço a figura. -Riu. -Ele vem muito aqui. -Girou no lugar. Kathya era alta o suficiente para não precisar de saltos ou ajuda para ver por cima das cabeças bêbadas e alegres pela boate. -Nadinha. Hum, o banheiro, talvez ele tenha ido. Vou procurar...

—Mas você pode...

—Relaxa, o pessoal aqui é de boa. -Entrou no banheiro masculino e saiu de lá pouco depois balançando a cabeça negativamente. -Ele não está lá.

—Será que ele foi embora?-Deu de ombros.

—Se foi, não se preocupe, eu tenho carro, posso te levar pra casa.

—Obrigada. Vou dar uma olhada por aí.

—Tudo bem. Se precisar de ajuda, sabe quem procurar. -Apontou para si mesma. -Kathya. -Deu um tapinha no meu ombro e se afastou para a pista de dança.

Agradecida pela ajuda repentina e preocupada com o sumiço de Klaus, comecei a andar pela boate, me certificando de olhar pessoa por pessoa, mas nenhuma delas era quem eu estava procurando.

Me aproximei do balcão, me perguntando se o barman teria alguma utilidade.

—Ei, Hargreeves, porra! Olha por onde anda!-Olhei na direção da voz. Um rapaz estava entrando por uma porta lateral que levava até a rua.

—Desculpa. -Pedi, me aproximando. -Você disse Hargreeves?

—Sim. É o idiota do Klaus.

—Você o viu?

—Lá fora, ele esbarrou em mim. Aquele imbecil não vê nada quando tem droga na frente dele...

Passei pelo rapaz, saindo pela porta como um foguete para o beco do outro lado.

Klaus estava logo ali, agachado, a cabeça baixa e algo nas mãos. Meu coração disparou. Ele tinha prometido... Não, eu precisava focar agora.

—Você está bem?-Corri até ele, me abaixando.

—Eu não usei. -Ergueu a cabeça, o rosto molhado e um cortezinho na testa. -Só queria ter certeza de que podia olhar pra ela e não usar. Juro. Eu não...

—Tudo bem. -Toquei a testa dele, fazendo o corte sumir. -Eu acredito em você. -Largou o pacotinho no chão. -Acho que é hora de irmos. -Assentiu. O ajudei a ficar de pé.

Saímos do beco em silêncio, não havia nada para ser dito... Não que eu soubesse.

***

Meu celular tocou às três da manhã. O peguei antes que também acordasse Klaus e vi o nome na tela. Diego.

—Alô?

—Preciso de ajuda. -Franzi a testa.

—Às três da manhã? E por que está me ligando? Você podia vir até aqui ou... Esperar...

—Preciso da sua ajuda por causa do seu poder. -Me sentei.

—Você está bem?

—Eu me machuquei. Se mandar um Uber te buscar, você vem?

—É claro. Mas o que...

—Te vejo daqui a pouco. -E desligou. Encarei o celular. Diego adorava um mistério.

O Uber chegou pouco tempo depois e me levou para o centro da cidade.

Encontrei Diego sentado numa calçada, a cabeça encostada no muro atrás de si e as pernas esticadas.

—O que houve?-Perguntei, me abaixando na frente dele.

—Eu quebrei a perna.

—O que? Como?

—Pulei de uma sacada. -Pisquei, confusa.

—Por que pulou de uma sacada?

—Eu estava perseguindo um criminoso. Mais perguntas?-Eu tinha muitas na verdade. As respostas dele não estavam me ajudando muito.

—Não. Por que não ligou pra emergência? Eu... Eu nunca concertei um osso quebrado.

—Fico feliz em ser seu primeiro. Agora, pode resolver?-Apontou.

—Eu não sei se vai funcionar.

—Mallory, por favor. -Assenti.

—Se não funcionar, você vai pro hospital.

—Nem...

—Diego. É a minha condição. -Revirou os olhos.

—Tá legal.

Estendi as mãos, sentindo com cuidado a perna dele até descobrir onde estava quebrado. Tinha sido na área da canela esquerda. Pelo menos não tinha sido uma fratura exposta... Eu provavelmente teria desmaiado.

Me concentrei, até sentir aquele formigamento familiar e ouvir um clique baixo.

—Acho que te consertei. -Afastei as mãos. Ele mexeu a perna com cuidado.

—É. Não dói mais. Viu? Você conseguiu. Nada de hospital. -Fiquei de pé.

—Não gosta de hospitais?

—Nem de agulhas. -Sorri, estendendo a mão para ajudá-lo a ficar de pé.

—Disse o cara das facas.

—É diferente. -Me segurei pra não rir.

—Aham. -Começou a andar, me apressei pra acompanhá-lo.

—Obrigado por ter vindo e por me curar.

—De nada. -Olhei em volta, um grupo de homens nos acompanhava com o olhar do outro lado da rua. Desviei o olhar. -Mas tenta não pular mais de sacadas.

—É um ótimo conselho.

—Eu nunca quebrei nenhum osso, nem quando criança.

—O que? Você era uma daquelas crianças chatas que nunca aprontava nada?

—Exatamente. Não está surpreso, não é?

—Não muito. -Ri. -Foi corajosa em ter vindo. A madrugada é intensa por aqui. Allison diz que não é nem um pouco louca de andar por aqui à noite, não quando pode haver um psicopata com uma faca em cada esquina.

—Bom, eu estou com o cara da faca, então... -Dei de ombros. Ele riu.

—É, faz sentido. Escuta, se puder não contar pra ninguém que precisei ser resgatado...

—Pode deixar. Seu segredo está à salvo comigo, Bruce Wayne.

—Valeu.

***

No dia seguinte, Klaus e eu encontramos Diego e Lila na cozinha. Allison já havia viajado, Vanya tinha passado a noite em seu apartamento e não havia sinais de Cinco ou Luther.

—Eu com certeza não dormi nada essa noite. -Klaus murmurou, enchendo a xícara de café até a borda.

—Podia ter ficado dormindo. -Avisei.

—Vou ficar bem.

—Então vocês são tipo namorados ou o que?-Lila perguntou, os pés em cima da mesa, o que teria feito minha mãe ter um treco.

—Somos melhores amigos. Mallory é meu pontinho rosa de felicidade e apoio. -A mulher fez uma careta.

—Que fofo.

—Vou contar uma coisa. -Diego disse, se inclinando para frente na mesa. -Mas fica entre nós.

—Eu sou túmulo. -Klaus disse.

—Ele não é. -Avisei. -Mas eu cuido disso.

—O Cinco têm saído toda noite. -Diego contou. -Sozinho. O que está aprontando eu não sei.

—A gente devia dar uma olhada no jornal. -Lila sugeriu. -Provavelmente o número de homicídios subiu. -Todos olhamos na direção dela. -Eu vou ter que ser mais clara? Cinco é um assassino profissional.

—Então esse é o normal dele?-Klaus murmurou.

—Se disserem que eu contei... -Diego começou.

—Você vai negar?

—Não, vou cortar suas línguas. -Mostrou a faca. Klaus e eu trocamos um olhar.

—Não vamos contar pra ninguém.

—Ótimo. -Levantou. -Temos treino daqui a pouco, Mallory. Lila vai nos ajudar.

—O que?-Perguntei. A mulher acenou pra mim. Engoli seco. Já tinha visto Lila lutando, ela ia me quebrar em pedaços se fosse minha oponente.

—Nos vemos daqui a pouco, colega. -Ela avisou, passando por mim e me dando um tapa no braço. Olhei para Klaus.

—Eu vou morrer. -Ele me encarou.

—Que cor quer seu caixão?-Perguntou tranquilamente.

Minha preocupação não foi à toa. Se minha definição de pegar leve era bem diferente da de Diego, Lila sequer conhecia o termo. Dizer que ela pegou pesado era pouco.

Sempre que Diego tentava interferir, ela dizia “Sei o que estou fazendo” e voltava para sua tentativa nada discreta de homicídio.

Finalmente, Lila declarou que a aula estava encerrada e me liberou. Eu teria saído correndo se não estivesse caída no chão, sem fôlego e toda dolorida.

—Você pegou pesado. -Diego sussurrou para a namorada.

—Diz isso por que nunca viu a Gestora me treinar. Eu nem usei uma arma de fogo. -Arregalei os olhos.

—Você quer os parabéns por isso?

—Deixa de ser mole. -Olhou pra mim. -Até a próxima, garota. -E saiu. Diego suspirou.

—Como eu achei que isso era uma boa ideia?

***

—Eu tive a melhor ideia de todas. -Klaus declarou. Sentei na cama e tentei me preparar para a nova encrenca em que ele queria se meter.

—Ah, teve?

—Sim. Nós vamos seguir o Cinco e descobrir o que ele anda fazendo secretamente.

—Meu medo era que você dissesse isso.

—O que poderia dar de errado?

—Cinco nos descobrir e nos matar?-Apontou pra mim.

—Você tem um ponto. Mas...

—Eu ainda não terminei. Ele é um assassino treinado. O que é que nós sabemos sobre seguir alguém?

—Okay, você tem outro ponto. -Roeu uma unha. -Ah... É claro! Bom, não vai ser tão simples... Oh, mas podemos negociar.

—Me perdi.

—Eu sei pra quem podemos pedir ajuda.

—Tenho medo de perguntar... Mas pra quem?

Por que é que eu fui perguntar? A segunda ideia maluca de Klaus era pedir ajuda para Lila. Me recusei a contar pra ela os planos, então o número 4 da família Hargreeves fez as honras. A mulher nos encarou e ouviu em silêncio, até que Klaus tivesse terminado.

Me preparei para vê-la rir da nossa cara e dizer que estávamos doidos, mas ela assentiu, compreensiva.

—Estou dentro.

—Simples assim?-Perguntei, enquanto Klaus comemorava.

—É claro. Você sabe o quanto eu odeio aquele merdinha?

—Então vai nos ajudar por que odeia o Cinco?

—Que bom que está pondo seus neurônios pra funcionar. Vocês têm papel e caneta pra anotar?

***

—Como estão as coisas?-O Doutor perguntou.

—Por enquanto, tranquilas.

—Por enquanto?-Troquei o celular de lado.

—Klaus decidiu seguir o Cinco. Não acho que será como um passeio no parque, principalmente se ele nos descobrir.

—Cinco foi o melhor e mais bem treinado agente da Comissão.

—Eu sei. Como eu disse, nada de passeio pelo parque. Mas não é fácil convencer Klaus do contrário quando ele põe alguma ideia na cabeça. Nisso, ele me lembra você.

—Que ótimo.

—Alguma notícia da Babá?

—Nada e isso é um mal sinal.

—Pelo jeito as coisas não querem mais ser fáceis.

—Arrependida de entrar pra Umbrella Academy?-Sorri para o nada.

—Não. Na verdade não. Acho que aqui é meu lugar. -Klaus apareceu na porta, fazendo sinais confusos e agitados. -Preciso ir. Se cuida e não some.

—Não faça bobagens. -Encarei meu novo melhor amigo.

—Bom... Vou tentar. -Desliguei a ligação e guardei o celular no bolso. -O que foi?

—Vamos, vamos, vamos. -Sussurrou. Revirei os olhos, achando graça e o segui pelo corredor.

Cinco estava na porta da frente, então Klaus me puxou para a sala, fazendo seu melhor para disfarçar.

—Hey, o que está assistindo?-Perguntei, vendo Luther no sofá com um balde enorme de pipoca e muitas latas de refrigerante. Alguém estava fazendo uma maratona.

—Diego me recomendou Vis a Vis. -Ele respondeu. -Comecei ainda pouco... Não estou muito impressionado.

—Eu comecei assim também e é uma das minhas séries favoritas. Talvez se surpreenda também.

—Não sei... Acho que não é o meu estilo. Vou terminar o primeiro episódio e ver outra coisa.

—Já viu The Witcher? É muito boa...

—Okay, okay, acabou o clube Netflix. -Klaus interrompeu, me puxando pela mão. -Mas nós temos que ir.

—O que está aprontando?-Luther perguntou.

—Nada demais. Tchau, grandão.

Sabe aquelas cenas cômicas em que um personagem segue o outro, e rola de precisar se esconder em lugares inusitados tipo atrás de latas de lixo e carrinhos de bebê? Bom, foi bem nesse estilo. Eu teria achado a situação toda mais engraçada se não estivesse com medo de Cinco se virar e gritar “Eu vou matar vocês!” a qualquer momento.

Seguimos o antigo melhor assassino da Comissão pelas ruas noturnas, atentos às dicas de Lila, até vê-lo atravessar a rua e seguir para um hotelzinho barato, sumindo num dos quartos.

—É o suficiente?-Perguntei. Klaus fez uma careta.

—Não sabemos o que ele veio fazer.

—E precisamos?

—Mallory, esse é o ponto dessa coisa toda. A gente seguiu o Cinco pra saber o que ele anda aprontando.

—E o lance de privacidade?-Virou pra mim.

—Vou te dizer uma coisa sobre uma família de sete irmãos, meu anjo: não existe privacidade. -Suspirei.

—Você quer ir até lá e ver o que ele está fazendo.

—Você é um gênio! Sim, eu quero.

—Ele com certeza vai nos matar. -Deu de ombros.

—Vai valer à pena, não vai?

—Não. Definitivamente não.

—Não seja negativa, Mallyzinha. Vamos.

E lá fomos nós. Eu, com a absoluta certeza de que íamos morrer. Klaus, com a ignorância de um alegre e inocente animalzinho sendo conduzido para o abate.

Passamos escondidos pela recepção, o que não foi difícil por que o cara lá dentro estava dormindo, e seguimos silenciosamente para o quarto 14, onde vimos Cinco entrar. A cortina estava bem fechada, e o murmúrio baixo que vinha lá de dentro podia ser de uma tv ligada.

Pra mim era o suficiente. Eu podia lidar com a minha curiosidade às vezes (minha mãe sabia muito bem como lidar com crianças curiosas). Talvez Cinco quisesse ficar sozinho, em paz, longe dos irmãos, vendo um programa qualquer na tv de um hotelzinho barato. Talvez não. Seja como fosse, não era da minha conta.

Klaus discordava totalmente e eu sabia disso. Estava quase implorando para irmos embora quando ele empurrou a porta com tudo, tropeçando para dentro do quarto.

Lá dentro, Cinco estava sentado numa poltrona, com uma xícara em mãos. Uma mulher na casa dos quarenta anos repousava na cama, e parecia estar gesticulando no meio de uma frase.

—Seu safado!-Klaus gritou. -Minha senhora, você sabe quantos anos esse rapazinho tem?

—O que vocês dois idiotas estão fazendo aqui?-Cinco perguntou, ficando de pé.

—Tentando descobrir o que você anda aprontando. E agora nós sabemos...

—E é claro que a ideia foi sua.

—Bom...

—A Mallory não chegaria nesse nível de estupidez nem em sessenta anos.

—Obrigada. -Agradeci.

—Ei!-Klaus reclamou. -O foco devia ser isso aqui. -Apontou para o irmão e a mulher na cama. -Isso é muito, muito nojento...

—Nós estávamos conversando, seu idiota. -Cinco interrompeu. -Mallory e eu conversamos recentemente e ela me disse que eu devia ter... Como você disse?

—Espaços seguros e confortáveis para agir como adulto. -Respondi. -O que você não consegue quando está com seus irmãos.

—Eles me tratam como criança. Eu não sou criança. Conheci a Eleonora e temos conversado como adultos. Apenas conversado. -Lançou um olhar penetrante para o irmão.

—Ele tem piadas sujas ótimas. -A mulher disse. -E paga muito bem.

—Então não tá rolando sexo nojento?-Klaus perguntou, confuso.

—Eu pareço alguma tarada sexual?

—Sinceramente?-Cinco olhou pra mim e nem precisou dizer nada para que eu entendesse.

—Acho que já sabe o que queria. -Comentei, segurando o pulso de Klaus e o puxando comigo. -Desculpa pela invasão. Eu sinto muito. Tenham uma boa noite.

—Mas...

—É isso. -O puxei para fora do quarto e fechei a porta. -Vamos embora.

—Mally...

—Klaus, chega. Sabe por que Cinco está seguindo meu conselho? Por que ele precisa. Seu irmão não é uma criança e merece privacidade.

—É um puxão de orelha?

—É. -Assentiu.

—Tudo bem, eu mereci. Vamos... A gente pode pegar um chocolate quente no caminho pra casa.

***

No dia seguinte, eu parecia a única na mansão. Alguém estava batendo na porta insistentemente e como ninguém foi atender, decidi fazê-lo.

—Eu posso ajudar?-Perguntei. No degrau abaixo um homem ajeitou o óculos nervosamente.

—Bom dia. Desculpa incomodar. Eu sou Ravi Cooper, repórter do GranMail. Aqui é a Umbrella Academy, certo?

—É.

—Eu estava procurando os irmãos Hargreeves para uma entrevista.

—Bom... Acho que vai ser difícil... É cedo e a maioria deles não está ou não acordou ainda...

—Não precisa ser hoje. -Tirou um cartão do bolso e me entregou. -Meu telefone, caso eles se interessem. Aliás, você é...?

—Mallory. Amiga da família.

—Ah. Bom, se puder falar com eles...

—É claro, vou falar.

—Obrigado e tenha um bom dia.

—Igualmente.

Fechei a porta e olhei o cartão por um instante. Um som na sala chamou minha atenção, e eu fui investigar, encontrando Luther no sofá cercado de um caos de latas de refrigerante e embalagens vazias de salgadinhos.

—Você dormiu?-Perguntei, ele pausou a tv e olhou pra mim.

—Você tinha razão, Vis a Vis é uma série perfeita!
—Ah... Então fez uma maratona.

—Acho que fiz. Já é de manhã?-Assenti. -Eu nem notei. O que é isso aí?

—Um cartão. Tem um repórter querendo falar com você e seus irmãos.

—É mesmo?-Entreguei o cartão pra ele. -Faz anos que ninguém se interessa pela Umbrella Academy. Eu já tinha esquecido como era a sensação.

—Bom... As coisas tão voltando ao “normal”, não é?

—É, parece que sim.

Os dias passaram com poucas novidades. Allison conseguiu seu papel naquele filme e tinha começado a gravar. Vanya estava dando aulas de violino de novo e me perguntou como podia fazer para encontrar uma boa terapeuta. Cinco não matou Klaus e eu por termos o seguido e continuou saindo à noite sem dar explicações. Felizmente, Klaus não quis segui-lo de novo. Diego estava bem ocupado com seu trabalho de justiceiro e eu tive que curá-lo algumas vezes. Luther maratonava Vis a Vis como se sua vida dependesse disso. O Doutor aparecia de vez em quando, preocupado com nossa segurança e meio desconfiado. A Babá não deu nenhum sinal de vida.

Duas semanas depois de aparecer pela primeira vez, Ravi Cooper retornou à Mansão Hargreeves, para entrevistar os irmãos. Allison fez sua parte por vídeo chamada, lá de seu trailer, numa pausa durante as gravações, pois não podia voltar ainda.

—Espero que goste de chá. -Comentei, deixando uma bandeja na mesinha. -Meu café é horrível.

—O cheiro parece bom. -Ravi disse, ajeitando o óculos.

—É Earl Grey. Luther disse que já vai descer.

—Ah, obrigado. Então... Você tem poderes, senhorita Mallory?

—Eu? Não, eu... Sou só uma garota comum, entre heróis. E apenas Mallory é o suficiente.

—É claro. -Sorriu. Ele era um cara bonito e pensar nisso me pegou de surpresa. Klaus e eu andamos conversando e notei que evitava classificar alguém como bonito ou não. Agora, eu me sentia mais confortável pra pensar nisso. Demissexuais acham outras pessoas bonitas. Só não significa que a gente vai querer transar com elas.

—Bom, eu... Vou... Enfim, hã... Se precisar de alguma coisa...

—Certo. -Me virei e comecei a sair da sala. -Obrigado pelo chá.

—De nada. -No corredor, encontrei Luther e parei na frente dele. -Por que você é uma nuvem de perfume?

—O que tem de errado?-Perguntou, parecendo preocupado.

—Você se arrumou todo pra entrevista... Que gracinha. Mas sabe que é pro jornal impresso, não é? Ninguém vai te ver.

—Ah... Bom... Se arrumar nunca é demais. -Assenti, achando graça. -E lá vou eu, me deseje sorte. -Cruzei os dedos.

Luther sorriu e passou por mim, entrando na sala.

Era engraçado como em dois meses eu tinha me apegado tanto àquela família que me sentia parte dela. Era como se eu sempre estivesse estado ali, como se também fossem meus irmãos.

***

As entrevistas saíram uma semana depois, com uma matéria de Ravi Cooper que era toda elogios à Umbrella Academy, isso animou os irmãos. Eles cresceram amados e adorados como heróis, devia ser difícil passar a ser anônimo de uma hora para outra. Vanya estava até pensando sobre um segundo livro autobiográfico. Luther estava começando a esquecer sua recente ideia maluca de voltar para a lua.

As coisas estavam finalmente voltando ao normal... No estilo Hargreeves de ser.

—É sério. -Klaus dizia, quando entrei na sala aquela noite. -Diego, você tem toda uma vibe bissexual. -Ergui uma sobrancelha.

—É disso que estamos falando?-Perguntei.

—Você talvez não conte, mas pode ajudar a provar meu ponto. Ele é ou não é, atrativo para todos os gêneros ?

—Eu não vou responder isso. E você também não devia, ele é seu irmão.

—Obrigado. -Diego disse.

—Não é sobre mim. -Klaus negou. -Mas todo mundo acha isso.

—Todo mundo quem?

—Todo mundo. -Apontou. -Diego, você não pode negar sua sexy vibe de bissexual quando está emanando isso o tempo todo.

—O tempo todo?

—Apenas olhe pra você mesmo. -Cruzei os braços, tentando ver o que Klaus achava tão importante. Diego estava apenas sentado no sofá, recostado no encosto, as pernas abertas. -Até os espíritos sentem essa vibe.

—Acho que se você continuar negando, ele não vai parar. -Avisei.

—Você é maluco. -Diego disse. -É só o que vou dizer.

—Gente, mais baixo. -Luther disse, sem tirar os olhos da TV. -Eu acho que a Macarena vai matar a Zulema.

—Ah, eu vou muito dar um spoiler pra ele.

—Não vai, não. -Cortei. -É um spoiler muito grave.

—Qual a graça de indicar uma série pra alguém e depois não dar spoilers?

—Você é um homem mal, Diego Hargreeves. -Klaus riu.

—Meu eu de doze anos escreveria fanfics hots de vocês dois. -Comentou. Fiz uma careta.

—Diego tem razão, você é maluco.

—Espero que não tenha percebido só agora, meu bem.

***

Naquele dia, enquanto eu treinava com Diego, o telefone tocou.

—Você vai atender?-Perguntei.

—Não. Eu não gosto de falar com pessoas.

—Pode ser importante. -Deu de ombros.

—Você é de casa agora, por que não atende?

Corri até o telefone a tempo de atendê-lo. Mas, pelo tempo de insistência, alguém precisava mesmo daquela ligação.

—Residência dos Hargreeves. -Okay, eu sempre quis atender o telefone como nos filmes.

—Oh meu Deus, que bom que atendeu, eu estava ficando mais desesperada ainda. -A voz feminina, e estridente como uma colegial, disse.

—Eu posso ajudar?

—Eu sou Kara, assistente do diretor Ferrel, estamos gravando aqui em Toronto.

—Certo. É sobre o filme da Alisson?

—Isso. Eu fui chamá-la essa manhã pra gravar uma cena externa e ela não estava no trailer!

—Você procurou fora dele?

—Procurei! Eu procurei em toda parte, mas ela não está aqui. E o celular está no trailer, junto com a bolsa, a carteira... Ela saiu sem levar nadinha!-Isso não parecia com algo que Allison faria. -Não sei mais aonde procurar. Achei melhor ligar e ver se não tiveram notícias da senhorita Hargreeves.

—Foi uma boa decisão. Vou falar com os irmãos dela e tentar descobrir o que houve. Se souber de mais alguma coisa, pode ligar pra cá?

—Posso.

—Obrigada, Kara. -Desliguei o telefone. Diego veio vindo no corredor.

—Que isso, Davies?-Perguntou. -A fofoca tava boa? A gente tem treino, lembra?

—Allison sumiu do set de gravação.

—Merda. -Foi até a parede perto do telefone, ergueu um quadro pela parte de baixo e apertou um botão. Na mesma hora uma sirene alta ecoou pela casa.

—O que é isso?

—Um aviso. -Fez uma pausa. -Reunião de emergência.
Luther, Cinco e Vanya se uniram a gente na sala. Nem sinal de Klaus.

—Alguém viu o irmão que falta?-Perguntei.

—Eu o vi antes do café. -Vanya respondeu. -Ele saiu pelos fundos e depois não o vi mais.

—Vocês têm certeza de que a Allison sumiu?-Luther perguntou, muito preocupado.

—Ela não levou o celular nem a bolsa. -Contei. -Allison nunca sairia sem suas coisas. Principalmente sem seus documentos, é muito arriscado.

—Então ela não sumiu por conta própria. Alguém pode... A gente tem que encontrá-la agora...

—Eu vou pra Toronto. -Cinco avisou, antes de desaparecer.

—O que ele...

—Dividir pra conquistar. -Diego interrompeu. -Vanya, você fica aqui caso ela volte ou a assistente ligue de volta. Luther e eu vamos pegar o primeiro voo pra Toronto. Mallory...

—Eu vou atrás do Klaus. -Afirmei.

—Tudo bem. Todos com os celulares ligados e atentos, por favor. Não precisamos de mais gente sumindo.

***

Klaus tinha saído sem o celular, mas isso era típico dele, assim como sumir. Mesmo assim, eu estava um pouco preocupada. Primeiro Allison e depois Klaus. Se não conseguisse encontrá-lo em algum lugar da cidade, significava que tinha algo errado acontecendo.

Passei na boate onde ele tinha me levado semanas antes, mas parecia fechada. Na frente, uma mulher batia num cara que se afastou e correu. Outros dois estavam correndo lá frente, para longe.

—Me chama de homem de novo pra ver se eu não acabo com vocês!-A mulher gritou.

—Kathya?-Chamei. Ela se virou.

—Menina, quanto tempo. É Mallory, né?-Assenti.

—Tudo bem?

—Ah, só o de sempre. -Jogou o cabelo pra trás dos ombros e se encostou na parede. -O que faz por aqui?

—Estou procurando por Klaus, de novo. Achei que ele pudesse estar aqui.

—Hum, não. A boate tá fechada, só abre à noite. E não vi aquele maluco hoje.

—Se vê-lo, pode avisar que estou procurando por ele? Problema de família.

—Pode deixar, querida. Vou falar com os meninos pra ver se sabem do paradeiro dele.

—Obrigada.

—Boa sorte, menina.

Comecei a me afastar, checando no celular endereços das boates próximas. Claro que Klaus podia estar em outro lugar, mas não é como se eu tivesse alguma ideia. Podia passar na revistaria onde tinha me levado uma vez, ele disse que o filho do dono vendia maconha quando estava por lá.

—Hey, Mallory!-Parei de andar, girando na direção da voz. Ravi Cooper vinha logo ali, ajeitando o óculos. -Que surpresa. Tudo bem?

—É, mais ou menos. Você mora aqui?

—Naquele prédio. Apartamento pequeno e de paredes finas. Então, qual é o problema?

—Não tem problema.

—Eu sou repórter, Mallory. Tenho faro pra essas coisas.

—Tô procurando pelo Klaus. Não faço ideia de onde ele pode estar. Fui até uma boate, mas está fechada. Ele não levou o celular, então...

—Entendi. Do outro lado da cidade tem uma boate que funciona 24 horas. Abriu recentemente, mas talvez...

—Talvez ele esteja lá. Onde fica?

—Olha, é bem longe. Ainda que pegue o metrô, vai ter que andar bastante. Você não quer uma carona?

—Eu não poderia... É muito longe, você deve estar ocupado...

—É meu dia de folga. E eu gosto de dirigir. -Parei um momento, analisando minhas opções.

—Tudo bem, vou aceitar sua carona. -Sorriu.

—É em troca pelo chá. Vem, meu carro está logo ali.

Guardei o celular na bolsa e segui Ravi até o estacionamento coberto do prédio dele.

—Qual é o seu carro?-Perguntei.

—É uma boa pergunta.

Então algo pontudo acertou a lateral do meu pescoço e o mundo girou e inclinou. Eu estava no chão.

Tudo escureceu.

***

—Você precisa acordar. Estou ficando entediado.

Ergui a cabeça e tentei entender o que estava acontecendo. Meus pulsos estavam muito bem presos aos braços de uma cadeira. Minha cintura e meus tornozelos também estavam presos.

—O que...

—Só por precaução. Não considero você uma ameaça. -Olhei pra frente.

Ravi Cooper estava parado logo ali, sem os óculos que estava sempre ajeitando e com uma roupa totalmente diferente, com muito roxo.

Muitas perguntas estavam passando na minha cabeça e eu não sabia qual delas faria primeiro, o que me deixou mais perdida ainda.

—Nenhuma ideia de por onde quer começar?-Perguntou. -Tudo bem, eu vou te dar uma ajudinha. Matem o curandeiro!

—Não. -Eu estava com mais problemas do que tinha imaginado.

—Acho que você costuma me chamar de “Babá”. Eu usei “Missy” antes, na minha regeneração feminina. Mas, graças à Diego, eu estou de volta aos velhos tempos. Pode me chamar de Mestre. Você não achou que tinha acabado, achou?

—Não. Sabia que voltaria. O Doutor disse...

—O Doutor diz muitas coisas. Ele nunca disse pra não confiar em estranhos?-Não, mas meus pais sim. É por esse tipo de coisa que não se aceita carona de desconhecidos.

—O que você quer?

—De você, eu ainda não sei. Seu poder não é tão interessante. Mas vamos começar do começo. Lembra quando encontrou Diego na França? Ele não reconheceu você ou o irmão, tentou matá-los...

—Eu me lembro.

—Aquilo era um teste. Queria ver se minha invenção funcionava.

—Você estava manipulando Diego.

—Isso!-Riu, batendo palmas. -É tão empolgante ter uma plateia participativa. Eu estava sim. Se não vou ter um exército leal por vontade própria... -Deu de ombros.

—Você pegou a Allison e o Klaus?

—A família toda, na verdade. Você foi a última. Oh, é claro. Tem a Lila e... Como é o mesmo o nome da sua irmã?

—Deixa ela fora disso!

—Uh. Toquei num ponto fraco. Ela é sua gêmea, tem poderes assim como você. Se puder agilizar as coisas e me dizer onde encontrá-la...

—Eu prefiro morrer.

—Posso ajeitar isso. -Estalou os dedos. Alguém entrou na sala e parou ao lado dele. Diego. -Preciso admitir que mesmo com a facada, ele é um dos meus favoritos. E sob meu controle, é tão obediente que nem parece a mesma pessoa. Você não acredita? Está duvidando da minha capacidade de...

—Eu não disse nada. E não importa o que você faça, o Doutor pode reverter.

—Difícil. Fiz algumas melhorias depois daquele teste. Quer ver como é? Diego, mate-a.

—O que? Não. -Ele começou a se aproximar e eu sabia que não seria para um abraço. -Diego, não!

Então as mãos dele estavam no meu pescoço e eu não conseguia respirar. Se me pedissem pra listar dez tipos de morte que eu poderia ter, ser estrangulada por um amigo não entraria na lista.

Meus pulmões gritaram por ar e o pânico começou a golpear meu peito e estômago. Não havia nada que eu pudesse fazer.

—Tudo bem, Diego. -O Mestre disse. -É o suficiente... Por agora. -Diego se afastou. Respirei fundo, desesperada por ar. -Viu? Eu tenho total controle sobre suas mentes. Não já nada que não fizessem por mim. Minha questão agora é... Você é útil ou eu posso te matar?

—Você... Disse que curandeiros... Eram úteis.

—É verdade. Vou pensar mais sobre. Enquanto isso...Diego, leve-a para as celas. Sim? Deixe-a presa até eu decidir.

Diego assentiu e me soltou, para amarrar então meus pulsos e me puxar com ele pra fora da sala. Quando já tínhamos nos afastado o suficiente e eu recuperei parte do fôlego, comecei a tagarelar.

—Você precisa me ouvir. Diego, você está sendo manipulado. Aquele homem era a Babá. A Missy. Aquela em que você atirou uma faca. Ele é o vilão, Diego, e você é um herói. Por favor... Precisa me ouvir, precisa... -Me fez parar de andar, de forma brusca. Comecei a me perguntar se tinha funcionado, mas parei quando ele puxou uma faca do cinto. -Não, não, não...

—Shh. -Cortou a corda que me prendia meus pulsos. -Sem escândalo, Davies.

—Você...?

—Foi mal, por antes. Eu tinha que fingir estar controlado. Meus irmãos estão completamente sobre o controle dele. Enquanto não souber o que fazer...

—Tudo bem, a gente pode resolver isso. -Esfreguei o pescoço com cuidado. -Acho que isso aqui é uma TARDIS.

—Como a nave do Doutor?

—Isso. Tenho uma ideia, mas...

—Oh, eu adoraria ouvir. -Diego e eu nos viramos, ele com a faca erguida na direção da voz. O Mestre cruzou os braços. -Qual sua ideia, número 9?

—Que tal eu te contar a minha?-Diego perguntou, girando a faca e ficando na minha frente. -É mais interessante.

—Não importa o que façam. Vocês estão na minha casa agora! Não tem Doutor pra salvar vocês, nem papai ou mamãe robô. É o meu jogo e eu tenho a vantagem.

—E sabe o que eu tenho na mira? Você. Mallory, sai. -Hesitei. -Dividir para conquistar.

—Famosas palavras finais. -Murmurei, começando a me afastar.

Meu plano era chegar até a sala de controle. O Doutor tinha me contado o suficiente sobre sua TARDIS e a do Mestre não podia ser tão diferente assim.

Não muito longe dali, Klaus surgiu no meu caminho.

—Ele te pegou também. -Parei, suspirando. -Você está sendo controlado?

Em resposta, ele correu na minha direção, os punhos erguidos. Desviei e agarrei o pulso dele, empurrando-o para baixo.

—Eu não quero te machucar, juro. Vai doer mais em mim do que em você. -Agarrei a nuca dele e empurrei seu rosto contra a parede. Klaus caiu, desacordado. -Desculpa. Eu prometo que curo você depois.

Voltei a andar, encontrando uma sala oval com quatro opções de caminho. Pra onde agora?

Senti alguém parar atrás de mim, comecei a me virar, erguendo o braço pra impedir algum ataque. Allison apenas me encarou, sem medo.

Eu ouvi dizer que você não consegue respirar.

Recuei um passo, franzindo a testa. De repente, era como se não lembrasse como respirar, não havia mais ar. Expirei, esvaziando os pulmões, mas eles não voltaram a encher.

Allison se afastou e sumiu por um dos corredores.

Respira! Você sabe respirar! Respira!

—Mallory, o que aconteceu?-A voz parecia distante.

Minha visão foi escurecendo. Me apoiei na parede, tonta.

—Mallory?-Diego segurou meu braço. -Merda! Respira, respira. O poder da Allison não dura pra sempre... Você pode lutar contra ele. -Meu peito estava doendo... Eu queria muito respirar ou desmaiar logo. -Mallory!

Abri a boca, sugando uma grande quantidade de ar. O alívio me atingiu com força, enchendo meus olhos de lágrimas.

—Melhor?

—Hoje... Não é meu dia. -Murmurei. Deu uns tapinhas no meu ombro.

—Okay. Nós precisamos... -Em segundos Cinco apareceu, segurando o braço do irmão e ambos sumiram.

—Diego?

Eu não ia ter um segundo de paz?

A resposta é não. Cinco reapareceu, um machado em mãos. Meu coração disparou de novo. Dessa vez eu ia morrer.

—Cinco... Você precisa me ouvir. -Avançou. Pulei pra trás, tentando evitar os golpes dele.

Isso não era fingimento... Ele queria me matar mesmo.

O machado passou raspando pelo meu braço direito, abrindo um corte na manga da minha blusa e outro na minha pele.

Eu não tinha a menor chance contra o melhor assassino (aposentado) da Comissão.

Cinco usou o cabo de madeira para me derrubar e ergueu o machado acima da cabeça.

—Por favor, não!-Gritei, erguendo os braços inutilmente para me defender.

De repente uma rajada de ar passou por mim com tudo, jogando Cinco contra a parede e fazendo meus ouvidos serem perturbados por um barulhinho irritante.

—Você tá bem?-Vanya perguntou, agarrando meu braço e me ajudando ficar de pé. O corte estava se fechando lentamente.

—Você não está...

—Não. Por algum motivo o Mestre não consegue me controlar. -Espiou Cinco no chão. -Você viu os outros?

—Diego estava comigo até Cinco sumir com ele. Klaus está desmaiado no corredor, Allison tentou me matar e não vi o Luther ainda.

—O que a gente vai fazer?

—Eu preciso chegar até a sala de controle

—Acho que fica pra lá. -Apontou.

—Okay. Encontre Diego, reúna todo mundo e os leve até lá assim que possível.

—O que você vai fazer?

—Atrapalhar muito os planos do Mestre.

Parte minha não queria se separar de Vanya. Eu estava insegura em ficar sozinha, mas precisava fazer alguma coisa. Por mim, pelos Hargreeves que tinham me acolhido como uma deles.

A sala de controle do Mestre me dava impressão de um lugar hostil. Em preto, prata e tons escuros de roxo, não parecia um lugar onde você tomaria um chá e falaria sobre o universo.

Me aproximei do console, olhando cada botão e alavanca, obrigando minha mente a lembrar das aulas de pilotagem com o Doutor.

Encontrei o aparelho de mensagem e pensei num recado curto, como ele tinha me ensinado. “Se for importante e urgente, você não quer que o leitor fique ocupado lendo em vez de ir te salvar”.

Digitei o mais rápido possível.

A BABÁ VOLTOU. SOCORRO. M.

—O que você está fazendo?-Apertei o botão de enviar e me virei enquanto o Mestre entrava na sala de controle.

—Nada.

—Péssima mentirosa. Não passou muito tempo com o Doutor.

—O Doutor não mente. -Riu.

—Só provou o que eu disse. Se afasta do console.

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—Ou o que?-Tirou um aparelho do bolso.

—Ou vou te enviar em miniatura pro Doutor. -Recuei um passo, sem me afastar do console. Precisava de outro botão.

—Então eu não sou útil?

—É mais inconveniente do que útil. -Continuei recuando.

—Ser chamada de inconveniente por alguém como você é um elogio. Quase causou a minha morte, a morte do Doutor, dos Hargreeves... Manipulou a mente deles...

—Blá, blá, blá... Você já vai começar a chorar?

—Eu pelo menos não estou em desvantagem. -Parei.

—E quem está? Eu? Você é quem está na mira. E sozinha. Na minha nave, com pessoas que eu controlo...

—Com uma mensagem enviada para o Doutor... E uma queda à caminho.

—O que?

Apertei com força e o mais rápido possível o botão escondido na parte de baixo do console. As luzes piscaram em alerta antes de tudo apagar e segundos depois a TARDIS do Mestre estava em queda livre.

***

Me levantei com dificuldade, sentindo muita dor do lado direito do tronco e manquei até as portas. Com a luz do dia era possível ver o Mestre caído perto do console.

—Mas que diabos aconteceu, a gente foi atingido por um míssil?-Sorri, reconhecendo a voz de Klaus. Os Hargreeves foram entrando na sala de controle. -Olha o Caminho das Índias ali, ó. Chuta ele!

—O Doutor não ia gostar disso.

—Mallyzinha!-Gritou, vindo me abraçar. -Eu tive um sonho muito louco em que você me batia.

—Desculpa. -Me afastei.

—Você não quebrou meu nariz não, né?

—Ele continua intacto. Todo mundo pra fora, tô preocupada com essa fumaça. -Saímos da TARDIS.

—Onde a gente tá?

—Não é muito longe de casa. -Diego disse, olhando em volta.

—É o último lugar onde a nave pousou. - Contei.

—Você tá bem?-Allison perguntou, se aproximando preocupada. —Eu lembro de...

—Estou bem. Eu sei que não teve culpa. -Olhei para Cinco. -Nenhum de vocês. Alguém precisa de cura?

—Preciso esfolar um cara. -Diego disse, se virando. Me meti na frente dele.

—O Doutor vai resolver isso.

—Como? Com diálogo? Tá aqui o meu diálogo. -Mostrou uma faca.

—Eu sei que está zangado...

—Zangado? Eu tô puto, e você também devia estar.

—Eu estou, e entendo, de verdade, que quer... Matar o Mestre, mas não funcionou da última vez, por que funcionaria agora?

—Se ele voltar, eu o mato de novo. Mato quantas vezes precisar.

—Isso vai te fazer ser melhor que ele?-Abriu a boca para responder, mas a fechou, sem saber o que dizer.

—Como dizem no Twitter... -Klaus começou, jogando o cabelo para trás do ombro. -Ela te jantou.

—Klaus...

—Gente!-Luther interrompeu, apontando. A TARDIS do Mestre desapareceu. -E agora?-Suspirei.

—Agora a gente volta pra casa. -Parei, vendo a TARDIS do Doutor se materializando logo ali. -E tenta voltar ao normal... Ou alguma coisa assim.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.