De Janeiro a Janeiro

Capítulo 32 "Não vou mentir"


Narrado por Viviane

"Não vou mentir em dizer que sinto falta da minha vida bagunçada, mas com você, eu tô bem melhor…

Primeiramente pensei que aquela não era a minha vida. A única forma daquilo realmente acontecer comigo seria se eu tivesse tomado alguma poção mágica para me transformar na protagonista de alguma comédia romântica do final do século passado, mas eu não havia bebido nada além de água nas últimas horas. Mas depois lembrei que eu podia não ser a mocinha de algum romance fofo, mas o Samuca era o mocinho. A prova disso é que lá estava ele: fazendo com que todas as pessoas presentes na quadra do colégio se calassem para ouvir a serenata que ele fazia para mim, ao lado de Rafa e um outro garoto que tocavam violão para o acompanhar na música.

Levei minha mão a boca, ainda achando que estava perdida em um sonho. Não conseguia parar de sorrir enquanto ele cantava, logo mais o colégio inteiro começou a bater palmas no ritmo da música.

Confesso que tô tão tranquilo, até engordei uns quilos de tão confortável que você me deixa… (…)

Janu e as outras líderes me encararam sorrindo, provavelmente pensando o mesmo que eu, no quanto eu era sortuda por Samuca me amar. Eu sabia o que aquela letra significava para o Samuca, era real, ele queria ficar comigo!

Eu tô sossegado aqui do seu lado. Eu tô sossegado. E é onde eu quero ficar!”

Quando a canção chegou ao fim todos aplaudiram, e Samuca finalmente veio em minha direção, abandonando a arquibancada, se aproximando com uma única rosa vermelha em mãos. Tentei me mexer, mas não conseguia, fiquei olhando feito uma boba enquanto ele chegava bem perto de mim, com o rosto vermelho de vergonha por ter feito isso na frente de tantas pessoas. Parecia estar torcendo para que eu tenha entendido a mensagem da música.

—Tem certeza? -é a primeira coisa que perguntei, querendo ouvir de sua boca. Querendo o ouvir dizer que ele tem certeza que seu lugar é comigo, independente de tudo que pode perder lá fora.

—Nunca tive tanta certeza de algo na minha vida. -ele estendeu a rosa em minha direção, esperando que eu a pegasse, com um sorriso estendido no rosto, um sorriso que derreteria até o mais gelado dos corações.

Peguei a flor, e ele rapidamente levou seus dedos aos meus cabelos afastando minha franja e se aproximou ainda mais do meu rosto. O beijei ao mesmo tempo que senti uma única lagrima emocionada escorrer pelo meu rosto.

Quantos momentos você pode apontar e dizer “foi ali que tudo mudou”? Foi ali que percebi que amava Samuca, não que somente amava, mas que o amaria pelo resto da minha vida, mesmo que não ficássemos juntos para sempre, eu ainda terminaria minha vida o amando.

—Eu te amo! -eu finalmente confessei quando nos afastamos, ele havia me dito na praia, mas eu não tinha o retribuído. Ele sorriu novamente e percebemos os aplausos que nos cercavam, nos beijamos outra vez e em seguida ele encaixou seus dedos nos meus, apertando firme minha mão, e nós dois corremos para longe dali sem nos importar com mais nada, já tínhamos tudo!

(...)

Encarei Samuca quando finalmente paramos de nos beijar, após termos fugido do jogo para conversarmos atrás da escola, sentados na grama do pátio.

—Nós precisamos conversar. -digo em uma tentativa falha de interromper nossos beijos, mas só então percebi quanta saudade eu estava sentindo dele, apesar de ter tentado tanto transformar toda a minha tristeza e saudade em ódio.

—É verdade. -ele diz, mas logo em seguida me beija novamente, me deitando na grama. Ele para por alguns segundos, me olhando fixamente. -Nunca mais vou te abandonar de novo! -Samuca diz com tanta convicção e certeza que por alguns segundos eu acredito, por alguns segundos eu quero mais que tudo no mundo que seja verdade, mas sei que não pode ser. Sei que não posso prendê-lo em um pedaço tão pequeno do mundo quando ele o merece por completo, merece que todas as pessoas conheçam e apreciam seu talento, seria muito egoismo da minha parte impedir que isso pudesse acontecer.

Me sentei outra vez na grama, dando um leve suspiro antes de começar a falar.

—Você vai sim, Samuca. Precisa ir! -o encarei, mas ele me interrompeu antes que eu pudesse continuar.

—Não, Cinderela. Eu já decidi isso, os últimos dias foram tão difíceis para mim, não vou suportar ficar sem falar com você de novo, e vão aparecer outras oportunidades! Não precisa ser uma coisa em que nós temos que nos preocupar agora. -ele levou os olhos até os meus, esperando pela minha reação a sua resposta decidida, entretanto permaneci imóvel, ainda desejando que tivesse um modo daquilo ser verdade. Segurei firme em suas mãos, o encarando frente á frente.

—Você vai fazer parte de uma banda que vai ser um sucesso! Vai salvar pessoas com sua música, assim como houveram músicas que te salvaram também, e você vai voltar sempre que der para me ver e vai falar comigo todos os dias ao celular, e ainda assim vai ser difícil, mas nós dois vamos passar por cima disso até que eu termine a escola e possa ir com você pra te acompanhar em todos os shows! Nós dois vamos conseguir, Samuca. Nós dois, pra sempre! -apertei suas mãos ainda mais firme, vão ser só um ano e alguns meses, podemos mesmo conseguir, sei que vamos.

—Caramba, como eu amo você! -ele declarou e me beijou intensamente novamente. E esse é um daqueles momentos que eu gostaria de poder congelar e ficar para sempre.

(…)

Narrado por Duda

Quando finalmente cheguei em casa, acreditando vigorosamente que nada poderia deixar o dia pior, avistei meu pai. Sentado na sala com a TV ligada, nem se dando conta de que estou lá até ouvir o barulho dos meus passos caminhando até meu quarto.

—Que fracasso hoje, em?! -ele berrou antes que eu tivesse a chance de fechar a porta do quarto, e assim que fiz isso e me deitei na cama, exausto, ele surgiu na porta, a abrindo sem permissão. -Fracassado você sempre foi, mas ao menos costumava fazer algum gol nos jogos. -ele solta uma risada que sai esquisita e forçada, apesar de nada ali ser engraçado, me levantei pronto para fechar a porta na sua cara. -Eu tenho vergonha de te ter como filho, garoto!

Após descobrir sobre a traição do meu pai e de toda a discussão e troca de socos, prometi a mim mesma que nada que ele falasse ou fizesse teria alguma influência sobre mim. Um homem que trai a própria esposa e tem um filho fora do casamento não pode ter o direito de apontar o dedo para ninguém. Prometi que nada que ele lhe dissesse me deixaria mal igual costumava ser antigamente, mas quando ele disse a frase não consegui passar por cima, me afetou do mesmo modo.

Ao invés de fechar a porta, simplesmente passei por ele. Não vou conseguir permanecer na casa com meu pai ali.

—Eduardo. -ele chamou, mas continuei andando. Até quando ele me incomodaria aquele nível? -Fez aquilo que eu te pedi? -ele perguntou com os braços cruzados, fazendo com que eu me virasse o encarando com firmeza.

—Sim, eu terminei com ela. -afirmei a ele e sai pela porta logo em seguida, pensando em pra onde iria agora. Por sorte me lembrei que o bar mais próximo era a duas quadras dali.