De Janeiro a Janeiro

Capítulo 1 "Verdade ou Consequência"


Ser eu era uma droga. Ser eu naquela tarde calorenta, com o calor se acumulando cada vez mais e passando por todos os alunos da escola depois de duas aulas seguidas de física era duplamente uma droga. Acrescentando isso ao fato das garotas metidinhas da minha sala tentarem me rebaixar para se sentirem melhor, minha pontuação subia para triplamente uma droga. E somando ainda minha melhor amiga louca gritando que queria brincar de verdade ou consequência, ding-ding-ding! O sininho no topo de Medidor de Droga não poderia soar mais alto.

—Vivi, por favor, para de gritar! –pedi tampando sua boca, mas ela me mordeu.

Estávamos no horário livre quando Viviane teve a ideia supostamente genial.

—Eu não vou jogar esse jogo. Quantos anos nós temos? 13?

—Biaaaa, por favor, se não brincar eu vou contar á sua mãe que você tomou outra advertência por brigar na escola! –ela ameaçou.

—Conta. –eu dei de ombros.

—Bia, se não brincar eu vou te fazer sentar com as lideres de torcida na hora do intervalo de novo.

—Ok, eu jogo! –decidi por fim, não por causa da ameaça, apesar de ser extremamente chato sentar com as líderes de torcida na hora do intervalo, mas aceitei porque sabia que a Vivi não iria parar de insistir até que eu realmente jogasse.

Ela comemorou com um sorriso convencido.

—Quem mais vai brincar? –perguntei, era verdade ou consequência, não dava para ser só nós duas.

—QUEM QUER JOGAR VERDADE OU CONSEQUÊNCIA? –Vivi gritou e grande parte das líderes de torcida se exaltaram no mesmo momento, elas amavam esse jogo.

Por que é que eu tinha concordado mesmo?

Vivi era uma das garotas mais populares da escola, então logo outros grupinhos apareceram. E depois de um certo tempo estava quase toda a nossa turma sentada em uma rodinha improvisada ansiosos pelo começo da brincadeira.

—Podemos começar? –perguntou uma das líderes.

—Jogando verdade ou consequência e nem me chamaram, é isso? –Duda perguntou, se aproximando, de repente, junto a Janu.

O casal do ano acabava de chegar a sala de estar.

—Chegou o aparecido... –murmurei, me levantando, pronta para sair do jogo se eles decidissem ficar.

—Falou a aparecida... –Eduardo bufou de volta, fazendo uma careta.

—Eu quero jogar! –Janu decidiu.

—Mas não vai. –eu respondi por todos. Simplesmente não queria que eles entrassem na brincadeira e acabassem com toda a graça que poderia ter.

—Quem é você mesmo para nos impedir? –Janu implicou, por que os dois não podiam ir namorar em outro canto e nos deixarem em paz?

—Uma garota que não quer que você jogue, e está dizendo que não vai! –falei, sendo obvia.

Como eu odiava aquela garota...

—Beatriz, qual o problema em participarmos? –Eduardo se intrometeu novamente.

—Ah, todos, simples assim. Por que não vão fazer outra coisa?

—Por favor, não comecem! –Vivi disse, se levantando também e fazendo uma expressão de tédio. –Bia, os deixem brincar, ok?!

—Tá, então eu saio. –decidi, e comecei a dar passos para fora daquele circulo.

—Não vai fazer falta nenhuma mesmo. –Janu provocou.

—O que não vai fazer falta nenhuma é esse nariz fora da sua cara! –falei, me voltando para ela, e me aproximando. Ela deu um sorriso falso e isso logo fez com que minha voltasse de quebrar sua cara aumentasse, então, parti para cima dela.

Mas antes que qualquer coisa acontecesse, senti as mãos de Duda me apertarem. Me assustei com o contato dele ao meu corpo, enquanto Janu voltou a sorrir. O que é que ele via nela?

—Ei, me solta. –pedi, e ele logo me soltou.

—Parem com isso. –Mosca, que também estava sentado ali, implorou.

—Bia, não seja egoísta, eles podem jogar. –Vivi insistiu.

—Deixa ela ir, Vivi. Tem medo de mim... –Janu disse, ouvir sua voz me irritava.

—Medo de você? –eu ri. –Ok, eu vou jogar! –decidi quando me lembrei das chances que eu poderia ter de fazer com que ela se desse mal naquele jogo.

—Vocês já sabem as regras, então, quem começa? –Vivi perguntou enquanto eu ainda me sentava no meio a rodinha.

—Eu. –decidiu Ana, uma das líderes de torcidas em que eu não odiava tanto.

Ela girou, a garrafa parou justamente em Mosca e eu.

Ele esfregou as mãos, ansioso para que eu me desse mal.

—Não seja mal comigo, Mosquinha. –falei e ele me olhou e fez que não com a cabeça.

—Verdade ou consequência?

—Verdade. –eu disse, era só o início do jogo.

Ele pensou por alguns segundos.

—Por que você odeia a Janu e o Duda?

Olhei para os dois, Janu fazia uma expressão de deboche, enquanto Duda parecia interessado na minha resposta.

—Aquela garota é chata, fútil, líder de torcida.

—Ei! –Vivi interrompeu, me corrigindo por xingar as líderes de torcida.

—E todos os outros nomes feios que eu não posso falar em um colégio. -continuei.

—E o Duda? –perguntou Mosca, esperando pela resposta.

—Eu não o odeio, eu só odeio as suas companhias.

Eu fui sincera, mas ao ver o olhar de Duda, me lembrei que talvez e não fosse muito sua fã. Antes dele começar a namorar Janu, era o tipo de garoto que ficava com todas as garotas da escola, e como eu era uma das poucas em que não estava na lista de “caidinhas pelo Duda” nós já não nos dávamos muito bem. Mas então ele começou a namorar a Janu, minha maior inimiga, e eu suspeitei que era só para me irritar então apenas ignorava os dois, mas aquele namoro durava até hoje.

E eu já nem sabia se preferia ele com ela, ou pegando geral como antes. Mas de qualquer forma, não era da minha conta!

—Mas eu ainda me pergunto se existe um coração no meio de toda a sua arrogância e jeito metido, não é mesmo filhinho de papai?! –virei-me para ele. Ele odiava que eu o chamasse de “filhinho de papai”.

—Eu me pergunto o mesmo de você, Bia. –ele falou.

—Minha vez. –mudei o assunto e girei a garrafa.

O jogo continuou, e várias revelações foram feitas. A garrafa parou três veze (quase seguidas) em Vivi, e a mesma respondeu todas as perguntas. Janu acabou tendo que beijar o Janjão em um dos desafios e Duda não pareceu se importar muito, já que aquilo só se tratava de uma brincadeira.

—Minha vez de girar... –Disse o Janjão, olhando para todos.

Para minha surpresa, parou em mim.

—Quero consequência! –me apressei para responder, já estava farta de tantas verdades.

—Oba! –comemorou Janjão, pensando em um desafio. –Quero que você beije o... –ele fez o famoso mistério. –O Duda! –disse, por fim, e eu o olhei para se ele estivesse brincando, eu não podia ter ouvido direito.

—Quem? –perguntei para ter certeza.

Duda parecia se divertir com meu sofrimento ao ter que beija-lo, estava com um sorrisinho irritante no rosto.

—O Duda não! –Janu se intrometeu, levantando-se revoltada. –Ele tem namorada. –ela disse, mas aquilo não parecia ser motivo o suficiente para evitar aquilo, afinal, Duda tinha deixado ela beijar outro garoto também.

Duda revirou os olhos, provavelmente pensando no mesmo que eu.

—Eu deixei você beijar o Janjão, é apenas um jogo, amor. –ele disse para Janu, como se fizesse questão de me beijar. Pisquei, percebendo que eu continuava em choque.

—Não é a mesma coisa, e isso não é apenas um jogo! –Janu falou arrumando motivos para não deixar que o beijo acontecesse, e pela primeira vez, queria muito que a palavra dela fizesse alguma diferença. A verdade era que Janu tinha uma certa insegurança na relação dela com Duda.

Mas, para a minha sorte, o sinal tocou no mesmo instante, anunciando que a aula de Geografia iria começar, e salvando Janu de ter visto algo desagradável para ela.

Todos saíram da rodinha e foram em busca a suas carteiras, percebi que Duda se aproximava de mim.

—Deu azar em, podia ter me beijado! –Disse o menino convencido.

—Como se eu quisesse! –respondi com sarcasmo. Quem esse garoto pensava que era?

—E não queria? –ele perguntou como se quisesse ter certeza que eu não gostava dele.

—Preferiria beijar um sapo, amiguinho! –respondi de uma vez por todas, dando um sorrisinho, mas eu sabia que havia ficado sem atitude depois do desafio de Janjão.

Fui até minha carteira, o deixando parado lá feito bobo.