Ele podia ver a menina correr pela casa, brincando. Pequena, cabelos escuros e olhos brilhantes. Era num tempo onde nada podia afetá-la. Num tempo onde não havia uma nuvem negra sobre a cabeça dela. Onde sua única preocupação era ser criança.
Enquanto passava entre os túmulos com Dembe, podia ver Keen, Ressler, Aram, Harold e sua esposa, e vários outros agentes. Jenna Mhoritz estava morta. Não era um truque, uma brincadeira ou uma mentira. Ela havia morrido. Morrido para proteger Raymond Reddington, seu padrinho.
Quando se aproximou mais, pode ver com clareza o que estava escrito na lápide.

JENNA MHORITZ
O “PARA SEMPRE” COMEÇA AGORA
1987 – 2018

Ela finalmente havia cruzado a ponte. Estava com Maria, com seus irmãos e amigos. Sua última missão, a de proteger quem devia proteger, havia a levado.
O FBI chegou atrasado. Jenna já tinha morrido, e ninguém poderia trazê-la de volta. A única coisa que faltava era Red dar os recados de Jen. Ele jurou que o faria.
Primeiro falou com Harold, antes do enterro começar. O diretor assistente ficou sem fala ao ouvir o recado de sua ex-agente. Foi a esposa quem agradeceu Raymond por transmitir o que Jenna queria.
Em seguida, foi até Aram. Surpreendentemente, ele começou a chorar. Red deu uns tapinhas no ombro dele e se afastou até onde Ressler estava, longe de todos os outros, e até de Lizzy.
—Jenna tem um recado pra você, Donald. –O agente cruzou os braços, tirando o olhar da lápide. –Ela disse que o ama, e que não queria tê-lo machucado.
—Ela se foi mesmo? Não é outro dos seus truques? Jenna está mesmo morta?
—Está. –O loiro assentiu.
—Ela sempre dizia... Que se morresse em serviço, seria uma honra. E ela morreu em serviço. Fez seu trabalho. Mas... –Não conseguiu continuar.
—Ela só caiu, após matar todos os cinco atiradores. Jenna era forte, e morreu lutando, é isso que importa. Lembre-se disso, e talvez isso o conforte.
Red seguiu até onde Lizzy estava sentada. A agente estava com os olhos vermelhos, e tinha um lenço em mãos, secando as lágrimas. Se sentou ao lado dela.
—Está acontecendo alguma coisa?-Keen perguntou. –Vi você indo pra lá e pra cá. O que houve?
—Jenna queria que eu transmitisse recados pra ela.
—Ah, Jen. –Fechou os olhos.
—Ela deixou um pra você.
—Deixou?-Olhou para Raymond. –O que?
—Disse que a amava como uma irmã. –Lágrimas voltaram a escorrer pelo rosto de Lizzy.
—Ela disse?
—Disse. E sei que é verdade.
—Tenho certeza que é. E é recíproco.
O enterro começou. Lá na frente, um padre dizia seu discurso. Os mais próximos de Jen mantinham sua mente dividida. Em parte ouviam o padre, e em parte lembravam da Dangerous que se meteu no FBI. Da garota mal educada que atrapalhava muitas missões com seu jeito irresponsável.
—Era um pedido de socorro. –Lizzy sussurrou. Reddington começou a prestar atenção nela. –Dava pra ver que ela estava chegando ao fim. Como uma vela que está queimando há horas, e então... Acaba.
—Lizzy...
—Ela se colocou entre você e cinco atiradores, sem hesitar. Sabia que ia ser atingida. Ela sabia que ia morrer.
—Jenna estava cheia de pequenos cortes superficiais. Pequenos cortes que foram aumentando de tamanho e profundidade. Perder os pais, perder a verdadeira mãe, a equipe, os irmãos, amigos...
—Perder Ressler...
—Ela não perdeu Ressler. Ela escolheu deixá-lo. Na cabeça dela, estava salvando-o.
—Mas se destruindo no processo.
—É disso que se tratam sacrifícios. Você perde algo. Na maioria das vezes, algo que importa. Jenna se importava com Donald, o amava. E por isso achou melhor salvá-lo do monstro que ela achava ser.
Red moveu o olhar para longe, vendo o que ninguém mais via. Duas meninas pequenas. Uma de cabelos claros, e a outra de cabelos escuros. Ambas estavam girando no lugar, rindo e cantando. As duas não fizeram parte da vida dele ao mesmo tempo, era apenas sua imaginação, forte demais. “Tio Ray, vem brincar com a gente!”, a de cabelos escuros gritou, chamando-o com a mão. “Vem!”.
—Raymond. –Dembe chamou, trazendo-o de volta a realidade. –Olhe para a esquerda. –Red franziu a testa, mas o obedeceu. Uma figura familiar se escondia atrás de uma árvore, espiando de longe. Tom Keen. –Acha que ele está aqui por quem? Jenna ou Elizabeth?
—Eu não sei. Onde está Lizzy?
—Ali, com o agente Ressler.
—Certo. Fique atento, se Tom tentar se aproximar, interfira. –Dembe assentiu.
—Não acredito que Jenna também me deixou um recado.
—Ela tinha aquela cara de mal humorada, mas fazia amizade fácil. E não tem como não gostar de você.
***
—Sem a agente Malik, sem a agente Mhoritz... Quem é o próximo?-Aram murmurava, quando Lizzy passou por ele. Ela quis parar e dizer algo, mas estava com pressa.
A sala de Jen estava vazia, uma agente já tinha retirado as coisas da antiga dona. O quarto na casa de Red ainda estava a mesma coisa. O que fariam com as coisas de Jenna? Ela não tinha família.
Encontrou Ressler na sala dele.
—Posso entrar?-Perguntou, ele fez que sim. –Estou indo ver as coisas de Jenna, arrumar as coisas dela e tirar de lá. Quer algo?
—Não. Ela devolveu minhas coisas depois que... Terminamos.
—Certo. –Se virou para a porta, então parou. Não podia adiar mais. Voltou e sentou na frente de Ressler. –Não sei como fazer isso de um jeito mais simples. Acho melhor terminarmos.
—Estive mesmo pensando nisso. Não deu certo, não é?
—Não. Mas ainda...
—Podemos ser amigos? Claro.
—Se precisar conversar... Sobre Jen... Estarei aqui.
—Obrigado.
***
—O que vai fazer com tudo isso?-Lizzy perguntou a Red, olhando em volta. O quarto permanecia intocável, do mesmo jeito que Jenna deixou antes de sair pela última vez.
—Não sei. Por enquanto... Vou deixar aqui. –Tocou um porta retratos ao lado da cama. Jenna e sua equipe, Dangerous. –Talvez doar algumas coisas, guardar outras.
—Acho que ela iria preferir isso. Sabe, a ficha demorou a cair quando... Entrei naquela lugar e vi Jenna caída. Uma vez... Ela forjou a própria morte, outra vez voltou... Então... Achei que veria Jen levantar e voltar ao trabalho... Voltar a ser... Jenna Mhoritz. Sete minutos se passaram... Então dez... E... Ela se foi, de vez.
—Ela cruzou a ponte. Ela encontrou a família dela.
Do outro lado do quarto, o fantasma de uma menina morena sorriu para ele.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.