De Janeiro a Janeiro

Capítulo 12 "A Última Madrugada"


Narrado por Beatriz.

A Última Madrugada.

—Que raios é isso? -perguntei ao telefone com Viviane, que acabava de confundir totalmente minha mente enquanto falava sobre festas, algo sobre o Samuca, e logo em seguida sobre “a última madrugada”. -O mundo vai acabar amanhã e não me contaram? É isso mesmo? -brinquei, mas ela se apressou em me explicar:

—Você sabe que o Samuca é um pouco mais velho que nós, ele está a ponto de se formar e todos os anos, os alunos do terceiro ano fazem essa festa de madrugada escondido dos diretores. -ela explicou. -Acontece as uma e quinze dessa madrugada, e eu adoraria se você fosse comigo.

—Então é tudo por causa do Muquinha? Ele te convidou? -Perguntei a zoando, mas parte de mim se preocupava com Vivi, ela sempre se entregava demais quando o assunto era garotos e acabava se magoando facilmente, o oposto de mim.

—Na verdade não, uma colega do terceiro ano que me convidou, mas ela disse que a festa é aberta, e quem quiser ir pode simplesmente aparecer, e como eu adoraria ir... -ela continuou dizendo, mas por alguns segundos eu parei de ouvir, escutei minha mãe dizendo algo sobre os Almeida Campos com alguém, e automaticamente minha audição estava focada na conversa dela.

Está me subornando para que eu vote no Almeida Campos, é isso? —ela parecia estar falando com alguém que estava na porta, e eu logo percebi que se tratava de política, e lembrei que o pai do Duda estava concorrendo.

—Beatriz, está me ouvindo? -Vivi perguntou fazendo com que eu voltasse a escuta-la.

—Primeiramente, eu costumo dormir de madrugada, não perderia meu fabuloso sono para ir a uma festa para encontrar as mesmas pessoas que vejo todo dia na escola. Além disso, você está em falta comigo por ter sumido por horas, então eu posso escapar dessa, sem contar que você pode ir com aqueles amigos nerds do Samuca que você tanto gostou. -argumentei, tagarelando rapidamente para que eu pudesse voltar a ouvir o que rolava na porta.

—É, tem razão, talvez você não precise ir. -Vivi se rendeu, sabendo que não teria como debater meus argumentos.

—Obrigada. -agradeci e logo desliguei o telefone, mas quando caminhei até a sala não tinha mais ninguém na porta.

—Mãe, quem era?

—Um idiota, me ofereceu setenta reais para que eu votasse no senhor Almeida Campos na eleição. -ela quase ria, por algum motivo aquilo parecia muito hilário para ela.

—O que respondeu? -voltei a perguntar, curiosa para saber o resto da história.

—Eu disse que não, é claro. E aquilo tudo era uma vergonha e que o denunciaria. -ela continuou, eu apenas concordei com a cabeça com sua atitude, estava prestes a voltar ao quarto, quando:

—Filha... -ela chamou me fazendo virar novamente. -Acho que vou concorrer a prefeita da cidade. -me contou, decidindo.

—Vai o quê? -perguntei, virando a cabeça. -Mãe, isso tem alguma coisa a ver com o seu ódio pelo senhor Almeida Campos, que por sua vez tem tudo a ver com o papai, por algum motivo que você não quer me contar?

—Claro que não, foi apenas uma ideia. Volte ao quarto, aproveite o resto da sua sexta-feira. -ela disse, e eu segui seu conselho e voltei ao quarto, mas sabia que aquilo não tinha sido apenas uma ideia.

(...)

—VOCÊ PRECISA VIR! -eram uma e meia da madrugada, e eu nem precisei ver o número antes de atender o telefone para ter certeza que se tratava de Vivi.

—Como ousa me acordar? -perguntei, irritada e sonolenta. Eu mal conseguia a ouvir por causa do barulho que parecia acontecer lá. -Vivi? -perguntei novamente quando ela não me respondeu, um pouco depois outra pessoa estava na linha:

—Você precisa vir! -era o Samuca, havia roubado o telefone de Vivi e ela gritava ao fundo para que ele devolvesse.

—Samuca? Se conseguir me dar três motivos eu vou. -disse a ele, porque sabia que o rapaz não seria capaz.

—Três? Bem... tem uma fogueira aqui. -ele começou e eu analisei o motivo, uma fogueira, aquilo era bem raro.

—E pessoas tocando em volta dela! -ele disse, e eu tive que concordar que aquele sim era um bom motivo.

—E? -perguntei, só faltava um.

Ele ficou em silêncio, parecia estar pensando.

—Diga a ela que o Duda não está aqui. -Vivi gritou novamente ao fundo. Aquele sim era um ótimo motivo!

—Não está? -perguntei.

—Eu não o vi... -ele respondeu.

—Chego em vinte minutos. -respondi, com preguiça de levantar, mas realmente parecia ser algo que eles quisessem muito que eu fizesse parte.

—Agradeço. -ele desligou.

(...)

Vai ser legal, vai ser legal, mentalizei enquanto me aproximava cada vez mais. Entrei no lugar, a primeira coisa que vi foi Janu, em um canto, cercada por amigas, a segunda foi a fogueira, pessoas tocando em volta e eu me arrependi por ter esquecido minha guitarra. Logo em seguida, Vivi e Samuca sentados conversando em um canto, comecei a caminhar até eles, até que vi o Duda, é claro que ele estava ali. Samuca e Vivi me viram no mesmo momento, e vieram até mim.

—Desculpe, ele deve ter chegado agora, não sabíamos. -Vivi disse, percebendo minha expressão. Desde o beijo e a briga, eu vinha evitando o Duda o máximo que conseguia.

—Tudo bem. Eu não me importo, só queria saber se há algum outro motivo pra vocês terem me feito levantar da cama no meio do meu sono.

—Você pode tocar! Samuca te empresta o violão dele, vamos! -Vivi disse, e puxou-me para mais perto de onde as pessoas tocavam.

Fiquei por ali por uma meia hora, realmente não era tão ruim quanto as outras festas da escola, mas quando comecei a me entediar, disse a Vivi:

—Vou ir ao banheiro, tá? -ela assentiu com a cabeça, e eu comecei a caminhar em direção ao banheiro, quando:

—Beatriz. -alguém chamou, e eu me virei para trás. Era a Janu, estava andando de um jeito estranho e segurava um copo na mão. -Sua ladra de namorados! -ela me acusou, pude sentir o cheiro de bebida.

—Eu não roubei seu namorado. Pode ficar com ele se quiser. -comecei, mas ela me interrompeu:

—Eu não caio mais nessa. Você e ele são ridículos, se merecem, eu vi vocês dois se beijando apaixonadamente na escada naquele dia, ridículos! E ficam agindo como se nada tivesse acontecido na minha cara. -ela reclamou, e eu a olhei começando a entender alguns fatos.

Se a Janu tinha chegado e nos pegado nos “beijando apaixonadamente” então talvez o beijo realmente não fosse para fazer ciúmes nela... Me assustei ao perceber o quanto havia gostado da notícia.

—Estão frequentando os mesmo lugares, mas nem se quer se falam. Você finge muito mal!

—Olha só, Janu. Eu sinto muito se você ainda nutri sentimentos pelo Duda, mas foi você quem terminou com ele, então mesmo se eu e ele estivéssemos...

—Está finalmente confessando, vadia? -respirei fundo, aquela garota estava me estressando.

—VIU EDUARDO? -ela gritou alto, e procurou Duda com o olhar, quando nós duas o achamos, percebemos que ele já assistia a possível briga.

—De novo isso? Janu... -ele veio em nossa direção.

—Cala a boca, não demorou muitos minutos pra você se jogar pra cima dessa daí depois que terminamos, e ainda ficou com aquela cara de coitadinho. -ela soltou uma risada.

—Você está bêbada, não sabe oque...

—Você também costuma ficar muito bêbado Duda. -nós dois reviramos os olhos.

—Olha só, eu não tenho nada a ver com isso, então já vou indo. -avisei e me virei para sair, Janu com certeza estava bêbada o suficiente para sentir saudades de namorar o capitão do time de futebol da escola. Afinal, aquela era sua única reputação.

—Foge, sua covarde, eu pelo menos não teria medo de demonstrar meus sentimentos. Aliás, dois covardes, todo mundo sabe que vocês estão tendo um caso. Vai dizer que papai não deixou, Duda? -ela perguntou ao Duda, e eu me virei novamente para olha-los, eu já sabia que falar do pai dele daquele jeito o irritava muito.

—Que tal brincarmos de verdade ou desafio? Ou apenas desafio, já que ninguém mais diz a verdade. -ela disse e me olhou em seguida. -Bia, eu te desafio a mostrar o que realmente sente. -ela disse, o olhar realmente era desafiador, como se apenas esperasse que eu fosse logo embora dali, e eu realmente senti vontade. A festa legal já tinha ficado chata a tempos. Mas então, segui o primeiro impulso que me veio a mente.

Andei rapidamente até Duda, e o beijei. Sem me importar com mais nada, mas torcendo para que Janu estivesse tão surpresa quanto Duda, e até mesmo eu, sua boca enfim havia sido calada. Parei de pensar, ignorei a leve reluta da minha cabeça, e me entreguei de vez ao beijo, ele fez o mesmo. Segurou meu cabelo, levando-me para mais perto. Quando nos afastamos, nos olhamos, ele ainda estava surpreso, Janu bufou alguma coisa e saiu correndo. Nós dois rimos.

—Quer sair daqui? -ele perguntou e eu assenti com a cabeça.